terça-feira, 10 de novembro de 2009

Simbolismo Português

Simbolismo em Literatura Portuguesa

(aulas da profa. Annie em 2003 - a interpretação é de minha responsabilidade)


Experiência supernatural das coisas, palavras consideradas sempre enquanto símbolo, ou seja, significado e significante. Temos então, no simbolismo, duas vertentes da palavra: uma, como poder de evocação, sugestão; outra, como poder de musicalidade da palavra.

Toda palavra é um símbolo.

Normalmente, em literatura, símbolo é o oposto da alegoria, ou seja, o símbolo tem valor imediato, é pronto e acabado. Seu significado está em si próprio. Ex: cruz = Cristo; balança = justiça.

Já na alegoria, o significado vai se construindo. É preciso somar passagens para se chegar ao significado (idéia-mãe).

No Simbolismo, a palavra evoca. O sentido é bem maior que o símbolo oposto ao da alegoria. A imagem não é tão imediata assim.

Correspondências

A Natureza é um templo onde vivos pilares
Pronunciam por vezes palavras ambíguas;
O homem passa por ela entre bosques de símbolos
Que o vão observando em íntimos olhares.

Em prolongados ecos, confusos, ao longe,
Numa só tenebrosa e profunda unidade,
Tão vasta como a noite e como a claridade,
Correspondem-se as cores, os aromas e os sons.

Há perfumes tão frescos como a jovem carne,
Doces como oboés e verdes como prados,
- E há outros triunfantes, ricos, corrompidos,

Que se expandem no ar como coisas sem fim
Como o âmbar, o almíscar, o incenso e o benjoim,
E cantam os arroubos da alma e dos sentidos.

(BAUDELAIRE, Charles. As Flores do Mal. Lisboa: Assírio & Alvim, 1996)

Este poema é como que um manifesto simbolista.

A Natureza aqui, como substantivo próprio e não comum, tem um significado bastante amplo. É o mundo no sentido de universo. É um templo.

O homem em sua existência terrena é um exilado. Está sempre a buscar sua origem, o divino. Está exilado da condição original (na perspectiva cristã).

No Simbolismo existe a condição primacial, primigênica. Antes de nascermos, estamos em comunhão perfeita com o universo. Estamos diluídos no mundo natural.

Ao sairmos desta condição plena primigênica, entramos num mundo marcado pela tragicidade. Então, a existência é a busca de se voltar à condição de comunhão com o universo.

Parece antagônico, mas, a existência terrena, na perspectiva simbolista, causa um individualismo que nos torna seres fragmentados.

O texto de Schopenhauer “O mundo como vontade e representação” foi o texto filosófico fundamental do Simbolismo. O homem é um exilado que busca sua condição primigênica. Ele é um ser fragmentado.

O que move o homem é recuperar a condição primeira e não, aquele monte de vontades, que pensamos que temos”. Essas são pequenas representações de vontade. A única vontade verdadeira é deixar a existência e voltar ao mundo natural.

“Bosques de símbolos” são coisas naturais que mostram ao homem a possibilidade de reintegração (elementos que evoquem aquele mundo primeiro – a água e a terra).

Qual a forma de deixar a existência?

Morrendo.

Ao sermos enterrados, somos amparados pela terra. Nossa mãe. (tem-se aqui a reintegração)
Os nossos românticos queriam a morte para se livrar da existência trágica. Os simbolistas, não. Estes, queriam a reintegração à natureza.

A morte na água era a maior possibilidade de reintegração. Ofélia com sua morte na água, tem esse sentido. Essa falta de adaptação à sociedade. Por isto, os simbolistas tomaram Ofélia em pintura como o ideal de decomposição e reintegração no Simbolismo (nesta morte já se refaz em natureza).

Vigora a idéia de desaparecimento do fragmentário e a união na totalidade cósmica.

Fragmentário/totalidade
Cisão/união

Não é antítese, é um processo.
No iluminismo, tínhamos o seguinte silogismo:

Mais ciência = iluminação = mundo melhor = mais encantamento = mundo mais igualitário

No Romantismo e no Realismo isso se mostrou o inverso do ideal. A ascensão da burguesia mostrada na literatura, seja num Almeida Garret ou num Eça de Queiroz (“Viagens da minha terra” ou “O crime do padre Amaro”, respectivamente), busca-se mostrar a decepção, por isso expressões como “regeneração” bastante comum em Portugal na segunda metade do século XIX. Temos então, nesse século, um homem desencantado, seja no período romântico, seja no realista e naturalista.

A Revolução Industrial trouxe a fragmentação e uma reificação do ser (processo pelo qual se objetivam as relações sociais, as relações humanas, os produtos do trabalho, transformando-os efetivamente em “coisas sociais” – conceito introduzido por Marx).

Antes, o homem participava de todo o processo de criação e produção. Depois, o homem foi retirado do processo totalitário e se tornou apenas uma engrenagem. Agora, o homem só vale pelo que produz e pode ser vendido.

Perdemos o conceito humanista do homem e a totalidade. O homem se tornou uma coisa facilmente substituível. Um fragmento.

O homem vai, então, se tornando cada vez mais fechado em si mesmo.

Encanto – (des) encanto
Ilusão – (des) ilusão

Aquela ilusão de que a Revolução Industrial traria mais felicidade aos homens foi pro espaço.
O homem do Simbolismo é o homem do desencanto, da desilusão. Já viu tudo isso e já passou por tudo isso.

Mas o suicídio não serve para o simbolista. Isto seria a desistência. Ele, então, se fecha em suas “torres de marfim” e procura no mundo natural sua reintegração, ou, busca nas coisas naturais a evocação deste mundo primevo que espera voltar um dia. Ele espera passivamente pela sua reintegração (pela morte). Busca no mundo natural, coisas que sugiram aquele estado natural primeiro e universal.

“Em prolongados ecos, confusos, ao longe,”

Existem elementos no mundo material (ecos, cores, aromas, sons) sempre em correspondência, e, que evocam unidade com o universo, com o mundo natural.

Sensações cinestésicas (constatações materiais) que são apreendidas pelos sentidos. Quanto mais se misturar essas sensações, mais evocações para o mundo integral.

Temos nos dois primeiros quartetos uma referência aos desejos íntimos dos humanos. Depois, no primeiro terceto, já aparece uma perspectiva mais sensual, mais material. Há uma queda: primeiro, ascensão mais metafísica. Depois, queda ao desejo mais carnal, material (necessidades materiais da existência – representação da vontade superficial) em detrimento da vontade verdadeira (reintegração universal).

Há um movimento de ascensão e queda e, no fim, nova ascensão “E cantam os arroubos da alma e dos sentidos”

Wmofox, 6.9.03

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