Este blog é para reflexões literárias, filosóficas e do mundo do saber. É também para postar minhas aulas da USP. Quero partilhar tudo que aprendi com os mestres de meu curso de letras.
domingo, 27 de abril de 2008
Só lendo Machado de Assis...
Quando leio os bons jornalistas de nosso país como Renato Rovai, Paulo Henrique Amorim, Mino Carta e mais alguns, fico ao mesmo tempo informado de fato e... como diria... abestalhado e perplexo pela compreensão do lugar em que vivo.
É tanta podridão e nojo por trás do verniz e capa grã-fina das coisas que nos cercam, e para piorar, é tanta subserviência até daqueles que esperávamos mais "culhão" para fazerem o enfrentamento com o status quo, que só lendo nosso mestre maior Machado de Assis para suportar o modo como a nossa sociedade está organizada.
A diferença entre o mestre da literatura e grandes jornalistas está na linguagem literária do Mestre do Cosme Velho e na metalinguagem dos nossos bons jornalistas progressistas. Ambos têm a capacidade de descrever, narrar, criticar ou abrir feridas, mas Machado traz uma sutileza ímpar nas ironias rabugentas. Frases curtas e certeiras. Agudas. Inteligentes.
Bom, sigo em meu objetivo de ler, reler e conhecer toda a obra machadiana. Já li quase todos os seus romances - os da chamada primeira fase, até 1880, e agora estou lendo Esaú e Jacó, o penúltimo antes de Memorial de Aires.
Confesso que quanto mais descubro alguma coisa a respeito da forma de fazer-literário do mestre Machado, mais quero reler o que já conheço para captar tudo o que perdi antes. É, no mínimo, instigante.
SUTILEZAS MACHADIANAS:
"... Eis aí vinha a realidade do sonho de dez anos (Natividade estava grávida dos gêmeos), uma criatura tirada da coxa de Abraão, como diziam aqueles bons judeus, que a gente queimou mais tarde, e agora empresta generosamente o seu dinheiro às companhias e às nações. Levam juro por ele; mas os hebraísmos são dados de graça..."
In: Esaú e Jacó, capítulo VI, Maternidade
"... Santos falava em fazer um deles (filhos) banqueiro, ou ambos. Assim passavam as horas vadias."
In: Esaú e Jacó, capítulo VIII, Nem casal, nem general
Post Scriptum (5/08/15):
A última citação, sobre os banqueiros, tem sentido dúbio, para quem não conhece o contexto. Tanto pode parecer que o sentido semântico é que o personagem Santos quer que os filhos sejam banqueiros para terem suas horas vadias, quanto que o casal, em sua morada, em horas vadias, pensava o futuro profissional dos filhos que viriam adiante.
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