terça-feira, 10 de novembro de 2009

Simbolismo Português (II)

Simbolismo. Com relação à Literatura Portuguesa.

Se não é o dinheiro que me interessa,
Por que a pressa?
É porque as contas clamam, pipocam, inflamam.

Mas eu queria tempo livre...
...o meu tempo livre.
Pra fazer o que bem entender.

Sempre quis ser pensador, escritor, professor...
wmofox


(aulas de 2003 - a interpretação é de minha responsabilidade)

Tenho gostado do Simbolismo. Seu significado. Seu momento.

O clamor dos autores em oposição ao fetichismo da matéria, à reificação de tudo e de todos.

Sinto que caso tivesse tido contato com esse conhecimento na época, teria me considerado um simbolista. Sou fragmento. Sempre me achei fragmento. Penso até que em alguns textos escritos por mim, como aquele do objeto inanimado fazendo suas reflexões e conjeturas acerca de voltar à natureza enquanto fragmento, tem muito dessa filosofia.

Continuando a análise do poema “Correspondência” de Baudelaire, vemos que no primeiro terceto há uma quebra daquela ligação mais pura e espiritual causada (evocada) pela natureza para começar uma ligação mais carnal: “Há perfumes tão frescos como a jovem carne,”. Ocorre um apelo sexual.

Há dois perfumes: um mais sensível, mais material. Outro, mais espiritual, que mesmo corrompido canta o arroubo da alma.

Tudo que está no mundo material está corrompido, porque nos lembra que somos fragmentados.
Spleen – o homem no século XIX é melancólico, desiludido, desencantado. Então, diziam que o baço produzia um líquido negro que, no sangue, causava um desencanto absoluto. Dominava seu espírito.

Lembrar que no Simbolismo toda palavra é escolhida de forma que seu significado tenha mais de uma leitura, que evoque estados de alma, que coloque o homem em contato com o mundo espiritual. (sentido, aliás, diferente do tradicional de símbolo, que nos remete a um significado mais imediato, o qual se opõe ao de alegoria)

Para os simbolistas, quanto mais for sugerido e evocado para o leitor, maior sucesso alcançado.

Esse uso da palavra enquanto símbolo, é uma ruptura com a tradição. Aqui, ela não tem objetivo clarificador. Consequentemente, ela se torna excluidora e não reificadora, ou seja, é feita só para pessoas especiais, preparadas.

A obra simbolista, mais refinada, não é passível de fácil coisificação, é dessa forma, tornada mais aristocrática, elitizada. Não é facilmente tornada mercadoria.

Essa concepção é oposta ao Romantismo, que queria democratizar a arte através do uso de palavras mais populares. No Simbolismo, através do sentido das palavras, somos evocados, ocorre sugestão para um mundo espiritual e então, vemos a correspondência entre o mundo físico e aquele outro metafísico.

Meio - Fim
Relação entre
Matéria e espírito

Os simbolistas criaram o alexandrino trímetro (4a, 8a, 12a) que é diferente do tradicional.

Música -> gera sugestão -> percepção sensorial

A música

Arrasta-me por vezes como um mar, a música!
Rumo à minha estrela,
Sob o éter mais vasto ou um tecto de bruma,
Eu levanto a vela;

Com o peito pra frente e os pulmões inchados
Como rija tela,
Escalo a crista das ondas logo amontoadas
Que a noite me vela;

Sinto vibrar em mim as inúmeras paixões
De uma nau sofrendo;
O vento, a tempestade e as suas convulsões

Sobre o abismo imenso
Embalam-me. Outras vezes é a calma, esse espelho
Do meu desespero!


(BAUDELAIRE, Charles. As flores do mal. Lisboa: Assírio & Alvim,1996)

Alguns simbolistas alternavam versos inteiros com seus quebrados: octossílabos-tetrassílabos; decassílabos-redondilhas menores.

Aqui, Baudelaire alterna o mais tradicional com o mais popular: o alexandrino e a redondilha menor. E é ainda um soneto.

Os simbolistas inovaram tanto (renovando a Lírica, com os princípios de construção do poema, mas, com relação ao passado) que abriram caminho para os modernistas.

“Arrasta-me” – já traz toda a força semântica do verbo.

A música tem esse poder de arrastar o homem para seu interior, para suas percepções sensoriais.

O formato dos versos (expansão, retração) também acaba apresentando materialmente aquilo que se quer sugerir. Temos também palavras cujo significado semântico também nos lembra expansão e retração: na primeira estrofe – mar (com seu movimento constante); na segunda estrofe – peito (com seu vai e volta que nos dá a vida).

A música vai causando um desligamento lento e também um religamento mais extra-sensorial.

O homem fica sujeito às intempéries da vida e do destino, assim como a nau às tempestades. O homem está perdido no contexto simbolista como a nau na imensidão do mar (sob as forças que os submetem)


Sobre o texto de Walter Benjamim, algumas frases marcam bem o seu significado para uma reflexão quase que imediata do que foi e é até hoje o entrelaçamento do capitalismo burguês com a arte.

“...a arte põe-se a serviço do comerciante”, referindo-se a Paris ser a capital do século XIX e sobre a criação das galerias parisienses de ferro e vidro em seus centros.

“Cada época sonha a seguinte”, de Michelet . Aqui também vemos um quadro que começou no passado e que é a pura realidade nos dias atuais. A propaganda cria as necessidades de consumo e cria o sonho de consumo de amanhã, já que tudo é mercadoria.

“As Exposições Universais transfiguram o valor de troca das mercadorias. Criam uma moldura em que o valor de uso da mercadoria passa para segundo plano. Inauguram uma fantasmagoria a que o homem se entrega para se distrair. A indústria de diversões facilita isso, elevando-o ao nível da mercadoria. O sujeito se entrega às suas manipulações, desfrutando a sua própria alienação e a dos outros”.

“...a moda prescreve o ritual segundo o qual o fetiche mercadoria pretende ser venerado. Grandville estende tal pretensão aos objetos de uso cotidiano e inclusive ao cosmos”.

“Em Baudelaire ou as ruas de Paris, vemos o engenho dele, nutrindo-se da melancolia. É alegórico. Pela primeira vez, com Baudelaire, Paris se torna objeto da poesia lírica. O flâneur ainda está no limiar tanto da cidade grande quanto da classe burguesa. Nenhuma delas ainda o subjugou. Em nenhuma delas ele se sente em casa. A multidão é o véu através do qual a cidade costumeira acena ao flâneur enquanto fantasmagórica. Na multidão, a cidade é ora paisagem, ora ninho acolhedor. O decisivo em Baudelaire, no entanto, um substrato social, no ‘idílio fúnebre’ da cidade: o moderno. O moderno é um acento primordial de sua poesia. Como o spleen ele deixa o ideal em pedaços”. (tudo citações de Benjamim)

No último poema das Flores do mal, “a viagem”, vemos a derradeira viagem do flâneur: a morte. Sua meta: o novo. “Ao fundo do desconhecido para encontrar o novo!”

Haussmann deu a si mesmo o nome de “artista demolidor”. Sentia-se como que chamado para a sua obra, o que enfatiza em suas memórias. Assim, ele faz com que Paris se torne uma cidade estranha para os próprios parisienses. Não se sentem mais em casa nela. Começa-se a tomar consciência do caráter desumano da grande metrópole.

Wmofox, 14.9.03

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