sexta-feira, 2 de abril de 2010

O porquê de "Esaú e Jacó", de Machado de Assis, ser bibliografia básica da carreira diplomática

Foto de William Mendes: pôr do sol no Palácio Real de Madri - Espanha (a partir da fachada sul, vendo o Pátio de Honra).
(atualizado em 4/4/10)

Estou pensando no porquê de o romance de Machado ser leitura obrigatória para o concurso da carreira diplomática do Itamarati.

Acredito que seja por se tratar a personagem de um diplomata aposentado que, ao falecer, deixa um conjunto de sete tomos sendo os seis primeiros do Memorial e um sétimo chamado de Último, que o narrador viria a chamar de Esaú e Jacó.

Machado descreve aquelas que seriam as características necessárias a um funcionário da carreira diplomática até à contemporaneidade dele.

"Não me demoro em descrevê-lo. Imagina só que trazia o calo do ofício, o sorriso aprovador, a fala brande a cautelosa, o ar da ocasião, a expressão adequada, tudo tão bem distribuído que era um gosto ouvi-lo e vê-lo".

Talvez o Ministério das Relações Exteriores veja também no conselheiro Aires as características básicas para um diplomata. O jeito de não pender apaixonadamente nem para um lado nem para o outro, de maneira a tentar conciliar os lados em qualquer tipo de pendenga internacional.

"Era cordato, repito, embora esta palavra não exprima exatamente o que quero dizer. Tinha o coração disposto a aceitar tudo, não por inclinação à harmonia, senão por tédio à controvérsia. Para conhecer esta aversão, bastava tê-lo visto entrar, antes, em visita ao casal Santos. Pessoas de fora e da família conversavam da cabocla do Castelo..."

E segue o conselheiro sem entrar em "bola dividida":

"-Chega a propósito, conselheiro, disse Perpétua. Que pensa o senhor da cabocla do Castelo?

Aires não pensava nada, mas percebeu que os outros pensavam alguma cousa, e fez um gesto de dous sexos. Como insistissem, não escolheu nenhuma das duas opiniões, achou outra, média, que contentou a ambos os lados, cousa rara em opiniões médias. Sabes que o destino delas é serem desdenhadas. Mas este Aires, - José da Costa Marcondes Aires, - tinha que nas controvérsias uma opinião dúbia ou média pode trazer a oportunidade de uma pílula, e compunha as suas de tal jeito, que o enfermo, se não sarava não morria, e é o mais que fazem pílulas. (...)"

MAS atenção, não quer dizer que o diplomata não tinha opinião e não a manifestava:

"Não cuides que não era sincero, era-o. Quando não acertava de ter a mesma opinião, e valia a pena escrever a sua, escrevia-a".

Bibliografia:

ASSIS, Machado de. Esaú e Jacó. In: Obras Completas. Editora Globo, 1997.

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