sábado, 2 de fevereiro de 2013

Riobaldo e Diadorim - Metáforas de todos nós


Veredas mineiras: um amanhecer.
Foto: William Mendes


Refeição Cultural

Riobaldo e Diadorim – Metáforas de todos nós


GRANDE SERTÃO: VEREDAS


Neste nosso viver, nesse mundo duro e trágico, todo mundo, desde criança, precisa se fazer um pouco Riobaldo para sobreviver em seu meio.

Nesta nossa vida de desejos e sonhos impossíveis, todo mundo, tem o seu Diadorim; a sua saudade, seus amores e seus pesares.

“Ao tanto com o esforço meu, em esquecer Diadorim, digo que me dava entrante uma tristeza no geral, um prazo de cansado. Mas eu não meditava para trás, não esbarrava. Aquilo era a tristonha travessia, pois então era preciso. Água de rio que arrasta. Dias que durasse, durasse; até meses. Agora, eu não me importava. Hoje, eu penso, o senhor sabe: acho que o sentir da gente volteia, mas em certos modos, rodando em si mas por regras. O prazer muito vira medo, o medo vai vira ódio, o ódio vira esses desesperos? – desespero é bom que vire a maior tristeza, constante então para o um amor – quanta saudade... –; aí, outra esperança já vem... Mas, a brasinha de tudo, é só o mesmo carvão só. Invenção minha que tiro por tino. Ah, o que eu prezava de ter era essa instrução do senhor, que dá rumo para se estudar dessas matérias...” (p. 248)

O entardecer em uma vereda da vida.
Foto: William Mendes


CISMANDO COM AS VEREDAS DO SERTÃO

Eu recheguei a uma conclusão: o Grande Sertão: Veredas não se lê de uma vez não.

Ele é um livro como aquele que usam chamar de "Minutos de Sabedoria".

É um belo livro como a bíblia, que é um antigo volume de histórias, salmos e sabedorias para aqueles que creem em um deus ou no mundo metafísico, pois ali se fala de amor, de solidariedade e também fala de vingança e poder – coisas tão humanas!

Eu posso viver com o Grande Sertão na cabeceira e ir colhendo minutos de profunda reflexão sobre a existência humana.

A beleza pura e agreste das e nas veredas.
Foto:  William Mendes


DIADORIM

Quando comecei a leitura do dia, acabei quedando e viajando nas ideias com as primeiras duas páginas. Pensei o mundo todo. Pensei a vida toda no dizer de Riobaldo citado acima.

Quem não tem na vida o seu Diadorim? Quem não está preso em uma circunstância ou vive com aquele vago desejo impossível ou aquela gastura daquilo que já se foi, passou e ficou queimando dentro de si – “é só o mesmo carvão só”.

Cada um de nós... Penso, por exemplo, meu pai com seu amor pela cidade de São Paulo...

Eu poderia citar uma espécie de Diadorim de cada pessoa próxima que conheço. E olha que o Diadorim de cada um vive lá no fundo no fundo e muitas vezes não é pronunciável...

Um certo luar nas veredas mineiras.
Foto: William Mendes


RIOBALDO

 “Eu estava meio dúbito. Talvez, quem tivesse mais receio daquilo que ia acontecer fosse eu mesmo. Confesso. Eu cá não madruguei em ser corajoso; isto é: coragem em mim era variável. Ah, naqueles tempos eu não sabia, hoje é que sei: que, para a gente se transformar em ruim ou em valentão, ah basta se olhar um minutinho no espelho – caprichando de fazer cara de valentia; ou cara de ruindade!” (p. 62)


Aí, lembrei-me do Riobaldo de cada um de nós. Eu cresci um menino de bom coração, até meio bobo lá naquela infância até meus dez anos. Aí, mudei pra Minas Gerais e caí num mundo estranho, duro, rude.

Tive que me fazer Riobaldo no bairro Marta Helena em Uberlândia, pra andar no meio das gangues, da Falange. Tive que olhar no espelho e fazer cara de ruindade. Pus muito esforço nisso. Deve ter dado certo. Passei a adolescência assim; carreguei isso comigo pra vida adulta. Hoje, vejo meu filho tentando fazer isso. E sei que o coraçãozinho dele é dos bons...

Sertões...

William


Bibliografia:

ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Editora Nova Fronteira. 19ª edição.

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