quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

A palavra. O valor das palavras




Acho que estas palavras serão um agradecimento e uma despedida de mandato sindical em São Paulo, Osasco e região


Nos dias que correm, estou às voltas com a questão das palavras.

Assisti dias atrás ao filme “A menina que roubava livros”. Belo filme! A história nos põe a pensar na questão das palavras.

A palavra descreve. Descreve de forma fria. Descreve de maneira acalorada. A palavra cria. A palavra condena. A palavra salva. A palavra organiza e muda a realidade. A palavra engana e mantém as pessoas amortecidas na mesma realidade dura. A palavra conduz para qualquer lado.

Palavras. Pegam-se a substância, a ação ou sentimento e o que se quer informar daquilo. Acrescentam-se os complementos das palavras com outras palavras e temos a descrição do mundo real ou imaginário, do desejo e do sonho.

Os livros. São oportunidades abertas. Podem ser o mundo. Podem criar mundos. Descrever mundos, vidas, situações.

Eu sonhei em viver a minha vida lidando com as palavras. Quis ser professor. Queria ser intelectual, mas era trabalhador braçal.  

Viver da palavra! Apesar de gostar do silêncio. Mas uma coisa é complemento da outra. A palavra e o silêncio.

Hoje tenho uma certeza sobre minha natureza humana: tenho um espírito de servidor público, não de capitalista. Quero as coisas públicas funcionando bem para as pessoas, independente da condição econômica delas.


Pelo estudo das palavras, saí do trabalho braçal.

Pelo uso das palavras, me vi no mundo organizando estudantes, moradores e trabalhadores.

Pela prática das minhas palavras, fiz amigos e acho que ganhei o respeito de pessoas ao meu redor. Pela prática de minhas palavras, fiz adversários também... assim funcionam as coisas no mundo. Isso é democrático!

Por manter a palavra e cumprir o apalavrado, aprendi a fazer política no movimento sindical. A palavra deve valer muito mais que qualquer promessa ou posição de poder. No nosso espaço de movimento social, espaço da utopia muda-mundo, a confiança na palavra pode equivaler à própria vida das pessoas, dos militantes.

Há que se tomar muito cuidado com a palavra, principalmente no campo da esquerda, porque ela separa o limite entre o pragmatismo e os princípios que construímos. A palavra deve definir os limites da prática.

Vemos nos dias que correm que a “técnica” pertence, mais que nunca, às formas de poder da estrutura burguesa. Estão atacando militantes históricos nossos através de uma falsa “técnica” própria da estrutura burguesa (na “justiça”, nos parlamentos). A nós da esquerda, a palavra – e a prática - deve ser sempre mais que a técnica. Nós é que lutamos contra a estrutura burguesa, o status quo.

Estou fora da chapa que concorrerá à eleição de nosso sindicato nas próximas semanas. Não planejei encerrar assim abruptamente o fim de minha relação de amor e dedicação a este Sindicato e aos trabalhadores desta base como representante sindical deles. Foram doze anos, não doze dias.

Alguns não cumpriram o apalavrado comigo e estou encerrando meu mandato sindical no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região com a certeza de dever cumprido para com os mais de 130 mil bancários desta base. Já são 25 anos como trabalhador bancário, já são 12 anos atuando e lidando com as palavras para buscar um mundo melhor para a classe trabalhadora e para os bancários de forma mais direta.

Desejo bom trabalho e muita dedicação aos bancários para os componentes da nossa chapa plural e unitária do Sindicato (porque acredito que vamos ganhar pelo bom trabalho que realizamos nos últimos três anos e pelo bom grupo que compõe a chapa). Desejo que todos trabalhem ao menos a jornada bancária para a nossa categoria nos próximos três anos e que o trabalho de base seja a prioridade de todos.

Pela palavra, eu defendo o Sindicato e sindicalizo bancários desde 1988, quando comecei a trabalhar no Unibanco, no CAU da Raposo Tavares, aos 19 anos de idade.

Pelas palavras e pela prática, eu brigava com as chefias nos locais de trabalho, pelo que achava correto e contra o que era injusto com os colegas dos bancos e das agências por onde passei no Unibanco e no Banco do Brasil.

Pela confiança nas palavras e no apalavrado, aceitei tarefas que o movimento sindical me pediu e, por minha palavra, sempre cumpri com o maior empenho aquilo a que me comprometi. Mesmo quando me designaram para tarefas em estruturas políticas que me afastaram do contato diário com os bancários na base, que todos sabem que é o que mais gosto de fazer. Fiz e faço com dedicação aquilo que tem que ser feito (mas sempre que achei espaço na agenda, dei os meus pulos e estive nas unidades falando com os bancários também).


AGRADECIMENTOS

Pelas palavras e pela prática, me convidaram para participar da chapa da CUT em eleição do nosso sindicato em 2002. Pelas palavras e pelo uso delas, estive por doze anos à frente das lutas da categoria, principalmente na construção da Campanha Unificada entre públicos e privados, e foi pelas palavras que os bancários votaram e aprovaram comigo as conquistas apresentadas nas defesas das assembleias decisivas sob greve nas onze campanhas nacionais entre 2003 e 2013. Meu muito obrigado aos bancários e bancárias de nossa base pela confiança e pela parceria.

Pelas palavras e pela prática, continuo à disposição e na luta por um mundo melhor, principalmente o mundo do trabalho e da classe trabalhadora. Sou dirigente da nossa Confederação e estaremos contribuindo com a luta de classe nos espaços que os trabalhadores acharem que devo estar.

Com a palavra, peço desculpas às pessoas que magoamos e desagradamos nesse período. Isso acontece até sem querer. Busquei e busco ser leal com todos, mas às vezes nossas palavras magoam as pessoas. Sorry! Lo siento! Perdão!

Eu quero agradecer de coração aos bancários e bancárias de São Paulo, Osasco e região pela oportunidade que me deram de representá-los nesses doze anos em nossa entidade sindical. Só minha família para dizer o quanto mudei como ser humano, como sou uma pessoa melhor graças à convivência com as dificuldades, tristezas e alegrias que é ser diretor de um sindicato e de uma categoria tão intensa como a dos bancários. Acho que minha família agradece mais que eu aos bancários e bancárias por eu ser uma pessoa melhor após esses doze anos. Valeu!

Sigo sempre na LUTA!

William Mendes
Bancário do Banco do Brasil

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