domingo, 23 de novembro de 2014

Rocky - A veia de lutador que habita em cada um de nós




Refeição Cultural


“Não é só uma questão de bater mais forte... é uma questão de saber suportar a dor... de persistência...” (personagem Rocky Balboa)

Não adianta negar o óbvio: que a história de cada um de nós é marcada e moldada por personagens que contatamos no passado, tanto na vida real quanto na fictícia, que nós somos hoje a soma de eventos ocorridos ao longo de nossa existência.


"O que somos é feito do que fomos, de modo que convém aceitar com serenidade o peso negativo das etapas vencidas." (Antônio Candido)


Somos hoje a soma de nosso viver. Também podemos dizer que somos fruto de nosso meio e ambiência cultural.

E olha que isso vale para tudo. Vale para nossa condição de saúde porque somos hoje o reflexo de uma vida alimentar regrada ou desregrada, bem como o hoje reflete se cuidamos de nosso corpo ou se abusamos dele. E não falo somente da questão do autocuidado.


Marcas de nossa herança proletária

Cada um de nós carrega os reflexos negativos das condições de trabalho a que fomos submetidos ao longo da nossa história proletária de venda da força de trabalho para os exploradores capitalistas.

Será que minha vista seca não é consequência das paredes e concreto que quebrei nas construções sem proteção alguma? Comi e respirei muito pó de cimento e tijolo na minha adolescência como ajudante de encanador.

Por que será que não tenho um olfato aguçado? Quantos têm noção do que é trabalhar com esgoto?

Aliás, minha história olfativa teve uma segunda dose de necessidade de bloqueio mental ao ato de cheirar: quando trabalhei em SP em distribuidora de palmitos, também na adolescência, tinha o momento pesado de descarregar caminhão com toneladas de caixas de palmito, e tinha os momentos mais “pesados” ainda – abrir latas estufadas de palmitos podres num canto isolado da empresa porque não se podia jogar fora a lata. Tive que conviver com o maior fedor do mundo...

Acho que sei porque meu cérebro bloqueou parte de meu olfato...



Personagens da primeira infância, da literatura e do cinema forjam nossa psique

Imaginem então quando falamos de personagens da literatura, do cinema, da vida política, das pessoas que tiveram alguma relação conosco durante o nosso crescimento como, por exemplo, nossos pais, nossos professores, familiares, vizinhos e amigos.

Nunca me esqueci do professor Glicério, de química, que nos ensinava a prestar atenção nas perguntas das provas para acharmos a solução adequada nas respostas... as perguntas são muito importantes mesmo!

A adolescência em condições difíceis nos anos oitenta me trouxe várias referências para suportar a vida, a dor, a tristeza, a raiva e não cair, não ficar pelo caminho. Pode não ser algo para se orgulhar ter se inspirado à esmo em personagens durões da vida real em meu entorno ou da ficção. Mas sobrevivi para depois ter outras oportunidades na vida a partir dos vinte e poucos anos.

Bom, por fim, tive boas inspirações também ao ver diariamente meus pais enfrentando com honra, ética, gana e humildade as dificuldades daquela época. É verdade que me inspirei em suportar a dor em personagens do cinema e da literatura, mas também através da arte marcial Kung Fu que tive a sorte de frequentar durante a adolescência e que me trouxe estabilidade de comportamento social.


A revisita ao passado também serve para enrijecer corpo e mente

A vida que levo há anos como militante de causas sociais é uma existência que exige uma grande energia interior, muito além daquela energia média do dia a dia de quem só está curtindo a vida e que tanto faz como tanto fez qualquer coisa. Sem nenhum demérito para a ampla maioria que vive assim. A escolha de ser militante do movimento social foi minha e eu assumo isso.

Mas para amanhecer diariamente e encaminhar as lutas para as quais nos dispusemos, é necessário encontrar força interior, equilíbrio e foco para suportar os movimentos de ataques e contra-ataques das posições contrárias no tabuleiro das lutas. É o nosso entorno diário. E é assim mesmo!

Vez por outra, revisito meus livros, meus filmes, meus personagens, testo minha resistência às dores físicas e psicológicas, enfim, me faço um guerreiro. Seja caminhando dezenas de quilômetros, seja testando o quanto ainda posso fisicamente, seja relendo livros de sociedades distópicas, seja revendo personagens como o velho pescador Santiago, ou os fantásticos e inspiradores Dom Quixote e Sancho Pança, ou também, revendo personagens dos filmes óliudianos das guerras, dos amores, das resistências.

Cada um tem seu jeito de se fortalecer.

E agora, vamos sair e tentar suportar o cansaço e cumprir meu objetivo de corrida. Vamos pra rua.

William


Post Scriptum

“A tua piscina tá cheia de ratos
tuas ideias não correspondem aos fatos...” (Cazuza)



Por falar nisso, conheço algumas figuras que adoram citar grandes políticos, filósofos e líderes religiosos como sendo suas referências – tipo Marx, Lênin, Jesus – mas que, convenhamos, acabam por ser completas aberrações entre o que pregam tais referências com a prática das figuras que as citam... vai entender, né!

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