sábado, 30 de maio de 2020

Instantes (16h30)




No sábado, ele se levantou cedo, com a ajuda do despertador do celular, para descer até a portaria do condomínio e receber os pães que haviam sido encomendados no dia anterior. Que preguiça levantar cedo depois de mais uma madrugada fria, coisa de onze graus. Feito isso, preparou o café para o filho e para ele e ficou na mesinha da cozinha lendo um pouco. Viajou até o passado. Foi para os anos setenta, oitenta, foi para a sua infância e para os tempos de seus pais e tios. Hobsbawm contou um pouco mais, foi até os anos cinquenta e sessenta. 

O historiador relembrou a ele que o Brasil e o México se industrializaram naquele período com patrocínio do Estado. O Brasil chegou a ser a 8ª economia mais industrializada num certo período da história, mas o desenvolvimento da indústria em parceria com o Estado (uma ditadura) foi com base em burocracia, corrupção e desperdício (o leitor pensou: e o crescimento econômico favoreceu a classe dominante às custas da miséria e exploração do povo pobre e trabalhador). Os dois países citados tinham população suficiente para garantir demanda e mercado interno, a demanda da população mais a demanda da máquina governamental garantiam o crescimento econômico. Hobsbawm contou também, e não era novidade, que naquele período após as grandes guerras e durante a Guerra Fria, bastava algum grupo pedir apoio aos Estados Unidos dizendo que no seu país ou novo país havia risco de ascensão do comunismo que os norte-americanos apoiavam o grupo ou ditador local para tomar o poder ou mantê-lo contra revoltas populares. Foi assim que aquela potência do Norte apoiou um monte de ditaduras corruptas e sanguinolentas naquelas décadas. Essa viagem ao passado foi através da leitura do capítulo "Terceiro mundo", do livro Era dos Extremos

O leitor decidiu ainda ler alguma coisa que o levasse mais para trás no passado, e leu um capítulo do livro Sapiens, de Yuval Harari. Aí sim, sua viagem no tempo foi bem para trás. Harari contou a ele sobre as desvantagens dos homo sapiens terem deixado a vida de caçadores-coletores para se transformarem em agricultores. Foi uma péssima escolha, em alguns sentidos que o historiador descreve no capítulo chamado "A maior fraude da história", que está na segunda parte do livro, "A Revolução Agrícola". Não foi o homem que dominou o trigo, foi o trigo que dominou o homem, diz ele. Antes, os humanos eram livres, se alimentavam de forma variada e até nos conflitos entre um grupo e outro, as chances de sobrevivência eram maiores, com os derrotados indo embora para outro lugar. Ao se estabelecerem em algum lugar, e passarem a depender de algum tipo de planta, trigo, por exemplo, a vida passou a ser em função do trigo. Se desse algum problema na colheita, as chances de fome e morte eram grandes. Se a terra fosse disputada por outro grupo, as chances de morte também eram grandes, porque o grupo "proprietário" preferia morrer a deixar sua terra e colheita... 

O leitor de história viajou algumas décadas com Hobsbawm, depois alguns milênios com Harari. 

Saiu então para correr no estacionamento do condomínio; o sol estava quente e convidativo. Fechou o mês com 50 km corridos naquele pequeno espaço possível. O leitor queria sobreviver, senão pelo prazer pessoal da existência, ao menos porque tinha amor a pessoas que dependiam dele de alguma forma. Finalizou aquela manhã e início de tarde assistindo animes com a família; era uma forma de integração entre o jovem filho e os pais.

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