quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Tempo (II)



"Daí a irreversibilidade do tempo físico, que tem uma direção. Irreversível é também, de outra maneira, o tempo vivido, pois que ficou para trás o sabor do ovo comido ontem e o prazer da água há pouco bebida. Mas a sua direção, que lhe empresta o atributo da finitude, segue, de momento a momento, entre passado e futuro, a linha fugidia dos instantes vividos, encurtada à proporção que a vida se alonga, aproximando-nos da morte." (NUNES, 1995, p. 19)


Refeição Cultural

O que é o tempo? Existe passado e futuro, ou só o presente? Existe o presente, já que a cada instante o presente já se tornou passado? Os acontecimentos de ontem no mundo são passado ou fazem parte de um tempo presente? As coisas a serem feitas (coisas cotidianas programadas) ou que vão acontecer amanhã ou depois de amanhã, ou até mesmo no próximo mês, são futuro ou pertencem ao presente?

Estou lendo textos que refletem essa antiga e intrigante questão humana sobre o tempo. Quando paramos para refletir sobre o tempo, algo estranho sentimos. A coisa nos incomoda. Deve ser por isso que pouca gente pára para pensar no tempo, ninguém gosta de sentir incômodo ou desconforto. "Pensar dói?" já questionava um artigo de Thomaz Wood Jr. que li tempos atrás (ler aqui) e que avaliava o quanto os seres humanos do mundo pós tecnologias da comunicação e redes sociais estavam deixando de pensar com profundidade sobre as coisas.

Existem vários conceitos de tempo e lendo o livro O tempo na narrativa, de Benedito Nunes, é possível compreender um pouco essa questão tão presente em nossa existência.

"Alinhamos cinco conceitos diferentes - tempo físico, tempo psicológico, tempo cronológico, tempo histórico e tempo linguístico - que diversificam uma mesma categoria, combinada à quantidade (tempo físico ou cósmico), à qualidade (tempo psicológico) ou a ambas (tempo cronológico), esse último aproximando-se do primeiro pela objetividade e opondo-se à subjetividade do segundo, cuja escala humana difere da do tempo histórico e da do tempo linguístico, ambos de teor cultural." (p. 23)

Ontem, olhava papéis e documentos que fazem parte da minha história enquanto pessoa e nossa história enquanto ser social, que se insere em um mundo real, que pertence ou pertenceu a determinadas comunidades e agrupamentos, a um lugar, enfim, registros do passado individual e coletivo. Ao trazê-los ao presente, não tem como não sentir coisas diversas, saudosismo, indignação, tristeza, orgulho. E o que vale o passado vivido neste presente que vivemos? Praticamente nada. Quase nada.

Devo aceitar que a vida é assim?

William


Post Scriptum: as primeiras reflexões sobre as leituras dessa temática estão na postagem que fiz ao ler o primeiro texto teórico da disciplina de Literatura Comparada II, com a professora Viviana Bosi, texto de Mircea Eliade. Ler aqui.


Bibliografia:

NUNES, Benedito. O tempo na narrativa. Série Fundamentos. Editora Ática, São Paulo, 1995.


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