quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Leitura - Robinson Crusoé (V) - Daniel Defoe



Refeição Cultural

"Agora, considerava o mundo como terra estranha, onde não existia objeto possível para as minhas esperanças e aspirações. Efetivamente faltava-me o convívio com a humanidade, e, segundo todas as aparências, não tornaria mais a tê-lo. Parecia-me que podia já encarar este mundo, como talvez no outro seja observado, isto é, um lugar onde vivemos outrora, e do qual saímos para sempre; devendo na verdade dizer dele o mesmo que Abraão ao rico orgulhoso na parábola bíblica:
'Separa-nos a nós ambos um abismo.'
" (p. 132)


Li o capítulo IX de As aventuras de Robinson Crusoé (1719), de Daniel Defoe. Como previ, a leitura será longa porque o livro é enorme, apesar de ser um romance de leitura simples, de linguagem prosaica, no formato de diário e narrado pelo próprio personagem.

Crusoé nos conta como passou o 3º e o 4º ano na ilha, chamada por ele Ilha do Desespero, mas enaltecida ao extremo em certos momentos da história. 

Enquanto lia as agruras do personagem para conseguir fabricar ferramentas e utensílios básicos da vida humana (tecnologias como panela, roupa e peneira), fiquei me lembrando o quanto somos dependentes uns dos outros, não somos nada sozinhos. Ontem, hoje e sempre.

É muito interessante uma ficção sobre um náufrago numa ilha deserta tentando produzir coisas simples que encontramos em qualquer feira ou comércio por aí.

VALOR DAS COISAS

"Em suma, as circunstâncias e a experiência convenceram-me que as coisas do mundo só têm valor aos nossos olhos conforme o uso que delas fizermos, e gozo pessoal que nos proporcionam, salvo a reserva do que podemos acumular em tempo e lugar para beneficiar o próximo com liberdade..." (p. 133)

Crusoé reflete que sem as ferramentas humanas ele seria só mais um animal naquele mundo, ou em qualquer lugar. A reflexão vem em sua mente por causa da quantidade de coisas que conseguiu retirar do navio naufragado.

Por falar em coisas especificamente humanas, o personagem nos conta como se transformou em crente, em alguém que acredita que a Providência divina foi responsável por tudo que aconteceu a ele, tanto coisas boas quanto ruins (estas para "puni-lo).

SOU O MAIS DESGRAÇADO DOS HOMENS?

"Essas reflexões tornavam-me sensível à bondade da Providência, e ao mesmo tempo grato pela minha condição atual, posto que não isenta de amarguras e misérias. Não posso deixar de recomendar esse trecho da minha história às meditações dos que, no meio das suas desgraças, atroam os ares com exclamações como esta:
'Haverá desventura e aflição comparável à minha?'
" (p. 134)

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Por fim, o capítulo termina com Crusoé dizendo que chegou à ilha com 36 anos e passaram-se 5 anos desde que chegou lá. O náufrago preencheu sua solidão com diálogos com Deus e ocupou seu tempo em ler a bíblia, cuidar da alimentação e no desenvolvimento de utensílios cotidianos sem ter condição ou habilidade adequada para isso.

"Na manufatura e conclusão das diversas obras, artefatos e alfaias que tenho mencionado, passaram-se cinco anos sem que ocorresse nada mais de notável. Nesse período a minha vida deslizou-se da forma que disse; simplesmente, além da cultura do trigo, do arroz e das vinhas, a principal ocupação foi construir uma canoa, que pus a nado, por meio de um canal de seis pés de profundidade e quatro de largura..." (p. 138)

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CRUSOÉ E NÓS: O QUE MUDOU EM 300 ANOS?

Será que existe muita diferença entre o diário do personagem Crusoé - náufrago solitário em uma ilha qualquer - e o diário de nós todos, 300 anos depois? Não sei. 

Ora o personagem se sente prisioneiro do azar e um infeliz, ora um felizardo e agraciado pela Providência. Não é assim que muitos de nós se sentem o tempo todo num mundo em crise e sem perspectivas de futuro?

Crusoé não passa fome na ilha, mesmo sem ter tecnologia adequada para prover o que precisa; por outro lado, milhões passam fome neste exato momento no mundo, mesmo com a maior tecnologia já vista pelos homens.

Crusoé atribui tudo que lhe acontece de bom ou ruim a um deus, à Providência divina; nos dias de hoje, mesmo conhecendo séculos de ciências, parte das pessoas do mundo atribue tudo que lhe acontece a alguma divindade. 

Enquanto isso, milhões de pessoas de boa-fé são manipuladas por canalhas que se passam por mensageiros de deuses.

... pensar na realidade me pesou o olho de maneira impossível de seguir na postagem. Mas tá bom por enquanto.

William


Bibliografia:

DEFOE, Daniel. As aventuras de Robinson Crusoé. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2005.

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