quinta-feira, 2 de março de 2023

Lendo: Os sentidos do lulismo - André Singer



Refeição Cultural

Osasco, 02 de março de 2023. Noite de quinta-feira.


"Em suma, penso que no lulismo a polarização se dá entre ricos e pobres, e não entre esquerda e direita. Por isso, a divisão lulista tem uma poderosa repercussão regional, e o Nordeste, que é mais pobre, concentra o voto lulista. Daí, igualmente, termos maioria tucana de São Paulo para o Sul, e petista do Rio de Janeiro para o Norte. Isso significa que o lulismo dilui a polarização esquerda direita porque busca equilibrar as classes fundamentais e esvazia as posições que pretendem representá-las na esfera política." (p. 35)


Acabei lendo 50 páginas do livro de André Singer mesmo não sendo meu foco de leitura no momento. Ontem almocei com o grande amigo e companheiro Carlindo, professor e economista que dedicou sua vida ao Dieese e às lutas da classe trabalhadora brasileira. Em nossa conversa, acabei citando alguns livros, autores e textos formativos para minha compreensão política e a tese de Singer sobre o lulismo é um dos textos que me colocaram a pensar muito sobre o Brasil e o povo brasileiro.

O livro foi lançado em 2012 pela Companhia das Letras e é composto de uma "Introdução", que li hoje, e quatro capítulos, um "apêndice" e um "posfácio". O texto introdutório do professor André Singer é muito esclarecedor, honesto no que se propõe e só de ler a introdução, me veio à memória todo um período de minha vida como dirigente sindical e estudioso do movimento social ao qual militei por mais de duas décadas. Eu li o ensaio que Singer havia escrito antes do livro, talvez uns dois ou três anos antes da publicação, mas não conhecia detalhes como se apresentam no livro.

A ideia central do autor é que Lula conseguiu entre a eleição de 2006 e 2010 mudar a característica dos eleitores que o elegeram e que elegeram Dilma em seguida pela identificação ao líder. Os muito pobres, subproletários, não votavam no PT até 2006, era a classe média que votava no PT. Lula com seu mandato, suas políticas de inclusão pelo consumo e seu jeito conciliador conseguiu quebrar a ligação que havia entre os muito pobres e os coronéis e caciques políticos. Singer descreve como isso se deu. É uma tese muito coerente com o que vimos no país.

Vale a pena deixar algumas citações, contudo vale a pena mesmo é ler o livro e compreender o Brasil, Lula, o comportamento do povo quando o assunto é eleição e a política de forma geral. E a tese de Singer é história brasileira pura.

William

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LULISMO = COMBATE À POBREZA

"Em suma, foi em 2006 que ocorreu o duplo deslocamento de classe que caracteriza o realinhamento brasileiro e estabeleceu a separação política entre ricos e pobres, a qual tem força suficiente para durar por muito tempo. O lulismo, que emerge junto com o realinhamento, é, do meu ponto de vista, o encontro de uma liderança, a de Lula, com uma fração de classe, o subproletariado, por meio do programa cujos pontos principais foram delineados entre 2003 e 2005: combater a pobreza, sobretudo onde ela e mais excruciante tanto social quanto regionalmente, por meio da ativação do mercado interno, melhorando o padrão de consumo da metade mais pobre da sociedade, que se concentra no Norte e Nordeste do país, sem confrontar os interesses do capital, ao mesmo tempo, também decorre do realinhamento o antilulismo que se concentra no PSDB e afasta a classe média de Lula e do PT, criando-se uma tensão social que desmente, como veremos, a hipótese de despolarização da política brasileira pós-ascensão de Lula." (p. 15/16)

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POBRE CONSERVADOR VÊ EM LULA A MELHORA SEM BADERNA

"O subproletariado reconhecendo na invenção lulista a plataforma com que sempre sonhara - um Estado capaz de ajudar os mais pobres sem confrontar a ordem -, deu-lhe suporte para avançar, acelerando o crescimento com redução da desigualdade no segundo mandato, e, assim, garantindo a vitória de Dilma em 2010 e a continuidade do projeto ao menos até 2014." (p. 21)

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CLASSES EM SI (MASSAS) E CLASSES PARA SI (COM CONSCIÊNCIA DE CLASSE)

"Em cada um deles (modo de produção asiático, o antigo, o feudal e o moderno burguês) há classes em si, ocupando posições objetivas nas relações de produção. As classes podem transformar-se em classes para si, isto é, conscientes de seus interesses e dispostas a lutar por eles no plano da política. No caso de classes em si que não logram se unificar e conscientizar-se para a ação coletiva, tendem a aparecer na luta política como massa, estruturada de fora para dentro, como acontece em O 18 Brumário (de Marx)." (p. 23/24)

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LULISMO É CONFLITO ENTRE POBRES E RICOS E NÃO ESQUERDA E DIREITA

"Procuraremos argumentar que o lulismo faz uma rearticulação ideológica, que tira centralidade do conflito entre direita e esquerda, mas reconstrói uma ideologia a partir do conflito entre ricos e pobres." (p. 32)

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LULISMO E VARGUISMO

"(...) o lulismo representa a criação de um bloco de poder novo, com projeto próprio, para cuja compreensão as noções de política de massa (O 18 Brumário) e de revolução passiva (Gramsci) me parecem úteis, desde que filtradas pela cor local. Um poder aparentemente acima das classes que leva adiante a integração do subproletário à condição proletária, assim como o varguismo soldou os migrantes rurais à classe trabalhadora urbana por meio da industrialização, da CLT e do PTB." (p. 45)

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Bibliografia:

SINGER, André. Os sentidos do lulismo - Reforma gradual e pacto conservador. 1ª ed. - São Paulo: Companhia das Letras, 2012.


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