sábado, 13 de setembro de 2025

Diários com Machado de Assis (17)



Refeição Cultural

Jaboticabal, 13 de setembro de 2025. Sábado.


Sou admirador de nosso escritor Machado de Assis, um fenômeno da natureza da espécie humana, nascido no século XIX num canto do mundo chamado Brasil. O "nosso" que usei acima é referente a essa coisa em comum entre eu, você e Machado: a gente nascida no nosso canto, essa terra habitada por povos originários antes da chegada dos europeus e após os séculos de exploração e gestão do país com o olhar de fora, para o bem dos outros e não para o bem do povo que aqui nasce, vive e morre.

Para não dizer que nada sei de Machado, posso dizer que já li todos os seus romances e algumas dezenas de contos de sua autoria. Aí, pensei em conhecer alguma coisa sobre sua obra poética, e faz alguns meses li o primeiro livro de poesias do Bruxo do Cosme Velho: Crisálidas, publicado em 1864 (comentário aqui). Achei uma leitura exigente, diferente de quando leio poesias com linguagem mais prosaica. 

Não quero dizer com isso que poesia com linguagem prosaica é simples, pois as imagens e metáforas podem ser mais complexas que em poesias com linguagem mais rebuscada.

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Antes de seguir com a reflexão ou refeição cultural, faço uma observação que andei pensando. Eu tenho escrito comentários sobre livros, poemas, filmes e gêneros da cultura já faz quase duas décadas. Ao ouvir uma análise de um crítico de cinema, o PH Santos, na qual ele explicava o que é de fato uma "crítica" reforçou em mim a leitura de que o que faço em meus textos no blog não são críticas literárias ou sobre filmes, pois não são baseadas em questões técnicas da referida arte. No entanto, o fato de meus textos não serem "críticas" não tira alguma contribuição que eles tenham a respeito da obra comentada, pois meus textos são impressões e comentários sobre os efeitos daquela obra sobre minha pessoa, um cidadão dedicado à compreensão do mundo e da vida. Ou seja, meus textos têm o seu valor, mesmo não sendo formalmente "crítica" literária ou sobre filmes.

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Voltando aos poemas de Machado de Assis, após a leitura de seu primeiro livro de poesia, comecei a ler o segundo livro, Falenas, de 1870. Aproveitei longas horas de estrada para ler alguns poemas de nosso escritor maior.

Interrompi a leitura do livro Falenas para ler alguma crítica a respeito do tema e estou lendo artigos muito interessantes de um estudioso do autor. O articulista se chama José Américo Miranda, pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo, e suas contribuições para a compreensão das obras poéticas de Machado são esclarecedoras.

Amigas e amigos leitores, vou seguir na leitura dos artigos sobre esses dois livros de Machado. Pensei em escrever esse comentário da série "Diários com Machado de Assis" porque ter acesso a conhecimentos compartilhados é uma coisa extraordinária da parte boa dos seres humanos.

Sigamos aprendendo sobre literatura e nossos grandes autores e suas obras.

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Instantes

Pelo momento que estou vivendo, é inevitável pensar sobre os sentidos da existência humana. Inevitável. Até uns trinta anos de idade, avaliando de onde estou com quase o dobro da idade, e com a experiência que a sobrevivência me deixou nas entranhas do ser animal, teria vivido uma vida de um jeito e só daquele jeito. Uma vida para mim, egoisticamente para mim e pronto. Não tinha a formação política que adquiri pelas veredas da vida. Antes, tinha um ódio ferrenho do mundo, depressão, indignação, falta de perspectiva de futuro. Se tivesse tombado pelo caminho, não teria tido a oportunidade de conhecer outras possibilidades da vida humana. Vivi até aqui e até Machado de Assis conheci melhor após os trinta anos, a segunda parte da existência que por acaso tive.

Apesar da impotência que sinto hoje, neste instante, em relação ao mundo e às pessoas que gostaria de ajudar, impotência em relação a não poder fazer algo por pessoas queridas, algo que só elas mesmas poderiam querer fazer por si mesmas, eu adquiri uma consciência que me dá uma espécie de responsabilidade para estar vivo, para combater o cansaço que meu corpo apresenta, pois se eu deixar rolar, a vida se esvai num curto espaço de tempo, contrariando as estatísticas do meu perfil social, estatísticas que me dariam até umas três décadas ainda caminhando pela Terra.

A expressão pesada de nosso grande escritor na foto acima, com mais ou menos 65 anos em 1904, me deixa sempre pensativo. Machado é um grande representante de nossa espécie, um grande brasileiro, um escritor e intelectual muito à frente da mentalidade de seu tempo de vida, um homem que se tivesse vivido só a metade de sua vida, não teríamos a oportunidade de conhecer a produção humana que ele nos legou após seus trinta e poucos anos. Vejam com é a vida e o viver, o ir vivendo.

Se eu tivesse deixado de existir com meus trinta anos, não teria tido a oportunidade extraordinária que tive de, do nada, me politizar e viver uma vida de lutas coletivas, deixando de ser só mais um egoistazinho desses que temos aos montes por aí, e sabendo que nem viver eu queria quando já tinha vinte e poucos anos.

Tudo isso tenho pensado ao estudar o mundo, a vida, ao ver os jovens ao meu redor, ao tentar compreender os comportamentos das pessoas e tentar compreender, mesmo sem aceitar, mas compreender por que as coisas e as pessoas são como são. Tento me imaginar no lugar e no tempo delas hoje, aquele que fui com a idade delas.

Tenho uma certeza: não posso julgar absolutamente nada das atitudes dos jovens ao meu redor. Não sei se seria diferente deles, na condição que estava antes, e na qual eles se encontram agora, neste mundo e sociedade colapsados.

Chega por hoje.

William

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