quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Izaías Almada: A síndrome Safatle/Dutra (I)


Apresentação do blog

Segue artigo muito bom do escritor Izaías Almada, publicado no site Carta Maior.


Imoral não é a posse do deputado José Genoino, como querem alguns, inclusive em nichos de esquerda. Imoral é atacar a democracia pelas costas, desrespeitar a Constituição e vender o Brasil por trinta dinheiros, tentando se criar um clima de violência e insegurança.

Por Izaías Almada, em Carta Maior


O Deputado José Genoino ao declarar em Brasília na última semana, um dia antes da sua posse legal e garantida pela Constituição, que o atual jornalismo brasileiro se transformou em nova forma de tortura dos cidadãos, escancarou para o País a sua divergência com o governo quanto à necessidade de uma reforma da Lei de Meios no Brasil. Não que o tenha feito com essa intenção, o que posso garantir por conhecer o deputado, mas foi o desabafo de um brasileiro que se sente perseguido e injustiçado pela forma com a qual a imprensa e o judiciário trataram a questão do “mensalão” (que ainda não se provou, é bom que se diga) e que mostra claramente a diferença entre os que lutam toda a vida, como dizia Bertolt Brecht, e os que lutam por pouco tempo, em particular aqueles que se deixam levar pelo canto da sereia do poder.

O episódio é emblemático para a agenda política de 2013, ano em que o xadrez eleitoral mexerá suas peças com muito cuidado por parte do governo e – para não fugir ao figurino – incivilizadamente por parte da oposição. A atitude da presidente Dilma, adiando a discussão sobre a Lei de Meios, poderá sair cara ao governo, pois evidencia uma estratégia, se é que se pode chamar assim, no mínimo incoerente para um governo que fala e age democraticamente, promove distribuição de riqueza, é verdade, mas que a distribui desproporcionalmente, considerando-se o número de contemplados, quando despeja milhões e milhões de reais a mais para o maior inimigo da democracia brasileira no momento, a imprensa venal e o oligopólio de seis famílias em que se sustenta.

A tese do “controle remoto”, tão ao gosto da presidente Dilma Rousseff, é uma falácia que depõe contra a sua sensibilidade e inteligência. Uma metáfora recorrente e de gosto e constatação duvidosas, que se contrapõe a realidade, pois poderemos mudar de canal, emissora de rádio ou jornal e a má qualidade do que se vê e lê, bem como a manipulação da informação, será sempre a mesma. E nessa manipulação no terreno da política, nos últimos dez anos, a vítima tem sido invariavelmente o governo, em particular o ex-presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores.

Para não voltar muito no tempo, basta que olhemos as recentes e indefectíveis retrospectivas das revistas semanais, dos jornalões e dos canais de televisão do ano que findou e lá estará estampada entre outras e sem o menor pudor esta pérola: o ano em que se começou a combater a corrupção no Brasil. Dá para levar a sério? A quem querem enganar? Quem começou combater a corrupção, o STF? De qual corrupção está se falando? A do Banestado… lembram-se? A da lista de Furnas, onde até o assassinato de uma modelo tenta-se encobrir? Da Privataria tucana? Da CPMI Veja/Cachoeira, que não ouviu a bandidagem? E as concorrências para obras do metrô na cidade de São Paulo, a Alston e a corrupção investigadas na Europa? O Rouboanel e inúmeros outros casos de corrupção comprovada contra o patrimônio público em vários estados da federação que sequer são lembrados pela mídia, envolvendo o DEM, o PSDB, o PPS etc?… A propósito, aguardo com ansiedade o novo livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr.

Chega a ser indecente, para dizer-se o menos, essa tentativa de parte da oposição brasileira em querer tapar o sol com a peneira, esquecendo-se da corrupção em que está atolada até o pescoço e que já ultrapassou há tempos qualquer limite de irresponsabilidade, e querer imputá-la aos seus principais adversários. Tudo sob o exercício do jornalismo irresponsável e de mão única, selvagem e mentiroso, esse que a presidente procura defender sob argumentos pouco sólidos.

E assim entramos em 2013. Dúvidas, esperanças, temores. Cada ano novo se inicia da mesma maneira para qualquer um de nós. Aos mais velhos resta a amargura de ver que pouca coisa muda no terreno das esperanças, que aumentam as dúvidas e – dependendo do otimismo ou do pessimismo de cada um – revigoram-se os temores.

O mundo continua a digerir a crise econômica iniciada em 2008, com o governo de muitos dos principais países ricos ainda às escuras e às apalpadelas, buscando apagar o incêndio, mas sem saber se não sobram brasas adormecidas que o possam reacender sob pequenos ventos a surgir não se sabe bem de onde. A propósito, recomendo a leitura de artigo do economista Paul Krugman e se encontra traduzido no portal Carta Maior.

O estrago causado pelo neoliberalismo econômico com as suas teses de estado mínimo e mercado máximo, os prejuízos causados a milhões de trabalhadores na Europa, nos EUA, parte da Ásia e África, o salve-se quem puder geral, mesmo com o surpreendente desempenho da América Latina nesse novo cenário nos últimos anos, configuram o traçado de uma nova geopolítica de atenção, com viés de sinal amarelo, deixando a humanidade em suspense e ansiosa para o que poderá acontecer nesse 2013 que se inicia.

O estado de saúde de dois grandes líderes, Nelson Mandela e Hugo Chávez, não trazem bons augúrios, bem como a possibilidade de nova intifada na Palestina. Por aqui, teremos que aguentar a direita relinchar pelas páginas dos jornais, câmeras de televisão e microfones de rádios, destilando o seu veneno de falsa democracia e exercendo (ou impondo) o seu direito de crítica sem resposta, num dignificante exemplo de como entende e pratica a democracia.

Imoral não é a posse do deputado José Genoino, como querem alguns, inclusive em nichos de esquerda. Imoral é atacar a democracia pelas costas, desrespeitar a Constituição e vender o Brasil por trinta dinheiros, tentando se criar um clima de violência e insegurança. Exigir a autocrítica e a renúncia de homens como Genoino e Dirceu pode, a princípio, parecer um ato de sabedoria política, mas no fundo implica em aceitar a condenação imposta por um julgamento de exceção, por um tribunal de atitudes parafascistas. E com o fascismo, todo cuidado é pouco! Venha ele de onde vier…


Escritor e dramaturgo. Autor da peça “Uma Questão de Imagem” (Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos) e do livro “Teatro de Arena: Uma Estética de Resistência”, Editora Boitempo.

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