sexta-feira, 22 de março de 2019

Marx: a forma relativa do valor da mercadoria e a forma equivalente




Refeição Cultural

"É curioso o que sucede com essas conceituações reflexas. Um homem, por exemplo, é rei porque outros com ele se comportam como súditos. Esses outros acreditam que são súditos, porque ele é rei." (Marx, em "O Capital")


Comprei semanas atrás o primeiro volume do livro O Capital - Crítica da Economia Política, de Karl Marx. Penso que teria sido mais proveitoso estudar esta obra clássica do pensamento humano em outra época, enquanto era um representante do meio social em que vivia. Agora, a leitura é mais por curiosidade.

Nesta obra, nos é informado no sumário que vamos ler sobre o "processo de produção do capital". A primeira parte do volume 1 nos apresenta o tema "Mercadoria e Dinheiro". Estou lendo sobre a mercadoria. 

Para mim, a leitura está sendo trabalhosa, talvez por dificuldade intelectual de minha parte. Além disso, leio várias coisas ao mesmo tempo, de maneira que estudo numa sentada algumas páginas de Marx e volto ao livro dias depois. 

No entanto, é inevitável perguntar a mim mesmo neste momento de minha existência: ler ou não ler Marx? Para não desanimar, fico com a lembrança de um texto que estudei no passado sobre ler ou não ler os clássicos e a resposta do autor para a questão era: é melhor ler do que não ler os clássicos.

Foi baseado nesse estímulo acima, que passei algumas horas com Marx neste dia.


A FORMA DO VALOR OU O VALOR DE TROCA

"As mercadorias vêm ao mundo sob a forma de valores de uso, de objetos materiais, como ferro, linho, trigo etc. É a sua forma natural, prosaica. Todavia, só são mercadorias por sua duplicidade, por serem ao mesmo tempo objetos úteis e veículos de valor. Por isso, patenteiam-se como mercadorias, assumem a feição de mercadoria, apenas na medida em que possuam dupla forma, aquela forma natural e a de valor."

E Marx nos recorda que as mercadorias só encarnam valor na medida em que são expressões de uma mesma substância social, o trabalho humano. Ele nos fala sobre um certo valor escondido: "Partimos do valor de troca ou da relação de troca das mercadorias, para chegar ao valor aí escondido".

Os estudos dessa temática vão elucidar a gênese da forma dinheiro do valor.

Todo o trecho que li faz as explanações baseado na fórmula abaixo:


A FORMA SIMPLES, SINGULAR OU FORTUITA DO VALOR

x da mercadoria A = y da mercadoria B, ou

x da mercadoria A vale y da mercadoria B

20 metros de linho = 1 casaco, ou

20 metros de linho valem 1 casaco


OS DOIS POLOS DA EXPRESSÃO DO VALOR: A FORMA RELATIVA DO VALOR E A FORMA DE EQUIVALENTE

"O valor da primeira mercadoria apresenta-se como valor relativo; ela se encontra sob a forma relativa do valor. A segunda mercadoria tem a função de equivalente ou se acha sob a forma de equivalente."

O valor do linho só pode ser expresso relativamente, em outra mercadoria.

Mais adiante o autor nos explica como identificar em que forma a mercadoria se encontra:

"Para saber se uma mercadoria se encontra sob a forma relativa do valor ou sob a forma oposta, a de equivalente, basta reparar a posição que ocasionalmente ocupa na expressão do valor, se é a mercadoria cujo valor é expresso ou se é mercadoria através da qual se expressa o valor."


A FORMA RELATIVA DO VALOR

O filósofo nos lembra que para comparar quantitativamente duas coisas diferentes é preciso convertê-las antes em uma mesma coisa: somente como expressões de uma mesma substância são grandezas homogêneas, por isso, comensuráveis.

"(...) é necessário admitir, simultaneamente, que linho e casacos, como grandezas de valor, são expressões de uma mesma coisa, ou coisas da mesma natureza. Linho = casaco é o fundamento da equação."

E segue:

"Nessa relação, o casaco representa a forma de existência do valor, é a figura do valor, pois somente nessa qualidade é idêntico ao linho..."


TRABALHO HUMANO CRISTALIZADO

"Ao dizermos que, como valores, as mercadorias são trabalho humano cristalizado, nossa análise as reduz a uma abstração, a valor, mas não lhes dá forma para esse valor, distinta de sua forma física."

No valor das mercadorias está contida a força humana de trabalho, tanto do tecelão do linho quanto do alfaiate dos casacos, neste sob a forma concreta e naquele sob a forma abstrata de trabalho humano (na equação 20 metros de linho = 1 casaco).

Duas citações deixam isso evidente para nós:

- "Só a expressão da equivalência de mercadorias distintas põe à mostra a condição específica do trabalho criador de valor, porque ela realmente reduz à substância comum, a trabalho humano, simplesmente, os trabalhos diferentes incorporados em mercadorias diferentes."

- "A força humana de trabalho em ação ou o trabalho humano cria valor, mas não é valor. Vem a ser valor, torna-se valor, quando se se cristaliza na forma de um objeto. Para expressar o valor do linho como massa de trabalho humano, temos de expressá-la como algo que tem existência material diversa da do próprio linho e, ao mesmo tempo, é comum a ele e a todas as outras mercadorias."

Marx nos diz que o valor da mercadoria linho está expresso pelo corpo da mercadoria casaco, o valor de uma mercadoria pelo valor de uso da outra.

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"Por meio da relação de valor, a forma natural da mercadoria B torna-se a forma do valor da mercadoria A, ou o corpo da mercadoria B transforma-se no espelho do valor da mercadoria A. Ao relacionar-se com a mercadoria B como figura do valor, materialização de trabalho humano, a mercadoria A faz do valor de uso B o material de sua própria expressão de valor. O valor da mercadoria A, ao ser expresso pelo valor de uso da mercadoria B, assume a forma relativa."
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Antes de entrar no ponto da forma equivalente, as páginas seguintes discorreram sobre a questão dos efeitos da produtividade na confecção das mercadorias.


A FORMA EQUIVALENTE

"Já vimos que a mercadoria A (o linho) ao exprimir seu valor por meio do valor de uso de mercadoria diferente, a mercadoria B (o casaco), imprime a esta última forma de valor peculiar, a forma de equivalente. O linho revela sua condição de valor, ao igualar-se ao casaco, sem que este adote uma forma de valor diferente de sua forma corpórea. Na realidade, o linho expressa sua própria condição de valor por ser o casaco por ele diretamente permutável. Assim, a mercadoria assume a forma de equivalente, por ser diretamente permutável por outra."

Na forma de equivalente, o valor de uso se torna a forma de manifestação do seu contrário, ou seja, do valor.

Marx explica que não podendo a mercadoria transformar seu próprio corpo em expressão de seu próprio valor, tem ela de relacionar-se com outra mercadoria, considerada equivalente, ou seja, fazer da figura física de outra mercadoria sua própria forma de valor.

E nos fala sobre o valor de troca: "(...) Em outras palavras, o valor de uma mercadoria assume expressão fora dela, ao manifestar-se como valor de troca".

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"Examinando mais de perto a expressão do valor da mercadoria A, contida na sua relação de valor com a mercadoria B, vimos que, dentro do seu domínio, se considera a forma natural da mercadoria A figura de valor de uso, e a forma natural de mercadoria B apenas forma de valor. A contradição interna, oculta na mercadoria, entre valor de uso e valor, patenteia-se, portanto, por meio de uma oposição externa, isto é, através da relação de duas mercadorias, em que uma, aquela cujo valor tem de ser expresso, figura apenas como valor de uso, e a outra, aquela na qual o valor é expresso, é considerada mero valor de troca. A forma simples do valor de uma mercadoria é, por conseguinte, a forma elementar de manifestar-se a oposição nela existente, entre valor de uso e valor."
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ALÉM DA DÚVIDA DO LER OU NÃO LER, A DO ESCREVER OU NÃO

A próxima parte da leitura, vai abordar ainda a forma total ou extensiva do valor, a forma de equivalente particular, defeitos da forma total ou extensiva do valor, forma geral do valor, até chegar na transição da forma geral do valor para a forma dinheiro do valor.

Além da dúvida deste leitor que vos fala, sobre ler ou não ler Marx, ainda fica outra dúvida tão difícil quanto a primeira: escrever ou não escrever a respeito do que leio? 

Escrevi por mais de uma década no blog. O ato de escrever exige muita disciplina e esforço. Por outro lado, o esforço ao escrever gera aprendizagem e memorização por reflexão naquele que escreve.

Talvez por isso ainda escreva alguma coisa aqui no blog nesta altura dos acontecimentos e mudanças sociais no meu mundo.

Abraços aos leitores que por aqui passarem.

William


Post Scriptum:

As demais postagens sobre O Capital estão disponíveis a partir da anterior (AQUI).

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