sábado, 8 de outubro de 2022

Formação Econômica do Brasil - Celso Furtado (XXXVI)

Quinta Parte

Economia de transição para um sistema industrial (século XX)

XXXVI. Perspectivas dos próximos decênios


"Essa disparidade de níveis de vida, que se acentua atualmente entre os principais grupos de população do país, poderá dar origem a sérias tensões regionais..." (Furtado)


Visionário, não?

Neste último capítulo, Furtado recupera em linhas gerais o que desenvolveu ao longo do livro e deixa algumas perspectivas do que poderia ocorrer no Brasil em seguida. Ele foi certeiro em algumas previsões.

"Se se prolonga a contração da procura externa, tem início um processo de desagregação e a consequente reversão a formas de economia  de subsistência. Esse tipo de interdependência entre o estímulo externo e o desenvolvimento interno existiu plenamente na economia brasileira até a Primeira Guerra Mundial, e de forma atenuada até fins do terceiro decênio deste milênio," (p. 245)

Na etapa seguinte, após a 1ª GM e os anos trinta, tem-se maiores investimentos no setor industrial e serviços conexos. Governo controla importações (foco em bens de capital e matéria prima) para fortalecer a indústria nascente e o mercado interno de consumo de produtos nacionais.

Furtado discorre sobre as relações comerciais entre as regiões do país, o Sudeste com o Sul e com o Nordeste, principalmente. A industrialização quase toda na região Sudeste vai beneficiar a população local em relação à renda per capita (ver epígrafe que cito no início do texto).

SUL - "Esse processo de articulação começou, conforme já indicamos, com a região sul do país. Por uma feliz circunstância a região rio-grandense - culturalmente a mais dissímil das demais zonas de povoamento - foi a primeira a beneficiar-se da expansão do mercado interno induzida pelo desenvolvimento cafeeiro." (p. 248)

NORDESTE - "A articulação com a região nordestina se faz por intermédio da própria economia açucareira. Nesse caso, a luta pelo mercado em expansão da região cafeeira não se realiza contra concorrentes externos, e sim contra produtores locais. A partir da segunda metade dos anos vinte, o sul do país passa a representar um mercado mais importante para o Nordeste (não incluída a Bahia) que o exterior." 

AMAZÔNIA - "Por último, a Amazônia se incluiu entre os beneficiários da grande expansão da região cafeeira-industrial. O mercado desta passa a absorver a totalidade da produção de borracha e permite a abertura de novas linhas de produção na região, como foi o caso da juta." 

INDUSTRIALIZAÇÃO CONCENTRADA EM UMA REGIÃO É PROBLEMA

Furtado diz que a industrialização começou no Brasil concomitantemente em quase todas as regiões, mas isso foi mudando ao longo do tempo por diversos fatores. As manufaturas têxteis, por exemplo, começaram no Nordeste a partir de 1844 (p. 249)

"(...) Com efeito, a participação de São Paulo no produto industrial passou de 39,6 para 45,3 por cento, entre 1948 e 1955. Durante o mesmo período a participação do Nordeste (incluída a Bahia) desceu de 16,3 para 9,6 por cento. A consequência tem sido uma disparidade crescente nos níveis de renda per capita. Em 1955, São Paulo com uma população de 10.330.000 habitantes, desfrutou de um produto 2,3 vezes maior que o do Nordeste, cuja população no mesmo ano alcançou 20.100.000. A renda per capita na região paulista era, por conseguinte, 4,7 vezes mais alta que a da região nordestina. Essa disparidade de níveis de vida, que se acentua atualmente entre os principais grupos de população do país, poderá dar origem a sérias tensões regionais. Assim como na interdependência econômica - à medida que se articulavam as distintas regiões em torno do centro cafeeiro-industrial em rápida expansão - na segunda poderá aguçar-se o temor de que o crescimento intenso de uma região é necessariamente a contrapartida da estagnação de outras." (p. 249-50)

Furtado explica no capítulo alguns motivos pelos quais a região Nordeste tem uma renda per capita menor do que a região Sudeste. 

Uma explicação do economista sobre o quanto a monocultura é complexa quanto aos efeitos bons ou ruins para a coletividade, vale a pena citar meio século depois de publicado por Furtado, por causa da condição em que se encontra o Brasil neste ano de 2022, após o golpe de Estado em 2016 e a transformação do país num fazendão exportador do agro "pop".

"O sistema de monocultura é, por natureza, antagônico a todo processo de industrialização. Mesmo que, em casos especiais, constituam uma forma racional (do ponto de vista econômico) de utilização de recursos de terra, a monocultura só é compatível com um alto nível de renda per capita quando a densidade demográfica é relativamente baixa. Ali onde é elevada essa densidade - o que ocorre na faixa úmida do Nordeste - a monocultura possibilita alcançar formas superiores de organização da produção. Com efeito, nas regiões densamente povoadas uma elevada densidade de capital por homem - condição básica para o aumento de produtividade - só se consegue com a industrialização." (p. 251-52)

E assim, cheguei ao fim da leitura do livro de Celso Furtado. Após fazer breves comentários em 36 postagens dos capítulos, farei uma postagem final de registro da leitura de mais um clássico lido em meus roteiros de busca de conhecimento pessoal. 

William


Leia aqui comentário sobre a leitura de mais um clássico da literatura brasileira e mundial, neste caso na área das ciências econômicas.


Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Grandes nomes do pensamento brasileiro. 27ª ed. - São Paulo. Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.


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