quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Diários com Machado de Assis (15)



Refeição Cultural 

Osasco, 13 de novembro de 2024. Quarta-feira.


Dormi pouco. Tenho dormido mal faz dias. Poucas horas e sem acordar bem-disposto. E olha que ontem caminhei 4 Km, era para ter dormido melhor. Suspeito de vários motivos para o sono pouco reparador. Problemas da família que me afetam, e sempre a política, sendo eu um animal político.

Tendo acordado cedo, me levantei. Me deu vontade de ler alguma coisa do Bruxo do Cosme Velho. Sempre me equivoco nesse apelido de Machado de Assis e escrevo Mestre do Cosme Velho. Tudo bem! Ele é tudo isso e muito mais.

Peguei o livro de contos do Machado organizado por John Gledson. Li o conto "Conto da escola", que está grafado de duas formas no próprio livro do Gledson: está escrito "Conto de escola" no índice e nas referências ao final do livro e "Conto da escola" na página 326. Evidente que essa diferença faz diferença no sentido semântico. Como o autor é estrangeiro, pode ser questão de tradução. 

Fui olhar na internet em uma página onde consulto todos os contos do Machado de Assis: esse conto está lá no livro "Várias histórias", de 1896, e está grafado "Conto de escola".

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CONTO DE ESCOLA (1884)

Vou ficar com a opção "Conto de escola". Ele foi publicado na Gazeta de Notícias em 8 de setembro de 1884 e depois no livro Várias histórias em 1895, segundo o livro de Gledson.

No enredo, um adulto faz referência ao passado, situa o caso que vai contar ao ano de 1840. Com uma memória incrivelmente detalhista, diz que o fato se passou numa segunda-feira do mês de maio. Pelo que pude perceber ao concluir a leitura do conto, o narrador teria motivos para guardar tantas lembranças do dia, pois teria sido um dia de aprendizado para toda a vida.

O garoto do ano de 1840 era peralta e inteligente, mas não ligava para a escola. Faltava às aulas ao sabor das escolhas diárias entre brincar em algum lugar ou ir para a escola. Ele teria menos de onze anos, pois faz referência a um menino bem mais velho de onze anos, o Curvelo.

No dia em questão, ele optou por ir à escola porque lembrou-se da sova que o pai havia lhe dado dias antes por alguma coisa que teria feito. Não fica claro se apanhou com vara de marmeleiro por ter faltado à escola ou não. Mas poderia ter sido esse o motivo da sova.

"(...) Ora, foi a lembrança do último castigo que me levou naquela manhã para o colégio. Não era um menino de virtudes."

Nosso narrador é chamado lá no passado por "Seu Pilar". O menino que dialoga com ele na cena da sala de aula se chama Raimundo e é filho do mestre, Policarpo. O narrador diz que o garoto não é muito inteligente e o seu pai é mais duro com ele do que com o restante dos alunos. Raimundo tem medo dos castigos do pai, o professor.

Seu Pilar nos conta que era um menino inteligente, mesmo sabendo que isso seria arrogante de se dizer. Acaba antes de todos as tarefas da escola (e faltava com frequência pelo que temos de informação no início do caso narrado).

O assunto da história que Seu Pilar está nos contando é sobre uma "troca de serviços", um "toma lá, dá cá" entre alunos. Foi uma proposta inédita para o garoto. Uma cola para uma lição de sintaxe a troco de uma pratinha (doze vinténs ou dois tostões). O garoto, Seu Pilar, se tinha dinheiro, era uns cobres (um cobre feio, grosso, azinhavrado...)

A causa do negócio, a "troca de serviços", era o medo que o Raimundo tinha do pai, o professor. Estamos no cenário do século 19 e a pedagogia do ensino é a violência, a temida palmatória, pendurada ao lado da janela da sala.

A história caminha para o seu desfecho, Seu Pilar pega a moeda, passa a cola e os dois são vistos pelo menino mais velho, o Curvelo.

Eu não gosto de dar spoiler em meus textos sobre romances, contos e filmes... 

Este conto em questão é de domínio público, qualquer pessoa pode lê-lo e ele é bem pequeno, de leitura rápida. 

Na página do blog, na versão para "web" (e não celular), tem um link para os contos do Machado na seção "Links a caminho da cultura". 

O final é bem ao estilo do escritor. O homem adulto que narra o "Conto de Escola" disse que aprendeu a lição naquele dia a respeito das consequências da corrupção e da delação. 

Mas o que realmente dominou seu coração no dia seguinte acabou sendo outra coisa, um encantamento que teve pelo caminho, que mudou seu foco e, quem sabe, até seu destino.

É isso! Eu não conhecia esse conto do Bruxo do Cosme Velho. Foi uma novidade para mim.

William


Post Scriptum: o texto anterior desta série sobre leituras de Machado de Assis pode ser lido aqui.


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