quarta-feira, 18 de março de 2009

Livro: Fragmentos Contemporâneos da História dos Bancários (Cap.3)



Capítulo 3

Panorama histórico após eleição de Lula/PT

Campanhas salariais de 2003 e 2004, a construção da Unidade da Categoria

Ao dar uma passada pela história mais recente envolvendo os bancários brasileiros, tanto de bancos públicos quanto de privados, alguns avanços foram determinantes para que a categoria seguisse nos dias de hoje sendo uma das mais fortes e com mais direitos coletivos da América Latina.

Na década de 90, a assinatura da Convenção Coletiva de Trabalho - CCT em 1992 -, com abrangência dos bancos privados e bancos regionais, foi o divisor de águas para os trabalhadores, pois o fato marcou o restante da década mantendo os bancários firmes no embate ao neoliberalismo. Mesmo sofrendo uma ou outra perda de direito, os bancários conquistaram o piso nacional, o vale-refeição em 1992, a cesta-alimentação em 1994 e a PLR em 1995.

Os bancos públicos federais tinham Acordos Coletivos - ACT - e, se por um lado, tiveram muitos direitos específicos até 1994, perderam boa parte deles após 1995.

A grande virada na correlação de forças entre bancários e banqueiros/governo se deu na década de 2000 com a campanha unificada e a vinda dos bancos públicos federais para a Convenção. Isso foi o que nos permitiu estabelecer uma política de aumento real de salários por um período contínuo de 6 anos (2004 a 2009), sequência de melhorias nunca registrada na categoria.

Dois acertos no período: povo elege Lula (PT) e os bancários unificam campanha

Os dois fatores influenciaram fortemente o que é o Brasil de hoje, que resiste melhor à maior crise econômico-financeira mundial desde 1929, e o que é a categoria bancária, que está mais forte do que estava na década passada, quando os bancários lutavam isolados, por bancos, e sofriam derrotas dos banqueiros/governos.

Só para enumerar algumas vitórias dos bancários, elencamos alguns fatos do período:

2003 - bancos públicos federais começam a obter vitórias

Bancários dos bancos públicos federais debatem em seus congressos que querem que o governo federal cumpra a CCT da categoria assinada com a Fenaban.

Fechado o acordo da Fenaban, governo faz proposta menor que a da categoria. Funcionários do BB entram em greve e após 3 dias de paralisação de quase 90% do quadro da empresa, governo volta atrás e apresenta proposta com avanços históricos:

-aplicou o índice da categoria de 12,6% na base do PCS, corrigindo os 12 níveis;

-pela primeira vez desde a reformulação da remuneração de pessoal, aplicou o mesmo índice para as demais verbas e referências VR, ou seja, com a regra da Fenaban os comissionados passaram a ter reajuste;

-na questão de isonomia, conquistamos os 5 dias de abono para os funcionários pós-98;

-na questão de organização da base, conquistamos o direito de eleger delegados sindicais com estabilidade;

-a cesta-alimentação do BB era menos da metade do valor da cesta da CCT da categoria. Conseguimos igualar o direito;

-nosso vale-refeição e auxílio-creche eram menores que os da CCT. Conseguimos igualar também.

-E, pela primeira vez, assinamos o acordo de PLR nos moldes da categoria - Acordo de PLR entre CUT/Fenaban, fazendo o BB gastar o dobro do autorizado pelo Dest (órgão regulador de estatais) e deixando de discriminar milhares de funcionários que não recebiam ou recebiam muito pouco comparado aos executivos do Banco.

2004 - Campanha Unificada inicia política salarial do aumento real

Para garantir que o governo federal não fizesse o mesmo que fez em 2003, ao não cumprir a Convenção dos Bancários no BB e na Caixa, o movimento sindical conseguiu a assinatura de pré-acordos com o governo, garantindo a aplicação das conquistas da negociação geral dos bancários.

A Executiva Nacional dos Bancários conseguiu uma proposta final que continha avanços norteados pelos principais pontos debatidos durante a Conferência Nacional dos Bancários daquele ano: aumento real, valorização dos pisos e um direito novo na Convenção - a 13ª cesta-alimentação.

Os bancários queriam inverter uma curva de perda inflacionária nos reajustes da data-base que já durava anos, com índices menores que a inflação, completados, às vezes, com abonos salariais.

A nossa proposta para os baixos salários da categoria era a política de aumento real, ou seja, inflação não se discute e queremos aumento do poder de compra em toda renovação de acordo.

Além do aumento real, os bancários definiram mais duas prioridades naquela negociação: aumento do piso e um direito novo.

A proposta econômica trazia reajuste de 8,5% mais R$ 30 incorporados aos salários até R$ 1.500, ou seja, aumento nos pisos de até 12,77%, frente a uma inflação no período de 6,64% (INPC). Aumento real de 1,74% a 5,75%.

A PLR para bancos públicos e privados proposta era de 80% dos salários mais um fixo de R$ 705,00, sendo 60% na 1ª parcela e 40% na 2ª (exceção do BB, 50% e 50%).

Negociamos incorporar à Convenção a 13ª cesta-alimentação, no valor de R$ 217.

Além dessas premissas gerais atendidas, tínhamos questões específicas propostas para a Caixa e o BB. Neste, propostas como solução para a Parcela Previ e correção do PCS pelo aumento real maior. O Banco do Brasil aceitou aplicar para todos o reajuste de 8,50% + R$ 30 no PCS, o que dava um aumento de 11,77% do E1 ao E12, proposta muito positiva para os funcionários mais antigos que tiveram perdas inflacionárias.

Além disso, estava garantido o aumento real para todas as verbas e comissões (nunca ocorrido) e cumprimento da CCT que trazia a 13ª cesta-alimentação.

Contexto conjuntural da campanha 2004

A campanha salarial dos bancários de 2004 se deu num período de grande confluência de fatores internos e externos ao dia a dia da categoria.

Só para citar alguns:

-eram as primeiras eleições gerais após a eleição de Lula (PT) em 2002. Passado o primeiro ano de governo, a grande mídia buscava movimentos de massa para manipular notícias que jogassem todos contra a administração de Lula;

-alguns bancários integrantes das oposições à CUT, vários deles candidatos a vereança e até a prefeitos por partidos nanicos como o PSTU, PCO etc, usavam o horário eleitoral gratuito na TV para criticar as negociações e fazer falsas acusações à Executiva Nacional dos Bancários, composta por todas as federações e pelos principais sindicatos do país;

-várias eleições sindicais ocorreriam no ano seguinte, como a do Sindicato de São Paulo, Osasco e região, e havia ordens do comando da oposição de fazer o caos nas assembleias dos principais sindicatos de bancários naquele setembro de 2004. Era a velha tese de oposição do quanto pior, melhor.

Greve de 30 dias e julgamento do TST para BB e Caixa

Os bancários rejeitaram a proposta conseguida em mesa de negociação com a Fenaban e iniciamos a mais longa greve geral da categoria.

Foi uma greve histórica e todos aprenderam muito com ela. Tanto o movimento sindical quanto os bancários de base.

Ao final, os banqueiros e o governo conseguiram interromper a greve com o julgamento de dissídio coletivo para os bancos federais, e contaram com o triste apoio da Contec - na época, a única Confederação Oficial de bancários (e que representa menos de 10% da categoria), que sempre foi usada para trair os trabalhadores. E os patrões contaram também com o PSTU e MNOB, hoje Conlutas, que traindo seu discurso de serem "combativos", ajudaram a jogar o destino dos trabalhadores para as mãos da justiça burguesa.

No julgamento, os bancários perderam alguns dos avanços conseguidos na negociação como a 13ª cesta-alimentação para todos; o BB não corrigiu mais o PCS em 11,77% com aumento real de 5%; e os bancários tiveram que compensar a metade do período de 30 dias de greve, criando uma referência para os banqueiros de compensação que dura até hoje.

MAS a greve foi muito positiva para a categoria, pois fez renascer o sentimento de luta de massas e a ideia de que existem limites que precisamos aferir a cada momento de nossa campanha para sair ganhando, como fizemos em todos os anos seguintes, com bancários unidos e trazendo conquistas de 2004 a 2008.

Os bancários também aprenderam que nem sempre os grupos e correntes que disputam espaço no movimento de massas têm como foco a contratação de melhorias para os trabalhadores e sim fazer suas disputas de máquinas sindicais, ficando em segundo plano se os trabalhadores vão ganhar ou perder com a campanha salarial em si.

Enfim, todos nós bancários aprendemos muito em 2004.

William Mendes


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