segunda-feira, 27 de julho de 2009

Representações do intelectual: tradicionais x orgânicos




Edward Said discorre sobre dois tipos de representação de intelectuais, uma de concepção na linha de Gramsci e outra na linha de Julien Benda.

GRAMSCI vê dois tipos de intelectuais: os tradicionais como professores, clérigos e administradores e outra como intelectuais orgânicos.

Intelectuais orgânicos "que Gramsci considerava diretamente ligados a classes ou empresas que os usavam para organizar interesses, conquistar mais poder, obter mais controle".

"Nos dias de hoje, o especialista em publicidade ou relações públicas, que inventa técnicas para obter uma maior fatia de mercado para um detergente ou uma companhia de aviação, seria considerado, segundo Gramsci, um intelectual orgânico..."

INTELECTUAIS ORGÂNICOS = HOMENS DE NEGÓCIO

"Ao contrário dos professores e dos clérigos, que parecem permanecer mais ou menos no mesmo lugar, realizando o mesmo tipo de trabalho ano após ano, os intelectuais orgânicos estão sempre em movimento, tentando fazer negócios".

JULIEN BENDA vê um grupo minúsculo de reis-filósofos: que constituem a consciência da humanidade. Cita como exemplos Sócrates, Jesus e, mais recentes, Espinosa, Voltaire e Ernest Renan.

VEÍCULOS DE MASSA USADOS PARA DISSIMULAR A VERDADE

"De acordo com Benda, o problema dos intelectuais de hoje é que eles concederam sua autoridade moral àquilo que, numa frase premonitória, ele chama 'a organização de paixões coletivas', tais como o sectarismo, o sentimento das massas, o nacionalismo beligerante, os interesses de classe".

Benda escreveu isso em 1927, antes da época dos meios de comunicação de massa, que depois passariam a ser importantes para governos, políticas e propagandas oficiais com o apoio de intelectuais, na construção de eufemismos e dissimulações da verdade.

O INTELECTUAL DEVE CORRER RISCOS

"De acordo com a definição de Benda, os verdadeiros intelectuais devem correr o risco de ser queimados na fogueira, crucificados ou condenados ao ostracismo (...) Têm de ser indivíduos completos, dotados de personalidade poderosa e, sobretudo, têm de estar num estado de quase permanente oposição ao status quo"

Aqui lembro o exemplo de Miguel Ángel Asturias em 1963, expulso da Argentina por denunciá-la de apoiar a ditadura na Guatemala.

EXCERTO de Claude Couffon no livro sobre Asturias:

"Estábamos en 1963. Asturias se encontraba en París con su esposa argentina, Blanca, en un nuevo exilio. Algunos meses antes, Guatemala había conocido una recrudescencia de la violencia, mientras la guerrilla se implantaba en las montañas, y la voz de Asturias se había vuelto más polémica para denunciar los apoyos exteriores - entre ellos los de Argentina - a un régimen fatal para su patria. Tal condenación había irritado al gobierno del país que lo acogía y la orden de expulsión fue pronunciada"

CASO DREYFUS, OUTRO EXEMPLO DE BENDA

"Benda foi espiritualmente moldado pelo caso Dreyfus e pela Primeira Guerra Mundial, ambos provas rigorosas para os intelectuais, que podiam optar por levantar a voz corajosamente contra um ato de injustiça militar anti-semita e de fervor nacionalista, ou ir timidamente atrás do rebanho, recusando-se a defender o oficial judeu Alfred Dreyfus, injustamente condenado..."

SAID PREFERE A LINHA DE GRAMSCI

"A análise social que Gramsci faz do intelectual como uma pessoa que preenche um conjunto particular de funções na sociedade está muito mais próxima da realidade do que tudo o que Benda escreveu..."

INTELECTUAL NO SÉCULO XXI

E mais abaixo fala das profissões intelectuais contemporâneas: "Hoje, todos os que trabalham em qualquer área relacionada com a produção ou divulgação de conhecimento são intelectuais no sentido gramsciano".

LÍNGUAS FRANCAS EXCLUSIVAS POR ÁREA

"Todos os intelectuais, o editor de um livro e o autor, o estrategista militar e o advogado internacional, falam e lidam com uma linguagem que se tornou especializada e utilizável por outros membros da mesma área: especialistas que se dirigem a outros experts numa língua franca em grande parte incompreensível por pessoas não especializadas".

OS INTELECTUAIS E AS REVOLUÇÕES E CONTRA-REVOLUÇÕES

"Não houve nenhuma grande revolução na história moderna sem intelectuais; de modo inverso, não houve nenhum grande movimento contra-revolucionário sem intelectuais. Os intelectuais têm sido os pais e mães dos movimentos e, é claro, filhos e filhas e até sobrinhos e sobrinhas".

A QUESTÃO CENTRAL PARA SAID

"A questão central para mim, penso, é o fato de o intelectual ser um indivíduo dotado de uma vocação para representar, dar corpo e articular uma mensagem, um ponto de vista, uma atitude, filosofia ou opinião para (e também por) um público. E esse papel encerra uma certa agudeza, pois não pode ser desempenhado sem a consciência de se ser alguém cuja função é levantar publicamente questões embaraçosas, confrontar ortodoxias e dogmas (mais do que produzi-los)...

Assim, o intelectual age com base em princípios universais: que todos os seres humanos têm direito de contar com padrões de comportamento decentes quanto à liberdade e à justiça da parte dos poderes ou nações do mundo, e que as violações deliberadas ou inadvertidas desses padrões têm de ser corajosamente denunciadas e combatidas"

É isso. ASSINO EMBAIXO!!


BIBLIOGRAFIA

ASTURIAS, Miguel Ángel. Miguel Ángel Asturias: París 1924-1933 - Periodismo y creación literaria. Edición Crítica. ALLCA XX, Fondo de Cultura Económica. Segunda Edición Amos Segala, 1996.

SAID, Edward W. Representações do intelectual - As Conferências Reith de 1993. Tradução de Milton Hatoum. Editora Companhia das Letras, 2005.

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