quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Leitura: O caçador de pipas (2003) - Khaled Hosseini



Refeição Cultural

"SERIA UM ERRO DIZER QUE SOHRAB era quieto. Quieto significa em paz. Tranquilidade. Estar quieto é baixar o botão do VOLUME da vida.
     O silêncio é pressionar o botão para desligar. Desligar tudo.
     O silêncio de Sohrab era o silêncio auto-imposto daqueles que têm convicções, daqueles que protestam, que tentam defender a sua causa recusando-se a falar. Era o silêncio de quem se escondeu no escuro, dobrou todas as bordas e as prendeu, bem enfiadas nos cantos, como se faz com um lençol.
" (HOSSEINI, 2005, P. 355-6)


Aos prantos terminei a leitura do romance de Khaled Hosseini - O caçador de pipas. Aos prantos. 

Enquanto lia o romance com as histórias de vida de Amir, Hassan, Sohrab e os demais personagens fiquei olhando para trás nas lentes da memória e vendo instantes da vida de personagens de nossa própria existência nesse palco da vida.

Anos setenta. Na ficção, garotos soltando pipas em Cabul, Afeganistão. Na vida real, garotos soltando pipas no Rio Pequeno, Butantã, São Paulo. O cerol que corta os dedos lá, corta cá. Corta pescoços também... mas quem ligava pra isso ou tinha noção disso?

Anos oitenta. Na ficção no Afeganistão o mundo de Amir e Hassan não existia mais. Mudanças políticas. Guerras. Regimes truculentos. Na vida real da minha infância, mudanças. Meu mundo não existia mais. O Rio Pequeno deu lugar ao Marta Helena, Uberlândia. Pobreza, ruas violentas, garotos que tinham que se tornar duros mesmo sem o serem. Riobaldos tataranas. O diabo na rua, no meio do redemoinho.

O romance de Khaled Hosseini mexeu comigo. Foi o primeiro livro de ficção em 2021. Apartei quatro livros começados e não concluídos para ler em janeiro. Muito bom esse livro! Muito bom!

NARRAR E CONTAR HISTÓRIAS - UMA HABILIDADE HUMANA

A literatura tem o importante papel de nos fazer viajar pelo mundo, pelas vidas de personagens ficcionais e ou reais, de nos colocar no meio de histórias que nos fazem pensar, que nos emocionam, que podem ser referências para o viver dali adiante. Literatura é fundamental para a evolução humana.

Tive a oportunidade recente de voltar aos ambientes escolares aos 50 anos de idade, para completar algumas matérias na graduação em Letras. Foi muito interessante. Meu entendimento foi bem diferente que antes, quando estudei mais jovem.

Me lembro de uma aula e um texto de uma disciplina de língua espanhola que nos trazia conceitos modernos sobre a linguagem humana, sobre as possibilidades de narrar e de reproduzir a realidade. Não me esqueço do meu espanto ao compreender que a linguagem jamais reproduz a realidade. Tudo que se descreve, narra, enumera é um recorte arbitrário de quem fala. Demais isso, né?

Realismo? Naturalismo? Imparcialidade ao narrar ou descrever algo? isso não condiz com a condição da comunicação humana. No segundo no qual alguma coisa aconteceu e alguém é chamado a dizer o que houve, aconteceram coisas inumeráveis. A linguagem humana é linear, encadeada. E o ambiente ao redor não é.

Narrar algo é sempre uma escolha de gênero discursivo, forma, conteúdo, ritmo, e outras estratégias mais desenvolvidas pelo emissor daquilo que se narra.

Gostei do livro de Hosseini. Já havia lido outro livro dele, totalmente por acaso. Minha esposa havia levado A cidade do sol (2007) em uma viagem para ler nas férias e eu que acabei lendo o livro. Ver comentário aqui.

O autor afegão e norte-americano sabe contar histórias. O cara é muito bom. Vou até pôr na fila o terceiro livro dele que temos aqui em casa - O silêncio das montanhas (2013).

Sigamos lendo textos que nos fazem refletir.

William


Bibliografia:

HOSSEINI, Khaled. O caçador de pipas. Tradução: Maria Helena Rouanet. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. 117º impressão.


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