domingo, 30 de novembro de 2008

Caminhada de domingo


O bosque que caminho fica atrás desses prédios.

Voltei de João Pessoa, Paraíba, esta manhã. Passei a noite quase que acordado. Estava necessitando caminhar para pôr as coisas no corpo em ordem.

Fui andar no pequeno bosque com um dia de sol quente. Caminhei cerca de 7 km. Foi muito prazeroso.

Estava bem deserto e solitário o ambiente. Não há nada melhor que isso. Muito melhor que andar na beira da praia apinhada de gente. Nesse sentido, não faz muita diferença pra mim andar na beira da praia de Caiçara, na Praia Grande, ou na praia de Tambaú, em João Pessoa.

É minha opinião e direito meu em dizê-la.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

E pra não dizer que não falei das flores...




Com o léxico português, usam chamá-la de Flor de Maio.

É apenas e tão somente em sua essência uma FLOR. Tudo e nada mais.

Morfologia - A flexão nominal de número




Oposição entre um indivíduo e mais de um indivíduo.


Como diz Saussure (1922) na língua tudo é oposição.

A situação especial fica por conta dos COLETIVOS, em que a forma singular envolve uma significação de plural. Como se trata de uma UNIDADE homogênea, vem no singular.

Mattoso nos diz sobre alguns casos particulares:

Tanto o plural para a indecomposição linguística de uma série de partes componentes (núpcias, exéquias, funerais), como para a expressão da amplitude (trevas, céus, ares) foram reunidos na gramática greco-latina sob a designação de PLURALIA TANTA, ou, menos adequadamente, PLURAL MAJESTÁTICO.


MORFEMA FLEXIONAL DE PLURAL

O morfema flexional de plural, oposto a um zero (0 singular), é fonologicamente o arquifonema /S/ das 4 fricativas não-labiais (sibilantes: /s/-/z/; chiantes: /s'/-/z'/) em oposição pós-vocálica final.

A sua representação fonológica como /S/ corresponde à realização do morfema diante de pausa. Esta posição parece a mais natural, desde que estejamos focalizando o vocábulo formal isolado. Ela está implícita na letra -s como signo de plural na língua escrita.


OU SEJA, o que verificamos é que há dentro de um dialeto regional, três ou pelo menos dois fonemas possíveis para o morfema flexional de plural em português.


O MORFEMA FLEXIONAL DE PLURAL SE REALIZA COM DOIS OU TRÊS ALOMORFES.

ALOMORFIAS:

1- Alomorfe zero (0) para os nomes paroxítonos terminados em /S/.

Ex.:

- flor simples (simples singular), flores simples (simples plural);
- ourives perito (ourives singular), ourives peritos (ourives plural).

2- Nomes terminados por consoantes no singular que seriam formas teóricas com um tema de vogal -e.

Ex.:

- mar(e)s;
- animal(e)> anima(l)es> animais;
- paz(e)s.


3- Caso mais complexo é o dos nomes de singular em -ão, tônico ou átono. O singular neutraliza 3 estruturas radicais distintas, ou antes, uma estrutura de tema em -e e outra, que ora tem o tema em -e, ora tem o tema em -o. Nesta última a forma teórica coincide com a forma concreta singular e o plural se faz regularmente pelo acréscimo de /S/ do plural:

Ex.:

- irmão-irmãos;
- órfão-órfãos.

Já a vogal do tema em -e se combina com uma estrutura terminada em -ã/aN/ e outra terminada em -õ/oN/. A vogal do tema se incorpora como assilábica à sílaba de travamento nasal e este passa a travar o tema:

Ex.:

- pãe/pa'N/ > pães;
- leõe/leo'N/ > leões.

Donde:

1) -ão: -ãos; -ãe: -ães. (só em mãe o tema teórico se realiza no singular: mãe:mães); -õe: -ões.

-ÕE: -ÕES é a estrutura mais frequente, ou antes, a estrutura geral, de sorte que a maioria dos singulares em -ão, sendo teoricamente õe, forma o plural em -ões.

As duas outras estruturas são tão reduzidas que se podem esgotar em pequenas listas.

É bom lembrar que existe variação livre de duas ou três estruturas teóricas para vários nomes:

Ex.:

- aldeão = aldeões, aldeãos e aldeães.


Bibliografia:

CÂMARA Jr., J. Mattoso: Estrutura da Língua Portuguesa, 23ª edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

Regras básicas na descrição do gênero nominal




Um resumo básico de Mattoso Câmara nos ajuda bastante na descrição do gênero nominal:

1) Nomes substantivos de gênero único.

Ex.: (a) rosa, (a) flor, (a) tribo, (a) juriti, (o) amor, (o) livro, (o) colibri, (o) homem, (a) mulher.


2) Nomes de dois gêneros sem flexão.

Ex.: (o,a) artista, (o,a) intérprete, (o,a) mártir.


3) Nomes substantivos de dois gêneros, com uma flexão redundante.

Ex.: (o) lobo, (a) loba, (o) mestre, (a) mestra, (o) autor, (a) autora.


O ARTIGO:

O artigo, que, como partícula pronominal adjetiva, tem uma função significativa bem definida, tem a mais a função de marcar, explícita ou implicitamente, o gênero dos nomes substantivos.


Bibliografia:

CÂMARA Jr., J. Mattoso: Estrutura da Língua Portuguesa, 23ª edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

A flexão de gênero e seus alomorfes




Relembrando...

A flexão de gênero é uma só, com pouquíssimos alomorfes: o acréscimo, para o feminino, do sufixo flexional -a (/a/ átono final) com a supressão da vogal temática, quando ela existe no singular: lob(o) + a = loba; autor + a = autora.


ALOMORFIAS NA FLEXÃO DO GÊNERO:

1- o par opositivo avô-avó.

2- as formas teóricas em /oN/
Ex.: bom /boN/ = boa; leão /leoN/ = leoa.

3- o sufixo derivacional aumentativo /oN/ vai para a sílaba seguinte como consoante /n/ acrescido da desinência –a: valentão /valeNtoN/ = valentona.

4- os radicais em /aN/ com tema em -o suprimem a vogal do tema no feminino: órfão-órfã; irmão-irmã.

5- o sufixo derivacional -eu suprime a vogal do tema -o /u/ e se ditonga ao acrescentar a desinência -a: europeu-europeia.

6- alternância da tonicidade, além do acréscimo da desinência -a:
Ex.: -oso /ôz/ = -osa /óz/ gostoso-gostosa
grosso /ôs/ = grossa /ós/

Segundo Mattoso Câmara, essas alomorfias se resolvem pelo dicionário, em que basta haver uma entrada para a forma teórica, em vez de se averbar simplesmente a forma de masculino.

Diz ainda: da mesma sorte, é ao dicionário que cabe informar sobre a chamada heteronímia no gênero, que não é mais do que a restrição a um gênero único de determinado membro de um par semanticamente opositivo. Por exemplo: homem, registrado como masculino, com uma remissão a mulher, por sua vez registrada como feminino.


Bibliografia:

CÂMARA Jr., J. Mattoso: Estrutura da Língua Portuguesa, 23ª edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Morfologia - O nome e suas flexões




(muitas frases aqui são citações do texto do professor Mattoso Câmara)


Relembrando...

Radical e tema são distintos. O tema vem a ser o radical ampliado por uma vogal determinada, que entra na flexão dos nomes e dos verbos.

Além dos verbos em temas 'a', 'e' e 'i', há nos nomes os temas em -a (rosa, poeta, planeta), os temas em -o /u/ átono final (livro, tribo, cataclismo) e os temas em -e /i/ átono final (dente, ponte, análise).

Assim, não se confunde a desinência de feminino -a, que aparece especialmente nos temas em -o (lobo, loba) e a vogal temática em -a, que não é marca de gênero (cf. poeta, masculino; artista, masculino ou feminino, conforme o contexto).


Os NOMES se dividem em SUBSTANTIVOS e ADJETIVOS. O contexto mostra qual é determinado e qual é determinante.

Ex.:
- marinheiro brasileiro = marinheiro (subst.) de nacionalidade brasileira (adj.);
- brasileiro marinheiro = brasileiro (subst.) de profissão marinheiro (adj.).


ADJETIVOS: a maioria tem temas em -o e -e. Os em -o têm a flexão de feminino em -a e os em -e não têm flexão, são neutros.

Ex.:
- homem corajoso, mulher corajosa;
- homem grande, mulher grande.


SUBSTANTIVOS: podem ter feminino em -a quando são de tema em -e ou quando são atemáticos.

Ex.:
- mestre-mestra; autor-autora; peru-perua.


INCOERÊNCIA NA APRESENTAÇÃO TRADICIONAL DAS GRAMÁTICAS

A flexão de gênero é exposta de uma maneira incoerente e confusa nas gramáticas tradicionais do Português. É ruim a forma de associação ao sexo dos seres para se falar da natureza semântica das palavras.

O gênero abrange todos os nomes no Português e não só os nomes de seres e, mesmo nestes, há problemas, pois para os animais temos os chamados substantivos EPICENOS, como cobra, sempre feminino, e tigre, sempre masculino.

Na realidade, o gênero é uma distribuição em classes mórficas, para os nomes, da mesma sorte que o são as conjugações para os verbos.

O mais que podemos dizer, porém, em referência ao gênero, do ponto de vista semântico, é que o masculino é uma forma geral, não-marcada, e o feminino indica uma especialização qualquer (jarra é uma espécie de jarro, barca um tipo especial de barco, como ursa é a fêmea do animal chamado urso)


NÃO É COERENTE confundir com flexão a RELAÇÃO SEMÂNTICA entre as palavras HOMEM e MULHER. Aqui, não se trata de flexão de gênero como afirmam as gramáticas.

O processo nesse caso é lexical ou sintático e não de flexão.


Na descrição da flexão de gênero em português não há lugar para os chamados 'nomes que variam em gênero por heteronímia'. O que há são substantivos privativamente masculinos, e outros, a eles semanticamente relacionados, privativamente femininos.

Nos casos de imperador-imperatriz, galo-galinha, perdigão-perdiz, o que ocorre não é um processo de flexão de gênero e sim um caso de derivação com os sufixos -TRIZ, -INHA, -ÃO.

IMPORTANTE: 

A flexão de gênero é uma só, com pouquíssimos alomorfes: o acréscimo, para o feminino, do sufixo flexional -a (/a/ átono final) com a supressão da vogal temática, quando ela existe no singular: lob(o) + a = loba; autor + a = autora.


Bibliografia:

CÂMARA Jr., J. Mattoso: Estrutura da Língua Portuguesa, 23ª edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

Procrastino, pois estou cansado




Confesso que estou procrastinando em relação a estudar para minha prova de Morfologia.

E olha que o tema é interessante. Mas estou destruído de cansaço devido ao trabalho sindical diário...

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Aula de Morfologia do prof. Emilio - Derivação




(eventuais equívocos conceituais são de minha responsabilidade)

DERIVAÇÃO - tipos de situação

1) alteram a categoria da palavra
prefixos: não sufixos: sim

2) apresentam as categorias nominais (gênero/número)
prefixos: não sufixos: sim

3) alteram o acento primário
prefixos: não sufixos: sim

SUBCATEGORIZAÇÃO

verbo: crer (em) descrer (de)
verbo: pensar (em) repensar (vazio)

AFIXOS - são eles que selecionam a base e não o inverso (selecionam adjetivos, substantivos e verbos)

base[categ]x = [afixo + base]y


NOMINALIZAÇÃO

bases: adjetiva, substantiva, verbal

adjetiva: -dade [x]n+dade = [[x]n dade]subst.
ex.: bom + dade = bondade

substantiva: -al [x]n+al = [[x]n al]subst.
ex.: banana + al = bananal

verbal: -ção [x]v+ção = [[x]v ção]subst.
ex.: realizar + ção = realização

ADJETIVAÇÃO

bases: adjetiva, substantiva, verbal

adjetiva: -íssimo [x]n+íssimo = [[x]n íssimo]adjetivo
ex.: bonito - bonitíssimo

nome: -oso [x]n+oso = [[x]n oso]adjetivo
ex.: bom + oso = bondoso

verbo: -vel [x]v+vel = [[x]v vel]adjetivo
ex.: lavar + vel = lavável

VERBALIZAÇÃO

bases: adjetiva, substantiva, verbal

adjetiva: -ec(er)
derivação parassintética, duas partes que fazem parte do mesmo processo: em[branqu]ecer

branqu=branc (a mesma raiz, só mudou a grafia)

en[gord]ar / a[vermelh]ar

substantivas:
cola > colar (subst. criou o verbo. o subst. é mais concreto)
data > datar (idem)

OBSERVAÇÕES IMPORTANTES DA AULA:

A CLASSE na derivação quem dá é o SUFIXO. Ex.: tudo que tem -OSO é adjetivo.

Substantivo pode ser usado como adjetivo. Veja os exemplos: navio-escola; sofá-cama; couve-flor

Aqui, o segundo qualifica o primeiro.

TOME uma base de natureza nominal, aplique o afixo -OSO e tem-se então um adjetivo. Esta é uma regra de formação de palavras. Alguns sufixos são produtivos (disponível para formar palavras novas). Outros não (ou menos).

Às vezes, os afixos selecionam também por certas características semânticas (além de categoria)

OU SEJA, o sufixo: qual a categoria seleciona? Tem algo mais semântico? Que categoria gera?

Em situações como:
pular > o pulo
comprar > a compra
perder > a perda

Muitos linguistas defendem que o verbo gerou o substantivo e não o inverso. As palavras derivadas manteriam "o processo" contido na palavra primitiva.



domingo, 23 de novembro de 2008

Corrida e caminhada 'domingal'




(ando brincando com a formação de palavras... aulas de morfologia... e anarquia de minha parte)

Apesar das chuvas de ontem, o dia amanheceu com um sol gostoso.

Saí para uma corrida a esmo.

Peguei a avenida nova rumo a Osasco; virei no Shopping e fui pela avenida do rio; passei embaixo da ponte de metal e fui até depois da Cidade de Deus. Meia-volta volver. Ao chegar a porta de casa, passei direto e fui para o bosque no Continental. Parei de correr, dei uma relaxada e voltei a caminhar subindo para a Vila Yara, dando a volta no parque e descendo a Franz Voegeli de volta a casa. (foi muito bom meu tempo só e em silêncio na rua)

Corri 38'30" (cerca de 6,5 km) e andei mais uns 40' (cerca de 4 km).

Chegando a casa liguei para meus pais e avó queridos em Minas.

Peões, filme de Eduardo Coutinho - comentário de Alexandre Werneck


Poster do filme.

Segundo filme que assisti neste sábado. Filme emocionante. Filme ou documentário de 2004.

Achei a crítica de Alexandre Werneck muito boa. Está no site www.contracampo.com.br.


PEÕES

Eduardo Coutinho, Brasil, 2004


Uma cena de Peões é absolutamente determinante para o filme e para defini-lo como uma obra de Eduardo Coutinho. E talvez mais definidor ainda seja saber que ela não estava nos planos do diretor para a montagem final. Entrou depois de muita reflexão e discussão, segundo o próprio. O momento em questão é aquele que Coutinho apelidou de “As regras do jogo”. Nele, o diretor reúne-se em uma sala com alguns sindicalistas para que eles, diante de imagens de filmes antigos (Linha de montagem, de Renato Tapajós; ABC da greve, de Leon Hirszman; e A greve, de João Batista de Andrade) e fotografias de jornal e de arquivos pessoais/sindicais, apontem os possíveis outros personagens para o documentário. Peões é um típico filme de Coutinho, com seus personagens captados pela câmera em momentos de singularidade absoluta, em uma celebração da construção de si pela fala. Mas nele, habita uma tensão que o particulariza: essa procura pelos personagens (que deu à filmagem um certo ar de gincana tratada com seriedade) introduziu no filme a problemática de sua feitura.

Porque há um problema prático que lhe é próprio: ele tem um prazo muito curto para fazer o filme. Praticamente um mês. E nesse tempo, tem que achar mais e melhores personagens. E desta vez Coutinho não tem um sistema espacial/lógico que os una, como em Edifício Master (os moradores de um prédio), Babilônia 2000 (os habitantes de uma comunidade em um morro) ou mesmo Cabra Marcado para Morrer (os laços de família). Em vez disso, ele trabalha com a rede. Rede de relações. Alguém, que se lembra de alguém, que conhece alguém que possa saber de outrem. É assim que se constitui a pesquisa do filme.

Nesse sentido é que Peões traz impresso em si a marca de sua feitura, assim como Cabra (o filme que consagrou Coutinho e que, como se sabe, nasceu – a fórceps – documentário da morte – um assassinato – de sua feitura como ficção). Nas entrelinhas das entrevistas do filme estão marcados esses laços. O que de antemão reforça o desejo (de) manifesto de Coutinho, que é o de não criar uma categoria. A “classe operária” do filme, ainda que fosse uma generalidade, seria uma generalidade possível, aquela produzida pelas relações que se puderam manter ao longo do tempo. Os personagens só puderam ser encontrados porque, na diáspora, deixaram marcas para trás.

E é dessas marcas que fala o filme. Nele, pulsa uma forte tensão, rara no cinema do diretor: aquela entre a memória e a história. Isso porque Coutinho habitualmente capta os personagens no momento de sua construção, na fala do entrevistado. Neste filme, diferente disso, ele tem um assunto, que o pressiona: seus personagens pertencem de fato a uma categoria, categoria que dialogou com a macro-história. Não são apenas pessoas, mas pessoas que tomaram parte do grande movimento operário que promoveu as grandes greves no ABC em 1979 e 1980.

Há uma tensão, então. E ela está marcada na montagem. Isso porque às falas dos personagens juntam-se imagens dos filmes usados para reavivar-lhes a memória, filmes que são, antes de tudo, documentos históricos. “Juntam-se”, entretanto, é uma ação que deve ser explicada. Isso porque um clichê habitual de documentário historiográfico é o uso do depoimento de testemunha para legendar uma imagem de época. Não é o que acontece. Coutinho foge da semiose como o diabo da cruz. Fazer isso seria criar um sentido de composição a priori. Em vez disso, edita em separada. Trecho de filme em um momento. Falas dos personagens em outro. Juntar, então, é pôr frente a frente, opor.

Essa oposição é, como se disse, o próprio sentido do filme. As falas dos personagens não servem para comprovar ou desmentir as cenas históricas e nem para testemunhas sua participação nelas. Em vez disso, servem para reconstituir particularidades onde a historiografia impõe noções como as de “classe”, “movimento” ou “partido”.

É a operação por excelência do cinema de Coutinho. Em Cabra, a família desmontada pela luta política e pelo assassinato do pai é retomada como uma série de pessoas quase sem ligação. Em Theodorico, Imperador do Sertão, a construção do real feita pelo próprio objeto o demarca não como coronel nordestino, mas como narrador. Em ambos os exemplos e em Peões, essa tensão entre particular e universal é ao mesmo tempo circunstancial e determinante. Veja-se o caso do Globo Repórter sobre o fazendeiro: Coutinho, em vez de apenas entrevistar Theodorico ou de fazer uma reportagem mostrando o seu poder, praticamente entrega a direção do filme nas mãos dele. A câmera de Dib Lutfi o acompanha e ele vai aonde quer e diz o que quer. Ora, Coutinho faz um filme sobre o poder em que o poder está inscrito na própria filmagem. O mesmo acontece em Cabra: a impossibilidade da família salta, decalcada, da própria estrutura do filme, que se move atrás de seus personagens.

Peões começa no Ceará atual, um ponto de partida aparentemente improvável para um filme sobre as greves de São Bernardo do Campo no começo dos anos 80. E começa com um plano feito da janela de um carro, que anda, mostrando a rua e casas que passam. Curiosamente (Coutinho, claro, renegará o símbolo), a imagem flui da direita para a esquerda (e não da esquerda para a direita, o sentido eleito pelo mundo ocidental como o do fluxo normal da escrita e, portanto, do tempo). O jogo de presente-passado apresentado pela abertura é revelador: o filme não dá conta de uma diáspora apenas, mas de duas. Não se trata apenas de para onde foram os operários participantes do movimento sindical que “se perderam” depois de 1980. Trata-se de de onde vieram os operários que constituíram a classe operária brasileira. Nesse sentido, vale a máxima de que São Paulo é o estado mais rico do Nordeste brasileiro.

E é onde Peões se toca com seu filme parceiro, Entreatos: Lula (que no filme de Coutinho é muito mais uma referência histórica, um antipersonagem) é um dos di-diaspóricos. Sua segunda saída é o contra-exemplo do filme, mas sua primeira, o abandono do Nordeste por São Bernardo, é a mesma. É peão, portanto.

Essa condição, aliás, é o ponto de encontro entre as duas forças em tensão na fita. A fala final assume um tom de síntese: define a categoria e ainda permite a Coutinho a mea culpa de não ser um deles. Ser peão é, em certo sentido, uma dualidade. É ser um soldado raso da industrialização brasileira, explorado e chamado à luta pela igualdade, mas é, ao mesmo tempo, fazer parte de uma elite intelectual e artística: o peão sabe seu ofício, conhece-o como poucos, executa-o como ninguém. É aquele sem o qual a fábrica (na época utópica dos filmes de arquivo) não funcionaria, mas é aquele que a fábrica (na época realista de hoje) não pode mais manter. Nesse sentido, enquanto problematiza o choque entre memória e história e a definição estanque de categorias limítrofes, Peões ainda se insere na filmografia de Coutinho como um filme de visão de mundo: toda nostalgia desconstrutiva que se poderia afirmar ao se olhar para trabalhadores saudosos da “era das revoluções” ou para a decadência de quem já foi outrora soldado da transformação e agora se acomoda na velhice doente se transforma – como em Cabra, Theodorico ou mesmo em Santo Forte – em índice de que a política é, no limite, uma moral. Peões não é um filme emocional, embora emocione. É um filme sobre as possibilidades do político como ethos cotidiano.

Alexandre Werneck

sábado, 22 de novembro de 2008

Caminhada leve à noite




Ontem, fiz uma caminhada leve de 5 km também para relaxar.

Vamos preparar a corrida de domingo (se o tempo ajudar, pois ainda não recuperei muito a tal natureza primitiva pra sair correndo na chuva como opção).

7X13 First Person Shooter (O mundo virtual)



Para tirar o estresse sindical das costas, assisti ontem a um episódio de Arquivo X, do 7º ano. 

No Brasil, o episódio abaixo ficou com o nome de "O mundo virtual" e a sinopse dizia o seguinte: "Um assassinato real em um jogo de realidade virtual leva Scully a enfrentar uma mortal personagem digital para salvar a vida de Mulder." (informação do DVD de minha edição de colecionador) 

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7X13 First Person Shooter 

Mulder and Scully are called to the offices of the First Person Shooter video game by the Lone Gunman, after one of the gamers was actually killed whilst inside the game. 

The members of the Lone Gunman have a vested interest in the game and share the concern of the game's programmers, Ivan and Phoebe, who wish to keep the death as low profile as possible to avoid any adverse publicity before the game is released. 

The victim appears to have been shot despite the fact that there is no evidence of a gun in the game area. Working with the computer they manage to get an image of a woman who it appears is responsible. When a computer guru is brought in to play the game, he too is attacked in the game area and killed. 

All the evidence suggests that the murderer is a virtual character inside the game called Maitreya, until the local police contact Mulder telling him they have a suspect in custody. The woman named Jade Blue Afterglow, who looks exactly like Maitreya, knows nothing of the game First Person Shooter, claiming that she was paid by a medical facility for a full body scan. 

Back at the First Person Shooter offices, the Lone Gunman are checking out the gaming area when the game starts by itself, trapping them inside. Mulder enter the game in order to aid Frohike, Langley and Briers, but he is soon over come by Maitreya. Promptly the game ends with Mulder still inside, however monitoring software locates him and it is left up to Scully to try to save him. 

Noteworthy Quote 

Mulder: "Maybe past where the imagination ends our true natures lie, waiting to be confronted on their own terms. Out where the intellect is at war with the primitive brain in the hostile territory of the digital world where laws are silent and rules disappear in the midst of arms. Born in anarchy with an unquenchable bloodthirst we shudder to think what might rise up from the darkness." *

Fonte: http://xfiles.wearehere.net/episodes/7x13.htm


* tradução livre: Talvez nossa verdadeira natureza esteja para além de onde termina a imaginação, esperando para ser confrontada em seus próprios termos. Lá onde o intelecto está em guerra com o cérebro primitivo, no território hostil do mundo digital, onde as leis se calam e as regras desaparecem no meio das armas. Nascidos na anarquia com uma sede de sangue insaciável, estremecemos ao pensar no que pode surgir das trevas.

Uma "Advertência" de Machado, de 1882



Refeição Cultural

Este texto é uma "Advertência" - muito interessante - que Machado faz na abertura de seu livro Papéis Avulsos

Também é legal o fato dele esclarecer o uso de um vocábulo - "reproche" -, supostamente em resposta a dois leitores que o questionaram a respeito do termo. 

É só apreciar: 

ADVERTÊNCIA 

Este título de PAPÉIS AVULSOS parece negar ao livro uma certa unidade; faz crer que o autor coligiu vários escritos de ordem diversa para o fim de os não perder. A verdade é essa, sem ser bem essa. Avulsos são eles, mas não vieram para aqui como passageiros que acertam de entrar na mesma hospedaria. São pessoas de uma só família, que a obrigação do pai fez sentar à mesma mesa. 

Quanto ao gênero deles, não sei que diga que não seja inútil. O livro está nas mãos do leitor. Direi somente, que se há aqui páginas que parecem meros contos e outras que o não são, defendo-me das segundas com dizer que os leitores das outras podem achar nelas algum interesse, e das primeiras defendo-me com S. João e Diderot. O evangelista, descrevendo a famosa besta apocalíptica, acrescentava (XVII, 9): "E aqui há sentido, que tem sabedoria". Menos a sabedoria, cubro-me com aquela palavra. Quanto a Diderot, ninguém ignora que ele, não só escrevia contos, e alguns deliciosos, mas até aconselhava a um amigo que os escrevesse também. E eis a razão do enciclopedista: é que quando se faz um conto, o espírito fica alegre, o tempo escoa-se, e o conto da vida acaba, sem a gente dar por isso. 

Deste modo, venha donde vier o reproche*, espero que daí mesmo virá a absolvição. 

Machado de Assis. Outubro de 1882. 

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*NOTA A - "ADVERTÊNCIA" 

Deste modo, venha donde vier o reproche... 

- "O alienista"..... p.s/nº, no início da obra. 

Não ousava fazer-lhe nenhuma queixa ou reproche... 

Cerca de dous anos para cá, recebi duas cartas anônimas, escritas por pessoa inteligente e simpática, em que me foi notado o uso do vocábulo reproche. Não sabendo como responda ao meu estimável correspondente, aproveito esta ocasião. 

Reproche não é galicismo. Nem reproche nem reprochar. Morais cita, para o verbo, este trecho dos Ined. II, fl. 259: "hum non tinha que reprochar ao outro"; e aponta os lugares de Fernando de Lucena, Nunes de Leão e D. Francisco Manuel de Melo, em que se encontra o substantivo reproche. Os espanhóis também o possuem. 

Resta a questão de eufonia. Reproche não parece mal soante. Tem contra si o desuso. Em todo caso, o vocábulo que lhe está mais próximo no sentido, exprobração, acho que é insuportável. Daí a minha insistência em preferir o outro, devendo notar-se que não o vou buscar para dar ao estilo um verniz de estranheza, mas quando a ideia o traz consigo. 

Bibliografia: 

ASSIS, Machado de. Papéis Avulsos I. Obras Completas. São Paulo: Editora Globo, 1997.

Metrópolis, filme de Fritz Lang, de 1926


Metrópolis, anúncio do Cine Pedro II, anos 1930.

Refeição Cultural

Sabadão. Cansaço geral. Necessidade de estudar para minha prova de Morfologia. Mas estou procrastinando, protelando, enrolando. (É puro cansaço) 

Bom, aproveitei o fato de a Net ter programado o filme Metrópolis para hoje e acabei assistindo a ele. Essa sempre foi mais uma de minhas infindáveis lacunas culturais. Nesse caso, lacuna cultural cinematográfica. 

Interessante o filme. Mas também o achei cansativo. 

Buscando algum comentário a respeito da obra na internet achei um bem detalhado no site Repórter Social. (atenção, pois ele revela o enredo do filme) 

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O SOCIAL NO CINEMA - "Metrópolis", de Fritz Lang: exclusão e opressão dos trabalhadores nas grandes cidades 

por FLÁVIO AMARAL 

A visão do futuro que o diretor alemão Fritz Lang apresenta na década de 1920 no seu clássico “Metrópolis” é sombria. Em grandes cidades, dominadas por arranha-céus, um cenário de exclusão e opressão. Operários tratados como máquinas, explorados por grandes corporações econômicas, submetidos a péssimas condições de trabalho seriam totalmente excluídos da sociedade. 

O filme, produzido em 1926, refletia o pessimismo da época. A Revolução Industrial atingia o ápice. Os operários, com poucos direitos, eram explorados e desumanizados em regimes de trabalho massacrantes. Os donos do capital tornavam-se cada vez mais ricos e poderosos enquanto a classe trabalhadora tinha cada vez menos chance de uma vida digna. Lang, através de um filme de ficção científica, projeta o futuro de 100 anos depois como a extrapolação de uma realidade que podia ser verificada nos países industrializados da época. 

As cidades cresciam em ritmo frenético, divididas em bairros nobres e áreas operárias. O diretor alemão projeta metrópoles monstruosas em que a divisão geográfica por classes sociais atinge limites perturbadores. Na superfície, em solos valorizados, os que fazem parte das classes privilegiadas ocupam imponentes edifícios. Os mais ricos se divertem em jardins paradisíacos e em bordéis suntuosos. Totalmente excluídos, os operários vivem na “Cidade dos Trabalhadores”, onde moram em prédios muito mais frios e homogêneos, enterrados no subsolo. De lá não saem. Trabalham nas máquinas que alimentam e fazem funcionar a cidade na superfície e é lá, em cavernas escondidas, que fazem suas reuniões proibidas para discutirem a exploração a que são submetidos. 

Ao contrário do discurso revolucionário, inspirado pelo marxismo, que ganhava força na Europa, principalmente após a Revolução Russa de 1917, Lang retrata operários bem menos politizados. Maria, a grande líder da “Cidade dos Trabalhadores” não tem um discurso baseado divisão de classes sociais e necessidade de união da classe trabalhadora contra os opressores capitalistas. Seu discurso é messiânico. A exploração e o sofrimento devem continuar até que chegue o “escolhido”, aquele que irá salvar os trabalhadores da opressão. Para ela, o conflito e a revolta não levariam a nada, não seriam capazes de melhorar a vida de ninguém. 

Mas Joh Fredersen, o grande detentor do poder e do capital quer o conflito. A revolta dos trabalhadores seria pretexto para se usar a força, utilizar todo o poder da repressão para criar uma realidade ainda mais opressora. Com a ajuda de um cientista desequilibrado, aprisiona e substitui a líder Maria por um moderno robô, criado para não só agir, mas sentir como um ser humano. A falsa líder incita a revolta e dá início a uma violenta rebelião. Máquinas são destruídas, a “Cidade dos Trabalhadores” é inundada, os operários invadem a superfície. Mortes, perseguições, destruição: o caos se instala em Metrópolis. 

Eis que surge o “escolhido”, o único capaz de levar paz e conciliar os interesses dos dois lados conflituosos. Ele é Freder Fredersen, o jovem filho do grande capitalista. Ao contrário do pai, Freder sensibiliza-se com a situação dos operários. Em uma visita ao subsolo, fica horrorizado com o sofrimento dos trabalhadores para manterem as máquinas funcionando. Assume o lugar de um deles e sente na própria pele a difícil vida de desumanização provocada pela rotina mecânica, pela vida de rebanho, pela escravização do trabalho. Freder, apaixonado por Maria, resolve defender os operários. Liberta a amada e, juntos, salvam as crianças da inundação na Cidade dos Trabalhadores. Em meio ao caos da revolta, consegue o que parecia impossível: um aperto de mão entre o capitalista opressor e um dos líderes dos operários. Sela a paz e une os dois mundos antagônicos. 

“Metrópolis” previa a exacerbação dos conflitos do capitalismo industrial. Traçava um futuro sombrio, com cidades segregadas, humanos robotizados e opressão das classes trabalhadoras. Mas a saída, pelo filme, não é o conflito. Lang não crê na união dos trabalhadores, não acredita na revolução do proletariado como solução. Acredita na visão humanista e conciliadora partindo do próprio capitalismo. Diante do pessimismo da época, a saída para melhorar o quadro de exclusão, opressão e exploração só viria com a mudança de posicionamento daqueles que detêm o poder econômico. O Estado, totalmente inexistente no filme, não teria nenhuma finalidade. 

A única solução para um mundo mais digno e justo seria uma postura responsável do poder econômico, com industriais mais preocupados com as condições de vida de seus funcionários. Em um mundo em que a polarização entre comunismo e capitalismo começava a despontar, Lang já apontava para uma terceira via, uma idealista e romântica visão de responsabilidade social dos empresários. 

Fonte: http://www.reportersocial.com.br/noticias.asp?id=1104&ed=cultura

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Instantes... 211108




Trabalhando pra burro nos últimos dias e com dificuldades em postar...

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Estudos de Português histórico




Leitura do texto "Breve notícia da ortografia portuguesa", de Antonio Martins de Araújo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil. 

1 - Nos labirintos da 'Scriptologia' Medieval 

A existência de grande número de variantes léxicas é fruto dos dilemas dos 'manuscritores' desde 1200. 

Ou se grafava as palavras cunhadas a partir de matrizes da língua-mãe, ou se grafava a partir da impressão auditiva vinda da emissão dos novos vocábulos. 

Só a palavra IGREJA, por exemplo, já conta nas pesquisas filológicas com mais de 50 variantes morfológicas e/ou meramente gráficas. 

Ex.: ecclesia, egleja, eglesa, eglessa, eglisa (...) eigleja, eygreya, eygreygya, igleja, igrejja, iglisa, igriga. 


2 - O dilema inicial: conservar ou inovar? 

Há posições antagônicas desde os séculos XVI, XVII etc. 

"em guardar a orthographia cõforme à ethymologia & pronunciação dos vocábulos" (Gândavo, Regras que ensinam a maneira de escrever a orthographia da língua portuguesa - 1574

"o escrever como se pronuncia, he com a penna imittar a língua, estampar com letras aquillo, que declaramos com palavras (não acrescentando, nem diminuindo, pois não he necessario, antes fiqua sendo mais perfeito o modo de aquelle, que cõ esta arte imittar a natureza)" (Álvaro Ferreira de Vera, Orthographia ou modo para escrever certo na língua portuguesa - 1631

Outros autores, apesar de irem na linha conservadora e latinista, acabam aceitando mudanças linguísticas como, por exemplo, Bento Pereira em Regras gerais, breves e comprehensivas da melhor orthographia com que se pódem evitar erros no escrever da língua latina, & Portuguesza. Para se ajuntar à Prosodia. Coimbra, Joseph A. da Sylva, 1733. (A 1a ed. é de 1666) 

"Para que guardemos certeza ou verdade em nossa escritura, assim devemos escrever, como pronunciamos, & pronunciar como escrevemos. D'outra maneyra será nosso escrever mentiroso" 

Bibliografia: 

PEREIRA, Cilene da Cunha & PEREIRA, Paulo Roberto Dias. ORG. e COORD. Miscelânea de estudos linguísticos, filológicos e literários in Memoriam Celso Cunha. Ed. Nova Fronteira, 1995, RJ.

Morfologia - Morfemas




MORFEMAS são unidades significativas mínimas. 

Ex.: 'ruas' = 'rua' + '-s' 

Os morfemas podem ser livres ou presos: 

LIVRES - figuram sozinhos como vocábulos. Ex.: 'rua' 

PRESOS - não se encontram isolados e com autonomia vocabular. Ex.: morfema de plural 's' 

Quanto à natureza, podem ser: 

LEXICAIS - significação externa: relação com o mundo extralinguístico. É uma classe aberta, infinita. Ex.: porta; ódio; curupira. 

GRAMATICAIS - significação interna, pois deriva das relações e categorias levadas em conta pela língua. É uma classe fechada. É finito e restrito no idioma. Ex.: artigos, preposições, vogais temáticas, marca de plural '-s'. 

Bibliografia: 

CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley. A nova gramática do português contemporâneo. 3a edição revista. Ed. Nova Fronteira, 2001, RJ.

domingo, 16 de novembro de 2008

Corrida domingueira




Hoje voltei a correr. Não corri muito, pois estou avaliando meu tornozelo, tendão e os músculos posteriores da perna. 

Felizmente, não estou sentindo o incômodo dos últimos tempos. Corri cerca de 5 km em 31' com bastante sol. 

É possível que a mudança que fiz após a leitura do artigo questionando o excesso de alongamentos antes das práticas esportivas esteja dando resultados. 

Deixei de fazer um monte de alongamentos nas pernas antes de andar ou correr e, aparentemente, isso não me prejudicou. Ao contrário, pode estar diminuindo a tensão e sensibilidade no local onde sinto o desconforto há meses. 

Vamos lá, devagar e sempre, e fazendo alguns testes em mim mesmo.

O mecanismo da flexão portuguesa (4)




CONCLUSÃO DO ASSUNTO NO TEXTO DE MATTOSO: 

"Uma complexidade da língua portuguesa, que prolonga uma situação latina, é a distinção que convém fazer entre radical e 'tema'. O tema vem a ser o radical ampliado por uma vogal determinada, que entra assim na flexão dos nomes e dos verbos. 

Em vez de CANT-, FAL-, GRIT-, por exemplo, temos os temas em -a: CANTÁ-, FALÁ-, GRITÁ-, que colocam esses verbos numa classe morfológica, dita 1a conjugação. Analogamente, temos a classe dos verbos de tema em -e- (2a conjugação) e a dos de tema em -i- (3a conjugação). 

Não é costume das nossas gramáticas estabelecer a mesma distinção para os nomes. Mas a conveniência de fazê-lo me parece inegável. Há nos nomes os temas em -a (rosa, poeta, planeta), os temas em -o /u/ átono final (livro, tribo, cataclismo) e os temas em -e /i/ átono final (dente, ponte, análise). Assim não se confunde a desinência de feminino -a, que aparece especialmente nos temas em -o (lobo, loba) e a vogal temática -a, que não é marca de gênero (cf. poeta, masculino; artista, masculino ou feminino conforme o contexto). 

Nos nomes, a ausência da vogal temática cria as formas que podemos chamar atemáticas e se circunscrevem, a rigor, aos oxítonos em -á, ou -ê, -ó, ou -ô, -u e -i (alvará, candomblé, noitibó, urubu, tupi). Os nomes terminados no singular em consoante pós-vocálica têm uma forma teórica em -e /i/ átono final, que se deduz dos plurais. Compare-se: feliz - felizes, mar - mares, e assim por diante (nos nomes terminados em /l/ há regras especiais que alteram superficialmente o resultado)." 

Bibliografia: 

CÂMARA Jr., J. Mattoso: 

.Estrutura da Língua Portuguesa, 23a. edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

O mecanismo da flexão portuguesa (3)




A rigor, só se encontram em português SUFIXOS FLEXIONAIS nos nomes e nos verbos. 

NOMES - em GÊNERO e NÚMERO. 


VERBOS - TEMPO E PESSOA GRAMATICAL 


NOMES 

GÊNERO - oposição entre forma masculina e feminina. Flexão básica: um sufixo ou desinência -a (átono final) para marcar o feminino. 

NÚMERO - contraste entre a forma singular e plural. Presença de um sufixo flexional ou desinência /S/ no final da última sílaba. 

"o masculino e o singular se caracterizam pela AUSÊNCIA das marcas de feminino e de plural" (morfena gramatical ZERO - 0) 

O CASO DOS PRONOMES: 

O que diferencia no caso dos pronomes (em relação aos nomes) são 3 noções gramaticais: 

PESSOA GRAMATICAL - referência no âmbito do falante (1a pessoa), no ouvinte (2a pessoa) ou fora da alçada dos dois interlocutores (3a pessoa). A referência também pode ser pra uma ou mais pessoas (4a, 5a e 6a, ou seja, 1a, 2a e 3a do plural) 

Aqui, esta noção não se trata de flexão e sim de vocábulos lexicais. 

GÊNERO NEUTRO para PRONOMES em FUNÇÃO SUBSTANTIVA - referência a coisas inanimadas (isto, isso, aquilo) ou formas específicas para humanos (alguém, ninguém, outrem) 

CATEGORIA DE CASOS para PRONOMES - diversos vocábulos de pronomes para formas retas e oblíquas. 

"As três noções gramaticais características dos pronomes NÃO ENTRAM NO MECANISMO FLEXIONAL da língua portuguesa." 

SÃO EXPRESSAS LEXICALMENTE por mudança de vocábulo. 

"Em relação aos nomes e pronomes, as noções gramaticais que se expressam por flexão são apenas as do gênero masculino e feminino e as de número singular e plural. E tanto para os nomes como para os pronomes, o mecanismo flexional é aí o mesmo." 

VERBOS 

Há duas noções muito diferentes que se completam para flexionar o vocábulo verbal. 

TEMPO - para designar a ocasião da ocorrência do que o verbo refere, do ponto de vista do momento da comunicação. Aqui acumula-se a noção de MODO (indicativo, subjuntivo, imperativo) e ASPECTO completo ou incompleto (perfeito/imperfeito). 

PESSOA GRAMATICAL DO SUJEITO - noção contida no vocábulo formal. 

Bibliografia: 

CÂMARA Jr., J. Mattoso: 

.Estrutura da Língua Portuguesa, 23a. edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

O mecanismo da flexão portuguesa (2)




O QUE DIZEM NOSSAS GRAMÁTICAS PORTUGUESAS... 

Costuma-se chamar de FLEXÃO DE GRAU, ocorrências como: 

fácil - facílimo 
triste - tristíssimo 
negro - nigérrimo 

Faltam no processo, para MATTOSO, entretanto, as condições para tal. 

Não há obrigatoriedade no emprego do adjetivo com esse sufixo de superlativo (é mais uma questão de estilística) e não há uma sistematização coerente para todos os adjetivos (paradigma exaustivo e exclusivo) 

O QUE OCORRE COM OS SUPERLATIVOS É UMA DERIVAÇÃO. 

"Em outros termos. A expressão de grau não é um processo flexional em português, porque não é um mecanismo obrigatório e coerente, e não estabelece paradigmas exaustivos e de termos exclusivos entre si" 

CONFUSÃO COM AS REGRAS DO LATIM: 

No latim havia morfemas gramaticais para graus (complexo flexional). Em português, o processo comparativo é SINTÁTICO e não de morfemas. 

Ex.: 

HOMO FELIX - homem feliz 
HOMO FELICIER LUPO - o homem é mais feliz do que o lobo 
HOMO FELICISSIMUS ANIMALIUM - o homem é o mais feliz dos animais 

Ou seja, mecanismos sintáticos no português: 

... mais do que... 
... o mais... dos... 

Varrão, diria aqui "DERIVATIO VOLUNTARIA" 

Bibliografia: 

CÂMARA Jr., J. Mattoso: 

.Estrutura da Língua Portuguesa, 23a. edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

O mecanismo da flexão portuguesa




O termo FLEXÃO é a tradução do alemão BIEGUNG 'flexão, curvatura', introduzido pelo velho filólogo Schlegel (1772-1829) e serve para indicar que UM DADO VOCÁBULO SE DOBRA A NOVOS EMPREGOS. 

Em Português equivale a segmentos fônicos pospostos ao radical - ou sufixos. São os SUFIXOS FLEXIONAIS, ou DESINÊNCIAS, que não se devem confundir com os sufixos derivacionais, destinados a criar novos vocábulos. 

Para Varrão (116 a.C. - 26 a.C.) se trata de DERIVATIO NATURALIS, para indicar modalidades de uma dada palavra e DERIVATIO VOLUNTARIA, que cria novas palavras. 

No caso das DERIVAÇÕES, os morfemas gramaticais não constituem um quadro regular, coerente e preciso. 

Na FLEXÃO há OBRIGATORIEDADE E SISTEMATIZAÇÃO COERENTE: É naturalis. Os morfemas flexionais estão concatenados em paradigmas coesos e com pequena margem de variação. 

Na língua portuguesa também há a necessidade da CONCORDÂNCIA. 

Na FLEXÃO existe uma RELAÇÃO FECHADA: "a lista de termos é exaustiva, 'cada termo exclui os demais' e não está na nossa vontade introduzir um novo termo no quadro existente" (Halliday). 

AO CONTRÁRIO, para cada vocábulo, há sempre a possibilidade, ou a existência potencial, de uma DERIVAÇÃO. A lista dos seus derivados não é nem exclusiva nem exaustiva. 

Bibliografia: 

CÂMARA Jr., J. Mattoso: 

.Estrutura da Língua Portuguesa, 23a. edição, Editora Vozes, Petrópolis 1995.

sábado, 15 de novembro de 2008

Caminhadas




Ontem, caminhei 1 hora no fim do dia - cerca de 6 km. 

Hoje, após o dia de trabalho, também caminhei cerca de 65' - 6,5 km. 

Bom, desde a corrida da semana passada, percebi um estresse muscular e do tendão do calcanhar. Sendo assim, decidi não correr ao longo da semana e só voltei a caminhar agora. 

Felizmente, parece que o incômodo no calcanhar diminuiu. Para ajudar, procurei me alimentar melhor estes dias com ingestão de bastante proteína tanto animal quanto vegetal e mais frutas e menos carboidratos. 

Vou avaliar ainda se amanhã corro ou caminho.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Leitura - A morte de Ivan Ilitch - León Tolstói (1886)



León Tolstói - foto da Wikipedia.

Refeição Cultural

Pois é, poderia parafrasear assim a máxima popular: "preenchendo lacunas culturais por vias tortas".

Comprei em 2008 este livro de Tolstói vendo-o por acaso sobre um dos trocentos balcões da feira de livros da FFLCH na USP.

Por acaso, também fiquei sabendo da existência deste livro através da história de Chris McCandless, personagem real inspirador do livro e do filme Na natureza selvagem. Era um dos livros que ele carregava consigo no Alaska.

"Instalado de novo no abrigo corroído do Fairbanks 142, McCandless retomou a rotina de caçar e colher. Leu A morte de Ivan Ilitch, de Tolstói, e O homem terminal, de Michael Crichton..." (Na natureza selvagem, de Jon Krakauer)

Por se tratar de Tolstói, é um romance bem pequeno - pouco mais de 70 páginas (na verdade podemos dizer que é uma novela). É considerado, no entanto, uma das obras mais perfeitas da literatura mundial.

Eu o achei bem triste. Profundo. Bem real. Bastante atual.

Engraçado! Estava hoje pensando na superficialidade e vazio das pessoas e das relações humanas neste mundo pós-moderno: NÃO GOSTO DO QUE VEJO AO MEU REDOR. NÃO GOSTO!

Ivan Ilitch descobriu isso em um momento crítico de sua vida. Sofreu muito com isso.

Sigo buscando o conhecimento. Tentando encontrar a sabedoria todos os dias...

William



Bibliografia:

TOLSTÓI, Lev. A morte de Ivan Ilitch. Tradução de Boris Schnaiderman. Editora 34. 1ª Edição 2006 (1ª reimpressão 2007)

Ação, reflexão, romance e cinema - Carlos Heitor Cony


GOSTEI MUITO do texto de Cony a respeito de romances de ação e reflexão e as quebras de fronteiras entre eles e também suas adaptações para outras formas de arte.

Ele traduz muito bem os problemas inerentes ao tema.


CARLOS HEITOR CONY

Ação, reflexão, romance e cinema

José de Alencar foi um rio e Machado apenas uma bica d'água, como queria Glauber Rocha?


O GÊNERO romance tem duas vertentes básicas: a ação e a reflexão. Nada impede que o romance de ação contenha reflexão ("Guerra e Paz", "O Vermelho e o Negro", quase toda a obra de Zola, Balzac, Hemingway etc.). E também não impede que o romance de reflexão tenha ação ("Gulliver", "Montanha Mágica", quase todo o Machado de Assis, quase toda a ficção de Sartre, Camus etc.).

A transposição de um romance ou conto para o gênero visual só é compensadora em nível artístico quanto a ação. A reflexão contida numa obra literária é intraduzível para o visual que cria outro tipo de forma de reflexão, mas condicionada pela ação.

Amigos estrangeiros, quando sabem de minha admiração por Machado de Assis, perguntam por que ele não é devidamente traduzido em outras línguas. Alguns de seus principais romances têm versões em muitas línguas (inglês, francês, italiano, espanhol, alemão), mas são edições que raramente chegam ao grande público, ficando nos meios acadêmicos e universitários. Jorge Amado é traduzido até em servo-croata, tem edições de bolso e é um dos autores mais editados atualmente. Sem falar no recente Paulo Coelho, um caso à parte.

Respondo a esse tipo de pergunta acentuando a diferença fundamental entre as duas concepções de romance. Jorge segue a linha de José de Alencar, muita ação, ação que fez Glauber Rocha (um cineasta) dizer que Alencar era um rio caudaloso e Machado de Assis uma torneira.

Diante de um romance que prioriza reflexão, evidente que o estrangeiro preferirá os próprios autores. Ele terá curiosidade de conhecer os dramas da seca brasileira ou as trapalhadas de um turco em Ilhéus. Um francês, por exemplo, terá curiosidade de conhecer um Jubiabá, uma Gabriela. Mas, para buscar reflexão, irá buscá-la em Montaigne, Voltaire, Pascal, Sartre, Camus.

Se isso ocorre no campo editorial das traduções, na transposição do romance para um veículo visual, o romance de reflexão é descartável quando não solenemente desprezado. Não faz tanto tempo assim, Paulo Francis disse mais ou menos a mesma coisa a propósito de "Lolita", que ele considera "intraduzível" para o cinema, apesar de haver, agora, duas versões cinematográficas do romance de Nabokov (conheço a de Stanley Kubrick e, ao contrário do Francis, não a jogo inteiramente no lixo, apesar da monstruosidade da Lolita de Kubrick ser uma adolescente mais para mulher feita do que para menina.)

No meu caso pessoal, minhas tentativas no gênero são quase desprovidas de ação. A meu modo, com as minhas limitações, procuro refletir sobre a condição humana em vez de narrá-la. Uso de um mínimo de trama para expor minha visão de mundo. No passado, naquela que agora eu posso considerar "primeira fase", costumava ser procurado para vender meus textos a produtores e cineastas. Vendi dois deles ("Antes, o Verão" e "Matéria de Memória", que se transformou em "O Homem e sua Jaula"). Mas parei. Quando me procuravam eu sugeria escrever uma história original para eles. E assim fiz "Os Primeiros Momentos" (com Paulo Porto e Odete Lara), "Os Devassos" (com Jardel Filho e Darlene Glória), "Paranoia" (com Anselmo Duarte e Norma Bengell), "Vera Verão" (que virou "Intimidade", com Vera Fischer e Perry Salles, dirigida pelo inglês Michael Sarne).

Bons ou maus, eles tinham alguma trama, alguns conflitos. Mas nunca senti atração para escrever roteiros ou peças teatrais. Como não sou dono do destino, nem do meu e muito menos do destino dos outros, houve um tempo em que fiquei responsável pela teledramaturgia da Rede Manchete de Televisão.

Não aproveitei nenhum texto meu, preferi fazer sinopses de livros de outros autores, como Alberto Faria, Paulo Setúbal, Agripa Vasconcelos e outros, inclusive de uma ideia do Adolpho Bloch sobre uma gafieira da antiga Praça Onze ("Kananga do Japão").

Volto ao conceito da ação e da reflexão. José de Alencar foi mesmo um rio e Machado apenas uma bica d'água, como queria o Glauber Rocha? São duas abordagens distintas para duas coisas diferentes. Acho que a reflexão fica mais próxima da literatura. E a ação é a matéria prima do cinema, hoje ampliada pela fartura dos efeitos especiais.


Fonte: jornal FSP, 14/11/08