Mestre Machado de Assis. |
Clássico Brasileiro
1881
Esta obra marca uma profunda mudança de rumo na literatura de Machado de Assis e, também, na Literatura Brasileira.
Como falo bastante da obra de Machado ao disponibilizar comentários sobre minhas aulas uspianas a respeito do tema, aqui destacarei frases, momentos e outras passagens marcantes do livro.
Não poderia deixar de começar por aqui:
"AO VERME
QUE
PRIMEIRO ROEU AS FRIAS CARNES
DO MEU CADÁVER
DEDICO
COMO SAUDOSA LEMBRANÇA
ESTAS
MEMÓRIAS PÓSTUMAS."
Não é fascinante para a época?
DEFUNTO AUTOR
> "eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor".
> "A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e cousa nenhuma".
OBJETIVOS DE BRÁS CUBAS
Objetivos de Brás Cubas ao tentar a invenção do emplasto (o nobre e o pessoal):
> "a invenção de um medicamento sublime, um emplasto anti-hipocondríaco, destinado a aliviar a nossa melancólica humanidade" (que belo e sublime, heim?).
> "posso confessar tudo: o que me influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos jornais, mostradores, folhetos, esquinas, e enfim nas caixinhas do remédio, estas três palavras: Emplasto Brás Cubas. Para que negá-lo?... De um lado, filantropia e lucro; de outro, sede de nomeada. Digamos: - amor da glória" (que humano, não?).
IDEIA FIXA
Veja o valor de uma ideia fixa:
> "direi que é ela a que faz os varões fortes e os doudos".
Por falar no mundo das ideias:
Neste livro aparece a filosofia Humanitismo (de Quincas Borba), que seria a profunda crítica irônica de Machado aos conceitos vigentes à época como Democracia, Liberdade, Liberalismo, Patrimonialismo, Patriarcalismo e Fraternidade, além de teorias como o Evolucionismo e o Positivismo.
LEI DA CONSERVAÇÃO (OU DO EGOÍSMO)
Eis o primeiro exemplo, falado aqui na boca de Pandora ou Natureza - a mãe e inimiga:
"- porque já não preciso de ti. Não importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem. O minuto que vem é forte, jucundo, supõe trazer em si a eternidade, e traz a morte, e perece como o outro, mas o tempo subsiste. Egoísmo, dizes tu? Sim, egoísmo, não tenho outra lei. Egoísmo, conservação. A onça mata o novilho porque o raciocínio da onça é que ela deve viver, e se o novilho é tenro tanto melhor: eis o estatuto universal".
FALSA NOBREZA
Foi costume por longo tempo estender-se os nomes das crias (filhos) para mostrar a junção das famílias. Na verdade, se trata de um sinal evidente de falsa fidalguia.
> "- Meu padrinho? é o Excelentíssimo Senhor Coronel Paulo Vaz Lobo César de Andrade e Sousa Rodrigues de Matos".
O PESO DA EDUCAÇÃO DE HOJE PARA O AMANHÃ
> "O menino é pai do homem" - profundo conceito sobre a educação dada aos filhos e que nos cobrará amanhã o que eles forem.
SOMOS HOJE O FRUTO DO QUE FOMOS ONTEM
Eis um resumo do meio doméstico em que vingou nosso defunto autor:
"O que importa é a expressão geral do meio doméstico, e essa aí fica indicada, - vulgaridade de caracteres, amor das aparências rutilantes, do arruído, frouxidão da vontade, domínio do capricho, e o mais. Dessa terra e desse estrume é que nasceu esta flor"
As mulheres na vida de Brás Cubas
MARCELA
E para falar dos amores desse defunto autor, nada como começar citando a doce Marcela: "Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos".
VIRGÍLIA
Virgília? "Era bonita, fresca... e era clara, muito clara, faceira, ignorante, pueril, cheia de uns ímpetos misteriosos; muita preguiça e alguma devoção, - devoção, ou talvez medo; creio que medo".
EUGÊNIA
A flor da moita
("- Não, senhor, sou coxa de nascença")
Machado não poupou nenhuma crítica àquela sociedade. Brás Cubas exala naturalmente todas as canalhices do homem que representa. Veja aqui suas observações sobre a jovem Eugênia, fruto de um beijo adúltero de 1814 em casa do menino Brás:
> "O pior é que era coxa. Uns olhos tão lúcidos, uma boca tão fresca, uma compostura tão senhoril; e coxa! Esse contraste faria suspeitar que a natureza é às vezes um imenso escárnio. Por que bonita, se coxa? por que coxa, se bonita? Tal era a pergunta que eu ia fazendo a mim mesmo ao voltar para casa, de noite, sem atinar com a solução do enigma..."
> "ao pé da minha Vênus Manca".
REFLEXÕES
Verdades duras e cruéis ditas muitas vezes por Machado ou seus personagens:
> "A infeliz (mãe dele) padecia de um modo cru, porque o cancro é indiferente às virtudes do sujeito; quando rói, rói; roer é o seu ofício".
> "Olha que os homens valem por diferentes modos, e que o mais seguro de todos é valer pela opinião dos outros homens" (apesar do século que carrega, poderia ser dito o mesmo hoje, não?).
> "Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes".
> "Talvez espante ao leitor a franqueza com que lhe exponho e realço a minha mediocridade; advirta que a franqueza é a primeira virtude de um defunto. Na vida, o olhar da opinião, o contraste dos interesses, a luta das cobiças obrigam a gente a calar os trapos velhos, a disfarçar os rasgões e os remendos, a não estender ao mundo as revelações que faz à consciência...".
VOCABULÁRIO:
Conúbio: 1. casamento, matrimônio. 2. relação íntima; ligação, união.
Ex: "Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio" (Ao leitor).
Tanoeiro: aquele que fabrica tonéis, pipas, barris.
Ex: "O fundador da minha família foi um certo Damião Cubas... Era tanoeiro de ofício".
Sestro: trejeito, gesto habitual; vício, hábito, mania (dentre outros significados).
Ex: "Mas é sestro antigo da Sandice criar amor às casas alheias".
Almocreve: condutor de bestas de carga; arrocheiro, recoveiro.
Ex: "O almocreve salvara-me talvez a vida" (em suas reflexões sobre dar ou não 3 moedas de ouro, dando uma pratinha e se arrependendo, pois deveria ter dado uns cobres).
De outiva: de oitiva - de ouvir dizer.
Ex: "Conhecia a morte de outiva".
BIBLIOGRAFIA:
ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Editora Klick da coleção de O Estado de São Paulo. Julho de 1997.
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