quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Malas de dinheiro não são coisas "normais"


Opinião

Ainda bem que meus colegas bancários da ativa e aposentados são treinados para explicar aos familiares e à sociedade que transações com grandes volumes de dinheiro em espécie não são coisas "normais"


Quando virei trabalhador da categoria bancária aos vinte anos de idade tive acesso a novos conhecimentos e a novos grupos de relacionamento como cidadão brasileiro. Passei a conviver com uma vida mais regulada e "normatizada", baseada em leis, normas e regras formais, que variam de tempos em tempos. Antes, nem declaração anual de imposto de renda eu fazia, como grande parte do povo brasileiro não faz.

Antes de ser bancário, tinha trabalhado quase uma década como criança e adolescente pobre nos mais diversos tipos de trabalhos braçais - ajudante de encanador, entregador de remédios, em lanchonetes etc - e alguns menos braçais como em escola de idiomas, mas todos os trabalhos eram ou informais ou formais como alguém não qualificado.

Como trabalhador do sistema financeiro brasileiro aprendemos noções básicas sobre dinheiro, moeda, capital, operações bancárias etc. Um ensinamento básico para um bancário é ter atenção redobrada quando qualquer operação envolve dinheiro vivo em pacotes, malas e volumes grandes de dinheiro em espécie. Fazemos cursos sobre isso, sobre lavagem de dinheiro, crime financeiro ou crime organizado.

Basta estudar minimamente um pouco de história das sociedades humanas para saber que a informalidade favorece alguns grupos e pessoas e prejudica outros. Numa sociedade informal se ferram o Estado e as maiorias que vendem sua força de trabalho para sobreviver: os trabalhadores.

Nas sociedades capitalistas, trabalhador vender sua força de trabalho sem contrato e registro é prejuízo na certa pra ele, porque ele não tem direito algum a nada: salário fixo, descanso remunerado, férias e 13º salário, licença maternidade, não tem acesso a saúde e previdência, aposentadoria etc. A vantagem da informalidade é toda do dono do dinheiro, do capitalista que compra essa mão de obra barata ("desonerada"). 

O Estado (o erário público) só se ferra com isso também porque os recursos públicos vêm de impostos e contribuições das atividades produtivas e dos bens e propriedades particulares. Por que será que atividades como jogo do bicho são ilegais? Por que será que jogadores de futebol multimilionários vivem com pendências com o fisco por não pagarem impostos corretamente? E esses "empresários" que sonegam até o último centavo do que devem de impostos ao Estado? Vai um produto sem nota fiscal aí?

Me lembro que no dia a dia do trabalho bancário, quando alguém chegava na boca do caixa com um pacote de dinheiro já era algo por si só pouco usual, não era normal se fazer operações bancárias com pacotes ou malas de dinheiro em espécie. Além do risco de assalto e mortes por causa disso, na agência nós tínhamos que parar alguém para contar o dinheiro, registrar com documentos a origem do dinheiro e a pessoa que estava portando aquilo tudo.

Pois é...

Após o golpe de Estado em 2016, que interrompeu um governo eleito democraticamente pelo povo brasileiro, um governo sem ilícitos e sem corrupção - o governo de Dilma Rousseff -, nós passamos a viver num país onde foram desfeitas e alteradas todas as leis, normas e regras construídas por décadas pela sociedade civil. Reformas extinguiram os direitos sociais do povão. Normas de proteção ao meio ambiente foram desfeitas. Regras republicanas de gerir o Estado foram pro saco com a milícia no poder.

Passamos a viver numa sociedade cínica, hipócrita, canalha. Algumas instituições do Estado nacional foram corrompidas em suas essências, em suas regras básicas, nas suas bases de existência.

Hoje, vemos no noticiário como algo "normalizado" uma família (um clã) possuir mais de uma centena de imóveis, sendo a metade adquirida em dinheiro vivo, em espécie, coisa de milhões e milhões de reais, como se isso fosse uma operação bancária ou empresarial "normal". Façam uma operação simples: calculem os salários oficiais de parlamentares desse clã e vejam se a renda lícita chega a 1% de todo esse patrimônio...

Qualquer pessoa minimamente honesta e com alguma ética sabe que esse patrimônio todo adquirido em dinheiro vivo não é normal, não parece ser legal, não é moral. Vivemos num país onde as leis, normas e regras são aplicadas ao povão, aos trabalhadores assalariados, aos comuns. Só.

Um trabalhador bancário passa umas três décadas de sua vida para adquirir com muito sacrifício um ou dois imóveis para suas famílias. O mesmo se dá com as principais categorias profissionais do Brasil - professores, metalúrgicos, comerciários, funcionários públicos da base da pirâmide, pequenos empreendedores etc. Já os "empresários" e uma maioria de "políticos", que pertencem a um seleto grupo social, o 1%, acumulam dezenas, centenas, milhares de imóveis e tudo bem, fica por isso mesmo. Os ideólogos da casa-grande atuam para "normalizar" essas fortunas como coisas normais.

A família dos 100 imóveis com a metade adquirida em dinheiro vivo é a família que chegou ao poder central do país após o golpe de 2016 e após as eleições fraudulentas de 2018, eleições que tiveram interferência política de agentes públicos de órgãos do Estado como a operação Lava Jato (lawfare) que prendeu o principal candidato do campo popular em 2018, Lula.

Que nojo dessa hipocrisia descarada de setores de sociedade brasileira que se intitulam "gente de bem" e que acham normal tudo que o clã no poder faz e representa! Que nojo!

Ainda bem que meus colegas bancários da ativa e aposentados são treinados para explicar aos familiares, amigos e conhecidos que transações financeiras e comerciais em grandes volumes de dinheiro em espécie não são coisas "normais", pelo contrário, são coisas bem suspeitas como aprendemos nos cursos sobre lavagem de dinheiro.

É ou não é, colegas bancários?

William


terça-feira, 30 de agosto de 2022

Pai, parabéns pelos seus 80 anos! Saúde e paz!



Feliz aniversário, pai!

Hoje pela manhã fiquei olhando fotos de meu pai ao longo de décadas de vida neste nosso Brasilzão miserável e lascado desde sua invasão pelos bárbaros do Norte. 

Os brancos europeus chegaram chegando por aqui. Mataram os povos daqui, estupraram as mulheres, trouxeram escravizados povos da África. Fomos nascendo por séculos miscigenados, filhos e filhas de mulheres subjugadas por homens machistas e brutalizados pelo meio. Povo brasileiro!

Meu pai completa hoje 80 anos de idade. Não é qualquer coisa viver aqui por 8 décadas nessa terra miserável onde poucos mandam em tudo, onde uma elite má e vil subjuga milhões de homens, mulheres e crianças como se todos nós fôssemos propriedades de suas fazendas-cidades, fazendas disfarçadas de cidade, mas com um coronel que manda até hoje em tudo.

Não terá festa nem reunião de família e amigos para celebrarmos esse feito de meu pai de sobreviver 80 anos no Brasil. Estamos todos meio que afastados pelo que nos tornamos, pelo que nos tornaram. Vítimas do embrutecimento que experimentamos forçadamente. Após escrever, vou ligar pro meu pai e parabenizá-lo e agradecer por tudo que vivemos juntos até aqui. Sobrevivemos... 

(já brigamos juntos para meu pai ter atendimento médico, o pai já teve infarto, AVC... sobrevivemos)

Meu pai é de uma família de poucos recursos, meu pai e minha mãe. Foram vivendo como milhões de brasileiros das classes subalternas. Sobreviveram aos anos 40 e 50. Veio o golpe militar e a ditadura por mais de duas décadas. No conluio dos ricos com os militares, o povão se lascou por décadas.

Meus pais se casaram em 1964. Minha mãe não conseguia ter filhos como eles gostariam. A Telma chegou em 1967 e eu em 1969. Crescemos em São Paulo na década de 70. E mudamos para Minas Gerais na década de 80. A vida seguiu difícil. Ditadura militar que só fodia com os pobres. Depois os anos difíceis de Sarney e Collor etc. 

Dos anos 90 adiante tivemos o neoliberalismo dos fernandos e depois nos anos dois mil tivemos os melhores anos da vida do povo brasileiro, o povão trabalhador e pobre, os anos de governos do Partido dos Trabalhadores, os anos de Lula melhorando a vida do povão como nós. 

(como disse Lula no debate para uma candidata: o porteiro, a empregada e o motorista dela viram a vida melhorar durante os governos do PT)

Pois é, em 2016 veio o golpe de Estado que nos fez voltar ao passado, numa terra pior do que tudo que nós com mais de 50 anos conhecíamos até agora, só sabíamos da história de miséria e maldade contra o povo ao estudar a história do Brasil. E agora é só miséria desde que colocaram a máfia no poder com o presidente vampiro traidor e depois a milícia que está lá agora.

Todos nós, todos mesmo, somos sobreviventes nessa terra dominada por gente má e vil ao longo de séculos. A casa-grande e seus capitães do mato e seus ideólogos fizeram dessa terra um lugar duro de se viver. Somos sobreviventes... meu pai é um sobrevivente... eu sou um sobrevivente. E sobrevivendo nessa terra, endurecemos.

As relações familiares e entre as pessoas em geral não são mais as mesmas. Estamos todos muito difíceis para nos relacionarmos com as outras pessoas. E com isso nos afastamos das pessoas que mais amamos e dos familiares, dos amigos e conhecidos. E temos que ter humildade e coragem para desfazer toda essa distância e isolamento. 

Tenho refletido sobre isso. Ao observar e estudar o que o capitalismo, as ferramentas tecnológicas da atualidade e as redes sociais fizeram com os seres humanos, tenho clareza de que todos nós somos vítimas desses sistemas que nos tornaram de difícil convivência uns com os outros. Temos que resistir a isso. Temos que nos reunir e reaproximar uns dos outros.


Pai, feliz aniversário! Agradeço por tudo que foi possível o senhor fazer por nós ao longo dessas oito décadas de vida, seis décadas de sua vida dedicadas e vividas com a mãe, comigo e a Telma, com o Victor e a Stefani, com a Ione, o Mário e a Olga, e com as pessoas mais próximas da família.

Saúde e paciência, pai! E paz em seu coração!

Um abraço do filho que está longe fisicamente, mas que está à disposição para o que o senhor precisar.

William


segunda-feira, 29 de agosto de 2022

História dos bancários: um olhar




Um olhar pessoal da história dos bancários brasileiros

Dia 28 de agosto é o dia dos bancários e das bancárias do Brasil. Dia 28 de agosto também é aniversário de criação da maior e mais importante central sindical do Brasil, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), que completou 39 anos de existência e, na minha opinião, segue sendo uma instituição estratégica para a classe trabalhadora brasileira.

Ao longo de três décadas trabalhei como bancário, 2 anos no Unibanco e quase 27 anos no Banco do Brasil, primeiro como estagiário e depois como funcionário concursado. Durante mais da metade dessa jornada laboral, atuei como um dirigente eleito pelos colegas para representá-los em espaços de organização e negociação de direitos coletivos. Foi o que fiz de melhor em minha vida.

Quando cheguei eleito ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região, em 2002, já era bancário do Banco do Brasil sindicalizado há uma década. Já era um pouco politizado pelo mundo do trabalho, mas não era tão politizado quanto passei a ser ao virar sindicalista. Minha formação política de esquerda foi de certa forma tardia, após os 30 anos de idade, ao ser dirigente estudioso e presente nas bases, porque antes minha participação nas lutas sociais e estudantis eram voluntariosas, mas sem consciência histórica e de classe.

Nos primeiros anos de movimento sindical, era minha característica prestar atenção em tudo e em todos, ouvir com atenção as lideranças mais experientes e das diversas forças políticas que havia, ler e guardar os materiais impressos que existiam sobre nossa história de organização e lutas etc. E assim me formei no dia a dia da representação e nas lutas da categoria e da classe trabalhadora. Minha base formativa foi o Sindicato e mais especificamente o coletivo de diretores e diretoras do Banco do Brasil no Sindicato e no movimento nacional do BB.

Exerci mandatos sindicais e de representação por praticamente duas décadas. Saí do movimento sindical, da vida política e de representação e do Banco do Brasil em 2019. Após meu afastamento dos espaços de organização e lutas da categoria à qual militei a vida toda passei a viver uma realidade bastante diferente daquela que vivia. Sair do topo das organizações sociais para o seio de sua casa e ainda enfrentar dois anos de isolamento pela pandemia mundial é um choque traumático. A mudança é muito radical e se a pessoa não encontrar um certo equilíbrio emocional e novos sentidos e significados pode ser que ela pire. Eu ainda estou buscando sentidos. Isso é normal.

Acumulei durante a vida de estudos e representação de classe uma quantidade enorme de materiais relativos à nossa história. Sabendo que é necessário mexer nessas coisas, se desfazer de boa parte delas e seguir adiante buscando sentidos para o viver, venho olhando os materiais, avaliando o que não dá para jogar fora, o que se poderia fazer com alguns dos materiais etc. Algumas coisas são muito interessantes. 

Pode ser que alguns dos documentos de nosso passado de lutas valham a pena serem citados, comentados e ou transcritos no blog A Categoria Bancária (acessar aqui), uma página na internet para a qual dediquei muito tempo de minha vida durante os mandatos que exerci, um espaço de formação e informação dos leitores, de prestação de contas e de registro da história coletiva de uma categoria de lutas e conquistas importantes do povo brasileiro.

Vamos ver se a vida e o momento atual me permitem dedicar algumas horas da semana para compartilhar um pouco de história da categoria bancária sob o meu olhar e com as minhas lembranças. Quase todo o material que acumulei é material que serviu de estudos para eu me tornar o dirigente que fui entre o início dos anos dois mil e meados de 2018, quando encerrei meu último mandato de representação. Tudo que li, estudei e aprendi no fazer sindical me transformou como ser humano. Eu mudei, o mundo mudou e tudo segue mudando. A mudança é a essência do que somos: natureza.

William Mendes


quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Diário e reflexões (25/08/22)


Refeição Cultural

Osasco, 25 de agosto de 2022. Quinta-feira, 15 horas.


Mais uma viagem para resolver questões que precisavam ser resolvidas. Viajei a metade do mês de julho e agora a metade do mês de agosto. Como as coisas mudaram nos últimos anos! Mudança é a normalidade do viver. A vida é a passagem do tempo, é a jornada e não os destinos. É a maneira como se vive a cada instante. Já vivi coisas tão grandes que às vezes até duvido, mas passou esse tempo. Agora é tempo de coisas pequenas que parecem grandes quando a vida é a vida dos comuns.

Das experiências dos últimos meses ficaram sentimentos diversos em mim. Um dos sentimentos que têm ocupado meus pensamentos é o sentimento da consciência da passagem do tempo, do envelhecimento de todas as pessoas de meu relacionamento e sobretudo o efeito da passagem do tempo sobre mim. 

O reencontro com pessoas da família me mostrou a fragilidade da vida. Pessoas de meu relacionamento há décadas se encontram em condições frágeis de saúde e podemos dizer que isso é algo esperado para parte das pessoas adoecidas porque o tempo passou e envelhecemos, cada um de acordo com o seu próprio viver. O tempo corre para todos nós e talvez os encontros sejam também de despedidas.

Das pendências que tenho que resolver, resolvemos uma delas. Não do jeito ideal, mas do jeito que a vida caminhou. Nos despedimos de Jaboticabal, entregamos o imóvel onde nosso filho passou alguns anos de sua vida. Lá ficaram alguns amigos do filhão e lembranças de um momento importante da vida: os tempos de estudos. Novas etapas virão e o filhão tem total liberdade de escolher o que achar melhor pra si. Terá nosso apoio. Neste mundo, neste momento, o que mais importa para um ser humano é tentar estar bem. 

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POLÍTICA

Após passar a maior parte de minha vida adulta e produtiva como dirigente político e representante eleito por pessoas me encontro num momento difícil em relação à política e aos destinos de nosso país e dos espaços sociais aos quais me encontro como cidadão. Não acredito mais em mudanças favoráveis ao povo através da democracia como a conhecemos, a democracia burguesa ou liberal. Não acredito mais na democracia após o golpe de 2016 e após as ferramentas atuais de tecnologia e de manipulação de massas.

Desde adolescente alternei sentimentos opostos em relação aos seres humanos. Ao mesmo tempo em que queria distância das pessoas porque me decepcionava muito com os comportamentos humanos e com a própria sociedade, desde muito cedo as pessoas foram me escolhendo para representá-las em espaços diversos, desde o período colegial os colegas estudantes me colocavam como representante de classe. Assim fui vivendo, querendo me isolar das pessoas e representando as pessoas. Representei pessoas no colegial, nos cursos universitários, no condomínio onde moro, no trabalho de bancário. Até orador da turma fui na colação de grau de Ciências Contábeis. Guardo com muito carinho essa escolha de meus colegas, foi uma honra imensa!

Me politizei de verdade, de verdade, quando virei dirigente sindical bancário. Antes era voluntarista, participava das lutas e movimentações porque entendia que era obrigação de todos os envolvidos em qualquer causa coletiva. Com a representação sindical me tornei um militante político formalmente, um dirigente com mandatos. Antes, liderei movimentos sem ter mandato nos cursos universitários que frequentei: em três oportunidades. Contribuí com ideias e ações que mudaram coisas para melhor para centenas e milhares de pessoas. Mas quando virei dirigente bancário as coisas ficaram muito muito maiores. E assim foram meus dias por 16 anos.

Agora, neste momento do mundo e da vida, não me vejo tentando convencer pessoas que nunca vi na vida e que não represento a escolherem candidatos e partidos A ou B. Sempre que fiz isso, eu representava pessoas e era natural que eu estivesse o tempo todo apontando o que entendia ser melhor para nós coletivamente. Fiz isso a vida toda e com toda a honestidade ao indicar propostas, partidos, pessoas, ideias, conceitos e soluções. Por isso fui um representante (político) que sempre esteve nas bases sociais que representava, porque sempre me esforcei para estar ao lado de quem representava e para apontar o que defendia e estar junto para os resultados positivos ou negativos daquilo que construímos juntos. 

Dizer para estudantes o que defendia e para bancários e trabalhadores o que defendia sendo um deles e representando eles era algo de muita responsabilidade e fiz isso por décadas. Mas não é a mesma coisa falar com uma pessoa que não considero um par - um igual -, que está numa condição muito diferente da minha, o que eu acho que seria melhor para ela. Enfim, é isso que sinto.

ELEIÇÕES 2022: VOTO NO PT (13)

É evidente que meu projeto de mundo é representado neste momento por nosso querido e eterno presidente Lula e pelo Partido dos Trabalhadores, partido no qual voto desde que tirei meu título de eleitor em 1988. Para me representar no Estado de São Paulo, votarei em Haddad e no companheiro Luiz Cláudio Marcolino, uma liderança de nossa categoria bancária que trabalha incansavelmente para a classe trabalhadora e para os mais humildes. Tenho plena confiança na representação do Marcolino para nossa Assembleia Legislativa de SP.

É isso! Diários e reflexões têm essas características de textos soltos, às vezes longos, olhando o passado, o presente e o amanhã.

William


Post Scriptum: estou tão enojado de redes sociais e de manipulação por parte dos donos delas e dos algoritmos que uma hora dessas vou conseguir me livrar dessas merdas e não mais terei perfil em nenhuma delas, já que nossos perfis são commodities para essas empresas canalhas manipularem multidões e destruírem o cérebro e o espírito humano das pessoas. Não é à toa que as pessoas que conhecemos e convivemos a vida toda viraram seres com atitudes irreconhecíveis e incoerentes ao que elas eram, as redes sociais mudaram essas pessoas talvez para sempre...


terça-feira, 9 de agosto de 2022

Formação Econômica do Brasil - Celso Furtado (XXIV)

Quarta Parte

Economia de transição para o trabalho assalariado (século XIX)

XXIV. O problema da mão de obra

IV. Eliminação do trabalho escravo


"O caso da ilha de Antígua é apresentado na literatura especializada inglesa como demonstrativo do caráter puramente formal da abolição da escravatura ali onde as terras estavam monopolizadas por uma classe social. A assembleia dessa ilha dispensou os escravos das obrigações criadas pelo Apprenticeship System, introduzido pelo parlamento britânico como medida de transição na abolição da escravatura. Esse sistema obrigava os escravos maiores de 6 anos a trabalhar 6 anos para os seus amos durante uma jornada de 7 1/2 horas diárias, mediante alimentação, roupa e alojamento. Ao escravo ficava a possibilidade de trabalhar pelo menos duas horas e meia diárias mais, mediante salário. Concedendo de imediato a liberdade total, os latifundistas de Antígua se concertaram para fixar um salário de subsistência extremamente baixo. A consequência foi que os ex-escravos, em vez de trabalhar 7 1/2 horas para cobrir os gastos de subsistência, como ocorreria se se aplicasse o Apprenticeship System, tiveram de trabalhar dez horas diárias para alcançar o mesmo fim. Não existindo possibilidade prática de encontrar ocupação fora das plantações, nem de emigrar, os antigos escravos tiveram de submeter-se. Com razão se pôde afirmar no Parlamento britânico, nessa época, que os milhões de libras de indenização pagos pelo governo da Grã-Bretanha aos senhores de escravos antilhanos constituíram um simples presente, sem consequências práticas para a vida das populações trabalhadoras. Em outras palavras, a abolição da escravatura só trouxe benefícios aos escravistas. Para uma análise completa do caso de Antígua veja-se LAW MATHIESON, British Slavery and Its Abolition 1823-1838, Londres, 1926." (Nota 124, p. 183)


A leitura desse capítulo me deixou numa bad danada. Vi nele o mundo ao meu redor neste momento, dia 9 de agosto de 2022 do século 21. É o tal materialismo histórico que a gente nem lembra que existe. Estamos num clima tão infestado de mitos e mentiras e sofistas aproveitadores da ignorância alheia que acabamos por ser fisgados nessa lavagem cínica que empesta o nosso dia.

Que bad!

"Prevalecia então a ideia de que um escravo era uma 'riqueza' e que a abolição da escravatura acarretaria o empobrecimento do setor da população que era responsável pela criação de riqueza no país." (p. 141)

COMENTÁRIO - Que o diga o senhor José de Alencar, escritor famoso e aclamado, defensor da manutenção da escravidão no Brasil (ler a respeito aqui).

"Propriedade da força de trabalho"

Furtado comenta um pouco no capítulo a questão da disputa por quem detém a "propriedade da força de trabalho" assim como a questão da reforma agrária e a propriedade da terra; fatores de produção.

COMENTÁRIO - Fizeram a formalidade da abolição da escravidão em 1888 e no dia seguinte como ficaram as coisas? Leia a citação acima, da nota 124. Até hoje, seguimos com a "propriedade da força de trabalho" e sem propriedade de mais nada... e as máquinas fazem agora o que boa parte da humanidade fazia... e os lucros não são distribuídos ao povo nem sequer com a redução da jornada de trabalho. Pelo contrário, os novos escravos não trabalham mais 10 horas como na referência aos escravos de Antígua para sua subsistência... trabalham 24 horas...

Que bad!

"Se bem não existam estudos específicos sobre a matéria, seria difícil admitir que as condições materiais de vida dos antigos escravos se hajam modificado sensivelmente, após a abolição, sendo pouco provável que esta última haja provocado uma redistribuição de renda de real significado." (p. 143)

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"necessidades" diferentes de acordo com o desenvolvimento mental

Essa parte final do capítulo me deixou muito incomodado. Talvez pela forma como Furtado abordou o tema, talvez porque eu concorde com ele ao ver o mundo ao meu redor.

Ao explicar que os escravos libertos na região central do país, a região do café, preferiam trabalhar só alguns dias porque isso era o suficiente para a subsistência deles, Furtado diz:

"O homem formado dentro desse sistema social está totalmente desaparelhado para responder aos estímulos econômicos. Quase não possuindo hábitos de vida familiar, a ideia de acumulação de riqueza é praticamente estranha. Demais, seu rudimentar desenvolvimento mental limita extremamente suas 'necessidades'. Sendo o trabalho para o escravo uma maldição e o ócio o bem inalcançável, a elevação de seu salário acima de suas necessidades - que estão definidas pelo nível de subsistência de um escravo - determina de imediato uma forte preferência pelo ócio." (p. 144)

Na hora, escrevi no canto do livro: "Caraca! Pensei nos novos escravos hoje... qual o nível de necessidades deles?"

Mas logo em seguida, me lembrei do quanto as ideologias da classe dominante atuaram para nos convencer de que nós das classes subalternas somos "preguiçosos" e não queremos "subir na vida" e merdas do tipo... que foda! Foram séculos de ideólogos da elite do atraso enfiando isso em nossas cabeças... (até chegarem na sofismática palavra "meritocracia")

Mais adiante, Furtado diz:

"(...) Podendo satisfazer seus gastos de subsistência com dois ou três dias de trabalho por semana, ao antigo escravo parecia muito mais atrativo 'comprar' o ócio que seguir trabalhando quando já tinha o suficiente 'para viver'..." (p. 144/145)

E eu anotei no livro: "Me lembrei das discussões que tinha com os gerentes do banco sobre não aceitar vender meus dias de férias...".

Uma vez, achei tão fdp o gerente me pressionando para vender minhas férias que disse pra ele que se eu tivesse dinheiro, eu era caixa executivo, eu aceitaria comprar dias de férias dele ao invés de vender os meus dias.

E Furtado termina esse 4º capítulo abordando a transição do trabalho escravo para o assalariado demonstrando que a forma como a abolição foi feita traria consequências profundas para a sociedade brasileira em relação ao desenvolvimento econômico do país, principalmente para a parcela "libertada" daquela forma.

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Que bad!

Neste momento da história do Brasil, o genocida no poder central está usando o orçamento do país para comprar votos durante os meses de eleição e os sofistas pregadores profissionais dos mitos manipulam zilhões de pessoas miseráveis para manterem o sistema de máfia no poder por mais tempo... 

Aff! Que bad!

William


Para ler comentários sobre o capítulo seguinte, clique aqui.


Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Grandes nomes do pensamento brasileiro. 27ª ed. - São Paulo. Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.


segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Discurso da servidão voluntária (La Boétie) - Pensamentos e frases




Refeição Cultural

La Boétie (1530-1563) foi um pensador francês que faleceu jovem, aos 32 anos de idade. Muitos de seus textos e pensamentos são conhecidos e chegaram até nós por intermédio de Montaigne (1533-1592), outro pensador e intelectual francês do século 16.

Reler os ensinamentos de Étienne de La Boétie, um jovem francês do século 16, e reler principalmente em períodos de processos eleitorais para cargos executivos e parlamentares é algo necessário para dar equilíbrio à razão e centralidade ao cérebro humano para todos que ainda insistem em pensar e não se transformaram em autômatos, robôs humanos, plugados em aparelhos celulares que viraram os donos dos corpos humanos que os transportam por aí.

La Boétie afirma que é possível resistir à opressão sem recorrer à violência e que a tirania se destrói por si mesma se os indivíduos se recusarem a obedecer o poder despótico não cedendo a ele com sua própria servidão voluntária. Essa é uma ideia de desobediência civil que pode ser a estratégia adotada pelo povo brasileiro no enfrentamento às ameaças reais que a casa-grande, a elite do atraso, enfim, a extrema-direita vem impondo desde que o golpe de Estado em 2016 acabou com a democracia que havia no país desde a constituinte e a Carta Magna de 1988.

Observação: entendo que onde o texto diz "homem" para o conceito de "seres humanos" podemos entender que se trata de homens e mulheres.

Observação 2: neste momento de minha vida, após tudo que vi e vivi nestas mais de cinco décadas de vida e de estudos da sociedade humana, preciso ler e ouvir teses pacifistas como essa de La Boétie, preciso me esforçar para acreditar em pacifistas como o nosso querido presidente Lula, e tantas pessoas mais que conheço e que pregam o pacifismo. Perdi a crença na solução pacífica das controvérsias... nossos inimigos atuais não compartilham do pacifismo e pregam nossa eliminação física. Quero acreditar no pacifismo, mas não é o que vejo como solução para mudarmos e salvarmos o mundo e o povão que sofre na mão do 1%. 

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FRASES E PENSAMENTOS

Em relação a um só líder ou soberano:

"É difícil acreditar que haja algo público num governo no qual tudo depende de um só"

A referência é a Monarquia, mas ele expande o conceito depois a tiranos em repúblicas. Eu estendo a reflexão para qualquer forma de poder onde um só dita as regras e o restante acata ou obedece, sem a menor crítica ou análise da questão.

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"É incrível ver como o povo, quando é submetido, cai de repente num esquecimento tão profundo de sua liberdade, que não consegue despertar para reconquistá-la. Serve tão bem e de tão bom grado que se diria, ao vê-lo, que não só perdeu a liberdade, mas ganhou a servidão."

Incrível, não? E um pouco mais adiante, La Boétie vai associar essa aptidão à servidão ao maldito do "hábito".

"Mas o hábito, que exerce em todas as coisas um poder irresistível sobre nós, não tem em lugar nenhum força tão grande quanto a de nos ensinar a servir. E como dizem de Mitrídates, que foi se acostumando aos poucos ao veneno, aprendemos a engolir sem achar amargo o veneno da servidão. Não se pode negar que a natureza nos dirige para onde quer, bem-nascidos ou malnascidos, mas é preciso confessar que ela tem menos poder sobre nós que o hábito."

Mais que nunca, é preciso que cada um de nós deixe o hábito da preguiça mental, do receber mastigado algum meme, mentiroso ou não, e sair por aí replicando e reproduzindo aquelas gotas de veneno ou maledicência.

Para ser livre e gozar da liberdade de pensamento e de ações, é necessário não ser um mero servo da manipulação.

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"Chego agora a um ponto que é, a meu ver, a mola mestra e o segredo da dominação, o apoio e o fundamento da tirania. (...) À primeira vista, será difícil acreditar, embora seja a pura verdade: são sempre quatro ou cinco que mantêm o tirano, quatro ou cinco que conservam o país inteiro em servidão."

Se lembrarmos que a obra e o autor são de mais ou menos 1550, século 16, e o tamanho da população da época, estamos falando hoje naquele menos de 1% que detém o poder sobre todos os meios - os de produção e os de comunicação. No Brasil, poucas famílias bilionárias detêm a metade da riqueza nacional e alguns milhares de pessoas privilegiadas têm uma renda que os isolam do restante dos 215 milhões de pessoas com pouco ou quase nada.

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SOBRE COVARDIA

"E quando vemos, não cem, não mil homens, mas cem países, mil cidades, um milhão de homens se absterem de atacar aquele que trata a todos como servos e escravos, que nome poderemos dar a isso? Será covardia?"

e

"Para conseguir o bem que deseja, o homem ousado não teme nenhum perigo, o homem prudente não regateia nenhum esforço. Só os covardes e os preguiçosos não sabem suportar o mal nem recuperar o bem. Limitam-se a desejá-lo e a energia de sua pretensão lhes é tirada por sua própria covardia."

Avalio que esses conceitos valem para todos nós. Como foi que permitimos que os canalhas que se apoderaram de todos os aparelhos de poder estatal brasileiro após o golpe de 2016 acabassem com canetadas diárias com conquistas históricas de todo o povo trabalhador de forma tão rápida e tão intensa em pouquíssimo tempo? Se o risco de extinção da vida é tão grande ao não ter emprego, direitos sociais, atendimento e socorro na falta de saúde etc, como não nos arriscamos a enfrentar tão poucos ladrões de nossa vida como esses canalhas que nos roubam tudo desde abril de 2016? Avalio, pessoalmente, que tem um quê de covardia nisso...

Estou sendo duro na avaliação, sei disso, porque tenho conhecimento de que a falta de organização e estratégia pelo lado da classe trabalhadora pesou nessa falta de reação à destruição de nossos direitos, mas acredito realmente que a covardia foi um componente que pesou para tudo isso também.

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NOSSOS ALGOZES NOS DOMINAM POR NOSSA CONIVÊNCIA

"Entretanto, aquele que vos oprime tem só dois olhos, duas mãos, um corpo, nem mais nem menos que o mais simples dos habitantes do número infinito de vossas cidades. O que ele tem a mais são os meios que lhe destes para destruir-vos."

La Boétie nos esclarece o tempo todo sobre nossa servidão voluntária, nossa permanência no hábito de servir quem nos oprime, abrindo mão de lutar por nossa liberdade.

"De onde tira tantos olhos que vos espiam, se não os colocais à disposição dele? Como tem tantas mãos para vos bater, se não as empresta de vós? Os pés com que pisoteia vossas cidades não são também os vossos? Tem algum poder sobre vós que não seja de vós mesmos? Como se atreveria a atacar-vos, se não tivesse vossa conivência? Que mal poderia fazer-vos, se não fôsseis os receptadores do ladrão que vos pilha, os cúmplices do assassino que vos mata e os traidores de vós mesmos?"

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São tantos os pensamentos e ideias que La Boétie concentra nesse pequeno texto sobre a servidão voluntária que vale a pena as pessoas terem o texto em mãos e lerem trechos aleatoriamente sempre que se pegarem numa condição desconfortável de falta de liberdade e de opressão imensa por parte de alguém ou algo.

É isso!

William


Bibliografia:

LA BOÉTIE, Étienne de. Discurso da servidão voluntária. Coleção a obra-prima de cada autor. Tradução: Casemiro Linarth. Editora Martin Claret. São Paulo, 2009.


domingo, 7 de agosto de 2022

Formação Econômica do Brasil - Celso Furtado (XXIII)

Quarta parte

Economia de transição para o trabalho assalariado (século XIX)

XXIII. Transumância amazônica


"Essa enorme transumância indica claramente que a fins do século passado já existia no Brasil um reservatório substancial de mão de obra, e leva a crer que, se não tivesse sido possível solucionar o problema da lavoura cafeeira com imigrantes europeus, uma solução alternativa teria surgido dentro do próprio país. Aparentemente, a imigração europeia para a região cafeeira deixou disponível o excedente de população nordestina para a expansão da produção da borracha." (p. 137)

A primeira observação é quanto ao termo "transumância" usado por Celso Furtado. Todas as definições que encontrei deixam claro que o conceito mais usado para a palavra é a migração de rebanhos, gado, pastoreados por pessoas, tipo os vaqueiros ou pantaneiros conduzindo gados pra lá e pra cá.

Furtado teria usado o termo para se referir a seres humanos tratados como gado mesmo? Ele está falando do Brasil do século XIX para o início do XX, ou seja, do fim da escravidão humana formal para uma nova forma de escravidão que vigora até hoje. Ou já em meados do século passado, ele usou o termo transumância em sua significação menos comum ou até rara se referindo a migração de gente como mão de obra? Sei lá.

Este é o 3º capítulo tratando do problema da mão de obra na transição para o trabalho assalariado no Brasil.

Um dos destaques do capítulo, pra mim, é a lembrança da morte de quase 200 mil pessoas por fome na região Nordeste na segunda metade do século XIX. Essa calamidade facilitou a migração dos nordestinos para a região amazônica, como mão de obra barata para expandir a extração da borracha, em alta no mercado internacional naquela época.

"Esse problema estrutural assumira extrema gravidade por ocasião da prolongada seca de 1877-80, durante a qual desapareceu quase todo o rebanho da região e pereceram de cem a duzentas mil pessoas." (p. 139)

Finalizo os comentários com uma comparação que Furtado faz dos migrantes europeus vindos para cá para as regiões de café na região Sudeste e os migrantes do Nordeste para a região amazônica: ele afirma no final da página 139 que a situação do povo daqui foi bem pior que a do povo que veio com alguns auxílios da Europa pra cá.

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COMENTÁRIO

A história só esclarece o que já sabemos ao estudar as origens das sociedades quando invadidas: os povos originários e nativos só se ferram nesses processos.

Depois no futuro os donos do poder vão usar o termo "meritocracia" para manipular o povão ao dizer que eles estão na merda porque não tiveram capacidade, porque são preguiçosos e outras merdas do tipo.

Neste desgraçado 7º ano do golpe de 2016 no Brasil, quando a "ponte para o futuro" nos levou paras os séculos de colônia que Celso Furtado nos descreve no livro, temos a chance de encerrar esse período e recomeçar um longo processo de independência e soberania do povo brasileiro de novo.

ELEIÇÕES DE OUTUBRO: temos dois projetos a escolher caso tenhamos eleições em outubro: o que está aí desde o golpe, o do Brasil colônia, e o que se apresenta para resgatar o país e criar perspectivas de um recomeço de paz e prosperidade para o povo, projeto liderado por Lula.

Vamos ver o que vai acontecer nos próximos meses. Os golpistas não vão abrir mão dessa colônia de exploração, não vão!

William


Para ler comentários sobre o capítulo seguinte, clique aqui.


Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Grandes nomes do pensamento brasileiro. 27ª ed. - São Paulo. Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.


sábado, 6 de agosto de 2022

Diário e reflexões (06/08/22)


Bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki.

Refeição Cultural

Osasco, 6 de agosto de 2022. Sábado.


"Em geral não se diz o que houve,

e sim o que ouve" (Oswald de Andrade)


SERÁ QUE HOUVE O QUE SE OUVE POR AÍ NOS TIK-TOKS DO MUNDO ATUAL, ORAL E VISUAL?

Num dia como este, 6 de agosto, em 1945, os norte-americanos jogaram uma bomba atômica sobre Hiroshima, Japão, dizimando a população civil daquela cidade instantaneamente. A guerra já estava resolvida, os países aliados vencedores da guerra já haviam triunfado, o exército vermelho dos soviéticos já havia derrotado Hitler e mesmo assim os Estados Unidos jogaram duas bombas atômicas sobre populações civis do Japão, em Hiroshima e depois em Nagasaki, no dia 9 de agosto. É bom que ninguém se esqueça disso. Num dia como esse, 6 de agosto, assassinaram centenas de milhares de seres humanos só para demonstrarem que podiam fazer isso. Essa coisa foi feita por seres humanos.


DA LINGUAGEM ORAL, INVENTAMOS A ESCRITA, NOS ALFABETIZAMOS, REGISTRAMOS A HISTÓRIA, E AGORA CAMINHAMOS PARA SERMOS ANALFABETOS (PRÉ-HISTÓRIA DE NOVO?)

Olhar para trás. Olhar o presente. Olhar o futuro. Existem passado, presente e futuro? Ou só existe o presente? Essa questão é uma questão pouco refletida por quase todos nós, seres humanos da era das redes sociais e dos algoritmos e das manipulações de massas com mentiras e ódios e medos. Quem liga para história e para filosofia? Quem liga?

Comecei esta reflexão lembrando do assassinato de centenas de milhares de pessoas por uma ordem de um governo de um país e depois citei a questão da noção de tempo, uma variável só existente na cabeça e no mundo dos homo sapiens. 

O tempo não existe a não ser como um marcador de coisas a partir do olhar dos seres humanos. Uma barata não pensa no tempo. Nem um leão. Muito menos um ipê. Uma pedra nem se fale! Só nós pensamos nessa coisa chamada tempo, e com o tempo o passado, o presente e o futuro. A história.

Ao viver mais, ficar mais tempo vivo, vemos mais coisas, vemos mais acontecimentos, vemos mais mortes. Vemos mais coisas conforme as oportunidades que se colocam ao nosso alcance, conforme o lugar, a época e nossa condição. 

Em alguns milênios (o tempo...) os homo sapiens classificaram os acontecimentos do tempo em história e pré-história, o marco que separa um período do outro foi a invenção da escrita, os registros que os animais humanos passaram a fazer sobre suas épocas. Nos últimos 7 mil anos, mais ou menos, deixamos de ser sociedades ágrafas e passamos a registrar a história.

Agora, no início dessa nova era, a era das redes sociais, do mundo oral e visual, do mundo do instantâneo, das dancinhas tik-tok e dos pets nas timelines, a humanidade passou a aprender a escrever na infância nas escolas para desaprender assim que para de usar a escrita e a leitura. Quando os humanos tik-tokers tentam escrever em comunicados rápidos de WhatsApp, aqueles signos são incompreensíveis... 

Sei não. Me parece que avançamos da pré-história para a escrita, para a história, e agora caminhamos para a era dos analfabetos funcionais, para a pré-história da nova humanidade.

Não sei se num futuro próximo teremos registros de dias fatais e marcantes na história humana como o dia 6 de agosto de 1945 ou mesmo os acontecimentos do dia 6 de agosto de 2022, registrado e lido daqui a algumas décadas (o tempo...)

Como refletiu o poeta: vai ficar difícil saber se o que se ouve, houve...

William


Post Scriptum (25/8/22):

Yuval Harari, em Sapiens (2011), trabalha com um conceito mais amplo, talvez mais moderno, de marco que separa história de pré-história. Ao invés de se fixar na questão da escrita e dos registros das civilizações, ele trabalha com o conceito de culturas, as culturas das sociedades humanas seriam os marcos da separação entre história e pré-história, pelo que entendi da leitura que já fiz do livro até agora. Dessa forma, a história humana teria por volta de 70 mil anos, mais ou menos. Algo bem anterior à etapa na qual os homo sapiens passaram a desenvolver a agricultura. Vamos estudando e vendo o que os estudiosos dizem a respeito de nossa história.


sexta-feira, 5 de agosto de 2022

45. Discurso da servidão voluntária - La Boétie



Refeição Cultural - Cem clássicos

Ao ver o professor Pedro Serrano citar La Boétie dias atrás, ao falar sobre a questão da tirania e dos apoiadores dos tiranos, acabei pegando meu livro do filósofo e relendo um de seus principais textos, um clássico.

Ganhei o livro do amigo Sandro Sedrez e tomei conhecimento do texto em janeiro de 2017. Cinco anos após a leitura, reli vendo na minha mente as imagens do Brasil regido por um tirano com o apoio de quase 1/3 da população. O que La Boétie explica tem muito sentido, juro pra vocês!

No livro, o filósofo enaltece o valor da liberdade e também discorre sobre motivos que fazem as pessoas abrirem mão de suas liberdades para servirem voluntariamente às tiranias. As observações do autor são feitas a partir de dezenas de exemplos históricos que ele vai citando a cada nova argumentação. La Boétie é muito perspicaz.

Não vou fazer um monte de citações aqui na postagem. A ideia central de manutenção das tiranias, citada por Pedro Serrano e por La Boétie, me fez ficar pensando a respeito.

Os apoiadores dos tiranos os apoiam porque também têm na tirania instalada no poder as suas oportunidades de praticaram as suas tiranias cotidianas, a tirania é conveniente a eles.

Aos que não são tiranos ou ao menos que não se sentem à vontade com a tirania cabe se organizarem e derrubarem os tiranos do poder, sabendo que pra isso terão que enfrentar seus vizinhos, familiares, conhecidos e todos os tiranos que os cercam...

É isso!

William


Post Scriptum: tem uma coisa que carrego comigo desde que frequentei um curso de gnose séculos atrás que ainda martela em meu coração (o cérebro): naquelas aulas de autoconhecimento, os instrutores diziam que os pecados e os erros eram muito mais graves e de difícil perdão naqueles que tinham mais conhecimento porque os cometiam com consciência do que era certo ou errado. Eu tenho muito mais dificuldades para lidar com os intelectuais e pessoas com algum grau de conhecimento que se locupletam com os tiranos e as tiranias do que com os ignorantes de sempre e os idiotizados do mundo moderno pós redes sociais e algoritmos... 


quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Formação Econômica do Brasil - Celso Furtado (XXII)

Quarta parte

Economia de transição para o trabalho assalariado (século XIX)

XXII. O problema da mão de obra

II. A imigração europeia


"É fácil compreender que esse sistema degeneraria rapidamente numa forma de servidão temporária, servidão essa que nem sequer tinha um limite de tempo fixado, como ocorria nas colônias inglesas. Com efeito, o custo real da imigração corria totalmente por conta do imigrante, que era a parte financeiramente mais fraca. O Estado financiava a operação, o colono hipotecava o seu futuro e o de sua família, e o fazendeiro ficava com todas as vantagens..." (p. 132)

Esse capítulo é como um episódio de uma dessas séries em plataformas de streaming atuais. Nele vemos como um país tende a dar errado já que seus vícios de origem são terríveis. E não quero aqui fazer coro com os ensaístas da burguesia que justificaram em clássicos da literatura porque o Brasil deu errado, justificando que a culpa seria do povo (como nos alerta Jessé Souza). É o contrário, a culpa é dos filhos das putas invasores que aqui chegaram ao longo dos séculos. A culpa é dos brancos europeus colonizadores, que depois seriam as nossas elites do atraso, ignorantes e vira-latas.

Vimos no capítulo anterior, que o Brasil tinha quase dois milhões de seres humanos oriundos do continente africano escravizados. Os escravos africanos estavam distribuídos nas lavouras de cana de açúcar no Norte, nas lavouras de algodão no Maranhão e nas áreas mineradoras da região central do país. Com os preços dessas commodities em baixa no mercado internacional por causa da concorrência, as casas-grandes estavam vivendo praticamente da produção de subsistência e das exportações com preços menores do mercado. O povão nas áreas urbanas estava se ferrando com falta de tudo e com fome pela inflação elevada. (alguma semelhança com o Brasil 2022 do agro "pop"?)

O capítulo é cheio de detalhes, não dá para ficar resumindo aqui. Furtado nos explica que não há comparações possíveis entre a migração europeia para a América do Norte e a migração que ocorreria na segunda metade do século XIX de colonos europeus para o Brasil. Não há! As formas e os motivos eram totalmente diferentes lá e cá. 

No Brasil, faltava mão de obra para empreender lavouras de café. Os escravos das outras atividades econômicas não estavam disponíveis para as casas-grandes que iriam focar no café. A forma encontrada aqui no final de algumas experiências foi o governo imperial bancar a vinda das famílias europeias e exigir que os fazendeiros bancassem o sustento delas por um ano. Antes disso, Furtado explica na p. 132 que os colonos que vieram nas décadas anteriores viravam quase que escravos também, com um tipo de servidão temporária que virava servidão permanente (1ª citação acima).

"A solução veio em 1870, quando o governo imperial passou a encarregar-se dos gastos do transporte dos imigrantes que deveriam servir à lavoura cafeeira. Demais, ao fazendeiro cabia cobrir os gastos do imigrante durante o seu primeiro ano de atividade, isto é, na etapa de maturação de seu trabalho. Também devia colocar à sua disposição terras em que pudesse cultivar os gêneros de primeira necessidade para manutenção da família. Dessa forma, o imigrante tinha seus gastos de transporte e instalação pagos e sabia a que se ater com respeito à sua renda futura. Esse conjunto de medidas tornou possível promover pela primeira vez na América uma volumosa corrente imigratória de origem europeia destinada a trabalhar em grandes plantações agrícolas." (p. 133)

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COMENTÁRIO

E com essa história toda, a gente chegou aos dias atuais. Furtado traz no final do capítulo números impressionantes de imigrantes europeus que aqui chegaram, aqui em São Paulo.

"O número de imigrantes europeus que entra nesse Estado sobe de 13 mil, nos anos setenta, para 184 mil no decênio seguinte e 609 mil no último decênio do século. O total para o último quartel do século foi de 803 mil, sendo 577 mil provenientes da Itália." (p. 133)

E numa canetada em 1888 os caras, através da princesa, "libertaram" quase 2 milhões de escravos de origem africana e disseram a eles "se virem!"... é verdade que teve muita gente boa nessa disputa política de liberta ou não liberta, mas o governo deixou os libertos por sua conta e risco... e depois muitos dos meus conterrâneos brancos vêm dizer até hoje que a meritocracia foi a base de suas "vitórias" na vida... e que não existe racismo no Brasil e outras merdas do tipo... aff! Que canseira dessas asneiras!

William

Para ler comentários do capítulo seguinte, clique aqui.
 

Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Grandes nomes do pensamento brasileiro. 27ª ed. - São Paulo. Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.


terça-feira, 2 de agosto de 2022

Diário e reflexões (02/08/22)


Refeição Cultural

Osasco, 2 de agosto, noite de terça-feira. 2022.


Ao voltar de uma corrida noturna aqui no bairro, senti durante o alongamento uma confluência de diversos pensamentos que atribulavam minha mente e quase tive uma crise de choro, foi estranho. Muita coisa passou pela minha cabeça. Agora já está tudo sob controle e dentro da rotina do viver.

Minha saúde não é mais a mesma desde que exerci minha última função no período laboral. Não sou velho para os padrões sociais da atualidade, mas tive uma vida muito intensa e isso pode ter me envelhecido muito mais rapidamente do que a quilometragem aparenta. 

Um dos meus sonhos era continuar correndo e praticando esportes assim que tivesse mais tempo na vida e esse sonho foi pro saco ao passar a ter problemas de dores no quadril desde 2018. Acabaram meus sonhos de longas corridas como meias maratonas e maratonas. Arte marcial também já era. Insisto nas corridas, mas após a prática me sinto como se tivesse sido atropelado por um trem. É foda!

Mas por que não saio por aí fazendo um monte de exames e vejo o que pode estar errado com minha saúde? Pago uma fortuna de planos de saúde para a família e como se diz por aí o mais comum seria ir de especialista em especialista até achar que encontrei o problema e a solução pra ele... 

Ao olhar para trás na minha vida antes e depois do mandato de gestor de saúde que exerci por quatro anos, diria que tenho um histórico de pouca relação com sistemas de saúde. Antes dos vinte anos, eu e minha família não tínhamos planos de saúde e quando conseguíamos algum atendimento médico era daquele jeito que o povão consegue, em algum hospital ou posto de saúde públicos. Nunca me esqueço dos barracos que armamos para salvar a vida de meus pais quando estavam entre a vida e a morte por algum caso agudo de saúde.

Na adolescência, a benzedeira Dona Nenzinha era a nossa salvação em Uberlândia. Em São Paulo, após voltar pra cá em 1987, também contei com benzedeiras, cirurgias espirituais e ajudas de toda ordem nos centros de umbanda. E nas necessidades de atendimento por eventos agudos como, por exemplo, cálculos renais e acidentes de moto era o hospital da USP que a gente procurava na região do Rio Pequeno, Zona Oeste.

Ao ter acesso a planos de saúde quando virei bancário, continuei sem ter a menor intenção de frequentar o sistema de saúde. Eu me sentia muito mal em ter um plano de saúde e o restante de minha família não ter. Quando eu passava mal por algum motivo, ficava em casa e aguentava o período ruim até melhorar. Juro que fiz isso praticamente até ser eleito diretor de saúde de nossa autogestão do Banco do Brasil, já com 45 anos de idade. Lógico que usei o plano, mas só quando o calo apertava.

Quando entrei por concurso público no Banco do Brasil, tentei por duas vezes incluir meus pais como dependentes do meu plano de saúde. As duas tentativas foram rejeitadas. O incrível é que um monte de colegas conseguia colocar os pais como dependentes nos anos noventa... as decisões eram arbitrárias... Anos mais tarde, na reforma estatutária de 1996, a situação mudou e o novo estatuto definiu de forma mais clara e rígida quem poderia ser dependente dos associados. Mas quem estava, teve um tratamento diferenciado para continuar usufruindo do sistema, pagando um valor menor.

Como gestor da autogestão em saúde, além de ter conhecido o modelo assistencial da Cassi e acreditar piamente nele, decidi investir na saúde de minha família e até hoje faço um grande esforço para mantê-los nos planos de saúde da Cassi. Entendo que ter uma oportunidade de atendimento médico é uma forma de aumentar a chance de ter meus entes queridos comigo. A família ainda é um porto seguro e uma referência num mundo tão sem sentido como esse no qual nos pegamos.

Acabei me alongando na reflexão, esses textos de diários têm essas digressões que visitam o passado e vão se fazendo enfadonhos até pra quem escreve.

Enfim, por que não saio andando pelo sistema e procurando problemas e soluções? Porque não confio mais no sistema de saúde ao qual pertenço como confiava quando ele era focado em nos proteger da sanha mercadológica dos capitalistas que vendem procedimentos de saúde e outras tralhas para enriquecerem às custas dos usuários de planos de saúde. O modelo preventivo e de acompanhamento por equipes de família está sendo todo terceirizado e não sei o que vai sobrar do modelo que tínhamos. Sei que terei que lidar com essa máquina ("indústria da saúde") de fazer dinheiro às custas da gente, mas voltei a me comportar como antes, quando evitava ao máximo usar o sistema de saúde. Isso não é nada bom...

No último texto de Memórias que escrevi no blog A Categoria Bancária (ler aqui), acabei falando um pouco do rumo que nossa autogestão está tomando e acho isso muito triste. Mas são os tempos. São as opções dos participantes dos sistemas sociais nos quais estamos enfiados.

Chega por enquanto... a cabeça está cheia de coisas, mas paro nas reflexões e nas digressões.

William


Post Scriptum (25/8/22):

Como disse acima sobre o esforço que faço para manter minha família com plano de saúde, neste mês de agosto teve reajuste no plano e a cacetada foi de mil reais de reajuste... mil reais... vou mantê-los no plano de saúde enquanto eu estiver vivo e puder dar oportunidade para eles terem acesso a alguma assistência médica nessa terra devastada pelo regime de morte e corrupção que se apossou do poder após o golpe de 2016. Dinheiro serve pra isso e não pra se acumular como pensam os capitalistas e a gente manipulada pela ideologia capitalista.


segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Formação Econômica do Brasil - Celso Furtado (XXI)

Quarta parte

Economia de transição para o trabalho assalariado (século XIX)

XXI. O problema da mão de obra

I. Oferta interna potencial

Este capítulo é chocante pela apresentação da questão da mão de obra escrava. Furtado apresenta alguns números da escravidão no Brasil e nos Estados Unidos ao longo do século XIX.

A nota 105 do livro é tão clara em relação aos números do tráfico de seres humanos que vale a pena deixar a citação aqui.

"Não se conhecem dados completos sobre a entrada de escravos no Brasil, nem mesmo para a época da independência política. Particularmente irregulares são os dados relativos às entradas pelos portos do norte. Entre 1827 e 1830 houve uma grande intensificação do tráfico, pois neste último ano aquele 'deveria' cessar em razão do acordo com a Inglaterra. As entradas pelo porto do Rio excederam 47 mil em 1828 e 57 mil em 1829, descendo para 32 mil em 1830. Essas importações foram evidentemente anormais, pois provocaram forte desequilíbrio no mercado, reduzindo-se os preços à metade entre 1829 e 1831. Outra etapa de grandes importações foi a que antecedeu à cessação total do tráfico, ocorrida entre 1851 e 1852. Com efeito, no quinquênio 1845-49, a importação média alcançou 48 mil indivíduos. Dificilmente se pode admitir que a importação total na primeira metade do século passado haja sido inferior a 750 mil (média anual de 15 mil), sendo porém pouco provável que haja excedido de muito um milhão. Nos EUA, entre 1800 e 1860 se importaram cerca de 320 mil escravos, e, desses, uns 270 mil foram contrabandeados depois da abolição do tráfico em 1808. O máximo das importações decenais (75 mil) foi alcançado no período imediatamente anterior à guerra civil. (Dados relativos aos EUA citados por L. C, GRAY, History of Agriculture in the Southern United States to 1860, Washington, 1933, tomo II, p. 630.)" (p. 181)

É chocante! Até a forma burocrática como o próprio Celso Furtado descreve a comercialização de seres humanos como se fossem gado. Mas o fato é que o racismo estrutural do qual falamos aqui no Brasil vem dessa realidade material e objetiva: a economia escravista que estruturou o Brasil nunca deixou de ser a base da sociedade brasileira, nunca!

Não à toa, vemos os absurdos que vemos sobre racismo neste exato momento em que escrevo esse comentário de leitura sobre a "formação econômica do Brasil".

Neste capítulo sobre a questão da mão de obra no século XIX, vemos a movimentação de milhões de seres humanos oriundos do continente africano, raptados e transportados para os Estados Unidos e para o Brasil e, ainda hoje, tem uns filh@s da puta que fazem de conta que não houve consequência alguma dessa tragédia humanitária ao longo do tempo fazendo com que todos os dados sobre pobreza e miséria recaiam sobre as populações descendentes dessa massa de pessoas capturadas e feitas de mão de obra gratuita para o engrandecimento dos brancos estrangeiros e seus descendentes das casas-grandes.

Pro inferno com cada racista que se apresente em nossa frente. Não se combate o racismo só se dizendo antirracista, racismo se combate com reação contra qualquer fdp racista, como vimos reagir nesta semana a atriz Giovanna Ewbank ao se deparar com uma racista num restaurante em Portugal.

William


Clique aqui para ler comentários do capítulo seguinte.


Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Grandes nomes do pensamento brasileiro. 27ª ed. - São Paulo. Companhia Editora Nacional: Publifolha, 2000.


Diário e reflexões (01/08/22)


Refeição Cultural

Osasco, 1º de agosto de 2022. Início da madrugada de segunda-feira do mês dos maus agouros como dizem as crendices populares. Não acredito nessas coisas, mas respeito quem acredita em mitos (em outras fases da vida acreditei em tudo: religiões, monstros, alienígenas, fantasmas, i ching, horóscopos, mau-olhado etc, tudo que se possa imaginar rsrs).


Pois é, cá estamos vivos (não é um diário de um Brás Cubas) e vivendo os dias como correm, meio no embalo dos acontecimentos cotidianos, meio que tentando ser o condutor de alguma coisa da própria vida (algo difícil - eu não me iludo -, não estamos no controle de nada). Sigo buscando atitudes dignas e significados, já que viver é dar sentidos ao viver.

Nas últimas semanas fiz algumas coisas fora da rotina. Ver pessoas que não via há tempos - familiares principalmente - foi algo diferente e importante. Sigo com o objetivo de reencontrar pessoas das quais me afastei. É uma atitude que quero ter. Um adoecimento e um falecimento aceleraram o processo. Mas tenho que ir além disso, buscar contatos. Mesmo que algumas experiências não sejam positivas, serão experiências do viver nesta fase de minha vida.

Também revi pessoas queridas e conhecidas de minha fase de vida laboral e de militância política. A falta de contato presencial com as pessoas, tanto por ter saído do banco, do movimento sindical e por causa da pandemia mundial de Covid-19 para uma pessoa que passou a principal fase da vida entre multidões é um acontecimento terrível, que nos afunda numa espécie de insignificância horrível, um vazio existencial difícil de lidar, mesmo sabendo que temos que aprender a lidar com isso, afinal de contas a vida é assim. As coisas mudam, todo dia, o tempo todo. Tudo muda e temos que ter sabedoria para nos adequarmos ao viver, às veredas do viver desse sertão existencial.

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BALANÇOS E BUSCA DE SIGNIFICADOS

Pode parecer algo inútil para a coletividade meu processo de revisita ao passado, estou revendo milhares de postagens nos blogs e mídias que mantenho há quase duas décadas. E sigo escrevendo aqui. Sinto que tenho que fazer isso, é como se fosse um balanço e fechamento de minha vida pública. A intenção da criação dos blogs foi a melhor possível, queria compartilhar conhecimento e ajudar pessoas naquele sonho de um mundo melhor, mais justo e igualitário. Ideal meio inocente e fora da realidade, mas eu pensava isso quando criei os blogs e fiz um esforço desumano para manter e alimentar dois blogs nesses anos todos. O blog sindical teve meio milhão de acessos durante o mandato de diretor de saúde da Cassi, criei um público leitor na época. Este blog de cultura também tem um acesso que até me surpreende. Num mundo de vídeo, som e imagem, fechar o mês de julho com quase 5 mil acessos em textos é algo considerável, penso eu. E o sindical está com quase 9 mil acessos por mês... meus textos de Memórias têm sido bastante acessados. Espero que eles ajudem as pessoas que os lerem.

Neste momento, estou revisando o ano de 2019 em minhas mídias. Foi o primeiro ano do governo de destruição total do Brasil e dos brasileiros. Foi meu primeiro ano fora de uma rotina de vida que levei por quase duas décadas como liderança e representante da classe trabalhadora. Tanta coisa mudou em minha vida, em nossa vida, desde então. Até o envelhecer é uma mudança pessoal difícil de lidar, mas faz parte do viver. Quando eu termino a revisão de um ano deste blog de cultura, eu encaderno o material. Poderia dizer que são livros e livros tudo que já escrevi na vida pública, e agora privada. Pode ser uma coisa só para mim, mas pelo menos os cadernos são partes de minha vida, organizados cronologicamente.

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HISTÓRIAS DAS LUTAS DA CATEGORIA BANCÁRIA

Outra coisa que estou organizando para talvez incrementar meus textos de memórias sindicais são as enormes quantidades de papéis, revistas, jornais, panfletos, cadernos e coisas do movimento de luta dos bancários, principalmente sob o recorte dos funcionários do Banco do Brasil. Após acabar de separar tudo o que tenho, talvez se a disposição e a saúde permitir, talvez eu comece a alinhavar textos a partir do material mais antigo que eu tiver até o último que tiver, seria uma coisa de longo prazo, mas primeiro eu preciso acabar de separar tudo aquilo. Depois vejo o que faço.

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Chega de registros, já adentramos o mês dos maus agouros. Como não existe nada disso, pode ser um mês de excelentes coisas. Tudo depende do acaso e das pessoas que aqui habitam.

William