domingo, 30 de agosto de 2020

300820 (d.C.) - Diário e reflexões



Domingo, 30 de agosto, depois do aparecimento da Covid-19 (d.C.).

Hoje é aniversário de meu pai. Meus parabéns, pai! 78 anos! Sei que a vida não está fácil. Estamos vivos e isso já é alguma coisa. Resistimos até aqui ao coronavírus, mesmo com os abusos que cometemos em relação ao isolamento social: estamos o tempo todo na rua, apesar dos cuidados recomendados. Resistimos até aqui, mesmo com os abusos que cometem cotidianamente contra nós, cidadãos comuns desse país sob golpe de Estado e regime fascista, regime baseado na mentira e privilégio dos ricos. 

Sobrevivemos até aqui aos infartos, aos derrames e acidentes vasculares, depressões, cânceres, raivas e frustrações e outras merdas que nos matam de morte morrida. Que bom que estamos vivos, pois a vida é única e viver é uma oportunidade diária de acontecimentos bons para amenizar a dureza da existência. Ontem vi o nascer do sol. Hoje vi um lindo ipê branco no dia de seu desabrochar. Pai, desejo ao senhor a saúde possível, já que o senhor tem diversos desgastes da passagem do tempo. Também já tenho os meus aos 51 anos. Amo vocês, pai, mãe, irmã e sobrinhos. Se cuidem aí. A pandemia impediu que nos víssemos este ano. Mas estamos por aqui. Saudades de vocês!

Por falar em coronavírus, a pandemia mundial já infectou 25 milhões de pessoas no mundo, sendo 3,8 milhões no Brasil. Já morreram 843.826 pessoas, sendo 120.462 brasileiras e brasileiros. O inumano no poder, seus asseclas e apoiadores nazifascistas afirmam que a Covid-19 é uma "gripezinha". Além disso, o sujeito no poder por fraude e golpe diz que não é coveiro, que todo mundo vai morrer um dia e a posição do governo sobre a situação das mortes pela pandemia é "E daí?". (informações sobre a pandemia: Johns Hopkins University)

Estou às voltas com minhas coisas guardadas, materiais que acumulei para estudar e ter mais conhecimentos em diversas áreas. Nunca pude ler os materiais porque a vida de um proletário se gasta no próprio viver de jornadas de manhãs, tardes e noites na sobrevivência cotidiana. Não tenho coragem de jogar fora, a gente tenta se desfazer e fica com pena de tanta informação e conhecimento nas revistas, nas apostilas, nos livros diversos, nas mídias de cultura. E no fundo, a questão é sobre a utilidade de tudo isso para mim hoje. O que aprendi serviu para o momento que já vivi, para o que eu já fui como ator social. Meu tempo passou para a maioria dos materiais que acumulei, e as coisas são assim mesmo. O que fazer com esse conhecimento à disposição de quem queira conhecimento? Os tempos são de se enaltecer a ignorância, a força bruta, a violência das armas.

Os materiais são fascinantes. Não sei se teria agido melhor como representante de classe se tivesse lido tudo isso, mas a leitura agora tem qual sentido para a minha vida neste mês? Neste ano e nos próximos que eu possa me pegar vivendo? É tudo esquisito.



Li algumas matérias de um jornal de setembro do ano passado - A VERDADE -, que me trouxeram conhecimento novo. Gostei da matéria sobre "Milton Santos, cientista negro, latino-americano". Vi pelo texto que não conhecia absolutamente nada do professor Milton Santos. Eu só sabia que ele era um dos maiores geógrafos do país. Não sabia que ele era natural da Bahia, descendente de escravos emancipados. Formado em Direito e Doutor em Geografia pela Universidade de Estrasburgo, França. Na ditadura civil-militar de 1964, foi demitido da Universidade Federal da Bahia, onde lecionava, foi preso por 60 dias e se exilou por muito anos. O texto me deu muito orgulho de saber quem foi Milton Santos.

Também li uma matéria grande sobre "Ludwig Feuerbach, filósofo da libertação". Gostei muito da matéria. O filósofo foi referência para Marx e Engels; foi aluno de Hegel e depois se tornou um crítico dele. Em sua obra "Reflexões sobre a morte e a imortalidade", de 1830, ele se opõe à crença na imortalidade e rompe com o cristianismo. Sua principal obra "A essência do cristianismo" (1841) afirmou que Deus seria a projeção das principais qualidades humanas. Mas "Ao se projetar em Deus, porém, o homem não se reconhece mais nele. Deus é encarado como um ser externo, independente do homem e com vida própria. Embora Feuerbach não utilize este termo, ele opera aqui com o conceito hegeliano de alienação (Entfremdung), que também seria apropriado por Marx no contexto de sua crítica ao capitalismo...". Vejam quanta coisa interessante se conhece ao ler, ao estudar materiais que temos em casa.

Enfim, enquanto estamos vivos, temos que buscar ser melhores que antes. Melhores para nós mesmos, melhores para os outros, melhores para o entorno social ao qual vivemos.

William


Fonte da citação: A VERDADE, edição de 05 de agosto a 05 de setembro de 2019, nº 219, ano 19.

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Alemanha de Eichmann e o Brasil pós-Golpe





"(...) uma velha lei de 1933 permitia que o governo confiscasse propriedade que tivesse sido usada para atividades 'hostis à nação e ao Estado'..." (ARENDT, 2019, p. 175)

"(...) terceiro, num decreto determinando que toda propriedade de judeus alemães que perdessem sua nacionalidade fosse confiscada pelo Reich (25 de novembro de 1941)." (ARENDT, 2019, p. 175)

"(...) 'o Ministério da Justiça só pode dar uma pequena contribuição ao extermínio [sic] desses povos'. (Essa linguagem aberta, numa carta do ministro da Justiça para Martin Bormann, chefe da Chancelaria do Partido, datada de outubro de 1942, é excepcional.)" (ARENDT, 2019, p. 175)


Refeição Cultural

Quatro horas da manhã. Não consigo dormir e me levanto. Pego o livro Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal (lançado em 1963), de Hannah Arendt. Retomo a leitura. Avancei mais dois capítulos: "Deveres de um cidadão respeitador das leis" e "Deportações do Reich - Alemanha, Áustria e o Protetorado".

Abro a janela da sacada e vejo o amanhecer. Nesses dias, o cantar de sabiás atravessa a noite e são eles que escuto ainda no escuro. Vejo os vultos que andam na penumbra lá embaixo. Mais um dia comum se inicia. Outros pássaros começam a cantar ou emitir seus chamados. A região tem joão-de-barro, bem-te-vi e outros mais.

O Estado alemão não trata de forma igual os cidadãos alemães. Segmentos inteiros da sociedade alemã são discriminados, perseguidos e sofrem todo tipo de absurdo. Após o início do governo de Adolf Hitler as coisas vão piorando cotidianamente. Judeus, comunistas, pessoas com qualquer tipo de deficiência física ou intelectual, oposições ao governo, quem pensa diferente, todos são alvo de perseguições.

Judeus não podem mais ocupar funções públicas, ser professores, servidores públicos. Depois não podem mais se casar ou se relacionar com os arianos. Depois não podem mais ter direitos básicos que os demais cidadãos têm. Tudo foi sendo normalizado. E a vida seguia normalmente para aqueles que não eram alvo das perseguições do Estado. Festas, casamentos, comemorações, diversões.

Os anos foram passando. Após 1933, veio 1934, depois 35 e 36 e o Estado nazista foi normalizando tudo. A linguagem alemã foi se adequando a toda barbárie. Matar milhares de pessoas com deficiência sob a denominação de "eutanásia". Depois matar adversários do governo com a mesma "eutanásia". Tomar as propriedades dos cidadãos que o Estado perseguia e considerava como indesejáveis. Tornar impossível a vida das pessoas... prisões, exílio, deportação...

E chegamos aos fornos e execuções em massa por fuzilamento nos diversos campos de concentração nazistas.

A banalidade do mal se dá através de um processo

No Brasil, fomos vendo acontecer absurdos atrás de absurdos após a população eleger para a presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Aqueles que viriam a apoiar o golpe de 2016 começaram a conspirar contra o governo de Lula desde o primeiro ano de seu mandato. As fake news (nome da moda para mentiras) já eram usadas contra Lula e o Partido dos Trabalhadores desde os anos oitenta.

Os barões das mídias e seus lacaios perseguiram por décadas as lideranças populares e dos trabalhadores brasileiros. Lula e o PT eram acusados de crimes absurdos como, por exemplo, o sequestro de empresário (com foto de sequestrador com camisa do PT em horário nobre). O PT era o partido que iria colocar um sem teto ou sem terra na casa de cada pessoa que tivesse uma casa própria. Que iria confiscar a poupança das pessoas (e no fim quem confiscou foi o Collor).

O chamado quarto poder, os meios de comunicação hegemônicos, dominado por algumas famílias de bilionários poderosos, tanto a mídia nacional quanto a local, nos estados e municípios, começou uma perseguição implacável ao partido do presidente Lula, eleito em 2002.

Como militante político, representante de trabalhadores, estudante de Letras, fui vendo tudo o que aconteceu no Brasil entre 2003 e 2020. O processo de envenenamento do povo, destruição da política e da democracia nos trouxe ao momento que vivemos hoje: o bolsonarismo. Sabemos quem são os responsáveis por essa tragédia. E eles estão livres, leves e soltos. 

Transformaram parcelas do povo brasileiro em bestas feras. Colocaram nos poderes constituídos através de eleições, monstros, gente criminosa. Gente má. O mesmo se deu em funções públicas providas por concurso ou nomeação direta. Normalizaram a maldade. 

O que há de pior galgou o poder estatal como consequência do processo de envenenamento do povo brasileiro. E não sabemos o que está por vir. Não se tem como prever os males após a abertura da caixa de Pandora. Falamos isso por anos.

O que sabemos é que o Terceiro Reich e o nazifascismo só acabaram após um guerra que matou dezenas de milhões de pessoas e destruiu dezenas de países na Europa e demais continentes envolvidos no conflito mundial.

O que vimos e temos acompanhado desde que todo esse processo de destruição do país começou, por parte dos poderosos que não aceitaram a democracia na vez de governos populares, o que vimos e vemos é que o Estado brasileiro, através de suas instituições, vem fazendo o mesmo que o Estado nazista fazia com seus cidadãos: perseguia, discriminava, prendia, confiscava bens, invadia a casa de pessoas. E pessoas morriam em consequência de ações do Estado.

O que tem de mais igual na Alemanha de Eichmann e no Brasil pós-Golpe é que o Estado brasileiro tem perseguido e sido injusto com certos segmentos da sociedade; para alguns, o rigor da lei ou até punição sem lei que sustente o ato e, para outros, tudo se é permitido, inclusive o que estaria proibido por lei. E isso vem piorando após o golpe de Estado e após as eleições fraudulentas de 2018. Não sabemos como isso vai terminar.

É impossível não lembrar o que o Estado brasileiro está fazendo com o cidadão Luiz Inácio Lula da Silva. Todos os dias, meses e anos dos últimos anos, tudo o que vemos é idêntico ao que o Estado alemão fez com milhões de judeus. Mas cada judeu tinha nome, tinha endereço, tinha família, tinha uma história e o Estado tratava aquele segmento da sociedade alemã como um nada (ou pior, como inimigo). E os alemães assistiram a tudo isso...

Chega por hoje... O sol saiu. Ele está encoberto pelas nuvens da manhã. Mas já são oito horas da manhã de sexta-feira.

William


Bibliografia:

ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. Companhia das Letras, São Paulo, 2019.


quarta-feira, 26 de agosto de 2020

À la Benjamin Button... (5)



Refeição Cultural

Olhar para trás...


Fico pensando na fala daquele relojoeiro que construiu o relógio da estação de trem da cidade com o tempo andando para trás. Ele queria que os jovens que morreram na 1ª Guerra Mundial pudessem voltar a viver, como o próprio filho, que saiu vivo daquela estação e voltou em um caixão. Estou falando do filme O curioso caso de Benjamin Button (2008). Naquele ano, o personagem nasceu com as características de um idoso de uns 80 anos e começou a rejuvenescer.

Fico olhando para trás e tentando entender por que chegamos aonde chegamos. Por que o Brasil foi destruído em tão pouco tempo após se destacar e avançar no início do século XXI, sob os governos do PT? Por que o povo aceitou toda essa destruição? Por que uma parte considerável do povo é miserável e, apesar disso, apoia os bárbaros e a elite que o humilha e maltrata? Por que outra parte do povo não se importa com toda a desgraça (no fundo apoia a situação)?

A vontade que dá é de sumir... mas "a vida é uma ordem, a vida apenas, sem mistificação", já dizia meu poeta favorito, Carlos Drummond de Andrade.

Olhei para trás no mês de julho na rede social na qual tenho uma conta. As postagens abaixo foram os comentários que fiz em relação à pandemia do novo coronavírus. Hoje, estamos com 117.665 mortos por Covid-19 no Brasil e o povo está em festa nas ruas, sem máscaras, bebendo e comemorando alguma coisa que eu não consegui entender ainda...

Os números da pandemia são impressionantes, tenebrosos. Não temos nada para comemorar. Os tempos são de morte. São 24 milhões de infectados no mundo, e 824.230 mortos. Mas os bárbaros ao meu redor, nas sacadas dos prédios aqui em Osasco, nas praias do Brasil, nos barzinhos, cantam, festejam, vociferam palavras de ordem, quase babam enquanto bebem, bêbados, babando algum instinto selvagem que não compartilhamos...

Os bárbaros animalescos no poder venceram o debate sobre a questão de normalizar as mais de mil mortes por dia. Venceu o lema do governo "E daí?". Estamos perplexos! 

Estamos perplexos, mas estamos vivos! E pode ser que sigamos vivos e algum dia possamos ver essa banalidade do mal ter algum fim e os criminosos serem julgados e condenados. Todos eles, os donos das mídias corporativas que estragaram o povo, os humanos que se apoderaram das funções de Estado para praticar crimes contra pessoas, contra instituições e contra o país.

William

27/7/20

87 mil mortos por Covid-19. Hospitais desassistidos pelo governo. O próprio presidente contaminado, sem máscara, anda em público assumindo o risco de transmitir o vírus para cidadãos sem acesso a planos de saúde...


Nada disso era necessário... essa destruição do país foi planejada pela elite canalha desse país (e seus meios midiáticos) e pelo império do Norte.


Todos esses crimes contra a vida e as pessoas e nosso país serão julgados em tribunais políticos e penais. Essa gente fascista vai pagar por seus crimes!


Vamos assistir a isso ainda!

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22/7/20

Normalizaram na imprensa empresarial 1000 "mil" (mil) pessoas mortas por dia. Toda vida importa. Mas olhem as estatísticas das vítimas... pobres, pretos, periferias, indígenas, baixa renda ou nenhuma renda...

Olhem quantas mortes em países com população do tamanho da nossa ou maiores. Só aqui e nos EUA tanta morte desnecessária...

DESEJO e VOU VER os responsáveis sendo julgados em tribunais internacionais!

(O BoletimCorona da revista Carta Capital, que divulguei na rede social com esse comentário acima, informou 82.771 mortos e 2.227.514 casos confirmados no Brasil. Informou também que o governo federal havia gasto até aquele momento menos de 1/3 da verba emergencial para o combate à pandemia...)

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20/7/20

Expresso minha solidariedade aos familiares e amig@s das vítimas dessa pandemia. Não fosse o comportamento desumano do inumano no poder, teríamos salvo muitas vítimas.

(No BoletimCorona da Carta Capital, que divulguei com o comentário acima, vimos que o desgraçado na presidência havia voltado a recomendar hidroxicloroquina no dia em que o país ultrapassava a marca de oitenta mil mortos. Os números impressionavam: 80.120 mortos e 2.118.646 casos confirmados...)

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17/7/20

77.851 mortos... minha solidariedade às famílias e amigos das vítimas. Isso não precisaria ser assim. Milhares de vidas poderiam ser salvas se a postura dos governantes dessa terra fosse outra.

Saudades dos governos de esquerda de Lula e Dilma, do PT. O povo era a prioridade do governo...

(Esse foi o comentário que postei na rede social com o BoletimCorona... no vídeo, lemos que o inumano no poder havia recomendado à Fiocruz que ela receitasse cloroquina para vítimas de coronavírus e a resposta da entidade foi que não recomenda cloroquina para Covid-19. A OMS dizia que não havia maneira de garantir que a queda das mortes ocorreria por si...)

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16/7/20

Pandemia

Caminhamos para 100 mil mortos (e 1/3 dos humanos neste solo apoiam os responsáveis pelas nossas tragédias...).

Povo bárbaro!

(O BoletimCorona informava que o Brasil ultrapassava os 2 milhões de casos confirmados naquele dia)

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15/7/20

75.366 mortos.

Nada de novo no front...

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14/7/20

Meus pêsames pelos 72.833 mortos pela Covid-19. Não era pra ser assim. Teríamos menos vítimas se os governantes tivessem o povo como prioridade como nos tempos dos governos do PT no Brasil. O povo era mais feliz...

(e talvez não soubesse).

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09/7/20

Pêsames...

Mais 1.220 mortos pela pandemia de coronavírus. 69.184 mortos pelas pandemias (Covid-19 e bolsonarismo).

Meus pêsames também pela democracia, que morre todo dia mais um pouco... mortes, mortes, mortes.

Mas estamos vivos e sonhamos com a democracia, com a unidade da classe trabalhadora e com a conquista da democracia. Sonhamos com a vida!

Enquanto há vida, há esperanças no amanhã.

(O BoletimCorona, da Carta Capital, informava que o primeiro ex-Ministro da Saúde do inumano, um sujeito que odeia o SUS e que tentou se passar por santo no governo fascista, disse naquele dia - se referindo ao sujeito na presidência - que quem aglomerava e não usava máscara contraía a doença...)

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07/7/20

66.741 mortos pelo vírus.

Os inumanos no poder (por fraude de fake news e lawfare) e "empresários" falaram em "uns 7 mil mortos"...

Com mil mortes por dia... serão 100 mil até o fim deste ano...


Meus pêsames aos familiares e amig@s das vítimas dessa tragédia neste país jabuticaba.

(Foi neste dia que disse que o país teria cem mil mortos até o fim do ano... errei feio feio! Neste momento da postagem no blog, estamos com mais de 117 mil mortos neste momento, 26 de agosto, e o mês nem terminou... mas o povo sem máscara está em festa nas ruas, bares e sacadas com churrasco... naquele dia 7 de julho, o BoletimCorona informava que o desgraçado no poder central havia testado positivo para Covid-19 e que ele havia voltado a criticar o isolamento social...)

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03/7/20

8 milhões de infectados pelo vírus Covid-19 podem estar entre nós, todos com risco de morte ou de sequelas em suas condições de saúde...

Apesar de saber que 1/3 desse povo brasileiro miserável está com Bolsonaro e se vê nele, e outro 1/3 não se importa com isso por despolitização e egoísmo (é praticamente mais um grupo que apoia o bolsonarismo), eu me solidarizo com o sofrimento pelos mais de 61 mil mortos.

Somos um povo bárbaro, inculto e miserável.

Sigamos vivos e dispostos ao bem coletivo e ao combate ao capitalismo, ao neoliberalismo e aos fascismos.

(O comentário acima é porque o BoletimCorona naquele 3 de julho informava que um estudo da Universidade Federal de Pelotas dizia que o Brasil poderia ter 8 milhões de infectados porque a subnotificação estaria na casa de 6 vezes mais casos que o número oficial. O prefeito de uma cidade da Bahia havia dito que abriria o comércio morresse quem fosse... o boletim trazia ainda uma imagem da live do desgraçado no poder - era um cubículo com um monte de homens brancos rindo e comemorando a vida [deles] e o poder... O Brasil chegava a 61.884 mortos naquele dia 3 de julho...)

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01/7/20

+180 mil mortos por Covid-19 até dezembro? (mil mortes por dia nos próximos 6 meses).

Esse país jabuticaba, bárbaro, medieval, no qual 1/3 do povo apoia um genocida inumano, no qual os golpistas acabaram com os direitos trabalhistas e previdenciários, acabaram com as categorias profissionais e com a educação e saúde, caminha para que a pandemia e a tragédia de cada morte, cada pessoa, cada ser humano falecido pelo vírus agressivo do novo coronavírus seja incorporada à "normalidade" do cotidiano bárbaro dessa terra.

Na maioria dos países que vivenciaram a pandemia da Covid-19, algumas mortes sensibilizavam as nações, mortes terríveis, as pessoas se afogavam sem conseguirem respirar... a pandemia foi uma tragédia na Itália, França, Espanha, China, Alemanha...

Aqui 1.000 mortos por dia viraram um nada, um número como outro qualquer comentado em meio às privatizações da água, das investigações de crimes da família que colocaram na presidência... do dólar que era alto quando estava 2,50 nos governos do PT e agora não é problema algum estar mais de 5,00 no governo Guedes/PIG/casa-grande.

Pois é, caminhamos para fechar o ano da (des)graça de 2020 com 250 mil mortos vítimas da pandemia de Covid-19, sem isolamento social, sem quarentena, sem recurso financeiro do Estado para que as pessoas desempregadas e sem renda permanecessem em casa.

Brasil... terra de ninguém!

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Fonte das informações sobre a pandemia de Covid-19: site da Johns Hopkins University e BoletimCorona da revista Carta Capital.

Brasil, Eichmann e as categorias privilegiadas




"(...) 'Ninguém veio até mim e me censurou por nada no desempenho de meus deveres, nem o pastor Grüber disse uma coisa dessas', ele repetiu. E acrescentou: 'Ele veio até mim e pediu alívio para o sofrimento, mas não objetou de fato ao desempenho de meus deveres enquanto tais'. Pelo depoimento do pastor Grüber parecia que ele buscava não tanto o 'alívio do sofrimento' quanto a isenção para algumas categorias bem estabelecidas anteriormente pelos nazistas. Essas categorias haviam sido aceitas sem protestos pelo judaísmo alemão desde o começo. E a aceitação de categorias privilegiadas - judeus alemães acima de judeus poloneses, judeus veteranos de guerra e condecorados acima de judeus comuns, famílias cujos ancestrais eram nascidos na Alemanha acima de cidadãos naturalizados recentemente etc. - fora o começo do colapso moral da respeitável sociedade judaica..." (ARENDT, 2019, p. 148)


Refeição Cultural

Categorias privilegiadas... Colapso moral da respeitável sociedade...

Muito do que já li sobre o comportamento dos alemães durante o período nazista, ou seja, durante o regime do 3º Reich, sob a liderança de Adolf Hitler, nos passa a descrição do clima cotidiano que se vivia à época, entre 1933 e 1945, tempo de duração do regime que pensava que duraria mil anos.

O filólogo judeu alemão Victor Klemperer, sobrevivente dos campos de concentração, descreve o cotidiano da Alemanha nazista em seus diários, depois transformados no livro LTI - A linguagem do Terceiro Reich (de 1947). O nazifascismo normalizou a banalidade do mal. Transformou em algo normal e corriqueiro aquilo que jamais seria aceito por qualquer ser humano em qualquer sociedade considerada civilizada.

Ao ler o relato de Hannah Arendt sobre o julgamento de Adolf Eichmann, já no início dos anos sessenta, e me encontrar no Brasil do ano de 2020 sob um novo regime de Estado, um regime que se estabeleceu após um processo de golpe de Estado que envolveu praticamente todas as instituições da velha república que havia, é impossível não identificar semelhanças entre os dois períodos: o do nazismo da Alemanha dos anos trinta e quarenta e o nosso mundo, tomado pelo mal de forma institucional e banalizada no cotidiano das gentes.

É por achar semelhanças entre os períodos de ascensão do mal em forma de governo que insisto em registrar algumas coisas, poucas, bobas, para quase ninguém, mas que devem ser registradas. Eu já escrevo neste blog há pelo menos 13 anos. O ideal inclusive seria imprimir e guardar os textos, distribuir cópias para alguns conhecidos, porque uma coisa virtual é mais frágil que uma vida humana. Uma ação qualquer de um terceiro e a coisa não existe mais (como a vida).

As categorias privilegiadas... colapso moral da respeitável sociedade...

Ao organizar o novo golpe de Estado contra a frágil e parca democracia brasileira, as elites privilegiadas desta ex-colônia de impérios não mediram as consequências e não avaliaram os riscos para tirarem do poder um Partido dos Trabalhadores que vinha melhorando a vida do povo "de forma lenta e gradual" e ao mesmo tempo vinha conciliando com essa mesma elite para que o país se desenvolvesse e distribuísse um pouquinho de benefícios aos milhões de brasileiros à margem da cidadania. 

E a consequência do golpe foi o que temos hoje. O crime organizado ascendeu ao poder de verdade. O que há de pior na sociedade ascendeu ao poder. Temos hoje como "normalidade" as coisas mais grotescas que se poderiam imaginar. Coisas que jamais seriam aceitas por qualquer sociedade considerada civilizada. Vivemos a mais dramática banalidade do mal na forma de governo, de Estado, e através de suas instituições. E nada acontece em relação a termos uma reação da sociedade civil. Nada!

As mentiras criadas (fake news e lawfare) para se destruir um partido e suas lideranças, um segmento da sociedade, um governo eleito democraticamente em 2002, 2006, 2010 e 2014, foram sendo repetidas e sustentadas por instituições da sociedade como mídia corporativa, ministérios públicos, órgãos de justiça, dentre outras instituições da sociedade, e agora vivemos o abismo, o colapso total. As vítimas não encontram justiça porque as instituições foram todas envolvidas e para se desfazer uma injustiça seria necessário rever todas as injustiças e mentiras mantidas pelas próprias instituições...

E com isso tudo que descrevi acima, normalizou-se as mentiras, o lawfare, a banalidade do mal, o privilégio das categorias privilegiadas. Estamos todos por nossa própria conta. Sozinhos. Milhões de pessoas que não fazem parte dos que apoiam ou pertencem aos grupos que ascenderam ao poder totalitário do Estado, e não sabemos o que fazer nesta situação.

Não temos mais instituições republicanas funcionando minimamente. Não temos mais leis para todos. O clima estimulado pelas classes dominantes no novo regime é o do ódio, da ignorância, o da carteirada... vivemos sob um novo regime totalitário. Se você não for adesista, se não for um deles, tudo pode contra você e os seus. E não adianta buscar justiça, porque ela é somente para os adesistas.

E teremos que sobreviver no meio disso tudo, e com ética, solidariedade e caráter, dimensões praticamente extintas pelo novo regime.

William


Bibliografia:

ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. Companhia das Letras, São Paulo, 2019.


sábado, 22 de agosto de 2020

Dilma Rousseff responde agressão do jornal FSP


Presidenta Dilma Rousseff.
Foto oficial da posse em 2011.

(Reprodução de artigo do site Dilma.com.br)


“A FALHA DE S. PAULO” ATACA OUTRA VEZ?


As afirmações do editorial do jornal a respeito do meu governo são fake news. A Folha falsifica a história, num gesto de desprezo pela memória de seus leitores

A Folha tem enorme dificuldade de avaliar o passado e, assim, frequentemente erra ao analisar o presente.

Foi por avaliar mal o passado que a empresa até hoje não explicou porque permitiu que alguns de seus veículos de distribuição de jornal dessem suporte às forças de repressão durante a ditadura militar, como afirma o relatório da Comissão Nacional da Verdade.

Foi por não saber julgar o passado com isenção que cometeu a pusilanimidade de chamar de “ditabranda” um regime que cassou, censurou, fechou o Congresso, suspendeu eleições, expulsou centenas de brasileiros do país, prendeu ilegalmente, torturou e matou opositores.

Os erros mais graves da Folha, como estes, não são de boa-fé. São deliberados e eticamente indefensáveis. Quero deixar claro que falo, sobretudo, do grupo econômico Folha, e não de jornalistas.

Quero lembrar, ainda, a publicação, na primeira página, de uma ficha falsificada do Dops, identificada pelo jornal como se fosse minha, e que uma perícia independente mostrou ter sido montada grosseiramente para sustentar acusação falsa de um site fascista. Mesmo desmascarada pela prova de que era uma fraude, a Folha, de forma maliciosa, depois de admitir que errou ao atribuir ao Dops uma ficha obtida na internet, reconheceu que todos os exames indicavam que a ficha era uma montagem, mas insistiu: “sua autenticidade não pôde ser descartada.”

Quem acredita que as redes sociais inventaram as fake news desconhece o que foi feito pela grande imprensa no Brasil – a Folha inclusive. Não é sem motivo que nas redes sociais a Folha ganhou o apelido de “Falha de São Paulo”.

O editorial de hoje da Folha – sob o título “Jair Rousseff” – é um destes atos deliberados de má-fé. É pior do que um erro. É, mais uma vez, a distorção iníqua que confirma o facciosismo do jornal. A junção grosseira e falsificada é feita para forçar uma simetria que não existe e, por isto, ninguém tem direito de fazer, entre uma presidenta democrática e desenvolvimentista e um governante autoritário, de índole neofascista, sustentado pelos neoliberais – no caso em questão, a Folha.

Todas as afirmações do editorial a respeito do meu governo são fake news. A Folha falsifica a história recente do país, num gesto de desprezo pela memória de seus próprios leitores.

Repisa a falsa acusação de que o meu governo promoveu gastos excessivos, alegação manipulada apenas para sustentar a narrativa midiática e política que levou ao golpe de 2016. Esquece deliberadamente que a crise política provocada pelos golpistas do “quanto pior, melhor” exerceu grande influência, seja sobre a situação econômica, seja sobre a situação fiscal.

A Folha, naquela época, chegou a pedir a minha renúncia, em editorial de primeira página, antes mesmo do julgamento do impeachment. Criava deliberadamente um ambiente de insegurança política, paralisando decisões de investimento, e aprofundando o conflito político. Estranhamente, a Folha jamais pediu o impeachment do golpista Michel Temer, apesar das provas apresentadas contra ele. Também não pediu o impeachment de Bolsonaro, ainda que ele já tenha sido flagrado em inúmeros atos de afronta à Constituição, e o próprio jornal o responsabilize pela gravidade da pandemia. A Folha continua seletiva em seus erros: Falha sempre contra a democracia, e finge apoiá-la com uma campanha bizarra com o bordão “vista-se de amarelo”.

Um país que, em 2014, registrou o índice de desemprego de apenas 4,8%, praticamente pleno emprego, com blindagem internacional assegurada por um recorde de US$ 380 bilhões de reservas, não estava quebrado, como ainda alega a oposição. Na verdade, a destituição da presidenta precisou do endosso da grande mídia para garantir a difusão desta fake news. O meu mandato nem começara e o impeachment já era assunto preferencial da mídia, embalado pelas pautas bombas e a sabotagem do Congresso, dominado por Eduardo Cunha.

Os dados mostram que a “irresponsabilidade fiscal” que me foi atribuída é uma sórdida mentira, falso argumento para sustentar o golpe em curso. Entre 2011 e 2014, as despesas primárias cresceram 3,7% ao ano, menos do que no segundo mandato de FHC (4,1% ao ano), por exemplo. Em 2015, já sob efeito das pautas bombas, houve retração de 2,5% nessas despesas. As dívidas líquida e bruta do setor público chegaram, em meu mandato, a seus menores patamares desde 2000. Mesmo com a elevação, em 2015, para 35,6% e 71,7%, devido à crise que precedeu o golpe, elas ainda eram muito menores que no final do governo de Temer (53,6% e 87%) ou no primeiro ano de Bolsonaro (55,7% e 88,7%).

Logo ao tomar o poder ilegalmente, os golpistas aproveitaram-se de sua maioria no Congresso e do apoio da mídia e do mercado para aprovar a emenda do Teto de Gastos, um dos maiores atentados já cometidos contra o povo brasileiro e a democracia em nossa história, pois, por 20 anos, tirou o povo do Orçamento e também do processo de decisão sobre os gastos públicos. Criou uma “camisa de força” para a economia, barrando o investimento em infraestrutura e os gastos sociais, e “constitucionalizando” o austericídio. O Teto de Gastos bloqueia o Brasil, impede o País de sair da crise gerada pela perversão neoliberal que tomou o poder com o golpe de 2016 e a prisão do ex-presidente Lula. E, a partir da pandemia, tornará ainda mais inviável qualquer saída para o crescimento do emprego, da renda e do desenvolvimento.

Se a intenção da Folha é tutelar e pressionar Bolsonaro para que ele entregue a devastação neoliberal, que tenha pelo menos a dignidade de não falsificar a história recente. Aprenda a avaliar o passado e admita seus erros deliberados, se quiser ter alguma autoridade para analisar um presente sombrio de cuja construção participou diretamente.

DILMA ROUSSEFF

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

A paz dos cemitérios (Eichmann, Arendt...)





"(...) 11 milhões de judeus tinham de ser mortos, um empreendimento de certa magnitude - e mais tarde haveria de preparar as atas. Em resumo, Eichmann funcionou como secretário da reunião. Por isso teve permissão, depois que os dignitários partiram, de se sentar perto da lareira junto com seu chefe, Müller, e Heydrich, 'e foi essa a primeira vez que vi Heydrich fumar e beber'. Eles não falaram de trabalho, 'mas gozaram de um descanso depois de longas horas de trabalho', muito satisfeitos, principalmente Heydrich, que estava excitado." (ARENDT, 2019, p. 130)


Refeição Cultural

Acordo nesta sexta-feira fria em Osasco, e pego o relato de Hannan Arendt para ler. Ela discorre sobre a banalidade do mal após acompanhar o julgamento de Adolf Eichmann no ano de 1961. Estou no capítulo sete, "A Conferência de Wannsee, ou Pôncio Pilatos". É tudo muito chocante. Mas é história, não é fake news.

Após a leitura de algumas páginas, parei de ler. A leitura choca. Fiz um chá e tomei em silêncio na cozinha, ouvindo o barulho da chuva lá fora.

Ao ler como se deram as discussões entre os líderes alemães do Terceiro Reich para acharem soluções técnicas de como assassinar perto de onze milhões de judeus da Europa fico estupefato, e ao mesmo tempo fico pensando em nosso cotidiano neste momento da história. Aquela reunião ministerial do novo regime... aquelas falas asquerosas sobre prender opositores, "passar a boiada" (em referência ao tempo de caos da pandemia) para destruir a Amazônia e as terras indígenas...

O novo golpe de Estado no Brasil se deu com novas técnicas, com novas características. Velhos são só os efeitos para o povo e para o próprio país: miséria e destruição.

Desta vez não colocaram os tanques na rua para derrubar um governo popular legítimo, eleito com 54,5 milhões de votos. Não. Conspiraram com as agências do império do Norte. Colocaram no poder lacaios contratados para destruir os direitos do povo e entregar o patrimônio do país. 

O quarto poder, a mídia lava jato, faria o trabalho de limpeza de consciências ao manipular as massas. As massas ignóbeis, ignorantes, incultas, escolheram como heróis os vigaristas que destruíram a vida e o país delas. Foram-se direitos trabalhistas, previdenciários, de educação e saúde, foram-se os patrimônios públicos.

Desta vez a estratégia de golpe contra os brasileiros escolheu e acertou alvos importantes. Destruiu a organização sindical enfraquecendo entidades de trabalhadores da cidade e do campo. Está destruindo os avanços de décadas na educação pública e está desfazendo a estrutura de saúde universal e constitucional. O novo regime está destruindo todas as estruturas de pesquisa e dados históricos do país. A queima de tudo é para reinar nas trevas.

Como se não bastasse o golpe e o enfraquecimento das organizações da classe trabalhadora, um vírus viria coroar os vitoriosos na guerra mundial entre capital e trabalho. Ponto para os capitalistas! O vírus não é coisa de deuses, nem dos diabos. Provavelmente nem dos humanos. A natureza simplesmente é e as coisas são como são. Mas a pandemia foi uma oportunidade extraordinária para os donos do poder, que já estavam sem desculpas para justificar a miséria do necrocapitalismo... Que merda!

Neste momento, alguns humanos (milionários, bilionários) retiram direitos do povo, sugam as finanças dos Estados e receptam patrimônio público roubado e o povo está recolhido, com fome, com medo, com raiva de seus pares (a ideologia é uma benção!), com fé que algum deus o liberte do mal e lhe conceda a graça da salvação.

Vivemos a paz dos cemitérios... e a chuva cai lá fora.

Felizmente, as leis naturais estão aí e a única certeza é a mudança. Tudo muda o tempo todo, inclusive neste instante em que escrevo... são bilhões de eventos nos segundos que passam... a mudança é a única certeza!

William


Bibliografia:

ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. Companhia das Letras, São Paulo, 2019.

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Banalidade do mal, Eichmann e o Brasil pós-golpe





"(...) o programa de extermínio dos pavilhões de gás do Leste brotou do programa de eutanásia de Hitler..." (ARENDT, 2019, p. 123)

"A primeira câmara de gás foi construída em 1939, para implementar o decreto de Hitler datado de 1º de setembro daquele ano, que dizia que 'pessoas incuráveis devem receber uma morte misericordiosa'..." (ARENDT, 2019, p. 124)

"(...) O decreto foi cumprido imediatamente no que dizia respeito aos doentes mentais, e entre dezembro de 1939 e agosto de 1941, cerca de 50 mil alemães foram mortos com monóxido de carbono em instituições cujas salas de execução eram disfarçadas exatamente como seriam depois em Auschwitz - como salas de duchas e banhos..." (ARENDT, 2019, p. 124)


Refeição Cultural

Brasil, ano de 2020, mês de agosto, 5º ano sob o golpe de Estado que interrompeu a democracia brasileira, os governos pacíficos do Partido dos Trabalhadores e os avanços históricos para a classe trabalhadora e o povo pobre.

Entre o início dos anos dois mil e o ano de 2014 o Brasil vivia uma época de felicidade simples do povo brasileiro. A classe trabalhadora tinha emprego, direitos sociais e sonhos. E as oportunidades de ascensão social não eram em conta-gotas, eram com escala nacional (de Estado) porque era o governo federal e seus programas que criavam oportunidades para dezenas de milhões de cidadãos, cuja origem lá atrás, um século e meio antes, eram as senzalas, os quartos de fundo, cortiços e favelas, eram as mães negras e índias e os pais brancos.

Com os avanços sociais, tivemos avanços culturais, avanços nos direitos humanos, e mesmo sem conseguirmos eliminar as mazelas da colonização e dos mais de três séculos de escravidão e exploração do povo, a tendência era de avanços para um povo que nunca teve nada, sequer água e comida, um teto e acesso à educação básica (estão apagando os dados históricos, mas ainda é possível verificar os avanços entre 2003 e 2015). 

Aquela parcela da sociedade que já tinha em si o animalesco, a maldade com requinte, ou a indiferença - gérmen da banalidade do mal -, estava sob uma espécie de controle social - o politicamente correto - porque ao vociferar seus preconceitos e ódios racistas, misóginos, étnicos e de classe o julgamento de seus pares vinha na hora, a reprimenda e até a punição por força de legislação. E devagar, avançávamos para uma sociedade melhor.

Que maçante lembrar isso... aí vieram as manifestações de 2013 capturadas pela casa grande, a operação norte-americana de derrubar governos latino-americanos - Lava Jato -, as mídias comerciais no Brasil e a criação de fake news pelo PIG (Partido da Imprensa Golpista) dentro do processo de lawfare contra o governo do Partido dos Trabalhadores, o impeachment sem crime da presidenta Dilma Rousseff (eleita com 54,5 milhões de votos) para entregarem o poder do país à camarilha mais vil e repulsiva na história de qualquer república já havida no mundo. E vieram as reformas que acabaram com direitos do povo e bens públicos. E veio a condenação e prisão sem crime algum do líder do povo Lula da Silva: 580 dias numa masmorra, sem crime algum. 

E as fraudes com apoio de parte dos 3 poderes que levaram ao poder um sujeito inominável. E não só ele. Uma base parlamentar - Câmara e Senado - com bestas feras eleitas propondo os maiores horrores que se possa imaginar. E bandos de ultradireitistas nos governos de Estados. Gente eleita comemorando assassinato de líderes comunitários como a vereadora Marielle Franco (RJ). A legião de fascistas e seres abomináveis foi eleita com as mentiras inventadas contra a esquerda e o Partido dos Trabalhadores no mês das eleições: hoje, de conhecimento público que mentiras resultaram em eleitos ilegítimos (zilhões delas), tudo público e documentado pelos órgãos do Estado e pela imprensa (aquela mesma que participou do golpe).

Há que se registrar a banalidade do mal em nosso cotidiano

Com nojo relembrei tudo isso acima. Mas é importante registrar que um trabalhador morreu ontem enquanto trabalhava numa rede de supermercados e cobriram ele com alguns guarda-chuvas por horas para que o comércio não interrompesse o atendimento.

É necessário registrar que já tivemos apresentador de jornal propondo fazer campos de concentração de pessoas por causa da pandemia do novo coronavírus.

Que o governo federal não tem ministro da saúde já faz meses e o país e o mundo vivem uma das maiores pandemias da história.

O vídeo de uma reunião ministerial do governo inumano deixou estarrecido os cidadãos que ainda não sofreram o derretimento cerebral e não aderiram à banalidade do mal vinda dos órgãos do poder estatal. O plano é "passar a boiada" enquanto estivermos sob a pandemia. Traduzindo, seria algo como: façamos todo o mal enquanto estamos em pandemia... (que já contaminou mais de 3 milhões de pessoas e matou 110 mil brasileiras e brasileiros). O governo diz ser uma "gripezinha".

E a gente lê estupefato a descrição de Hannah Arendt sobre o cotidiano dos 12 anos de governo de Adolf Hitler e o jogo de linguagem utilizado para levar uma nação a apoiá-lo nas atrocidades que cometeu.

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"Nenhuma das várias 'regras de linguagem' cuidadosamente inventadas para enganar e camuflar teve efeito mais decisivo na mentalidade dos assassinos do que este primeiro decreto de guerra de Hitler, no qual a palavra 'assassinato' era substituída pela expressão 'dar uma morte misericordiosa'..." (ARENDT, 2019, p. 125)
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Quão longe estamos de vermos "eutanásia" e "morte misericordiosa" aos índios do Brasil, aos camponeses dos movimentos dos sem-terra, aos cidadãos em condições de rua nas cidades, aos pobres e trabalhadores sem planos privados de saúde, aos cidadãos que são nominados e identificados como sendo de esquerda, ou comunistas, ou petistas, ou sindicalistas? Ou "antifascistas"? Quão longe estamos daquele ambiente de banalidade do mal descrito por Hannah Arendt e por Victor Klemperer em seu LTI - A linguagem do Terceiro Reich?

William


Bibliografia:

ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. Companhia das Letras, São Paulo, 2019.


segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Artigo de Carole Cadwalladr, sobre o Facebook


Apresentação:


Este é um blog de compartilhamento de ideias, sem fins lucrativos. Vez por outra, compartilho nele artigos de relevância, citando a fonte e o autor. É o caso deste excelente artigo publicado no site da Carta Maior, traduzido por Clarice Meireles. Sou leitor e parceiro de Carta Maior há muito tempo e recomendo que as pessoas se inscrevam naquela que é uma das principais fontes de artigos e opiniões progressistas e de esquerda do Brasil.

O artigo de opinião é de Carole Cadwalladr

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(reprodução de artigo do site Carta Maior)


Se você não está aterrorizado com o Facebook é porque não está prestando atenção

O Facebook e os EUA são hoje uma coisa só, e o mundo é um lugar mais doente por isso, diz jornalista que revelou o escândalo da Cambridge Analytica

Por Carole Cadwalladr

28/07/2020 - 11:36


Em 2016, nós não sabíamos. Éramos inocentes. Ainda acreditávamos que as mídias sociais apenas nos conectavam e que as conexões eram boas. Que tecnologia era sinônimo de progresso. E que progresso era sempre algo melhor.

Quatro anos depois, já sabemos demais. E, no entanto, parece que não entendemos nada. Sabemos que as redes sociais são inflamáveis e que o mundo está em chamas. Mas é como a pandemia. Entendemos, em linhas gerais, como as coisas podem piorar. Mas continuamos irremediavelmente humanos. Incansavelmente otimistas. Claro que acreditamos que haverá uma vacina. Porque tem que haver, não é?

No caso do Facebook, o pior já aconteceu, só não admitimos. Falhamos na maneira de lidar com o problema. E não há vacina a caminho. Em 2016, tudo mudou. Quanto a 2020... Bem, veremos.

Já atravessamos o equivalente a uma pandemia de redes sociais – um contágio descontrolado que adoeceu o espaço de notícias e informações, infectou o discurso público e, de forma silenciosa e invisível, subverteu os sistemas eleitorais. Não se trata mais de saber se isso vai acontecer novamente. Claro que vai. Não parou. A questão é saber se nossos sistemas políticos, a sociedade e a democracia sobreviverão – se podem sobreviver – à era do Facebook.

Já estamos através do espelho. Em 2016, um governo estrangeiro hostil usou o Facebook para minar e subverter sistematicamente uma eleição americana. Sem nenhuma consequência. Ninguém – nenhuma empresa, indivíduo ou nação – jamais foi responsabilizado.

Zuckerberg diz que Vidas Negras Importam e, no entanto, sabemos que Donald Trump usou as ferramentas do Facebook para retirar e negar deliberadamente o direito de voto de negros e latinos. Sem consequências.

E embora conheçamos o nome "Cambridge Analytica" e tenhamos ficado momentaneamente indignados com a cumplicidade do Facebook em permitir que dados pessoais de 87 milhões de pessoas fossem roubados e utilizados, inclusive pela campanha de Trump, uma multa de 5 bilhões de dólares foi paga, mas nenhum indivíduo foi responsabilizado.

E isso foi só nos EUA. Para nós, na Grã-Bretanha, há ainda um acerto de contas ainda maior por fazer. Sem Facebook, não teria havido Brexit. O futuro do nosso país – nossa nação insular, com seus mil anos de história contínua da qual nos orgulhamos – foi definido por uma empresa estrangeira que provou estar fora da jurisdição do parlamento.

Quem na Grã-Bretanha entende isso? Quase ninguém. Talvez o comitê de inteligência e segurança, que expressou seu espanto esta semana por não ter sido feita nenhuma tentativa de investigar interferências estrangeiras no referendo da UE. E talvez Dominic Cummings, o homem sentado no número 10 da Downing Street ao lado de Boris Johnson.

Dominic Cummings conhece o papel que o Facebook desempenhou no Brexit. Ele escreveu sobre isso. Em detalhes excruciantes ao estilo Cummings. Ele descreveu o uso deliberado de desinformação direcionado a indivíduos desconhecidos em escala nunca antes vista em uma operação eleitoral. Ele disse ter utilizado mais de um bilhão de anúncios no Facebook. A um custo de centavos por visualização.

Ele não fala sobre isso hoje, é claro. E embora o comitê de inteligência tenha apontado que as empresas de mídia “embora tenham o controle, não estão desempenhando seu papel”, também disse que “o DCMS nos informou que [CONFIDENCIAL]”. (N. da T.: DCMS é o Departamento de Digital, Cultura, Mídia e Esporte do Reino Unido)

O fato é que hoje sabemos que houve abuso sistemático da plataforma pelas campanhas Leave (pró-Brexit). Sabemos que brechas em nossas leis foram deliberadamente exploradas. E sabemos que essas ações foram consideradas ilegais e “punidas” por “reguladores” cujos “regulamentos” mostraram não valer o papel em que foram escritos.

O Facebook será usado para sabotar a eleição presidencial dos EUA em 2020? Sim. O Facebook será responsabilizado? Não. Estamos diante de um choque no sistema que mudará os EUA para sempre? Sim. Porque Trump ou ganhará essa eleição usando o Facebook ou a perderá usando o Facebook. Os dois resultados cheiram a desastre. No domingo, entrevistado por um repórter da Fox, ele se recusou a dizer se deixaria a Casa Branca caso perdesse a eleição.

Os EUA, a ideia dos EUA, está à beira do abismo. E no cerne frio e morto da missão suicida em que se encontra, está o Facebook. O Facebook e os EUA tornaram-se indivisíveis. Facebook, WhatsApp e Instagram são hoje o sistema circulatório da vida e da política americanas. Um sistema circulatório que está doente.

Como doente está o mundo todo, uma vez que o capitalismo americano serviu de vetor para infectar o mundo. “Liberdade de expressão” algoritmicamente amplificada e sem consequências. Mentiras espalhadas em alta velocidade. Ódio expresso livremente e compartilhado livremente. Ódio étnico, supremacia branca, nazismo ressurgente, tudo isso se espalhando invisivelmente, de modo furtivo, sem poder ser visto a olho nu.

Por Trump 2020, a banda voltou a se reunir. O principal cientista de dados da Cambridge Analytica, Matt Oczkowski, lançou uma nova empresa, a Data Propria, que está trabalhando com Brad Parscale, diretor digital da campanha de Trump em 2016. E Trump está testando os limites. Pode fazer anúncios com símbolos nazistas? Sim. (Foi retirado, mas já tinha alcançado milhões de visualizações.) Pode espalhar mentiras sobre fraudes em votos por correspondência? Sim. Pode ameaçar os manifestantes da Black Lives Matter com violência? Sim. Ele poderá usar o Facebook para contestar a eleição? É o que vamos ver.

Em um mundo onde não há consequências, o homem mau será rei. E uma empresa multinacional agressiva cujo modelo de negócios está ameaçado pelo oponente do homem mau, na melhor das hipóteses, está em conflito de interesses; na pior, é cúmplice.

Nesta semana, Mark Zuckerberg foi obrigado a negar ter um "acordo secreto" com Trump. "É uma ideia ridícula", disse. Fez eco, estranhamente, à sua reação em novembro de 2016, quando pela primeira vez foi sugerido que notícias falsas veiculadas no Facebook poderiam ter desempenhado um papel na eleição de Trump: "é uma ideia maluca", disse então.

Não era maluquice. Era verdade. Sabemos disso por causa do trabalho minucioso que o FBI e os comitês do congresso fizeram na investigação sobre interferências estrangeiras nas eleições americanas. Trabalho que nem começou no Reino Unido. O que descobrimos esta semana não foi um acidente. Foi por causa de outro populista que não queria que a verdade viesse à tona: Boris Johnson.

O Facebook também está no centro dessa história. É o Facebook que permite que países hostis como a Rússia nos ataquem em nossas casas. Uma guerra geopolítica travada bem debaixo de nosso nariz, em nossos bolsos, em nossos telefones.

Este é o mundo do Facebook agora. E nós vivemos nele. E se você não está aterrorizado com o que isso significa, é porque não está prestando atenção.

Tradução de Clarisse Meireles

*Publicado originalmente em 'The Guardian' | Tradução de Clarisse Meireles

domingo, 16 de agosto de 2020

À la Benjamin Button... (4)



Não adianta fazer cara de mau, como dizia
Riobaldo Tatarana, porque no fundo somos
de coração bom, somos humanistas.

Refeição Cultural

Olhar para trás...

Madrugada de domingo. Estou vivo. Sendo assim, reflito; pois sou um ser humano e me nego a ser um bicho irracional. Decidi olhar para trás nesse momento de minha vida e nesse momento conturbado do mundo, do nosso mundo. Posso olhar cinquenta anos para trás; é alguma coisa. Tenho o desejo de entender algumas coisas, de compreender o porquê que as coisas são como são.

Remexendo e organizando as coisas que tenho, fico impressionado pela quantidade de papéis, revistas, livros e mídias que acumulei ao longo da vida. A conclusão imediata que se pode tirar é que pelo menos eu tive o desejo de ser menos ignorante, de ter mais conhecimento. Não pude ler a maioria do que acumulei, mas é porque a vida era gasta no viver, no viver de um proletário. A vida passa voando entre uma exploração e outra por comida e abrigo.

Se calhar de viver até os 81 anos eu bem que poderia me sentar, pegar tudo aquilo que juntei e fazer a devida leitura. Vai que na leitura e no conhecimento novo eu conforte meu coração despedaçado por acordar num país bolsonarista, no meio de um povo que permite as barbaridades contra si mesmo sem reação. Quantas vezes pensei ao longo da fase menos remediada da vida que preferiria morrer a ser um escravo acomodado.

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Olhando para trás no meu perfil da rede social, olhando o mês de julho deste ano, vi postagens interessantes. Como sempre, pouca visualização. Creio que o algoritmo tem peso nisso.

Postei um comentário demonstrando estupefação ao ver uma matéria de um dos maiores sindicatos de bancários do país debochando do fato de outro sindicato ter perdido uma liminar que mantinha em casa (home office) os bancários que tinham coabitação com pessoas do grupo de risco (Covid-19). Francamente, ao ver um sindicato fazer isso, a gente vê que a esquerda e os trabalhadores terão muita dificuldade para derrotar nossos inimigos, os capitalistas exploradores e donos do mundo. A postagem gerou perto de 30 comentários muito interessantes. Sou grato a todas e todos que opinaram a respeito da questão.

Fiz alguns vídeos sobre política, os vídeos também foram postados na minha conta do YouTube. Repliquei informativos da revista Carta Capital sobre os números da pandemia de Covid-19. Os infectados e os mortos são muito maiores do que a previsão que eu havia feito: já são mais de 107 mil vítimas fatais. Mas o bolsonarismo venceu a narrativa e não existe nem quarentena nem isolamento social no país. Uso de máscara é lei, mas cumpre quem quer. Normalizaram-se mil mortes por dia como se fossem uma notícia de acidente de trânsito entre dois carros. É nesse país bárbaro que nos transformaram para tirar por golpe o Partido dos Trabalhadores do poder, já que pela democracia a casa grande não via chance alguma.

Voltei no tempo até o dia 28 de julho. O dia que postei na rede social a foto acima. Havia escolhido uma foto para mostrar que estava com gana de lutar e enfrentar os desgraçados que destruíram nosso país e nosso mundo. Mas vamos ser realistas: não adianta aprender a fazer cara feia e seguirmos sozinhos e isolados. Nossos inimigos estão com todos os meios à disposição deles. E nós não estamos de mãos dadas e unidos.

Vamos dormir pois já são três horas da manhã. Pelo menos ouvi, na última hora e meia, músicas das antigas, da época em que eu ouvia música diariamente.

William


Post Scriptum:

Uma das imprecações que fiz em julho, deixo registrada aqui, pois vai que ela se realize um dia...

"FASCISMO (instantes...): País vive um momento decisivo em sua história. Esses apoiadores do fascismo, que apostam na mentira, na manipulação e no fanatismo de parcela da população (parte dela ignorante e parte cínica), podem continuar com seu gozo momentâneo. Ali na esquina vocês vão se encontrar com o julgamento e com a condenação penal e moral de seus atos. Torço para que vocês não sejam "justiçados". Espero que vocês tenham o legítimo direito humano à defesa. 

Pulhas fascistas! Vocês vão cair!"

sábado, 15 de agosto de 2020

150820 - Diário e reflexões



Distopia. Desenho de William Mendes.


Sábado, dia 15 de agosto, sábado chuvoso em Osasco. Este é o ano em que apareceu o novo coronavírus, Covid-19, que já infectou 21 milhões de pessoas no mundo, já matou 766,6 mil pessoas, colocou em quarentena bilhões de pessoas e paralisou as economias dos países. A pandemia virou até desculpa para toda a tragédia humana que já era uma realidade mundial por causa do necrocapitalismo: alguns caras detêm todas as riquezas e os meios produtivos do mundo e os 7 bilhões de humanos não têm nada (na verdade temos 8 bilhões de humanos). Esse era o normal antes de janeiro de 2020.

Não sabemos como a história vai registrar esse período de pandemia mundial. Muitos livros de ficção do século XIX e XX imaginavam sociedades distópicas num futuro próximo ou distante. Imaginavam governos totalitários que controlavam até o pensamento das pessoas e eliminavam aquelas que se rebelavam contra o sistema, imaginavam sociedades onde ler era proibido, imaginavam sociedades onde máquinas dominavam os seres humanos. De propósito misturei ficção e história.

O que é ficção e o que é história? O que é verdade e o que é mentira? Na sociedade do presente, essa de hoje, os conceitos se misturaram e a realidade virou uma lama só. As duas primeiras décadas do século XXI trouxeram novas tecnologias que revolucionaram o mundo das comunicações e com isso a sociedade humana mudou, deu um salto para outra fase de sua existência. A internet se apresentou como algo maravilhoso para os seres humanos. Todo mundo poderia se comunicar livremente, sem interferência dos meios midiáticos tradicionais: rádios, TVs, jornais e revistas. Dinheiro público e cientistas de faculdades do mundo todo criaram e alguns caras se apropriaram das descobertas e registraram o YouTube, o Facebook, o Twitter, o Instagram etc. E o mundo mudou...

Então, o que é ficção e o que é verdade? No primeiro parágrafo dei um panorama da pandemia de Covid-19 com os dados de agora de manhã da Johns Hopkins University. Mas num dos países do mundo, um que agora voltou à condição de colônia, desta vez dos Estados Unidos, os caras que foram colocados no poder por golpe de Estado afirmam que a pandemia é uma gripezinha e que nada deveria mudar no cotidiano das pessoas porque gente morre todo dia mesmo, "e daí?", e que o que se deve fazer é tocar a vida. Os pobres têm que trabalhar para manter os ricos em suas casas em isolamento social para evitar a Covid-19. Os seguidores e apoiadores do governo, chamados de bolsonaristas, afirmam que essa tal de Covid-19 é invenção da esquerda. Pois é! E já morreram 106.523 pessoas nessa nova ex-colônia. Os países civilizados começaram as quarentenas e o isolamento social de novo por causa da pandemia voltar a contagiar e matar. Aqui nunca tivemos isolamento e quarentena efetivamente, pois o inumano no poder atuou contra isso. (as pesquisas apontam que quase metade da população apoia o desgraçado no poder...)

Voltando às novas tecnologias de informação e comunicação do mundo virtual... Agora uns caras detêm os meios onde bilhões de pessoas e milhões de empresas e instituições vivem, sobrevivem, tentar viver e sobreviver. Quem estiver fora desses meios é ogro, é um ser quase inexistente. E esses caras dominaram as economias, dominaram os países, dominaram as mentes das pessoas. Algumas pessoas de carne e osso, nem melhores nem piores que outras pessoas, têm a capacidade de influenciar, decidir sobre a existência ou não de bilhões de pessoas e instituições nessas redes sociais deles...

Interessante... a cada dia a realidade mais se parece com os clássicos de ficção que pensavam sociedades distópicas e quase impossíveis de se viver...

William

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

À la Benjamin Button... (3)



Olha o que as redes sociais fizeram
conosco: exposição. Aqui, lavando
banheiro ao som de AC/DC.

Refeição Cultural

Olhar para trás...

Dias atrás, uma amiga me pediu sugestões de leituras. Após pensar um pouco e ciente que não é fácil sugerir alguma coisa para alguém, falei sobre alguns dos livros de Saramago que mexeram comigo e sobre o livro Sapiens - Uma breve história da humanidade (2011), de Yuval Harari, que estou lendo lentamente. De Saramago, citei A viagem do elefante (2008), A jangada de pedra (1986), Ensaio sobre a cegueira (1995) e Ensaio sobre a lucidez (2004). As obras de Saramago são do tipo "E se acontecesse tal coisa..." e nos fazem pensar muito.

Citei também dois autores com os quais tive contato ano passado, por ter cursado disciplinas de literatura hispano-americana na Faculdade de Letras da USP. O chileno Roberto Bolaño e a mexicana Margo Glantz. Ambos me fizeram pensar muito. Bolaño me deixou bolado (rsrs). Citei o livro El gaucho insufrible (2003). Por fim, citei como leitura agradável e prazerosa, e que também nos faz pensar na vida, o livro A carruagem dos espelhos (2019), de Sandro Sedrez dos Reis, amigo de longa data. O livro tem narrativas curtas e uma estória maior. Os contos me emocionaram muito.

Ainda andando para trás no tempo e nas postagens de agosto no perfil da rede social, vi publicações minhas de lamentos e alguns comentários de amigos e conhecidos. Lamentos não mudam nada da realidade. Mas faz parte, já que somos humanos, não somos máquinas.

Chega por enquanto. Minha caminhada para trás vai ficar interessante à medida que o tempo avançar bem para trás. Agora as coisas estão muito recentes. 

Havia postado a foto acima na rede social, no dia 1º de agosto. Ela ilustra bem o que nos tornamos com o advento das redes sociais nas duas últimas décadas. Às vezes, postamos nulidades e futilidades que não agregam nada para a humanidade. Aliás, é o que mais fazemos, infelizmente. E quando postamos algo útil, quase ninguém vê.

As pessoas postam fotos do que comem, do que fazem, de onde estão, com quem estão, o que estão sentindo etc. Aí os donos das redes sociais pegam todas essas informações, jogam nos programas de algoritmos dos computadores, processam e criam máquinas que manipulam comportamentos humanos em qualquer parte do planeta onde as redes sociais atuam.

Que situação...

William

À la Benjamin Button... (2)




Refeição Cultural

Olhar para trás...

Quando criei meu perfil na rede social que viria a ser uma das maiores do mundo e que passaria a ser uma ferramenta de ódio global e manipulação de centenas de milhões de pessoas, inclusive através de mentiras em escala nunca vista na história da humanidade, eu criei o perfil pensando em me aproximar das pessoas; acredito que boa parte dos usuários de redes sociais pensou de forma semelhante: encontrar pessoas, compartilhar as coisas da vida, passatempo e distração e atividades humanas do tipo.

Hoje não temos ilusão alguma. As poucas redes sociais do mundo e seus poucos donos estão destruindo os seres humanos. Não aproximaram as pessoas, afastaram pessoas, desfizeram famílias e amizades. As sociedades permitiram que poucas pessoas detivessem poder demais num mundo com 7 bilhões de pessoas. Poucas pessoas detêm quase todo o patrimônio humano; poucas pessoas têm poder de vida e morte sobre os próprios humanos, fauna e flora, água, terras, alimento; poucas pessoas estão estragando a vida do planeta Terra, que até o momento a ciência afirma ser o único no universo com vida.

Se o tempo andasse para trás, será que faríamos as coisas diferentes? Se pudéssemos voltar no tempo, será que as coisas teriam sido melhores para a maioria dos humanos? Dificilmente. As coisas são como são, a natureza e as coisas simplesmente são. Se não fosse como são, seriam de outra forma e pode ser que fossem melhores para alguns seres e piores para outros seres. Mas não vou me enveredar por esses senões. Não vem ao caso.

Ao rever o filme O curioso caso de Benjamin Button (2008) fiquei pensando a respeito da estória. Aliás, assisti ao filme novamente porque já estava pensando nele. Acho que o bolsonarismo faz a gente querer voltar no tempo e encontrar uma forma de evitar que essa desgraça aconteça, e olha que o bolsonarismo é anterior à pandemia de Covid-19, então não serve de desculpa dizer que o mundo estragou por causa da pandemia, porque estragaram o meu país, o meu mundo, muito antes da pandemia do novo coronavírus.

Eu não estou sofrendo por mim, juro. Estou sofrendo pelos jovens que tiveram seu presente e futuro estragados por essa desgraça de golpe de Estado que fizeram no Brasil para interromper o processo de avanços para o povo miserável, processo que era tocado através da política e liderado pelo Partido dos Trabalhadores, partido com seus defeitos, mas respeitador do processo democrático. E os avanços para o povo ocorriam sob um regime de paz, temos que destacar isso. Será que eu poderia ter feito algo a mais para evitar essa desgraça em nosso país? Em nosso mundo? Onde errei? Onde erramos? É duro! Estou vivo e por isso me questiono.

Na rede social que usa meus dados para manipular o mundo publiquei postagens em agosto sobre a leitura de Hannah Arendt e sua tese da banalidade do mal, tese desenvolvida ao presenciar o julgamento do nazista Adolf Eichmann no início dos anos sessenta. Publiquei lamentos também, algo muito comum em redes sociais, algo captado pelos algoritmos da rede e utilizados contra nós mesmos e contra nossa gente e nosso lugar de viver. É um dilema o que vivemos hoje, porque a sociedade humana se moldou à tecnologia de comunicação disponível e não basta decidir apertar um botão e dizer "tô fora disso" porque o mundo é isso. Não temos que sair do mundo.

Chega por enquanto. Vamos dormir pois já são duas horas da manhã. A vida segue e a gente insiste em viver e pensar, a gente insiste em não abandonar nosso cérebro e nossa inteligência. A razão existe para ser utilizada. Seguirei pensando sobre tudo isso que estou refletindo e que está incomodando o viver.

William

terça-feira, 11 de agosto de 2020

Eichmann nos lembra o novo regime do mal





"Se o que Eichmann cometeu foram atos de Estado, então nenhum de seus superiores, muito menos Hitler, chefe de Estado, poderia ser julgado por qualquer corte..." (ARENDT, 2019, p. 109)

"Ele nunca assistiu efetivamente a uma execução em massa por fuzilamento, nunca assistiu ao processo de morte pelo gás, nem à seleção dos mais aptos para o trabalho - em média, cerca de 25% de cada carregamento -, que em Auschwitz precedia a morte. Ele viu apenas o suficiente para estar plenamente informado de como funcionava a máquina de destruição..." (ARENDT, 2019, p. 105)

"(...) a 'regra da linguagem' que, no seu caso, foi a mentira de uma epidemia de tifo inexistente no campo de concentração de Bergen-Belsen, que os cavalheiros também queriam visitar. O efeito direto desse sistema de linguagem não era deixar as pessoas ignorantes daquilo que estavam fazendo, mas impedi-las de equacionar isso com seu antigo e 'normal' conhecimento do que era assassinato e mentira..." (ARENDT, 2019, 101)


Refeição Cultural

Escrevo e registro ao modo de imprecador...

Ia começar a postagem quando parei para tomar café da manhã com minha esposa. Temos o hábito de ver um ou dois vídeos de fontes progressistas enquanto comemos. Como os vídeos abordaram o país e o bolsonarismo, e a normalização do mal, fiquei bem deprimido, com um aperto no coração e na região adbominal. Tinha acabado de ler várias páginas do relato de Hannah Arendt sobre o julgamento do nazista Adolf Eichmann e já estava tocado pelo absurdo do mal ter sido o normal durante os regimes fascistas do século passado.

Como chegamos a isso? Como chegamos ao bolsonarismo? É uma pergunta retórica. A pequena parcela da sociedade que pensa, que tem formação e consciência política sabe como chegamos a essa barbárie. O ódio e o medo foram projetos de dominação da casa grande dessa ex-colônia. E o PIG (Partido da Imprensa Golpista) foi grande responsável por chegarmos onde chegamos. 

A parte que pensa da minha geração - ou que não é indiferente - viu o envenenamento do povo brasileiro por parte da imprensa empresarial e totalitária, com milhares de capas, manchetes, horas de TV e rádio com matérias mentirosas contra um segmento da sociedade: a esquerda e suas lideranças. Não há inocência alguma, nem isenção no que estamos vivendo: foi projeto e a abertura da Caixa de Pandora é o resultado.

A parcela da sociedade que lê, que escreve, que estuda e conhece história, sabe como chegamos a isso. Não sou escritor. Não sou escrevente. Acredito que seja ao menos um escrevinhador, alguém que anota, registra, que utiliza a capacidade humana da linguagem para registrar a história.

Um dos vídeos que vi durante o café mostrava um jovem da idade de meu filho vociferando bobagens contra a esquerda, chineses, a invenção da Covid-19... e demais loucuras inventadas pelas fake news, e aquele rapaz estava absolutamente dominado pelo ódio, sem a menor capacidade de reflexão ou razão. É assustador porque aquele rapaz poderia cometer qualquer desatino com aquele ódio todo. 

Difícil... difícil seguir. Mas temos que seguir, temos que resistir, que sobreviver e construir um novo amanhã. 

O sol ainda brilha e aquece todas as manhãs

Sair para buscar pães, mesmo com o "novo normal", com máscaras na cara por causa da pandemia, e sentir o sol aquecendo seu corpo é algo indescritível, inclusive por causa da simplicidade da coisa. O sol. O calor do sol te envolvendo como um abraço caloroso. Em tempos de carência de abraços, o abraço do sol é acalentador.

Tempos estranhos. Passamos a vida toda sabendo que os cachorros tinham que colocar focinheira para andarem com seus donos. Vejam a cena nesses tempos. Os donos têm que colocar focinheira para andarem com seus cachorros. Tempos estranhos.

Vou seguir registrando. Acho que é necessário. Viver pode não ser preciso, mas registrar é necessário. Sabemos do passado porque registros chegaram até nós. Parece que cada vez somos menos leitores, escritores, escrevinhadores. Os novos tempos com redes sociais, venenos diários de ódio e medo por imagens, fake news em memes, reduzem os que pensam, os que escrevem, os que leem. Os que registram.

Vou ao estilo de imprecador. Vai que eu viva muitos anos ainda. Vai que eu viva até os 81 anos. A geração de meus pais nasceu quando o mundo enfrentava o nazifascismo. A geração de meus pais viu Eichmann ser julgado e condenado. A minha geração viu Pinochet ser preso pelas acusações de corrupção e violações a direitos humanos. (o ditador faleceu por infarto e "inimputável" por "questões de saúde")

A vida humana é frágil, e nos tempos atuais são grandes os riscos de morte natural ou por causas externas. Mas fica minha imprecação: vai que eu esteja vivo na próxima década, nas próximas duas décadas... pode ser que eu veja julgados e condenados esses criminosos que estão destruindo nosso país e matando nossa gente.

Acalme o coração. Não deixe o desespero, a raiva, a tristeza dominarem sua essência e matarem seu corpo. Amanhã é sempre outro dia.

William
Escrevinhador


Bibliografia:

ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal. Companhia das Letras, São Paulo, 2019.