quarta-feira, 31 de março de 2021

19. A guerra dos mundos - H. G. Wells



Refeição Cultural - Cem clássicos

"Talvez no plano maior do universo, essa invasão marciana tenha trazido um benefício para a humanidade. Livrou-nos da serena confiança no futuro que é a mais pródiga fonte de decadência, trouxe enormes contribuições para a ciência humana e colaborou muito para promover o conceito de bem comum da humanidade." (WELLS, 2016, p. 299)


Ao reler uma postagem dos primeiros anos deste blog, vi nela a referência a diversos autores dos quais ainda não havia lido nenhuma obra. Era uma postagem sobre lacunas culturais. Eu falava sobre os autores que o jovem Chris McCandless gostava. Chris se fez Alex Supertramp e se embrenhou no Alasca após dois anos perambulando por áreas inóspitas dos Estados Unidos. Ler postagem aqui.

Nosso super andarilho citou Dickens, H. G. Wells, Mark Twain, Jack London, H. D. Thoreau e Melville. E também Guerra e Paz, de Tolstói. Grandes lacunas culturais para mim. De lá para cá, tive a felicidade de conhecer uma obra importante de Wells, A guerra dos mundos (1898). E agora estou, finalmente, lendo Herman Melville, Moby Dick (1851).

Nesta manhã de quarta-feira, 31 de março, reli os últimos 3 capítulos do livro de H. G. Wells, clássico que havia lido em 2017. Li também o prefácio de minha edição, texto de Braulio Tavares. Na época da leitura, fiz postagem no blog (ler aqui).

O livro é interessantíssimo. A vontade que temos é de iniciar a releitura inteira na hora, mas não dá porque temos lacunas culturais a superar (rsrs). Também fica o desejo de ler outras obras de H. G. Wells.

Alex Supertramp, estou no caminho das leituras, já sou um cinquentão e não li diversos daqueles autores que você lia e gostava, mas posso dizer sem receio: você tinha um tremendo bom gosto literário!

O livro de Wells é muito metafórico. Estamos sob uma pandemia mundial de ignorância - terraplanismo, fake news e bolsonarismo no Brasil - vivemos uma verdadeira guerra dos mundos, guerra entre a razão e a ignorância, guerra entre a civilização e a barbárie. 

Na ficção de Wells temos os marcianos, nós e o Outro na disputa pelo espaço vital. Temos as bactérias. Na vida real temos os vírus como o novo coronavírus disputando conosco o espaço vital.

É uma ficção que nos coloca a pensar. Como a reflexão que citei acima - "promover o conceito de bem comum da humanidade" -, nossa chance enquanto seres humanos está em nos unirmos para promover o bem comum, derrotando o capitalismo que destrói a vida na terra, derrotando o mal representado por figuras como, por exemplo, aquele ser abjeto que governa o Brasil neste momento.

Seguimos lendo os clássicos.

William


Bibliografia:

WELLS, H. G. A guerra dos mundos. Tradução de Thelma Médici Nóbrega. 1ª ed. - Rio de Janeiro: Suma de Letras, 2016.


terça-feira, 30 de março de 2021

300321 - Diário e reflexões



Refeição Cultural

Fui persistente na leitura hoje, defini que leria o capítulo 4 de Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda, e assim o fiz. Foram 45 páginas de muita informação sobre o Brasil, sobre os povos ibéricos - portugueses e espanhóis - e várias análises muito bem articuladas pelo autor. Na minha edição, além do capítulo original, tem 4 textos incluídos posteriormente por Holanda. O conteúdo que li foi o seguinte:

"O semeador e o ladrilhador

- A fundação de cidades como instrumento de dominação - Zelo urbanístico dos castelhanos: o triunfo completo da linha reta - Marinha e interior - A rotina contra a razão abstrata. O espírito da expansão portuguesa. A nobreza nova do Quinhentos - O realismo lusitano - Papel da Igreja.

Notas ao capítulo 4:

1. Vida intelectual na América espanhola e no Brasil 

2. A língua-geral em São Paulo

3. Aversão às virtudes econômicas

4. Natureza e arte"


A leitura me fez refletir muito. A gente acaba compreendendo muita coisa, muitos porquês. Porque tanta gente apoia o regime fascista e de morte do líder mais mentiroso da história do país. A gente acaba entendendo até porque a direção da Cassi tem fixação por terceirizar todo o modelo assistencial construído há duas décadas, cujo sucesso é em parte por causa do modelo ter estrutura própria. Ao ver a nossa gênese na colonização portuguesa acabei entendendo a cabeça daqueles colegas. Enfim, a gente entende muita coisa, pelo menos fica com várias inferências sobre as coisas.

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O cenário ao qual nos encontramos é desanimador. Estamos há mais de um ano sob a imposição mortal da pandemia mundial do novo coronavírus. A vida mudou e ficou muito mais difícil para todos, sobretudo para a classe trabalhadora mundial. A existência se tornou mais instável, a vida está mais incerta do que já era. Além das mortes momentâneas que já nos ocorria - acidentes, doenças, violências - agora se morre dias depois se formos infectados pelo vírus.

Que planos fazer para os meses desse ano de 2021? Por ser brasileiro e viver no país destruído e subjugado pelo regime genocida no poder, sei que não serei vacinado este ano. Nem eu nem meus familiares e amigos porque os desgraçados do regime de morte atuam a favor do caos, não temos o que os cidadãos dos demais países do mundo têm: a chance de se vacinarem e um governo que combata a pandemia. Isso nos reduz muito a chance de felicidade nesse processo de viver sem viver plenamente. O que temos de planos é sobreviver e sobreviver... 

Estou melhor que a ampla maioria do povo brasileiro, pois estou na pequena parcela da população que pode se dar ao luxo de seguir as recomendações das autoridades mundiais de saúde para se evitar sair, evitar aglomerações, ficar em casa, fazer higienização adequada e usar máscaras para evitar pegar o vírus e para evitar transmitir o vírus para os outros. Estou na pequena parcela da população brasileira que tem o privilégio de poder ficar em casa enquanto durar a pandemia. Se não posso ajudar a combatê-la, já ajudamos não atrapalhando quem combate a pandemia. 

Todos os dias temos recorde de mortes por Covid-19. Hoje morreram 3.780 pessoas no Brasil (em 1 dia!). A culpa é do regime fascista, e quero viver para ver os genocidas julgados e condenados por isso.

Enfim, estou lendo, estudando. Alternando momentos ruins e momentos razoáveis. Não posso reclamar de absolutamente nada. É só lembrar no segundo seguinte a situação da maioria e devo me colocar no meu lugar de privilegiado.

Amanhã é dia 31 de março. Um dia que marcou o Brasil e a história mundial por causa dos desgraçados que deram um golpe de Estado em 1964 e colocaram o país em mais de duas décadas de autoritarismo, morte, fim das liberdades, enriquecimento da parcela que planejou o golpe, empobrecimento do restante do povo subjugado pelos golpistas. Um dia para nunca mais se repetir. 

E os desgraçados no poder por golpe de novo pretendem comemorar de forma ilegal, criminosa, imoral e canalha o golpe que rasgou a Constituição e pôs fim a democracia em 1964.

Quero que se f... esses canalhas que comemorarem a merda da ditadura, tanto a do passado quanto a que o líder do regime atual quer implantar.

Temos que sobreviver, estudar, melhorar como seres humanos, superar esse momento do país e esses lixos que tomaram o poder e temos que reconstruir o país e os direitos dos brasileiros.

William


Bibliografia:

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Raízes do Brasil - Ler é entender xuxas, janaínas



Refeição Cultural

A cidadã brasileira Xuxa defendeu que cidadãs e cidadãos presos sejam usados como cobaias em experimentos para servirem para alguma coisa. Mengele fez muito disso nos presos do regime nazista. A cidadã Janaína, deputada mais votada de São Paulo, sugeriu deixar os cidadãos mais velhos à própria sorte na falta de leitos para atendimento hospitalar, priorizando os mais jovens (por causa da pandemia de Covid-19 e colapso do sistema hospitalar). Ela não sugeriu cobrar mais impostos dos ricos para suprir de recursos adicionais o Estado e o SUS.

Hoje li mais um capítulo do livro de Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil, publicado em 1936. Li esse clássico em 2009 e decidi relê-lo agora. É impressionante como o ensaio de Holanda nos faz entender as xuxas e janaínas que estão ao nosso redor!

O Brasil é hoje um país pária do mundo, um lugar amaldiçoado por tudo e por todos no planeta Terra. Somos governados por um regime genocida em pleno século XXI, depois das experiências trágicas e sanguinárias do regime nazista de Hitler e de regimes fascistas e autoritários que marcaram o século XX. 

Nosso regime ilegítimo (eleições fraudulentas em 2018) já levou à morte mais de 300 mil cidadãos e cidadãs por jogar as pessoas à própria sorte (ao próprio azar) durante a mais trágica pandemia virótica depois da gripe espanhola. O vírus Sars-Cov-2 (Covid-19) se tornou a principal ferramenta de manutenção dos trogloditas no poder. Não temos vacina, não temos auxílio emergencial, e o objetivo dos sociopatas no poder é levar o país ao caos para ampliar o golpe de Estado através de milícias, estado de sitio ou violências autoritárias do gênero.

Ao ler Raízes do Brasil dá pra entender um pouco mais a nossa gênese, a gênese dessa gente que organizou o golpe de Estado em 2016. Dá pra entender um pouco mais essa gente que votou e apoia o crime organizado no poder do país. Estamos sob o domínio violento dos mesmos homens brancos e escravocratas que barbarizam por aqui há séculos.

É isso. Lendo textos como este de Holanda a gente compreende um pouco mais as coisas. E como diz Hobsbawn na Era dos Extremos estudar e compreender a história e o que os homens fizeram não é perdoar ou concordar com toda a desgraça feita.

William


domingo, 28 de março de 2021

Moby Dick - Capitão Acab à la Hamlet



Refeição Cultural

"- Fala, ó grandiosa e venerável cabeça - murmurou Acab. - Não tens barbas que te adornem, mas o musgo te fornece cãs. Fala, cabeça potente! Dize-nos o segredo que encerras! Não existe mergulhador que tenha afundado tão profundamente como tu. Essa cabeça, agora iluminada pelo sol, moveu-se outrora pelos alicerces deste mundo, lá onde apodrecem âncoras, nomes e frotas não registrados nos anais da história e também esperanças ignoradas: ali onde, no seu mortífero porão, essa fragata que é a terra leva como lastro os ossos de milhões de afogados; esse espantoso reino áqueo era a tua morada mais habitual. Estiveste nos lugares aonde nunca chegaram sinos nem mergulhadores; dormistes ao lado de mais de um marinheiro cuja mãe insone teria dado de bom grado a vida para ocupar o teu lugar; vistes amantes abraçados saltarem do navio em chamas: coração de encontro a coração, afundavam sob as ondas triunfantes, fiéis um ao outro, quando o céu parecia havê-los traído. Viste à meia-noite piratas que assassinavam e atiravam pela borda o piloto que ia caindo, caindo, na noite mais lôbrega do insaciável sorvedouro, e enquanto os criminosos prosseguiam incólumes na sua viagem, raios súbitos transformavam em lascas o navio vizinho que conduziria um esposo fiel aos braços abertos e anelantes da esposa. Ó cabeça, viste o que seria bastante para fazer estremecer os planetas e causar a infidelidade do próprio Abraão, e contudo não pronuncias uma sílaba." (MELVILLE, 1998, p. 361)


Essa passagem de Moby Dick me trouxe na hora a lembrança de Hamlet e suas elucubrações sobre a morte.

Neste domingo, me desliguei do mundo à tarde para retornar ao baleeiro Pequod e singrar os mares do Sul com a tripulação sob comando do capitão Acab.

Consegui ler 40 páginas. Foi meu 12º dia de leitura deste clássico da literatura mundial do século XIX. O baleeiro está no Oceano Índico e já citou a ilha de Java.

O baleeiro conseguiu pescar a primeira baleia branca. É uma parte triste porque a gente fica com dó do cachalote. Eles pescavam o maior mamífero do mundo por causa do óleo, principalmente.

Passei por capítulos fantásticos como "O Calamar" que fala de um tipo de lula gigante, um monstro daqueles mares de 170 anos atrás.

CENA: estava sentado na pequena área de casa lendo, e minha esposa me perguntou sobre o que sentia naquele momento de leitura. Falei que estava imaginando a cena daquele monstro do mar, o Calamar, e outros monstros como os leviatãs - baleias gigantes - aos olhos dos marinheiros de 170 anos atrás. Também pensava na informação do livro de que cachalotes caçavam calamares. É de se pensar realmente sobre a mentalidade e visão de mundo daqueles homens que se lançavam ao mar séculos atrás com tanta coisa ainda desconhecida...

Enfim, a leitura aliviou um pouco o martírio desses dias de mortes. A pandemia de Covid-19 está matando mais de 3 mil brasileiros por dia. A morte iminente nos cerca. Em poucos dias podemos morrer. 

Vamos nos esforçar para sobreviver e recomeçar o mundo, sem a ameaça do coronavírus e derrotando o regime genocida que se apossou do nosso país.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


sábado, 27 de março de 2021

Querô (uma reportagem maldita) - Plínio Marcos



Refeição Cultural

"Raiva é um negócio que ninguém pode tirar da gente. Só podem dar mais." (p. 30)

"Fui sem estrilar. Mas não foi fácil. Acho que nunca tinham limpado aquelas privadas antes. Se alguém fosse cagar nelas, ia sair cagado. Mas eu não dizia porra nenhuma..." (p. 32)

"Até pensava em dar um capricho em mim, pra ela me ver bem vestido. Parei de pensar tanto em arrumar um revólver, pra pensar em roupa. Era do caralho curtir aquela menina, a tal da Lica." (p. 48)

"E viu que eu estava mal. Me fez chá, café, me deu comida. Mas tudo que eu botava pra dentro, as tripas botavam pra fora. Era a porra do medo. Medo ferve as tripas." (p. 65)


Entre ontem e hoje, sábado 27 de março, reli o livro de Plínio Marcos, Querô, obra de 1976. A história de Querô é um soco no estômago de todos nós, é a história de nosso ontem, de hoje, e, infelizmente, de amanhã.

Jerônimo da Piedade, o Querosene, o Querô. Filho da prostituta Alzira da Piedade e sem pai. Crescido no prostíbulo, criado pela cafetina Violeta, e depois nas ruas, e depois recolhido em uma prisão de menores, e depois nas ruas. Querô.

Enquanto lia a história de Querô, via flashs do passado, instantes da minha vida ao longo de décadas. Não via só minha vida, via a vida dos querôs ao meu redor. O tempo inteiro pensava nos querôs espalhados por cada canto desta terra tão fecunda e tão miserável: Brasil.

O acaso me fez um sortudo. Não fui um Querô. Comecei com sorte, sendo filho da Dirce e do Gercir. Mas muitos de nós poderiam ter tido o mesmo percurso de Jerônimo da Piedade. 

A miséria e a pobreza de um país como o Brasil são contagiantes, encurralam a todos nós, nos põem todos em guerra: pobre contra pobre, miserável contra miserável.

(15h27 - interrompo a confecção da postagem... soube neste minuto de mais uma vítima da Covid-19, agora um amigo aqui do condomínio. Mais uma vítima do genocídio. Tantos anos juntos aqui onde moramos, reuniões, confraternizações (Sr. Epaminondas, presente!). Mais uma morte severina, morte matada pelo regime genocida... paro para respirar...)

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As narrativas de Querô me fizeram lembrar de coisas muito duras na vida. 

Baratas. Me lembrei muito de baratas. As baratas foram um verdadeiro tormento na minha vida. As baratas nas diversas residências nas quais vivi. Aquele monstro. Tive azar com baratas ao longo da vida humilde que tive, com a família e depois sozinho. Amassar barata na cara (foi difícil superar isso). Amassar barata na botina... casas onde precisei combater colônias de baratas. Jogava inseticida e matava dezenas delas. Numa casa de fundo de quintal onde morei, na entrada de uma favela e em frente a um córrego sujo, tinha um banheiro comunitário no qual as baratas saíam do ralo enquanto se tomava banho... cara, era foda! Muitas casas com baratas tive nas veredas de minha vida.

Merda. Trabalhei de ajudante de encanador antes dos 17 anos de idade. Quebrar concreto, paredes, passar canos de esgoto. Certa vez, tive que tirar o vaso sanitário e os canos de uma casa em reforma. Tive a experiência de ter que mexer na merda dos outros. Obras novas eram melhores por não ter encanamento usado. É um serviço difícil. A sociedade deveria valorizar, respeitar e remunerar adequadamente os serviços braçais que as maiorias jamais gostariam de fazer.

Ler a história de Querô me fez pensar muito no momento em que estamos no Brasil: pandemia de coronavírus e sob o comando do crime organizado - bandidos endinheirados, gente má e gente com desvios mentais no poder, psicopatas. Desemprego em massa após a destruição do país pela Lava Jato e pelo golpe de 2016 (em 2014 vivíamos a experiência do pleno emprego e as pessoas escolhiam onde trabalhar). Mais de 300 mil mortos oficialmente por Covid-19, sem oxigênio, sem atendimento médico. Sem vacinas para todos. Provavelmente, o mesmo número de mortos por mortes severinas, pela miséria, pelo trabalho intermitente sem direitos, pelo não atendimento médico de urgência.

Querô. Não fui órfão como Querô. Não tive o mesmo fim de Querô por diversas casualidades aparecidas nas veredas da vida neste sertão brasileiro. Tive pais. Tive amigos. Tive amores. Tive sorte. Tive companheiros do movimento sindical e político que me mostraram o caminho da consciência política. Tive empenho sim, mas não foi por meritocracia que vivi até aqui, foi pela solidariedade da vida em sociedade, foi por oportunidades surgidas a partir de movimentos externos a mim. Tudo que nós da classe trabalhadora somos e temos, nós excluídos da casa-grande, que não nascemos naqueles berços, tudo que temos é fruto das lutas sociais coletivas.

Chega. Reflexão feita a partir da obra de Plínio Marcos. Vivendo sob o país dos bolsonaros, de moros e dalagnois e sua multidão de apoiadores dementes, canalhas e trogloditas.

Essa gente vai passar, vai cair, vai encontrar o fim.

William


Post Scriptum (13/12/22): assisti na Netflix ao filme Querô (2007), direção de Carlos Cortez, com Maxwell Nascimento no papel principal. Gostei da adaptação da obra de Plínio Marcos.


Bibliografia:

MARCOS, Plínio. Querô (uma reportagem maldita). São Paulo: Publisher Brasil, 1999.


quarta-feira, 24 de março de 2021

Moby Dick - No Pequod fujo da Covid



Refeição Cultural

Nesta quarta-feira 24, consegui chegar à metade do livro de Herman Melville - Moby Dick. Este é mais um clássico da literatura mundial que decidi ler durante a pandemia mundial de Covid-19. Viajar por algumas horas nas narrativas ficcionais é uma forma de sobreviver e manter um pouco da minha sanidade mental e da minha humanidade.

Durante as horas de leitura, evito ligar o celular e entrar em redes sociais. Hoje repeti essa disciplina. Acordei cedo e comecei a ler. Estava difícil de embalar na leitura. Sono... Olho pesado... Li poucas páginas e fechei um pouco os olhos... Insisti na leitura. Felizmente peguei o ritmo e fui adiante. Foi incrível! Li da página 269 até a 322, cheguei à metade do romance. Fiquei feliz!

Nossa psique, nosso eu, precisa desses momentos de cultura e estudos, senão quebramos.

Ao ligar o celular e entrar nos sites de informação, começam as notícias duras. Um grande companheiro de lutas morreu ao sofrer um infarto (Pedro Eugênio, presente!). O Brasil atingiu a marca trágica de 300 mil mortos por Covid-19 e isso não precisaria ser assim, caso não estivéssemos sob um regime genocida. 

São tantas pessoas queridas que estão com o vírus, algumas em casa, outras hospitalizadas, algumas em estado grave. Já era para termos vacinado dezenas de milhões de pessoas, mas os políticos fizeram politicagem com a pandemia e nós nos ferramos. Difícil tudo isso! Nossa vida está sob risco de morte iminente. Morte morrida e morte matada, mortes severinas: vírus, infarto, AVC, quedas, apendicite, tiro.

Pensando num vídeo bonito que recebi de minha mãezinha querida, vou deixar aqui uma palavra de otimismo e não de desânimo. Essas coisas ruins vão passar, vamos recomeçar uma sociedade e uma vida melhor, então vamos sobreviver e, de mãos dadas, recomeçar. Esses seres do mal que se apossaram de nosso mundo vão passar, vão cair, vão ser presos, alguns vão morrer antes da gente.

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MOBY DICK

"Nunca Starbuck conseguiu esquecer o aspecto do velho, uma noite em que descendo à cabina para observar o barômetro viu-o com os olhos fechados, sentado na cadeira parafusada ao soalho; a chuva, o granizo derretido com que a tempestade acabava de açoitá-lo, gotejavam do seu chapéu e do casaco, que vestia ainda. Na mesa próxima jazia desenrolado um daqueles mapas de mares e correntes a que já nos referimos. Na mão fortemente crispada balançava-se uma lanterna. Com o corpo ereto, a cabeça voltada para trás, os olhos fechados dirigiam-se para a agulha do axiômetro que se movia pendurado numa viga do teto.

     'Terrível ancião!', pensou Starbuck estremecendo. 'Dormindo, no meio da borrasca, tens ainda os olhos sempre fixos no teu propósito!'" (p. 278)


Nossa viagem a bordo do baleeiro Pequod, sob comando do capitão Acab, nos trouxe aventuras e novidades. A tripulação do baleeiro jura ter visto Moby Dick pela primeira vez, só seus jatos de água, mas dizem que era o cachalote branco.

O narrador e marinheiro do baleeiro, Ismael, aponta na sua narrativa alguns presságios, e ele faz isso de forma bem interessante. Primeiro um bote naufraga na primeira saída ao mar, depois aparecem corvos marinhos na embarcação, depois um vento que derruba uma trombeta de um capitão de um navio que passou diante do Pequod.

"- Olá, os do navio! Viram o cachalote branco?

     Porém, quando o estranho capitão, inclinando-se sobre a descolorida amurada, dispunha a levar a trombeta aos lábios para nos responder, esta caiu inopinadamente das suas mãos sobre o mar, e como o vento se levantasse então com violência, ele fez inúteis esforços para se fazer ouvir sem ela. Entretanto, o seu navio distanciava-se cada vez mais, e enquanto os tripulantes do Pequod davam provas evidentes, ainda que silenciosas, de ter notado o fatídico incidente à simples menção do nome da baleia branca a um outro navio, Acab refletia..." (p. 280)

Por fim, na leitura de hoje, tivemos uma história dentro da estória, no capítulo "História do Town-Ho". É um capítulo longo e o leitor vai conhecer a história de uma das vítimas do cachalote branco Moby Dick.

Ainda li alguns capítulos que falaram sobre as representações pictóricas das aventuras de baleeiros e caças às baleias.

É isso. Este foi o 11º dia de leitura de Moby Dick. Volto ao clássico Melville daqui a dois dias. Vou retomar a leitura de ontem, de Sérgio Buarque de Holanda e seu clássico Raízes do Brasil (1936). 

Caso haja interesse em outras postagens sobre a leitura de Moby Dick, a mais recente está aqui.

Temos que sobreviver e ajudar a refazer o mundo destruído pela pandemia, pelo bolsonarismo e pelo capitalismo.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


terça-feira, 23 de março de 2021

Raízes do Brasil - Lendo algo que ajude a entender



Refeição Cultural

Ao acordar nesta terça-feira 23, fiquei olhando para o teto por um tempo. Decidi que não leria Moby Dick hoje, mas sem peso na consciência porque ontem o dia de leitura rendeu. Queria ler alguma coisa que explicasse a situação do Brasil. E o pior é que sei muita coisa que explica um pouco tudo isso, mas queria muito entender por que parte do povo brasileiro é tão escrota.

Quando nos lembramos da realidade do Brasil e de toda a desgraça que se abateu sobre o nosso mundo após o golpe de Estado em 2016 e após a ascensão do regime fascista sob o comando de um clã de milicianos, golpe "com Supremo com tudo" como disse à época um senador da república, enfim, quando nos lembramos da realidade, temos vontade de ler alguma coisa definitiva, que alinhave tudo, do início ao fim da história. Essa ideia simplista é uma bobagem, mas a vontade de compreender as coisas é grande.

Fui até a estante, olhei, olhei, sei que o ideal talvez fosse ler um de meus livros do sociólogo Jessé Souza, mas ainda não estou pronto para os livros dele. Certa vez peguei um pra ler e vi que ainda não estava na hora. Por enquanto, fico com as entrevistas e artigos dele. Aprendi em minha vida de leitor amador que certos livros só são possíveis de se ler quando chega a hora certa.

Fiquei vendo os nomes dos livros. Acho essa coisa do nome dos livros algo central. Exemplo: "Cem anos de solidão"! Como não ler um livro desses? Quem não estiver se sentindo assim após um ano de pandemia de Covid-19 que levante a mão...

Escolhi "Raízes do Brasil", de Sérgio Buarque de Holanda. Dos pensadores brasileiros, dos quais minhas lacunas culturais são quase integrais, não li quase nada. Esse eu li em 2009. Provavelmente li porque recém começava um mandato de secretário de formação na confederação dos bancários e queria estudar muito para fazer um papel decente na secretaria. O nome foi decisivo: as raízes dessa merda toda na qual estamos enfiados até o pescoço...

Tomei um breve café e comecei a releitura. O texto de abertura, do professor Antonio Candido, foi espetacular! Ele falou de 3 obras centrais para a geração dele: Casa-grande e senzala (1933), de Gilberto Freyre, Raízes do Brasil (1936), de Sérgio B. de Holanda e Formação do Brasil Contemporâneo (1942), de Caio Prado Júnior. O texto de Candido é de 1967. Depois li os dois primeiros capítulos. 

Assim passei essa terça, sem ligar o celular até umas quatro horas da tarde. Entrar em redes sociais tem sido um martírio. São tantas mortes e tantas pessoas infectadas pelo vírus mortal... o vírus foi estratégico para os grandes capitalistas (ficaram mais ricos) e é utilizado pelo regime genocida como ferramenta de governo, como meio para atingir seus objetivos, todos eles contrários aos interesses do Brasil e do povo brasileiro. 

Repito o que disse na postagem de ontem. Ficar em casa é um ato de cidadania. Evitem sair se puderem ficar em casa, assim vocês diminuem os riscos de pegar Covid-19, infectarem mais pessoas, e contribuem para não aumentar mais ainda a demanda por atendimento no sistema de saúde que já está saturado.

Leiam. Quem sabe lendo a gente não contribui para que o mundo recomece algum dia.

William


Post Scriptum: O Brasil registrou nesta terça 23 o recorde de mortes por Covid-19 num único dia. Não sei se o correto é 3158 (UOL) ou 3251 (Carta Capital), depende das fontes pesquisadas, e sabe por quê? Porque os desgraçados do regime genocida desde meados do ano passado fizeram de tudo para que o povo não soubesse sequer os dados oficiais de mortes e contaminações pelo vírus, afinal era só uma "gripezinha", e o país segue numa condição "confortável" em relação à pandemia, segundo o governo. Não temos vacinas para quase ninguém, temos mais de 200 milhões de pessoas e viver ou morrer é uma questão de acaso, porque se pega Covid-19 mesmo tomando todos os cuidados sugeridos pelas autoridades de saúde. É isso!


segunda-feira, 22 de março de 2021

Moby Dick - Em casa, mas no mar com Acab



Refeição Cultural

Hoje foi o 10º dia de leitura do clássico de Herman Melville, Moby Dick, de 1851. Diferente do dia anterior, hoje consegui ler 5 capítulos (mais de 30 páginas), alguns bem interessantes.

Foi possível ver as reflexões do capitão Acab sobre as revelações dele para sua tripulação, confessando que a viagem do Pequod era uma viagem de vingança e caça à baleia branca que lhe estraçalhou a perna. Refletiu que isso não foi uma boa ideia porque caso o baleeiro não faça o seu papel e dê retorno econômico à tripulação, ele pode até enfrentar uma revolta e perda de comando.

O capítulo "O mapa" descreve a rotina nos mares e traz informações que dão verossimilhança ao romance, no sentido de explicar ao leitor que é factível um baleeiro encontrar-se com determinadas espécies de baleias e outros tipos de seres do mar porque já se conheciam em meados do século XIX rotas e correntes marinhas, épocas nas quais cardumes iam e vinham, hábitos de animais marinhos etc.

O Pequod avista pela primeira vez baleias e os leitores acabam descobrindo que havia mais uma equipe de bote, um 4º bote, um grupo vinculado ao capitão Acab. Os botes se lançam ao mar e não conseguem pescar nada. E chega uma tempestade pra atrapalhar mais ainda o baleeiro e sua tripulação.

Enfim, venci mais um dia de leitura de um grande clássico da literatura mundial. A postagem sobre a leitura anterior pode ser vista aqui, caso aja algum interesse do leitor do blog.

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LER QUIETO EM CASA É UM ATO DE SOLIDARIEDADE, CIDADANIA E AMOR AO PRÓXIMO

A pandemia mundial de Covid-19 está numa fase mortal no Brasil, a transmissão segue incontrolável e o sistema de saúde já começa a colapsar em diversas partes do país. Pessoas morrem sufocadas sem oxigênio, pessoas morrem sem atendimento algum; por outro lado, pessoas seguem fazendo festas e aglomerando sem uso de máscaras e estão se lixando para seus semelhantes. Então, ao ficarmos em casa, já que parte de nós pode ficar em casa, estamos contribuindo para não aumentar a transmissão do vírus e entupir o sistema de saúde.

Se houvesse interesse dos governantes de extrema direita, o Brasil seguiria as recomendações mundiais e teríamos vacinação em massa, lockdown e isolamento social, uso de máscaras e higienização adequada, teríamos auxílio financeiro para a sociedade suportar o período da pandemia e mais de 200 mil mortes seriam evitadas. Mas temos um genocídio porque os governantes são genocidas. Já morreram perto de 300 mil pessoas, mais de 12 milhões foram contaminadas e as sequelas podem atingir mais de um terço dos infectados. 

Ao saber que parte da população do país onde nasci se revelou uma gente má, ignorante, movida a ódio e preconceito, defensora de regimes autoritários e vis, perdi todo o amor e pertencimento que tinha em relação ao Brasil e aos brasileiros. Estou seco de sentimentos em relação ao que sentia por meu mundo. Desacorçoei do povo deste país desgraçado. Tenho vergonha de ser brasileiro, vergonha de conhecer tanta gente bolsonarista, canalha, bandida. Estou sem chão. Não sei como viveremos o resto de tempo que temos na vida, que pode ser dias e pode ser décadas. Mas meu sentimento de pertencimento morreu.

Seguimos querendo sobreviver a tudo isso. Estando vivo, há sempre a possibilidade do prazer e de momentos felizes ao ler um bom livro, ouvir uma boa música, ver o sol e os pássaros e a natureza, amar as pessoas.

William


Moby Dick - A brancura do cachalote



Refeição Cultural

Tem dias que a leitura de literatura é um exercício de persistência, de resiliência e de se mostrar determinado. Neste domingo 21, nono dia de leitura de Moby Dick, meu ânimo conspirou para que eu não lesse nada da narrativa de Melville. Mas insisti.

Não aconteceu nada de excepcional que me impedisse de ler, simplesmente minha mente não conseguia fixar o entendimento na leitura, cada parágrafo lido era perdido. Comecei e voltei e parei várias vezes. Me fiz de teimoso e li pelo menos um capítulo.

O capítulo que li "A brancura do cachalote" foi um capítulo com muita coisa. Um texto complexo, difícil de ler porque o texto é racista ao extremo, é um texto duro, que faz comparações históricas e outras coisas. Valeria a pena reler em outro momento. Seria o 42 pela minha contagem, já que a edição que tenho não enumera os capítulos.

Inclusive a técnica narrativa chama a atenção do leitor atento. Ora é o personagem narrador Ismael quem narra e reflete, ora não é Ismael porque ele é citado pelo narrador. Ou é um narrador demiurgo da estória ou é o próprio Melville.

A BRANCURA DO CACHALOTE

Ismael fala que já foi contado o que significa Moby Dick para o capitão Acab, mas ainda não havia falado sobre o que significa o cachalote branco para ele, um simples marinheiro do Pequod: horror.

"Esse horror era contudo tão misterioso e inefável, que chego a desesperar de conseguir descrevê-lo de maneira clara. O que me atemorizava sobretudo era a brancura do cachalote..." (p. 226)

A partir daí, o narrador reflexiona sobre a cor branca, as coisas brancas. Ele cita coisas em que o branco traz um sentimento bom, acolhedor, de coisa boa, um sentimento positivo e fala da gaivota e do corcel branco no oeste norte-americano.

E fala sobre o homem branco... que merda racista! 

"(...) conquanto essa preeminência se aplique também à raça humana, dando ao homem branco um domínio ideal sobre todas as tribos de cor..." (p. 226/227)

Depois ele fala de quando o branco traz o sentimento ruim, negativo, assustador. Cita o branco dos corpos mortos, o branco cadavérico. Fala mal das pessoas albinas.

Enfim, teria muitas citações para fazer sobre esse capítulo, mas já são duas horas da manhã de segunda-feira, a postagem é uma reflexão sobre a leitura e sobre atos de leitura e vamos encerrar por enquanto. Caso alguém tenha interesse em ler postagens anteriores, a mais recente está aqui.

Superei tudo e li Moby Dick pela 9ª pegada na obra. O livro tem 650 páginas e felizmente conseguimos chegar à 235. Aos poucos, vou lendo os clássicos e sobrevivendo à pandemia. Já li até Decameron, com suas mais de 800 páginas. 

Um comentário final: eu não sei o que vai ser da humanidade, não sei. Tenho refletido sobre isso, como se fosse um grande pensador. 

Sou só um cidadão simples do mundo, sem profissão, inclusive. Não fui contador. Não fui professor. Tive a ocupação de bancário.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


domingo, 21 de março de 2021

210321 - Diário e reflexões



Refeição Cultural - Banzo

No livro Becos da Memória, Conceição Evaristo nos fala de uma dor no peito, uma dor de tristeza, uma certa forma de depressão e melancolia, algo difícil de descrever. Li esse livro dias atrás. Banzo... peço licença ao povo preto para nominar minhas dores e tristezas de banzo também.

Ao ver o quanto as pessoas estão sofrendo é impossível não sofrer, não sentir essa dor indescritível no peito, uma dor dentro da gente. Esse banzo. Mas morrer e desistir da vida não resolve nada, pois a vida é uma ordem, a vida apenas, sem mistificação, já dizia meu poeta referência, Drummond.

A sensação de impotência é uma das piores sensações que o animal humano pode ter. Eu tenho comigo que foi dessa sensação que surgiram todas as formas de crenças e religiões que buscam explicar a vida através do algo para além da morte, essa fase tão real e sabida de todo ser humano. Fico até feliz quando vejo as pessoas aceitando perdas pela morte com essas conformações religiosas. Sei que isso ajuda elas na superação do luto.

Dá muita tristeza ver as pessoas queridas bebendo e usando as diversas drogas legais e ilegais para esquecer e suportar o banzo que todos estamos sentindo; é duro ver as pessoas destruindo a si mesmas. Dá uma dor impotente na gente saber que pessoas queridas estão com Covid-19 e com risco de morte por essa pandemia descontrolada por causa do regime genocida. E os genocidas seguem no poder.

Para suportar os dias e os fatos uso toda a experiência que a vida me proporcionou, sou só mais um animal humano tentando sobreviver a tudo isso. Até o momento, estou vencendo o banzo. Espero seguir sem Covid-19, sem morrer pelas outras mortes severinas tão brasileiras; eu não me importo com a minha morte, mas me importo com a consequência da minha morte na vida de pessoas queridas.

Também quero viver para ver nos tribunais o clã de bandidos que destroem nosso mundo e nossas vidas. Desgraçados do mal! Morrendo não vejo (e não sofro) com as merdas criminosas deles, mas vivo tenho a chance de ver o fim deles. Muitos sobreviveram e comemoraram o fim de lixos humanos como Hitler, Mussolini, Mengele. Vou comemorar o fim desses desgraçados no poder no Brasil destruído pelo golpe.

Tento ler literatura até como escape, mas a leitura está tão difícil! A cada parágrafo, caio da estória ficcional para a história do presente. E tenho que ficar indo e voltando, não é fácil. Mas insisto em tentar ler. É importante. Tento estudar e aprender algo novo, é importante também. O mundo vai precisar de humanos para reconstruir a sociedade, para reconstruir os humanos que sobrarem e que vierem.

Por que escrevo em blog para todos verem? Sabia a resposta quando era alguém com lugar de fala na representação política de grupos de pessoas. Escrevia para prestar contas por ser figura pública, escrevia para influenciar, escrevia para compartilhar saber. Agora não sei bem. Talvez todos nós tenhamos que registrar a história acontecendo, mesmo que seja sob a ótica da vida privada, do ser atomizado. Compartilhar para os poucos que leem nosso ponto de vista.

Tudo que sobra para o amanhã, dos seres humanos e das sociedades, são fragmentos de coisas públicas e privadas, de vencedores e de perdedores. Assim são os fragmentos que as gerações seguintes encontram e tentam reconstruir através de versões e imaginações. Fragmentos.

Banzo... fragmentos...

Como diz Drummond num outro poema seu "o essencial é viver!" (Passagem da Noite).

William

sexta-feira, 19 de março de 2021

Moby Dick - Crepúsculo



Refeição Cultural

"Sinto uma secura na fronte? Oh! Houve tempo em que, do mesmo modo que o nascer do sol me estimulava nobremente, o crepúsculo me aplacava. Não é mais assim. Essa luz adorável já não me ilumina. Toda beleza é para mim uma angústia, desde que não a posso gozar. Tenho o privilégio da alta percepção; falta-me a humilde capacidade de gozar. Sou maldito da maneira mais sutil, maldito no meio do paraíso. Boa noite, boa noite!" (p. 203)


Meus sentimentos são semelhantes aos sentimentos descritos pelo capitão Acab ao ver o crepúsculo no mar. Não consigo gozar as possibilidades das belezas da vida no contexto em que nos encontramos. Nós brasileiros estamos vivendo no inferno mesmo podendo estar no paraíso.

Como disse o linguista Gustavo Conde em sua transmissão na noite passada ou retrasada (não me lembro bem), não tem como uma pessoa normal não estar mal, triste, sofrendo, frente à realidade de mortes diárias por Covid-19, mortes evitáveis se não estivéssemos sob o comando de um regime fascista e genocida. 

Hoje ouvi uma entrevista do professor e cientista Miguel Nicolelis ao DW Brasil (de 17/3/21) e num certo momento ele comenta que viu um estudo que diz que 4 em cada 5 mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil se o governo tivesse seguido as recomendações da ciência e das autoridades mundiais sobre formas de lidar com a pandemia mundial de Covid-19. Isso quer dizer que 232.251 vidas poderiam ser poupadas da morte até agora caso não estivéssemos sob um regime genocida (morreram 290.314 pessoas no país).

Está muito difícil ler o clássico Moby Dick (1851) porque a concentração na leitura é dificultada pelas notícias ininterruptas das desgraças que se abateram sobre o Brasil após o golpe de Estado e após as eleições fraudulentas de 2018 que colocaram no poder os genocidas que governam e que apoiam o governo no parlamento (além dos canalhas apoiadores em outras instâncias da burocracia do Estado brasileiro). 

LER É PRECISO, MANTER A CULTURA É NECESSÁRIO: apesar de não ser fácil, eu me esforço para ler e vou seguir lendo. É importante para mim e para a humanidade manter a cultura e a inteligência humana vivas. Outros tempos virão. Se conseguir atravessar essa fase da história brasileira sem morrer terá sido com o esforço de aprender um pouco todos os dias, sairei dessa um pouco menos ignorante.

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MOBY DICK

"E ainda hoje não se extinguiu na mente dos baleeiros, em geral, o prestígio original do cachalote, classificado especialmente pelo terror entre todas as outras espécies de leviatãs." (p. 218)

Li menos que o desejado neste 8º dia de leitura, mas li o que foi possível. Foram cinco capítulos, sendo o último deles bem interessante. O capítulo se chamava "Moby Dick".

O narrador Ismael nos conta o que é ser marinheiro de um baleeiro e viver lidando com os maiores monstros da terra. Ele vai descrever a fama das baleias brancas, os cachalotes. Amigos leitores, estamos lendo um romance de meados do século XIX, é bem interessante a composição narrativa de Melville.

"(...) embora os outros leviatãs pudessem ser perseguidos com êxito, apontar a lança a uma aparição tal como a do cachalote não era tarefa para um homem mortal; tentar fazer isso equivalia inevitavelmente a ser despedaçado e atirado de súbito na eternidade. Sobre esse ponto podem-se consultar documentos notáveis." (p. 219)

O narrador segue descrevendo a caça às baleias brancas e falando da fama de Moby Dick, considerado por muitos como um ser imortal e sobrenatural, que podia até estar em mais de um lugar ao mesmo tempo.

Ficamos sabendo também do embate mortal entre o capitão Acab e Moby Dick, evento em que o leviatã lhe arrancou a perna.

"(...) uma vez um capitão, agarrando a faca para cortar a linha do inimigo, arremessou-se contra a baleia, como um duelista de Arkansas que avançasse procurando loucamente, com uma lâmina de seis polegadas, chegar até à profundidade da vida do cachalote. Este capitão era Acab. E foi então que, subitamente, fazendo deslizar a sua mandíbula interior em forma de foice, Moby Dick ceifou a perna de Acab, assim como um segador corta a relva num pasto." (p. 221)

E assim temos neste capítulo um resumo do que estamos fazendo no baleeiro Pequod, sob o comando do capitão Acab e tripulação, em busca de vingança, da caça do cachalote conhecido nos Mares do Sul como Moby Dick, o mais terrível leviatã daqueles tempos.

Amig@s, leiam! Leiam a ajudem a mantermos a mente humana para as gerações futuras. Caso haja interesse em ver as outras postagens sobre Moby Dick, aqui está a mais recente delas.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


quarta-feira, 17 de março de 2021

Moby Dick - Acab vai à caça da baleia branca



Refeição Cultural

"- Saca-rolhas! - gritou Acab. - Sim, Queequeg, os arpões ficam todos retorcidos e cravados nela. Sim, Daggoo, o seu jorro é enorme como um feixe de trigo, branco como uma pilha da nossa lã de Nantucket, depois da grande tosquia anual. É verdade, Tashtego, a sua cauda em forma de leque é como uma vela no meio de um vendaval. Morte e inferno, marinheiros! Vós vistes, Moby Dick! Moby Dick! Moby Dick!" (p. 198)


Estamos à bordo do baleeiro Pequod, saídos de Nantucket, Massachusetts - Nordeste dos Estados Unidos -, sob o comando do capitão Acab e os demais oficiais e marinheiros, os pilotos Starbuck, Stubb, Flask e seus arpoadores Queequeg, Daggoo e Tashtego, e juntos ao marinheiro que nos conta a estória, Ismael.

Este foi o 7º dia de leitura desta clássica e épica aventura proporcionada a nós leitores do mundo por Herman Melville, em 1851.

Na primeira semana de leitura, li entre segunda e sábado e descansei no sétimo dia... Para descansar, li um livro no domingo - Becos da Memória, de Conceição Evaristo - e outro na segunda - O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry. Retomei agora Moby Dick e vamos mais alguns dias na viagem pelos mares do mundo. Já passei da página 200.

Estamos no período mais mortal da pandemia mundial de Covid-19 no Brasil de regime genocida. Lendo quieto em casa, estou atendendo ao apelo de parte das autoridades políticas e de saúde do Brasil e do mundo. 

Temos que ficar em casa. Para quem tem condições é um dever cidadão e humanista evitar ao máximo sair e se aglomerar com outras pessoas para evitar pegar o vírus e disseminar sua contaminação para os nossos semelhantes. 

Estamos chegando a 300 mil mortos no país e o sistema de saúde colapsou, quase não há leitos disponíveis na maior parte dos Estados brasileiros. As pessoas podem morrer em consequência dos efeitos da infecção pelo vírus Sars-Cov-02 e por qualquer outra necessidade hospitalar. Entendem isso?

Lendo em casa, estou fazendo a minha parte como cidadão, como ser humano consciente e educado. Ficando em casa, faço o possível para sobreviver a essa tragédia humanitária que vivemos. Quero viver porque a vida vale a pena, quero viver para amar e estar com as pessoas, quero viver para ler os clássicos da literatura e para contribuir para um mundo melhor de alguma forma. 

Quero viver para ver julgados e condenados os genocidas e criminosos no poder.

Leiam! Não deixem a literatura morrer! Não deixem seus cérebros atrofiarem suas capacidades cognitivas!

Aos interessados na postagem anterior, clique aqui.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


terça-feira, 16 de março de 2021

18. O Pequeno Príncipe - Saint-Exupéry



Refeição Cultural - Cem clássicos

Estamos vivendo tempos difíceis, tempos de pandemia, tempos de bolsonarismo no Brasil, regime da morte que a história classificará no futuro como classificou os regimes fascistas e nazista da primeira metade do século XX.

Nesta segunda-feira, 15 de março, acabei relendo O Pequeno Príncipe, do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, livro de 1943. Foi uma leitura por acaso, mas já que estou contando meus clássicos, lá vai a postagem pra contar mais uma obra lida.

Meu blog é um diário aberto, começou com intenções bem legais de compartilhamento de conhecimentos - What I Know Is (wiki) -, lá na época do nascimento da Wikipedia, e a vida foi caminhando e o mundo mudando. 

Fui blogueiro quando fui estudante de Letras, fui blogueiro quando fui dirigente sindical e diretor de entidade de saúde, em mandatos de representação. Tudo isso passou. O blog seguiu. Agora sou blogueiro, um cidadão do planeta terra. Não poderia dizer que sou escritor. Menos, né! Será que posso dizer que sou "blogueiro"? "O que você faz? Sou blogueiro..." (não sei, mas é tão ruim não ser nada...)

Enfim, acordei nesta terça 16 pensando nisso (por que ainda escrevo no blog? Acho que é porque é horrível não ser nada). 

Ontem, não pude sair para correr no fim da noite porque começou o horário com restrições de circulação a partir das 20h (a pandemia está mortal demais!) e eu vinha correndo depois desse horário. Aí peguei O Pequeno Príncipe, que estava de bobeira sobre o móvel, pois minha esposa acabara de colocar uma capa de plástico na velha edição. É uma leitura que sempre emociona... você é responsável por aquilo que cativas...

A edição que li é de 1974, com ilustrações originais em aquarelas do próprio autor e com tradução de Marcos Barbosa.

A outra edição que li e fiz postagem foi uma edição em inglês. A postagem de 2011 pode ser lida aqui. Nela estão diversas citações e passagens interessantes da obra clássica. A leitura de ontem foi mais descompromissada.

Li dois livros em dois dias, no domingo e na segunda. No domingo li um belo romance de Conceição Evaristo, Becos da Memória (ler aqui). Essas leituras foram feitas no intervalo de uma leitura clássica de maior fôlego que comecei na semana passada, Moby Dick. Voltarei agora para Melville.

Vamos vivendo. Vamos lendo. O ser humano mudou após o advento das redes sociais e das tecnologias da informação e da comunicação. Já não nos bastamos, agora só achamos que valemos alguma coisa se somos reconhecidos pelo mundo externo a nós mesmos. A gente escreve por causa dessa coisa que viramos.

William


segunda-feira, 15 de março de 2021

Leitura: Becos da Memória - Conceição Evaristo



Refeição Cultural

INTRODUÇÃO

Estamos no mês de março. Estamos no Brasil de regime neofascista e genocida em consequência de um golpe de Estado ocorrido em 2016 - desta vez colocaram no poder os maiores corruptos e lesas-pátrias jamais colocados no poder somando todos os golpes brasileiros. O Brasil é o epicentro da pandemia mundial de Covid-19 e o regime no poder é o maior parceiro do vírus Sars-Cov-2. Brasil e brasileiros, párias do mundo!

Estamos em um dos países mais racistas do mundo, país onde a escravidão humana permanece até hoje, de forma disfarçada desde 13 de maio de 1888, quando deram uma canetada jogando na miséria milhões de pessoas de pele preta para que morressem de fome sem pão, sem terra, sem trabalho. País com 5 séculos de escravidão. País que mais mata negros no mundo, de morte matada e de morte morrida (matada também, sem direitos de cidadania).

Neste domingo, 14 de março de 2021, completaram-se 3 anos do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, metralhados por milicianos do Rio de Janeiro, a mando de alguém ainda não revelado pelas autoridades. O Brasil não é para amadores. As forças políticas que organizaram o golpe e a destruição do país estão no poder, infiltradas em todas as instituições da sociedade através de seus representantes, serventes, lacaios e capitães do mato modernos. 

(Sabem quem foi solto neste 14 de março, dia do assassinato de Marielle Franco? O deputado troglodita e fascista que se elegeu às custas de quebrar uma placa em homenagem à Marielle... ele estava preso por ameaçar autoridades e neste domingo foi para prisão domiciliar... esse é o Brasil: solto no dia da morte de Marielle!)

BECOS DA MEMÓRIA

"Escrevo como uma homenagem póstuma à Vó Rita, que dormia embolada com ela, a ela que nunca consegui ver plenamente, aos bêbados, às putas, aos malandros, às crianças vadias que habitam os becos de minha memória. Homenagem póstuma às lavadeiras que madrugavam os varais com roupas ao sol. Às pernas cansadas, suadas, negras, aloiradas de poeira do campo aberto onde aconteciam os festivais de bola da favela..." (p. 17)

A "introdução" no início da postagem é a descrição do contexto em que peguei para ler neste domingo pela manhã o livro Becos da Memória, da escritora Conceição Evaristo, livro escrito por ela nos anos oitenta e publicado em 2006 e depois republicado em outras edições - a minha é de 2017 pela Pallas Editora. É o 3º livro que tenho o privilégio de ler desta intelectual mineira, mulher negra e com uma escrita que nos toca profundamente e nos põe a pensar a vida e o mundo após cada leitura sua. (ler aqui sobre Ponciá Vicêncio e aqui sobre Olhos D'Água)

Amig@s, passei o dia de domingo na companhia das personagens do livro Becos da Memória. Foi inevitável passar o dia revirando os becos de minha memória. Lia Evaristo e via o bairro Marta Helena, onde cresci em Uberlândia, Minas Gerais. Lia Evaristo e visitava as diversas casinhas onde moramos, onde morei (em MG e em SP). Lia Evaristo e via a condição da gente pobre, favelada, da gente preta, da gente miscigenada de peles multicores, mas com cabelo "ruim", como ensinam os brancos que cultuam os preconceitos.

Li Evaristo e passei o dia visitando os becos de minha memória... eu tenho pele branca, tenho irmã preta, tenho família de pele multicor. Família de cabelo "ruim". Todos viemos da pobreza descrita na obra de Evaristo, que aborda o mundo miserável e as condições injustas e absurdas da gente de pele preta escravizada e depois "libertada" na condição de morte sem pão, sem terra, sem trabalho, como os ascendentes da personagem Maria-Nova.

Evaristo nos conta, na edição que tenho, um pouco da história e da gênese do romance. É bem interessante.

"Foi o meu primeiro experimento em construir um texto ficcional con(fundindo) escrita e vida, ou, melhor dizendo, escrita e vivência. Talvez na escrita de Becos, mesmo que de modo quase que inconsciente, eu já buscasse construir uma forma de escrevivência."

GÊNESE: "Em poucos meses, minha memória ficcionalizou lembranças e esquecimentos de experiências que minha família e eu tínhamos vivido, um dia. Tenho dito que Becos da memória é uma criação que pode ser lida como ficções da memória. E, como a memória esquece, surge a necessidade de invenção."

NADA É VERDADE, NADA É MENTIRA: "Entre o acontecimento e a narração do fato, há um espaço em profundidade, é ali que explode a invenção. Nesse sentido venho afirmando: nada que está narrado em Becos da memória é verdade, nada que está narrado em Becos da memória é mentira. Ali busquei escrever a ficção como se estivesse escrevendo a realidade vivida, a verdade."

BANZO: "Na roça, às vezes, meu pai contava histórias e dizia sempre de uma dor estranha, que nos dias de muito sol, apertava o peito dele. Uma dor que era eterna como Deus e como o sofrimento.

     "Totó entendia, era menino, mas, de vez em quando, sentia aquela punhalada no peito. Uma dor aguda, fria, que sem querer fazia com que ele soltasse fundos suspiros. O pai de Totó chamava aquela dor de banzo." (p. 19/20)

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BANZO... uma dor no peito que podemos muito bem nominar a dor que sentimos desde o golpe de Estado no Brasil, desde aquela sessão do congresso em que o lixo fascista falou de Ustra... aquela dor que passamos a sentir no peito ao ver as ofensas a Dilma, ao ver a prisão injusta de Lula, ao ver as 270 mil mortes por Covid-19 por culpa do regime fascista, a dor no peito a cada absurdo, a cada perda, a cada humilhação que sofremos como brasileiros por sermos do país dos bolsonaros. Banzo...

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Amig@s leitores, leitura profunda! Passei o domingo visitando os becos da memória...

- Marielle vive porque seus ideais são os nossos ideais!

William


Bibliografia:

EVARISTO, Conceição. Becos da Memória. 1. ed. - Rio de Janeiro: Pallas, 2017.


sábado, 13 de março de 2021

Moby Dick - Uma aula sobre baleias (em 1851)



Refeição Cultural

Ufa! O sábado 13 de março está terminando. Hoje foi o 6º dia de leitura do clássico do escritor norte-americano Herman Melville. Não li pela manhã como ocorreu entre segunda e sexta-feira. Tive uma agenda cultural diferente (agenda de quarentena de pandemia mundial de Covid-19). 

Pela manhã, assisti ao filme de Francis Ford Coppola, O poderoso chefão, de 1972. Foram mais de 3 horas de filme. Havia relido o livro semanas atrás (ver comentário aqui). Agora vou ver os três filmes baseados no clássico de Mario Puzo. Eu não gosto de ver filmes antes de ler ou reler os livros nos quais eles foram baseados.

A leitura de hoje de Moby Dick foi um pouco cansativa, talvez porque eu estivesse cansado. Para se ter uma ideia, li umas dez páginas e vi que não estava bom o meu entendimento e acabei relendo tudo. Entendo que minha fase de leitor me exige um pouco isso, ser um leitor atento. Enfim, vou até descansar da viagem pelos mares no domingo e ler outra coisa.

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MOBY DICK

"Entretanto, se passarmos em revista todas as alusões sobre o Leviatã feitas pelos grandes poetas da antiguidade, ficareis convencidos de que a baleia da Groelândia era para eles o monarca sem rival dos mares. Chegou porém o tempo de se fazer nova proclamação. Aqui é Charing Cross! Ouvi todos, bom povo: a baleia da Groelândia foi deposta. Reina agora o grande cachalote!" (p. 166)


Li 6 capítulos neste sábado. Conheci Acab, o capitão principal do baleeiro Pequod. Ele perdeu uma perna em uma de suas pescas de baleia. Tem uma perna postiça.

"mal notei que não pouco da sua fealdade predominante era devido àquela perna branca, exótica, sobre a qual ele se mantinha. Antes de mais nada, já me ocorrera a ideia de que aquela perna de marfim fora fabricada com o osso polido da mandíbula de um cachalote." (p. 155)

O papel do narrador na estória é muito importante, ele é um narrador personagem. Ismael é membro da tripulação do Pequod. Ele nos lembra também da importância de alguns membros do navio. Abaixo, ele está falando dos três pilotos:

"Na verdade, dificilmente se poderiam encontrar melhores tripulantes e oficiais, cada qual à sua maneira, e todos três eram americanos: um natural de Nantucket, outro de Vineyard e o terceiro do cabo Cod." (p. 154)

O capítulo "Cetologia" é magistral! Eu fiquei impressionado com as descrições científicas sobre peixes e baleias com direito a citações da época, atualizadas até o ano anterior ao lançamento da obra, 1851. 

Claro que a obra é literatura de ficção, mas a qualidade da técnica ficcional chama a atenção do leitor, auxilia na economia da obra e dá verossimilhança à narrativa. Li até um trecho para meu filho que estuda Biologia para ele ver que legal.

"Não pretendo dar uma descrição anatômica minuciosa das várias espécies ou - pelo menos aqui - apresentar uma longa descrição. Meu objetivo é simplesmente traçar o esquema de uma sistematização da cetologia. Sou arquiteto e não construtor." (p. 167)

O narrador descreve um conceito da época:

"em alguns setores debate-se ainda a questão de saber se a baleia é ou não um peixe. No seu Sistema da natureza, 1776 da era cristã, Lineu declara: 'Portanto, separo as baleias dos peixes'. Mas pelo que sei, até o presente ano de 1850, os tubarões, os sáveis e os arenques, contra o decreto de Lineu, dividem ainda a posse dos mares com o Leviatã." (p. 167)

Logo abaixo, o narrador manda sua opinião e segue adiante com sua narrativa.

"Deve-se dizer, evitando toda polêmica, que adoto a antiga tese de que a baleia é um peixe e recorro ao santo Jonas para me apoiar." (p. 167)

Bem, vamos respeitar porque a narrativa é dele e não nossa (rsrs).

Enfim, serão páginas e páginas de descrição de baleias, segundo o conceito adotado pelo narrador.

Encerro a postagem e vamos descansar um pouco de Moby Dick. A leitura não é leve como foram alguns dos livros que li recentemente. Sei que estou superando uma lacuna cultural importante, uma ficção referencial na linguagem contemporânea.

Abraços aos leitores amig@s. Caso haja interesse em ver postagens anteriores, é só começar por esta aqui, que vai da mais recente até a primeira, em retrospectiva. Para ler na ordem cronológica, é só acessa o blog por plataformas que mostrem a página inteira.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


sexta-feira, 12 de março de 2021

120321 - Diário e reflexões



Opinião (ou reflexão, ou explosão, sei lá o que é isso!)


Brasil dos bolsonaros, dos bolsonaristas (e dos isentões). Dos cafajestes da casa-grande manipuladora dos miseráveis brasileiros (até dos miseráveis com alguns tostões, dos idiotas tipo "sou classe média"). Sexta-feira de mais uma semana mortal de Covid-19. São 275.105 mortes desde que se noticiou a primeira morte pelo novo coronavírus há um ano. Mas aqui é o país dos bolsonaros, a expansão das armas de fogo de todos os calibres segue firme e forte, e agora armas sem rastros de origem.

Mas ainda tem patrimônio público pra entregar pros golpistas, pros gringos, pros "empresários" de colarinho branco, pra casa-grande, então o genocídio seguirá nos próximos dias semanas meses, ao custo de umas 60 a 90 mil mortes por mês (só por Covid-19, fora os milhares de mortos por falta de leitos em hospitais para qualquer outra necessidade - até dos "classe média" com algum tostão). E os doentes, então? Seremos uma terra de sequelados pela Covid-19 e pelas doenças severinas, que nos levam a diversas mortes severinas.

Mas ainda tem direitos sociais do povo brasileiro pra eliminar. Esta semana mesmo foderam os servidores públicos em troca de uns trocados de auxílio emergencial para o povo (PEC 186). Os servidores não terão mais reajustes por uma porrada de anos, igual fizeram com o SUS e a educação... mas fiquem tranquilos, os banqueiros e rentistas continuam com os seus direitos sociais garantidos!

Então, segue o genocídio, com apoio de todas as outras instituições da sociedade burguesa e capitalista brasileira. Apoio do parlamento. Apoio dos meios midiáticos empresariais. Apoio dos órgãos de "justiça". Apoio dos bilionários. Apoio de parte dos "crentes". E, lógico, apoio de uma parte da população que se identifica e se vê representada pela canalha que colocaram no poder. Se os bolsonaros não tivessem apoio, não estávamos nesta situação infernal.

Essa é a realidade pra registrar. Que mais além de mortes? Tem a volta de Lula ao cenário político. Mas ainda assim, tem as mortes sem prazo pra acabarem. Tem uma esperança por aí ao vermos Lula. Mas não veremos uma mudança para melhor da noite para o dia, não é assim que funciona. Por enquanto, o cenário dos próximos dias semanas e meses é de mortes... unfortunately!

Estou azedo neste fim de dia. Às vezes, isso é preciso, depois de tantos anos de desgraça ao nosso redor é difícil manter o humor e a paciência o tempo todo.

É isso. Eu não tenho medo de morrer. Nunca tive. Mas se tiver um AVC ou infarto (ou uma diarreia mortal) a qualquer momento e morrer, como aconteceu nesta semana com o senhor da feira com quem comprava bananas toda semana (faleceu após um AVC), poderia dizer que estou preparado para o fim? Não sei, talvez ficassem coisas várias a serem feitas ainda. 

E se o vírus desgraçado estiver em mim e eu morrer? Morto não sentiria nada, mas seria uma tristeza para algumas pessoas amadas. (sabe, é tão chocante receber a notícia de mortes como a do senhor da barraca da feira... a vida é um instante. Eu comecei a perguntar o nome de todo mundo com quem lidamos diariamente e nem cheguei a perguntar o nome dele. Que foda essas mortes assim! Meus sentimentos aos familiares e amigos dele)

Chega de registros por hoje. Tô meio de saco cheio. Amanhã estarei melhor...

William


Moby Dick - Nos lançamos ao mar



Refeição Cultural

"Ao mesmo tempo preparou o Senhor um grande peixe, que engoliu a Jonas: e Jonas esteve no ventre do peixe três dias e três noites. (Jonas, II, 1.)"  (MELVILLE, 1998, p. 11)


A leitura de Moby Dick nesse 5º dia foi num horário diferente do planejado. Tenho tentado dormir mais cedo para acordar um pouco mais cedo para ler de manhã, mas nesta madrugada despertei antes das 6h e não consegui dormir mais. Então embarquei no Pequod com a tripulação e nos lançamos ao mar. (caso haja interesse na postagem anterior, é só clicar aqui)

Consegui ler bem e avançar na narrativa. Já se foram 150 páginas e parei e deixei para amanhã o capítulo chamado "Acab". Finalmente vamos ter contato com o capitão Acab (ou Ahab em inglês). Já estamos em alto mar, zarpamos de Nantucket com destino aos Mares do Sul, pelo que entendi, vamos descer todo o Atlântico e contornar o Cabo Horn, lá no Extremo Sul da Patagônia para atingir o Pacífico.

Eu confesso que a leitura de Moby Dick para um militante político como fui a vida toda em um momento da vida nacional como este não é fácil, não é fácil. Mas é necessário! Para minha sanidade e para sobreviver, já que uma das coisas que posso fazer para contribuir socialmente com o povo brasileiro é ficar em casa, com a família, e evitar pegar o vírus e transmiti-lo aos outros.

Viajar é preciso, e a literatura de ficção e certos tipos de leituras nos permitem isso. Concentrando, consigo viajar com Melville; sem concentração, a cabeça se pega nas desgraças do momento. Mas é importante tentar a leitura literária. 

OPINIÃO: me incomoda tanto pensar que pouca gente do povo tem lido, os trabalhadores não devem estar lendo quase nada, as pessoas do povo estão trabalhando como escravos, estão por sua conta e risco sem direitos básicos; os que poderiam ler mais estão o dia todo em jogos e nas redes sociais, e ainda têm as séries, que vieram para capturar os antigos leitores de literatura. Não sou contra jogos nem séries, mas sei que essas coisas estão matando a leitura e a capacidade literária da humanidade.

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O TUBARÃO QUE HABITA EM NÓS

"Não ponhas a perder o nosso arpoador. Nunca se viu dizer que arpoadores religiosos fossem hábeis no ofício. A religião tira-lhes de dentro o tubarão. E um arpoador que não tenha em si um pouco de tubarão não vale um caracol." (p. 118)

Esse fragmento está na parte da estória em que os capitães do Pequod estão escolhendo a tripulação para se lançar por 3 anos ao mar na pesca da baleia. Estão avaliando se aceitam o canibal Queequeg ou não. Eles o aceitaram após ele demonstrar o quanto é bom com o arpão.

Ao entrar no capítulo "Indo para bordo", parei a leitura por um instante. Era perto de 7 horas da manhã. Estava lendo na cozinha. Ouvia os passarinhos lá fora. Olhei pela janela (a foto da postagem) e vi os bem-te-vis brincando na piscina vazia do prédio em frente. Vi passarem diversas maritacas. Me lembrei das viagens a Porto de Galinhas, o cheiro do mar, os bem-te-vis brincando por lá. A ficção nos ajuda a viajar, tanto na obra quanto na imaginação.

O FRIO DO NORDESTE DOS EUA NO NATAL

"Finalmente a âncora foi levantada, içaram-se as velas e deslizamos pelo mar afora. Era um Natal frio e rude, e à medida que o breve dia nórdico surgia da noite encontramo-nos quase em pleno oceano hibernal (...) imensos flocos de gelo, encurvados, pendiam da popa." (p. 133)

Essa passagem de Moby Dick me trouxe a lembrança dos dias que passei em Nova York em uma semana de dezembro de certo ano. Foi uma lembrança tão fácil, pois me lembrei do frio e do gelo no alto do Empire State Building, do gelo na baía em frente à Estátua da Liberdade e do frio que senti naqueles dias.

Enfim, li capítulos muito interessantes nesta manhã de 5º dia de leitura. O capítulo "O advogado" discorre sobre a profissão dos baleeiros naquela época, meados do século XIX. Falou-se de séculos de caça à baleia pelo mundo, até sobre o mundo antigo.

Por fim, Ismael, narrador e personagem presente no navio Pequod, nos apresentou as 3 duplas de pilotos e arpoadores. Um dos pilotos teve um capítulo só para ele, Starbuck. Ele faz dupla com Queequeg num dos botes. Os outros dois pares são Stubb, o 2º piloto, com Tashtego, e o 3º piloto Flask com Daggoo Aasvero.

Na leitura de amanhã, estaremos no Pequod com o capitão Acab e sua tripulação. Se os fados me permitirem, é claro. 

(os tempos estão terríveis! Há instantes, soube da morte do senhor que me atendia numa das barracas da feira. Teve um AVC... como somos frágeis!)

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.


quinta-feira, 11 de março de 2021

Moby Dick - Conhecemos o navio Pequod



Refeição Cultural

"Todos os homens tragicamente grandes têm em si algo de mórbido." (MELVILLE, 1998, p. 101)


Nesta manhã de quinta-feira, li dois capítulos de Moby Dick. Foram tantas as informações que acabei parando neles. No capítulo chamado "Chowder", vemos Ismael e Queequeg se hospedarem na estalagem A Panela, na ilha de Nantucket. Chowder é uma espécie de guisado de peixes ou mexilhões com carne de porco e outras coisas.

O nativo Queequeg tem uma espécie de ídolo negro chamado "Yojo", um pequeno artefato, para o qual dirige suas orações. Lá no início da narrativa, quando Ismael conheceu Queequeg na Estalagem do Jorro, soubemos que ele tem consigo uma machadinha de índios norte-americanos, um tomahawk, que também serve de cachimbo a ele, que fuma através do cabo.

O capítulo seguinte - "O navio" - é muito importante por trazer diversas informações para o desenvolvimento da estória. Ismael sempre nos lembra que seu futuro está nas mãos dos fados, da providência. Essa questão dos fados se mostra mais uma vez ao Queequeg sugerir que Ismael vá sozinho ao cais para acertar em qual baleeiro eles vão se lançar ao mar. Yojo foi o responsável por essa decisão de Ismael ir sozinho ao cais.

Assim conhecemos o navio Pequod, "todos os leitores devem saber muito bem que é o nome de uma célebre tribo de índios de Massachusetts, hoje tão extinta como os antigos medos". (p. 96)

Pequod é um navio pequeno e antigo, com mais de meio século de viagens pelos mares. Seu antigo comandante é o capitão Peleg, que junto com o capitão Bilbad, são proprietários da embarcação, que tem ainda outros proprietários acionistas: viúvas, órfãos e magistrados. Pequod é de propriedade coletiva.

Ismael pergunta pelo capitão atual do navio e descobre alguma coisa sobre ele, seu nome é Acab (Ahab em inglês), nome com origem nas escrituras sagradas, como a maioria dos nomes dos moradores de Nantucket, local colonizado pelos quacres, uma seita antiga. O capitão Acab perdeu uma perna na última viagem no baleeiro, num embate com uma baleia.

PLR (Participação nos Lucros e Resultados)

Pasmem! E não é que fui encontrar PLR na obra clássica Moby Dick! A vida da classe trabalhadora é dura já faz muito tempo! Essa questão de remuneração variada, invenção dos proprietários para explorar os trabalhadores despossuídos de seus meios de subsistência ao compartilhar os riscos e embolsar os lucros é antiga.

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"Sabia já que no negócio da pesca de baleia não se pagavam salários, mas todos os marinheiros, inclusive o capitão, tinham certa participação nos lucros. Essas porções eram chamadas tantos e proporcionais ao grau de importância dos respectivos cargos desempenhados." (. 103)

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Para aqueles que achem que isso é um bom negócio para o trabalhador, é só ver o que o próprio Ismael calcula logo adiante. Ele imagina poder sobreviver durante os 3 anos de serviços porque o dinheiro dará para ele comer e só.

"E, ainda que o tanto de 275 avos fosse o que se convencionava chamar um tanto muito fracionado, era, ainda assim, melhor do que nada; e se tivéssemos uma viagem proveitosa, o dinheiro talvez desse para pagar a roupa que eu gastasse, sem falar na minha alimentação durante três anos a bordo, pela qual não teria de pagar nem um centavo." (. 104)

Que coisa, heim! A exploração dos seres humanos é uma coisa muito antiga. É a mesma lógica da escravidão moderna, um proprietário de terras coloca um monte de gente para trabalhar nas suas colheitas e as pessoas gastam o que ganham para comer na própria fazenda. Ao final, ainda estão devendo. O mesmo nas fábricas de roupas, sapatos, peças etc. Nos bancos temos os PRs, programas por resultado: um diretor e um gestor ganham 100 mil e um trabalhador na ponta ganha 500 reais.

É isso! Fim das leituras por hoje, 4º dia de viagem com Moby Dick. Se houver interesse em ler as outras postagens sobre a leitura é só clicar aqui, a última feita.

William


Bibliografia:

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Berenice Xavier. São Paulo: Publifolha, 1998.