domingo, 28 de fevereiro de 2021

17. O chefão - Mario Puzo



Refeição Cultural - Cem clássicos

"Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual." (CALVINO, 2000, p. 10/11)


Eu li O chefão (1969), de Mario Puzo, ainda na adolescência. Pela lembrança que tento puxar da memória, li o livro antes dos 17 anos porque acho que a leitura foi anterior a minha volta para São Paulo, depois de morar muitos anos em Uberlândia. Se não me engano, a edição que tenho foi a que li, quando meu primo Jorge Luiz me emprestou na época. Estou com ela porque ele deu seus livros e ganhei alguns deles faz alguns anos.

Peguei o livro para reler no dia 8 de fevereiro desta época pandêmica e de sobrevivência humana sob o poder das máfias no Estado brasileiro. Meu filho estava assistindo aos filmes baseados na obra de Mario Puzo e ao comentarmos a respeito da estória, disse a ele que havia lido o livro na adolescência. Como fiquei interessado em ver os 3 filmes dirigidos por Francis Fort Coppola, pensei comigo: "- Por que não reler antes o livro?". E assim, peguei pra ler o bichão.

O livro é um catatau, é um texto grande. Achei que seria uma leitura rápida, mas não foi. A edição que tenho está dividida em 9 livros. Após ralar na leitura, ainda faltam 100 páginas para acabar. Mas adianto que foi muito bom reler esse clássico da literatura mundial. No livro VI, que retrata o tempo que Michael Corleone passou na Sicília, revi aquela cena que achei interessante o filme ser fiel ao livro, o fato de o personagem ficar com o nariz escorrendo desde que levou o soco que lhe quebrou a mandíbula e lhe deformou o rosto.

Ao reler décadas depois a ficção de Puzo sobre a máfia, estando vivendo sob o domínio da máfia no país em que moro, vemos o quanto é interessante um dos conceitos que Calvino sugere sobre os clássicos (citado acima). Quando adolescente, eu vivia num bairro dominado pela Falange e se não fôssemos "amigos" dos caras, não vivíamos no bairro. O livro sobre a máfia retrata isso. E agora vivemos sob o domínio da máfia em escala gigantesca, nacional. Eu sou outro, o mundo é outro, mas a ficção segue atual. Pobres daquelas e daqueles que hoje não são amigos dos bandidos de colarinho branco no poder.

Tenho que intercalar livros novos com livros a reler, como diz Calvino: "Por isso, deveria existir um tempo na vida adulta a revisitar as leituras mais importantes da juventude. Se os livros permaneceram os mesmos (mas também eles mudam, à luz de uma perspectiva histórica diferente), nós com certeza mudamos, e o encontro é um acontecimento totalmente novo." (p. 11)

A leitura está em andamento, e a postagem também. O blog é um espaço vivo e mutante. Vamos terminar as 100 páginas e vamos assistir aos 3 filmes de Coppola.

Por enquanto é isso. Volto à postagem depois. (28/2/21)

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Fim da leitura do livro em 2/3/21.


COMENTÁRIO PÓS LEITURA

A leitura não foi difícil. Puzo utiliza linguagem cotidiana no texto. O livro contém todos os preconceitos inerentes ao seu tempo, racismo e sexismo são constantes e nos incomodam ao ler a estória. A narrativa sobre o poder das máfias na constituição da sociedade norte-americana é muito bem construída. A trama se passa durante a primeira metade do século XX, indo e voltando ao início do século e ao momento pós 2ª GM.

As famílias dos mafiosos resolvem as coisas comprando autoridades, colocando elas em suas folhas de pagamento, ou simplesmente matando as pessoas que atravessam seus caminhos. Don Vito Corleone, o padrinho, utiliza um sistema baseado em fazer um favor para quem lhe pede algo e a pessoa fica lhe devendo uma. Um dia a pessoa terá que lhe pagar o favor. Don Corleone chama a isso de "amizade", ele é amigo dessas pessoas que lhe devem algum favor. A ficção é atemporal, basta vermos a realidade do país onde vivo, o Brasil, ou a Colômbia, por exemplo.

É isso! Essa ficção nos lembra que sem instituições que funcionem corretamente no Estado, na sociedade onde vivemos, estamos sós, estamos por nossa conta. O Brasil pós golpe de Estado em 2016 está assim. A máfia e as milícias tomaram o poder e a insegurança e o risco de morte e perseguição se tornaram a nossa realidade.

Triste isso! Viver sob o domínio das máfias.

William

Bibliografia:

CALVINO, Italo. Por que ler os clássicos. Tradução de Nilson Moulin. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.


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