Opinião
Todos estamos adoecendo com a destruição do país, e não haverá médicos nem remédios, nem para pobres nem para remediados. É o fim do país que fomos, inclusive considerando o passado colonial
Não estou com nenhum entusiasmo para escrever. Depois de mais de quatro décadas de existência buscando me libertar da ignorância, do desconhecimento, do analfabetismo funcional, dos preconceitos que carreguei comigo, depois de lutar anos e anos para me libertar de todo o ódio que senti do mundo, da vida, da sociedade, das injustiças sociais, dos ricos e bilionários responsáveis pelas desgraças dos pobres e do povo, depois desse percurso tentando ser uma pessoa melhor, vem o retrocesso civilizatório que estamos presenciando dia após dia no mundo e no novamente brazil-colônia neste início de século e milênio.
Por que escrever algo, registrar sentimentos e reflexões, descrever eventos e fatos que ficarão marcados na história pessoal, social e humana? Acho que a resposta seria simples: porque as pessoas que virão depois de nós têm o direito de saber como foram as coisas no passado, e por que as coisas aconteceram como aconteceram.
Que saberíamos sobre o nazismo se não houvesse relatos de pessoas da época, tanto olhando de fora quanto de dentro daquilo?
Os leitores do filólogo judeu-alemão Victor Klemperer não saberiam sobre a linguagem do Terceiro Reich se ele não tivesse, de forma abnegada, se agarrado aos seus diários durante anos e anos de observação e de sobrevivência ao regime de Hitler, Goebbels e lixos humanos assemelhados. Que saberíamos sobre os pensamentos, sonhos e pontos de vista de uma jovem judia escondida com a família entre paredes falsas e sótãos na Holanda ocupada, fugindo do ódio exterminador nazista, se Anne Frank não tivesse registrado isso em seu diário?
Enfim, está difícil encontrar energia para escrever. Até porque os textos produzidos com grande trabalho de pesquisa e dedicação de horas de concentração, acabam por serem lidos cada vez por menos leitores, e os alfabetizados funcionais parecem estar rareando por aí, neste momento da história humana.
As coisas que me incomodaram muito nesses dias, que amarguraram meu coração e adoeceram meu ser, física e psicologicamente, foram os temas ligados às consequências do golpe de Estado aplicado no Brasil, com a retirada do Partido dos Trabalhadores do poder por uma nova técnica de golpe - o lawfare.
O impeachment sem crime de responsabilidade de Dilma, a prisão política de Lula sem crime algum (inclusive com a morte de sua companheira de toda a vida, Dona Marisa, morte por tortura psicológica e humilhação a ela e família), e a provável morte de Lula pelo mesmo mecanismo de tortura psicológica (é difícil este homem de 73 anos continuar resistindo a tanta violência contra sua honra), têm abalado a saúde de muita gente brasileira, muita mesmo, mas como as doenças crônicas são invisíveis e sem sintomas, poucos farão associação com a desgraça estatística do adoecimento que vem por aí.
Uma metade da população está adoecendo violentamente com as tristezas que estamos passando ininterruptamente pela destruição acelerada do país após o golpe de 2016, após a retirada dos direitos do povo e com a destruição do patrimônio nacional em benefício de agentes externos ao país. A doença tristeza e desesperança no amanhã se soma à doença desemprego ou subemprego para destruir a saúde dessa geração.
A outra metade da população está adoecendo, e também não sabe disso. Está doente crônica com todo o ódio, preconceito e cinzentice que carrega em si (me lembrei do prefeito do tudo cinza), com toda a virulência nauseabunda que carrega em seu cotidiano contra os imaginários comunistas, bolivarianos, doente de ódio contra petistas (petralhas), gays, sindicalistas, negros, nordestinos, professores do mal, estudantes do mal, corruptos alheios do mal (eles não são corruptos, hahaha). Doente crônica essa outra metade de brasileiros ricos, remediados e também os pobres-coitados de direita alimentados pelas máquinas de ódio que nos lembram as Teletelas do Grande Irmão, no distópico "1984", de Orwell. (ai geração cara na tela...)
Essa metade doente vibra e comemora qualquer idiotice ou tragédia como "Escola sem partido", o fim do convênio Cuba-Brasil no programa "Mais Médicos" e o consequente fim do atendimento a mais de 30 milhões de seres humanos em quase dois mil municípios do país. Comemoram a nomeação de uma equipe de governo escolhida cada ministro entre os piores de seu segmento, enfim, essa outra metade, "vencedora" nas eleições, está tão doente quanto a outra metade 'perdedora", mas esse adoecimento do Brasil não será facilmente captado pelas estatísticas da tragédia brasileira.
A saúde do povo brasileiro, mais os pobres que só têm o SUS, mas também os remediados, aquele povo que acha que é classe média porque tem plano de saúde por causa de sua relação empregatícia, a saúde brasileira vai degenerar de forma irrecuperável. Seremos um subproduto humano na nova experiência da guerra pela hegemonia política e econômica do planeta. Nenhum país, nenhum povo, foi tão cachorro, tão miserável e tão estúpido de se entregar para os Estados Unidos como o povo de meu país, sem lutar, sem resistência alguma, só com a docilidade e ignorância histórica de ser manipulado sempre pela casa-grande.
Estamos doentes, crônicos do corpo e da alma. As perspectivas do que vem por aí são terríveis. Mas podemos inverter esse quadro a qualquer momento, porque a história humana é feita de imponderáveis... (que venha um logo!)
William
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