quinta-feira, 5 de julho de 2012

Instantes - Algo de sentimento da morte

A morte e o cavaleiro - cena do filme "Sétimo Selo" de Ingmar Bergman.

Não sei se começo de trás pra frente ou de frente pra trás.

Fiquei semanas esperando a ligação fatídica, aquela que recebi lá no Ceará informando que minha avó havia acabado de morrer.

As coisas não têm relação lógica. Não sei porque fiquei com o nome e o desejo de ler naquela hora o livro de J. D. Salinger - O apanhador no campo de centeio.

Procurei o livro no aeroporto em Fortaleza e não o encontrei. Procurei o livro no aeroporto de Brasília e não o encontrei. Fui para o velório, para a dor e a tristeza em Uberlândia. Não consegui chorar hora nenhuma naquela noite que passei ao lado do caixão de minha avó.

Fui uma das quatro pessoas da família que se ofereceram pra passar a noite ao lado do corpo de minha avó.

Só consegui chorar no cemitério, depois que todos saíram da frente do túmulo e tive alguns instantes com minha avó e tia Alice - duas pessoas simples que marcaram muito minha vida.


Em fevereiro deste ano, também vivi a sensação de achar que perderia um dos pilares de minha vida. Meu pai infartou e fiquei uma semana ao lado dele nas noites e madrugadas, aguardando pela sua sobrevivência.


No intervalo de quase dois meses de internação de minha avó, minha mãe fraturou a coluna e hoje se encontra numa cama torcendo para se recuperar e voltar a andar.


Trouxemos meu pai para São Paulo no último domingo à noite, pois minha mãe ligou dizendo que meu pai estava quase morrendo em casa e se negava a aceitar chamar a ambulância para levá-lo para o SUS de Uberlândia - a UFU. Trouxemos, então, meu pai para São Paulo. Fomos buscá-lo no aeroporto de Campinas no domingo à noite.

Meu paizinho tem diversos problemas de saúde e é  um sobrevivente e lutador. Mas o cara é um camarada difícil de lidar. Tá no sangue!

Fui na segunda-feira de manhã com meu pai para o HU da USP. Após umas cinco horas de espera, conseguimos ser atendidos. Após mais umas doze horas de espera e exames, constatou-se pneumonia em meu pai e a internação foi inevitável.

Passei 26 horas acordado ao lado de meu pai novamente e felizmente ele foi mandado no dia seguinte para se tratar na casa de meu tio, ali próximo da USP, por risco de infecção hospitalar.

Precisei ir ao Sindicato naquela tarde de terça e só pude dormir uma hora e quinze minutos entre sair do lado de meu pai no HU e chegar ao centro de São Paulo, onde tinha uma reunião.


EXPERIÊNCIA MARCANTE

Quando voltei para ficar com o meu pai na casa de meu tio no início da noite, passei por uma experiência difícil. Estava dormindo em pé e quando desci do ônibus em que vim para a casa de meu tio, acabei entrando na frente do ônibus após andar alguns metros.

Foi tão rápido! Só percebi que ao virar, dei com o ônibus e o baque me levou de volta pro meio-fio e não pra baixo do ônibus. Até agora me lembro daquele milésimo de segundo. Como o acaso nos pega em uma fração de segundos...

Não quis comentar nada quando cheguei a casa de meu tio. Meu pai estava lá, com um pouco mais de cor e já aguentando ficar em pé ao menos para ir ao banheiro.

Em pouco mais de uma hora, meu pai começou a dizer seus desaforos a mim e ao meu tio e tia, dizendo que já ia voltar de novo pra Uberlândia e que ninguém seguraria ele. Não adiantou dizermos que ele estava com pneumonia e só não estava internado por risco de infeção hospitalar. Ele não poderia ir a lugar algum nos próximos dias.

Eu ainda estava com aquela coisa do baque do ônibus que não me matou e meu pai fazendo desaforos a mim e aos meus tios como se não importasse todo o sacrifício que fizemos para trazê-lo de Uberlândia e buscar salvar a vida dele.

Eu mandei meu pai olhar na minha cara, falei umas verdades pra ele e chamei ele de ingrato, disse que quase morri por andar dormindo por ter cuidado dele no dia anterior e sai revoltado.


Ainda descendo a avenida Franz Voegeli perto de casa, totalmente deserta em período sem aulas das faculdades, estava disposto a qualquer merda que fizesse acabar minha tristeza e revolta com a ingratidão da vida.

As três regiões ao redor da minha casa têm muitos assaltos a pedestres. A passarela da estação de trem da CPTM - Altino (já fui assaltado lá) e as duas grandes avenidas que quando estão desertas são um perigo. No meio da descida, um carro passou por mim e parou alguns metros à frente, não vi nada dentro pelos vidros escuros. Desgraçados, eu não temia nada. O carro andou e parou umas duas vezes pro meu lado. Fiquei esperando algum filho da puta sair do carro e vir até mim. Seria a segunda vez naquela noite que eu teria uma experiência com riscos.

Naqueles segundos eternos, esperei... e o carro acabou me deixando de lado e foi embora.


Estou em dias difíceis. Passei ontem e hoje com dormência na língua, boca e com o braço esquerdo formigando. Estou em dias difíceis!

A relação com pai e filho está uma merda. Meus pais estão vivos, mas só sobrevivem. Acho que o mundo é um lugar de gente ingrata. Eu tenho minhas culpas pela ausência na família. Sempre digo que a vida é dura e que o mundo é um lugar hostil.

(Também parou em minha mente a imagem de uma garota adolescente, de aparência humilde, chorando hoje agachada e encostada em uma pilastra no metrô República em meio à multidão. Fiquei tocado por aquilo...)

Que merda estar usando meu blog de cultura pra escrever isso. Foda-se!




E O LIVRO DE SALINGER?


Estou acabando a leitura. Sou um quarentão e acabei escrevendo da mesma forma e com a mesma linguagem do personagem adolescente Holden Caulfield. Que merda!




FUNDO MUSICAL


Passei a última hora e meia ouvindo "knockin' on heavens' door" nas interpretações de Bob Dylan, Guns N' Roses e Avril Lavigne...

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