segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017
Leitura: A corrosão do caráter (1998) - Richard Sennett
Olá prezad@s leitores e amig@s,
Um dos livros que li neste mês de fevereiro, ou melhor, que concluí a leitura iniciada há muito tempo, foi o livro de Richard Sennett, A corrosão do caráter, consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo (1998).
Tenho andado com certo sentimento de urgência, de emergência, na realização das leituras que tenho como objetivos de vida, tanto as literárias quanto as de outras linhas de conhecimento. Sempre tive pouco tempo para ler em função de uma vida com jornadas de trabalho e estudos nos 3 períodos do dia e desde a adolescência.
A solução para ler obras que desejo e que estão na fila tem sido pegar meus livros nos instantes em que não estou com minhas tarefas de gestão na Cassi e ler ler e ler.
Estamos no feriado de Carnaval e além de descansar um pouco o corpo, porque estou extenuado por causa do trabalho, aproveitei para ler e refletir sobre diversas questões da existência e da vida em sociedade.
A postagem é sobre este estudo de Sennett, analisando as mudanças comportamentais dos trabalhadores americanos entre as décadas de 1970 e 1990.
Meus dias deste feriado foram de leitura dedicada a terminar um livro profundo de Denise Paraná - Lula, o filho do Brasil (2002). É mais uma obra que fiquei anos lendo e nunca terminei. São mais de 500 páginas. Decidi terminar a leitura nestes dias. Amig@s, de sábado para hoje, segunda-feira, reli alguns capítulos e as análises em mais de 150 páginas e deixei o gran finale para amanhã, terça. O estudo sociológico e psicanalítico de Denise é fan-tás-ti-co!
Ambos, o de Sennett e o de Denise, nos deixam pensando muito sobre a nossa classe trabalhadora em seus contextos sociais.
Segue abaixo pequenos excertos sobre a obra de Richard Sennett. Não teria como eu fazer uma longa postagem crítica e analítica por falta de tempo para isso. Eu realmente recomendo a leitura desta pequena obra pela atualidade conceitual para compreender o efeito nefasto nas novas gerações em relação à visão de curto prazo e seu efeito sobre as relações pessoais, profissionais e sociais.
O NOVO CAPITALISMO E O CARÁTER
"Talvez o aspecto da flexibilidade que mais confusão causa seja seu impacto sobre o caráter pessoal. Os antigos anglófonos, e na verdade escritores que remontam à antiguidade, não tinham dúvida sobre o significado de 'caráter': é o valor ético que atribuímos aos nossos próprios desejos e às nossas relações com os outros. Horácio escreve que o caráter de alguém depende de suas ligações com o mundo. Neste sentido, 'caráter' é um termo mais abrangente que seu rebento mais moderno 'personalidade', pois este se refere a desejos e sentimentos que podem apostemar por dentro, sem que ninguém veja".
CARÁTER E A RELAÇÃO COM O LONGO PRAZO
"O termo caráter concentra-se sobretudo no aspecto a longo prazo de nossa experiência emocional. É expresso pela lealdade e o compromisso mútuo, pela busca de metas a longo prazo, ou pela prática de adiar a satisfação em troca de um fim futuro...".
Imaginem vocês, amig@s leitores, o efeito da visão de curto prazo para sistemas mutualistas como saúde e previdência... é uma tragédia, se as pessoas não conseguirem compreender que para saúde e previdência estamos falando de décadas, quiçá séculos.
Ao longo do estudo, Sennett compara a visão de mundo e comportamento dos trabalhadores nos anos noventa em relação aos seus pais ou geração anterior, nos anos setenta. A mudança no emprego e no comportamento é muito grande.
Nos anos setenta, o mundo do trabalho ao longo de uma vida (e os trabalhadores eram sindicalizados) apresentava uma perspectiva linear e criava certa segurança no amanhã. O criar os filhos, comprar a casa, aposentadoria etc.
E HOJE?
"Como se podem buscar objetivos de longo prazo numa sociedade de curto prazo? Como se podem manter relações sociais duráveis? Como pode um ser humano desenvolver uma narrativa de identidade e história de vida numa sociedade composta de episódios e fragmentos? As condições da nova economia alimentam, ao contrário, a experiência com a deriva no tempo, de lugar em lugar, de emprego em emprego. Se eu fosse explicar mais amplamente o dilema de Rico (o jovem trabalhador analisado), diria que o capitalismo de curto prazo corrói o caráter dele, sobretudo aquelas qualidades de caráter que ligam os seres humanos uns aos outros, e dão a cada um deles um senso de identidade sustentável...".
O autor nos conta da desgraça que foi a terceirização nos Estados Unidos e os efeitos nocivos gerados para os trabalhadores por esta estratégia capitalista de exportar os empregos americanos para outros países de mão de obra mais barata.
Imaginem vocês o que nos espera com a pauta "Terceirização" total sendo uma daquelas de destruição do mundo do trabalho e dos direitos sociais no Brasil após o golpe de Estado consubstanciado em 2016 por uma camarilha de ladrões que tomaram conta de todas as instituições do Estado Nacional?
O "NÓS" E A DEPENDÊNCIA MÚTUA
"No início do capitalismo, como mostrou Albert Hirschmann, a confiança nas relações comerciais surgiu pelo franco reconhecimento da dependência mútua..."
e
"(...) Uma visão positiva dos próprios limites e da dependência mútua parece ser mais da área da ética religiosa que da economia política. Mas a vergonha da dependência tem uma consequência prática. Corrói a confiança e o compromisso mútuos, e a ausência desse laços ameaça o funcionamento de qualquer empreendimento coletivo..."
ENFIM...
Caros leitores e leitoras, o livro é muito importante para nossa reflexão, consciência do estado atual das coisas e para pensar estratégias de como lidar com o novo comportamento humano e do mundo do trabalho.
Como gestor de autogestão em saúde, modelo mutualista solidário intergeracional, para cuidar de pessoas por décadas e décadas, eu tenho que desenvolver estratégias de congregar pessoas para o longo prazo, para as coisas coletivas, com base na confiança e na solidariedade.
É isso. Eu já conheço do tema e lido com ele. Mas temos que estudar muito e associar pessoas em nosso sistema de saúde e previdência, como deve ocorrer com os sistemas públicos e complementares, como ocorre no caso da comunidade Banco do Brasil, que tem a Cassi e a Previ.
Abraços,
William Mendes
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