Apresentação do Blog:
Olá prezad@s leitores amig@s,
Este é o segundo artigo que apresento aos amig@s leitores a respeito do conceito de pós-verdade. No primeiro que li e partilhei (ler AQUI), tivemos uma centena de acessos. Espero ter sugerido um bom texto para reflexão.
Eu fico pensando a partir da posição social que ocupo nesta aldeia global o que podemos fazer para disputar hegemonias na conformação da sociedade humana. Eu estou no campo da representação dos trabalhadores, e esta classe social que represento está situada numa sociedade sob a égide do sistema de exploração capitalista.
Por estudo e por experiência no enfrentamento ao sistema hegemônico ao qual me contraponho, tenho claro que a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante, a classe dos donos do capital e proprietários de todos os meios de produção social, meios materiais e imateriais. Há alguns estudos demonstrando que 8 pessoas têm a riqueza da metade da população do Planeta. No Brasil seria o mesmo, 8 pessoas detêm a riqueza de metade do povo, 100 milhões de vidas.
Quais seriam as estratégias mais adequadas para enfrentar a máquina totalitária de divulgação da ideologia dos donos de tudo, os meios de comunicação de massa monopolizados pelas corporações desses empresários? (no brazil atual chamamos de Partido da Imprensa Golpista - PIG)
Além do ponto de vista do articulista, a matéria aborda o ponto de vista da revista The Economist. De certa forma, os donos dos meios "oficiais" de comunicação insinuam que a pós-verdade é por causa da velocidade e descontrole da internet e das redes sociais.
Eles são os empresários que por décadas decidiram sozinhos o que era "verdade" (porque publicado) ou o que não existia (ceifado da pauta), já que não se publicava e divulgava o que não interessava a eles, enquanto suas empresas de comunicação criavam a pauta que fosse de interesse político e econômico dos donos do poder. Agora temos o advento da rapidez das redes sociais e da rede mundial de computadores, e as empresas Facebook e Google, por exemplo, quase donas de nossos perfis humanos.
Eu entendo que uma das alternativas para construir alguma perspectiva de enfrentamento de mentiras que colam para disputas de hegemonia e destruição de reputações é um forte trabalho de base real, no caso da representação social. Falo isso como tentativa de defesa de fatos reais junto às bases, porque, ao final, as mentiras divulgadas em períodos de eleições, com prazos normalmente curtos para desfazer maledicências, podem prevalecer e levar ao poder segmentos que podem enfraquecer a política e não fortalecê-la. Pensem a respeito do artigo e da minha opinião sobre o trabalho de base.
Por estudo e por experiência no enfrentamento ao sistema hegemônico ao qual me contraponho, tenho claro que a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante, a classe dos donos do capital e proprietários de todos os meios de produção social, meios materiais e imateriais. Há alguns estudos demonstrando que 8 pessoas têm a riqueza da metade da população do Planeta. No Brasil seria o mesmo, 8 pessoas detêm a riqueza de metade do povo, 100 milhões de vidas.
Quais seriam as estratégias mais adequadas para enfrentar a máquina totalitária de divulgação da ideologia dos donos de tudo, os meios de comunicação de massa monopolizados pelas corporações desses empresários? (no brazil atual chamamos de Partido da Imprensa Golpista - PIG)
Além do ponto de vista do articulista, a matéria aborda o ponto de vista da revista The Economist. De certa forma, os donos dos meios "oficiais" de comunicação insinuam que a pós-verdade é por causa da velocidade e descontrole da internet e das redes sociais.
Eles são os empresários que por décadas decidiram sozinhos o que era "verdade" (porque publicado) ou o que não existia (ceifado da pauta), já que não se publicava e divulgava o que não interessava a eles, enquanto suas empresas de comunicação criavam a pauta que fosse de interesse político e econômico dos donos do poder. Agora temos o advento da rapidez das redes sociais e da rede mundial de computadores, e as empresas Facebook e Google, por exemplo, quase donas de nossos perfis humanos.
Eu entendo que uma das alternativas para construir alguma perspectiva de enfrentamento de mentiras que colam para disputas de hegemonia e destruição de reputações é um forte trabalho de base real, no caso da representação social. Falo isso como tentativa de defesa de fatos reais junto às bases, porque, ao final, as mentiras divulgadas em períodos de eleições, com prazos normalmente curtos para desfazer maledicências, podem prevalecer e levar ao poder segmentos que podem enfraquecer a política e não fortalecê-la. Pensem a respeito do artigo e da minha opinião sobre o trabalho de base.
William
(reprodução da matéria - não utilizei imagens originais)
Pinocchio by Enrico Mazzanti (1852-1910) - 1883, colorido por Daniel Donna - Wikipedia. |
A era da pós-verdade
Por Gabriel Priolli
Fonte: Carta Capital — publicado em 13/01/2017
O Dicionário Oxford consagrou o termo neste ano em que a sociedade preferiu os boatos aos fatos
Uma nova palavra entrou para o léxico mundial em 2016 e fecha o ano em alta, frequentando as mais diversas bocas e páginas do mundo político e jornalístico. É a "pós-verdade", um elegante étimo composto que pode parecer fruto da mais refinada filosofia contemporânea, mas não vai muito além de “tucanar” a mentira, naquele antigo e consagrado sentido de falar difícil, com sotaque tecnocrático, o que pode ser dito de forma simples e direta.
A “pós-verdade” despontou para a fama graças ao Dicionário Oxford, editado pela universidade britânica, que anualmente elege uma palavra de maior destaque na língua inglesa. Oxford definiu a acepção e mostrou a evolução do termo, observando que ele não foi cunhado neste annus horribilis da história humana, mas seu uso cresceu 2.000% nele. O Google registra mais de 20,2 milhões de citações em inglês, 11 milhões em espanhol e 9 milhões em português, uma ideia de seu sucesso.
Na definição britânica, “pós-verdade” é um adjetivo “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”.
Não seria então, exatamente, o culto à mentira, mas a indiferença com a verdade dos fatos. Eles podem ou não existir, e ocorrer ou não da forma divulgada, que tanto faz para os indivíduos. Não afetam os seus julgamentos e preferências consolidados.
O termo, diz a Oxford, foi empregado pela primeira vez em 1992 pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich, em um ensaio para a revista The Nation. Em 2004, o escritor norte-americano Ralph Keyes colocou-o no título de seu livro The Post-Truth Era: Dishonesty and Deception in Contemporary Life. Mas quem mais contribuiu para a sua popularização mundial foi a revista The Economist, desde quando publicou, em setembro passado, o artigo “Arte da mentira”.
No texto de The Economist, o mundo teria entrado em uma era política de pós-verdade, especialmente depois que os britânicos ignoraram os alertas sobre o “Brexit” e votaram por deixar a Comunidade Europeia, e que os americanos desdenhavam das graves advertências sobre Donald Trump, estando prestes a colocá-lo na Casa Branca.
O semanário lamenta que o eleitorado dos dois países desconsidere fatos objetivos e prefira acreditar em lendas, como a de que refugiados turcos invadiriam a Inglaterra se o Brexit não fosse aprovado, ou de que Barack Obama não é americano e fundou o Estado Islâmico, e de que os Clinton assassinaram um assessor em 1993, como propalou Trump.
Republicado em diversos países, o comentário da revista britânica suscitou analogias e um vasto inventário de “pós-verdades”. Na Colômbia, o acordo de paz do governo com as Farc foi derrotado em referendo porque as igrejas, em especial as evangélicas, convenceram boa parte dos eleitores de que ele estimularia a dissolução das famílias e a homossexualidade das crianças. “O anticristo está na Colômbia”, disparou um pastor nas redes sociais, em comentário que viralizou.
Em meio às suas 297 páginas, o tratado de paz apenas propunha a equidade de gênero, “para garantir que mulheres e homens participem e se beneficiem em pé de igualdade da implementação desse acordo”. E fazia referência à “necessidade de ter em conta a comunidade LGBTI”.
Foi o suficiente para políticos ultraconservadores como Álvaro Uribe fazerem uma barulheira, muito conhecida dos brasileiros, sobre uma suposta e temível “ideologia de gênero”.
No Brasil, aliás, a “pós-verdade” é a linguagem da moda na política e não ocorre apenas nos delírios fundamentalistas. Como vários parlamentares admitiram, Dilma Rousseff não cometeu nenhum crime de responsabilidade na Presidência da República, condição indispensável para o impeachment, mesmo assim foi deposta pelo “conjunto da obra” e nada foi capaz de impedir.
A Operação Lava Jato mistura intencionalmente doações legais que empresas fizeram a candidatos nas eleições com propinas que pagaram a parlamentares, criminalizando a política como um todo, e o eleitorado conservador vai às ruas para apoiar o juiz Sergio Moro e seus cruzados da moralidade pública, sem fazer qualquer ressalva.
É um eleitorado capaz de jurar sobre a Bíblia que o “filho do Lula”, esse ser abstrato e afortunado, é dono da Friboi e de quase tudo no País. E que se preocupa seriamente quando a “musa do impeachment”, a advogada Janaína Paschoal, comenta sobre a possível instalação de uma base naval russa na Venezuela e diz que Vladimir Putin está prestes a invadir o Brasil.
Na tese de The Economist, endossada pela mídia tradicional de todos os países, a “pós-verdade” disseminou-se por culpa da internet e das redes sociais. “A fragmentação das fontes noticiosas criou um mundo atomizado, em que mentiras, rumores e fofocas se espalham com velocidade alarmante”, diz a revista. “Mentiras compartilhadas online, em redes cujos integrantes confiam mais uns nos outros do que em qualquer órgão tradicional de imprensa, rapidamente ganham aparência de verdade.”
É uma visão confortável que relativiza, quando não omite totalmente, a responsabilidade da própria mídia na eclosão do fenômeno. Se agora vivemos o reinado da “pós-verdade”, por dedução lógica teria havido antes uma época de pura verdade na mídia, na qual os cidadãos podiam confiar cegamente. Ignora-se em que parte do planeta tal era gloriosa teria ocorrido, que povo foi beneficiado e quais teriam sido os seus heróis jornalísticos.
“Os indivíduos e os veículos que mais alertam contra os perigos das ‘falsas notícias’ e da ‘política da pós-verdade’ são os maiores disseminadores delas”, resume o jornalista e blogueiro inglês Neil Clark. “É como ouvir lições da boca de Al Capone sobre a imoralidade do contrabando, ou o corcunda de Notre-Dame a exigir que todos sentem com as costas retas.”
Clark lembra das armas de destruição em massa no Iraque, que a mídia acreditou existirem e que justificaram uma invasão militar sanguinária, com milhares de mortos. Elas nunca apareceram. Lembra do pretexto amplamente noticiado para liquidar Muammar Kaddafi (e a Líbia junto), um suposto massacre que estaria na iminência de ocorrer em Benghazi, mas nunca se efetivou.
Lembra que a mídia ainda não apresentou prova dos ataques químicos que acusa Hafez al-Assad de cometer na Síria. Lembra, enfim, de verdades incômodas, que The Economist e a mídia pró-ocidental preferem não trazer ao seu cenário de “pós-verdade”.
O máximo que esses veículos admitem é que alguns mecanismos do jornalismo que praticam não funcionam. “A busca da ‘imparcialidade’ na veiculação de notícias com frequência cria um falso equilíbrio, à custa da verdade”, afirma The Economist. “Os cientistas da Nasa dizem que Marte, provavelmente, é desabitado. O professor Zureta diz que pululam alienígenas no planeta. Opinião por opinião, cada qual que escolha a sua.”
Expostos a uma mídia que cultiva o pensamento único, os brasileiros não têm essa opção. Não encontram uma segunda opinião para acreditar, visto que a prática basilar do jornalismo, de sempre ouvir o “outro lado” nos assuntos apurados, faz tempo que entrou em desuso por aqui.
Não é pelo excesso de versões, portanto, senão pelo seu exato oposto, que a opinião pública nacional desacredita dos fatos e se nutre de factoides imaginários, cevados na ignorância e no preconceito.
A “pós-verdade” talvez expresse, no plano da mídia, a mesma perda de credibilidade que afeta a política. Uma imprensa que se acredita “a serviço do Brasil”, “de rabo preso com o leitor”, que “faz a diferença”, que tem “tudo a ver”, padece hoje da desconfiança tanto do público de esquerda quanto daquele de direita.
Ambos sabem que essa imprensa lê o mundo pela ótica estrita de seus interesses – de classe, políticos, empresariais etc. – e que são eles que definem as notícias, não a importância dos fatos.
Se é assim, se a notícia é o que o veículo quer que ela seja, se a “verdade” é tão relativa e subjetiva quanto qualquer opinião, por que o espanto com a explosão da “pós-verdade”? O cidadão comum posiciona-se sobre um terreno movediço de informações, cada vez mais instável, e precisa angustiadamente da segurança das certezas.
Vai encontrá-la no próprio cabedal de ideias que lhe foram incutidas pela educação familiar, a formação escolar e o convívio social. Se os fatos se ajustarem a essas ideias, ótimo. Caso contrário, não virão ao caso.
À era da “pós-verdade”, portanto, corresponde um “pós-jornalismo”. Não é mais aquele que duvida, pergunta, reflete, busca interpretar a complexidade do mundo, mas que afirma peremptoriamente, sentencia, reitera, constrói a realidade conforme os lobbies que faz ou defende.
Na balbúrdia da vida digital, no caos informativo das redes sociais, ele é apenas uma fonte a mais de “convicções”, não uma bússola para a informação confiável. Mas, prepotente, prefere atacar o Facebook e demais distribuidores de conteúdos do que fazer a autocrítica dos próprios defeitos.
Em meio a tudo isso, o cidadão vai desanimando. Pesquisa da empresa de tecnologia Kaspersky apurou que 73% dos usuários brasileiros de redes sociais pensam em excluir seus perfis e só não o fazem para não ficar longe dos amigos e das recordações. No mesmo estudo, global, os americanos insatisfeitos são 78%.
O porquê da insatisfação? Todos consideram as plataformas uma perda de tempo. Estão saturados das meias-verdades e mentiras inteiras que alimentam indistintamente notícias ou delírios, em tempos obscuros de “pós-verdade”.
Uma nova palavra entrou para o léxico mundial em 2016 e fecha o ano em alta, frequentando as mais diversas bocas e páginas do mundo político e jornalístico. É a "pós-verdade", um elegante étimo composto que pode parecer fruto da mais refinada filosofia contemporânea, mas não vai muito além de “tucanar” a mentira, naquele antigo e consagrado sentido de falar difícil, com sotaque tecnocrático, o que pode ser dito de forma simples e direta.
A “pós-verdade” despontou para a fama graças ao Dicionário Oxford, editado pela universidade britânica, que anualmente elege uma palavra de maior destaque na língua inglesa. Oxford definiu a acepção e mostrou a evolução do termo, observando que ele não foi cunhado neste annus horribilis da história humana, mas seu uso cresceu 2.000% nele. O Google registra mais de 20,2 milhões de citações em inglês, 11 milhões em espanhol e 9 milhões em português, uma ideia de seu sucesso.
Na definição britânica, “pós-verdade” é um adjetivo “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”.
Não seria então, exatamente, o culto à mentira, mas a indiferença com a verdade dos fatos. Eles podem ou não existir, e ocorrer ou não da forma divulgada, que tanto faz para os indivíduos. Não afetam os seus julgamentos e preferências consolidados.
O termo, diz a Oxford, foi empregado pela primeira vez em 1992 pelo dramaturgo sérvio-americano Steve Tesich, em um ensaio para a revista The Nation. Em 2004, o escritor norte-americano Ralph Keyes colocou-o no título de seu livro The Post-Truth Era: Dishonesty and Deception in Contemporary Life. Mas quem mais contribuiu para a sua popularização mundial foi a revista The Economist, desde quando publicou, em setembro passado, o artigo “Arte da mentira”.
No texto de The Economist, o mundo teria entrado em uma era política de pós-verdade, especialmente depois que os britânicos ignoraram os alertas sobre o “Brexit” e votaram por deixar a Comunidade Europeia, e que os americanos desdenhavam das graves advertências sobre Donald Trump, estando prestes a colocá-lo na Casa Branca.
O semanário lamenta que o eleitorado dos dois países desconsidere fatos objetivos e prefira acreditar em lendas, como a de que refugiados turcos invadiriam a Inglaterra se o Brexit não fosse aprovado, ou de que Barack Obama não é americano e fundou o Estado Islâmico, e de que os Clinton assassinaram um assessor em 1993, como propalou Trump.
Republicado em diversos países, o comentário da revista britânica suscitou analogias e um vasto inventário de “pós-verdades”. Na Colômbia, o acordo de paz do governo com as Farc foi derrotado em referendo porque as igrejas, em especial as evangélicas, convenceram boa parte dos eleitores de que ele estimularia a dissolução das famílias e a homossexualidade das crianças. “O anticristo está na Colômbia”, disparou um pastor nas redes sociais, em comentário que viralizou.
Em meio às suas 297 páginas, o tratado de paz apenas propunha a equidade de gênero, “para garantir que mulheres e homens participem e se beneficiem em pé de igualdade da implementação desse acordo”. E fazia referência à “necessidade de ter em conta a comunidade LGBTI”.
Foi o suficiente para políticos ultraconservadores como Álvaro Uribe fazerem uma barulheira, muito conhecida dos brasileiros, sobre uma suposta e temível “ideologia de gênero”.
No Brasil, aliás, a “pós-verdade” é a linguagem da moda na política e não ocorre apenas nos delírios fundamentalistas. Como vários parlamentares admitiram, Dilma Rousseff não cometeu nenhum crime de responsabilidade na Presidência da República, condição indispensável para o impeachment, mesmo assim foi deposta pelo “conjunto da obra” e nada foi capaz de impedir.
A Operação Lava Jato mistura intencionalmente doações legais que empresas fizeram a candidatos nas eleições com propinas que pagaram a parlamentares, criminalizando a política como um todo, e o eleitorado conservador vai às ruas para apoiar o juiz Sergio Moro e seus cruzados da moralidade pública, sem fazer qualquer ressalva.
É um eleitorado capaz de jurar sobre a Bíblia que o “filho do Lula”, esse ser abstrato e afortunado, é dono da Friboi e de quase tudo no País. E que se preocupa seriamente quando a “musa do impeachment”, a advogada Janaína Paschoal, comenta sobre a possível instalação de uma base naval russa na Venezuela e diz que Vladimir Putin está prestes a invadir o Brasil.
Na tese de The Economist, endossada pela mídia tradicional de todos os países, a “pós-verdade” disseminou-se por culpa da internet e das redes sociais. “A fragmentação das fontes noticiosas criou um mundo atomizado, em que mentiras, rumores e fofocas se espalham com velocidade alarmante”, diz a revista. “Mentiras compartilhadas online, em redes cujos integrantes confiam mais uns nos outros do que em qualquer órgão tradicional de imprensa, rapidamente ganham aparência de verdade.”
É uma visão confortável que relativiza, quando não omite totalmente, a responsabilidade da própria mídia na eclosão do fenômeno. Se agora vivemos o reinado da “pós-verdade”, por dedução lógica teria havido antes uma época de pura verdade na mídia, na qual os cidadãos podiam confiar cegamente. Ignora-se em que parte do planeta tal era gloriosa teria ocorrido, que povo foi beneficiado e quais teriam sido os seus heróis jornalísticos.
“Os indivíduos e os veículos que mais alertam contra os perigos das ‘falsas notícias’ e da ‘política da pós-verdade’ são os maiores disseminadores delas”, resume o jornalista e blogueiro inglês Neil Clark. “É como ouvir lições da boca de Al Capone sobre a imoralidade do contrabando, ou o corcunda de Notre-Dame a exigir que todos sentem com as costas retas.”
Clark lembra das armas de destruição em massa no Iraque, que a mídia acreditou existirem e que justificaram uma invasão militar sanguinária, com milhares de mortos. Elas nunca apareceram. Lembra do pretexto amplamente noticiado para liquidar Muammar Kaddafi (e a Líbia junto), um suposto massacre que estaria na iminência de ocorrer em Benghazi, mas nunca se efetivou.
Lembra que a mídia ainda não apresentou prova dos ataques químicos que acusa Hafez al-Assad de cometer na Síria. Lembra, enfim, de verdades incômodas, que The Economist e a mídia pró-ocidental preferem não trazer ao seu cenário de “pós-verdade”.
O máximo que esses veículos admitem é que alguns mecanismos do jornalismo que praticam não funcionam. “A busca da ‘imparcialidade’ na veiculação de notícias com frequência cria um falso equilíbrio, à custa da verdade”, afirma The Economist. “Os cientistas da Nasa dizem que Marte, provavelmente, é desabitado. O professor Zureta diz que pululam alienígenas no planeta. Opinião por opinião, cada qual que escolha a sua.”
Expostos a uma mídia que cultiva o pensamento único, os brasileiros não têm essa opção. Não encontram uma segunda opinião para acreditar, visto que a prática basilar do jornalismo, de sempre ouvir o “outro lado” nos assuntos apurados, faz tempo que entrou em desuso por aqui.
Não é pelo excesso de versões, portanto, senão pelo seu exato oposto, que a opinião pública nacional desacredita dos fatos e se nutre de factoides imaginários, cevados na ignorância e no preconceito.
A “pós-verdade” talvez expresse, no plano da mídia, a mesma perda de credibilidade que afeta a política. Uma imprensa que se acredita “a serviço do Brasil”, “de rabo preso com o leitor”, que “faz a diferença”, que tem “tudo a ver”, padece hoje da desconfiança tanto do público de esquerda quanto daquele de direita.
Ambos sabem que essa imprensa lê o mundo pela ótica estrita de seus interesses – de classe, políticos, empresariais etc. – e que são eles que definem as notícias, não a importância dos fatos.
Se é assim, se a notícia é o que o veículo quer que ela seja, se a “verdade” é tão relativa e subjetiva quanto qualquer opinião, por que o espanto com a explosão da “pós-verdade”? O cidadão comum posiciona-se sobre um terreno movediço de informações, cada vez mais instável, e precisa angustiadamente da segurança das certezas.
Vai encontrá-la no próprio cabedal de ideias que lhe foram incutidas pela educação familiar, a formação escolar e o convívio social. Se os fatos se ajustarem a essas ideias, ótimo. Caso contrário, não virão ao caso.
À era da “pós-verdade”, portanto, corresponde um “pós-jornalismo”. Não é mais aquele que duvida, pergunta, reflete, busca interpretar a complexidade do mundo, mas que afirma peremptoriamente, sentencia, reitera, constrói a realidade conforme os lobbies que faz ou defende.
Na balbúrdia da vida digital, no caos informativo das redes sociais, ele é apenas uma fonte a mais de “convicções”, não uma bússola para a informação confiável. Mas, prepotente, prefere atacar o Facebook e demais distribuidores de conteúdos do que fazer a autocrítica dos próprios defeitos.
Em meio a tudo isso, o cidadão vai desanimando. Pesquisa da empresa de tecnologia Kaspersky apurou que 73% dos usuários brasileiros de redes sociais pensam em excluir seus perfis e só não o fazem para não ficar longe dos amigos e das recordações. No mesmo estudo, global, os americanos insatisfeitos são 78%.
O porquê da insatisfação? Todos consideram as plataformas uma perda de tempo. Estão saturados das meias-verdades e mentiras inteiras que alimentam indistintamente notícias ou delírios, em tempos obscuros de “pós-verdade”.
Fonte: Carta Capital
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