segunda-feira, 27 de maio de 2024

2 de 100 dias



2. Abrição de boca, bocejando sem parar. Não é nem meia-noite ainda. Cansado. Voltamos do cinema agora à noite. Terceira semana seguida que conseguimos ir ao cinema. Bom isso! Alimento cultural.

Ontem, enquanto refletia sobre minha vida, o que incluiu pensar minhas relações com o mundo e algum tipo de busca de satisfação ou entendimento pessoal, vi que me encontro num momento da vida parecido com o que vivia nas primeiras etapas da vida adulta. 

Parecido, mas diferente. Naquela época, vivia tempos de fúria, de incertezas sobre o futuro nas questões mais comezinhas do viver de um membro das classes subalternas de um dos países mais injustos e desiguais do mundo. Num determinado momento de crise, inventei um jeito de ir vivendo dia a dia. Não tinha nem trinta anos de idade. E fui vivendo.

Hoje, reflito sobre incertezas a respeito do futuro em condições diferentes das condições daquela época. Tenho certa segurança e regularidade em relação à vida social e econômica, tenho perspectivas de pagar em dia as despesas do viver. Essa condição veio após quase quarenta anos de venda de minha força de trabalho como uma pessoa que nasceu no seio das classes inferiores socialmente.

Refleti ontem sobre minha saúde. Ou melhor, sobre minha não-saúde, sobre minha condição de perda da condição de saúde. Cada roteiro de vida é único e com ele vem as consequências do percurso. Imagino que o meu percurso foi foda. Agora é hora de fazer os remendos que forem possíveis no meu tecido esgarçado.

Enquanto corria no parque, pensei em viver a cada 100 dias perseguindo algo possível de se alcançar ou realizar nesse curto espaço de tempo. Eu efetivamente não vejo com clareza como será o nosso Natal. Já escrevi sobre isso. Não quero e avalio que não posso deixar de estar com minha mãe nesta data. No entanto, sei que colocar todos juntos no mesmo local e data não será simples. 

Por mais que estejamos chegando ao meio do ano civil, pensar dezembro está meio esquisito para mim. E o mundo então? Minha visão de mundo com a formação que tenho tem me deixado desesperançoso em relação à minha espécie, a única que pode ser educada, como diz Paulo Freire. Quem quer e quem querendo pode ser educado hoje?

Se chegar ao dia dois de setembro, 100 dias a partir de ontem, o que poderia ter feito até lá? No final da reflexão de ontem, avaliei que poderia tentar ser mais "acabativo" porque sempre comecei trocentas coisas e acabei poucas delas. Acabativo...

Foi pensando nisso que peguei para acabar a coleção de dez volumes do clássico Gen Pés Descalços, mangá ou História em Quadrinho (HQ) de Keiji Nakazawa. Uma história porrada sobre a bomba atômica lançada sobre Hiroshima e os efeitos da guerra e da radiação nas vítimas, principalmente civis. Comecei a ler a história da família Nakaoka lá no final de 2022 e até agora só tinha lido cinco volumes. Decidi ler todos os que faltam em sequência e de ontem para hoje já li o volume 6 (comentário aqui).

Quem sabe assim, não tento me tornar mais acabativo nesses 100 dias de vivência neste mundo de instabilidade crescente em meu país e nos países todos deste planeta em destruição acelerada e sob comando de alguns poucos homens fdp. E que nenhum acidente vascular ou infarto ou doença ruim dê cabo de mim, torço por isso!

Não sei se vivi tudo o que poderia viver neste segundo dia de uma centena de dias. Não fiz nada que mudasse o mundo. Mas não sei se é pra tanto a minha vida. Percebi o básico: como santo de casa, não faço milagre algum. 

William


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