Vidas proletárias nas veredas... Potencialidades, acasos. |
Refeição Cultural
Osasco, 17 de dezembro de 2022. Sábado.
O que é a vida? O que é a vida? O que define o que vai ser uma vida? Que tipo de ser vivo faz essas perguntas? Pra que servem essas questões?
O homo sapiens que tece esse texto é um ser vivo. Quem é ele? O que é ele? O que é a vida pra ele? O que é a vida dele pra outrem?
A vida dos seres vivos é uma sequência de acasos da natureza do primeiro momento em que ela ocorre até o último instante, o momento do fim daquela forma de vida.
A vida do ser que tece esse texto é um exemplo banal e corriqueiro de uma forma de vida na natureza.
Tudo é acaso da natureza ou na natureza? Ambos. Tudo é na natureza e da natureza, é do mundo natural.
O dia que passei aqui no planeta Terra foi um dia corriqueiro. Cheguei até o fim da noite por pura casualidade. Não enfartei. Não me engasguei. Não sofri um acidente vascular nem um acidente externo, um tiro ou atropelamento. Acasos.
O mesmo não se deu com milhões de seres vivos, que deixaram de existir ao longo desse dia terrestre. Milhares de árvores foram derrubadas. Diversas formas de vida morreram nos rios e mares e demais biomas. Milhares de vidas da minha espécie morreram hoje. Inclusive Nélida Piñon, aos 85 anos de idade. Meus sentimentos aos familiares e amigos.
Acasos, tudo na natureza é casualidade, eventualidade, mesmo quando é planejado e supostamente controlado. Não existe controle sobre nada, a ideia de controle e planejamento é mais uma das abstrações do fantástico cérebro da espécie humana.
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Ao observar o mundo e eu mesmo - olhar pra fora e pra dentro -, ao tentar visualizar meu passado através da fantástica fábrica de abstrações humanas - o cérebro -, ao imaginar o que poderia fazer amanhã, caso queira, sinto uma espécie de consciência de minha fragilidade, e sorte, e potencialidade. Quase tudo poderia fazer ainda, e pode ser que não possa fazer mais nada ou quase nada. Quem sabe? O acaso é deus!
Poderia comprar uma boa moto e sair rodando por aí, sonhei com isso por tanto tempo! Mas não. Poderia fazer uma casa-galpão como planejei na adolescência. Poderia fazer rapel, paraquedismo de novo. Mergulho. Poderia escalar montanhas, poderia fazer quase tudo, mas... me falta o sentido dessas coisas. Coisas da lista de objetivos que fiz décadas atrás.
Poderia começar a estudar qualquer coisa, qualquer coisa, Matemática, Paleontologia, História, Filosofia, línguas porque sempre quis ser poliglota. Poderia fazer de novo o curso de Educação Física que precisei interromper por falta de dinheiro, fato que me marcou profundamente pela tristeza que senti por isso. O tempo avançou no seu ritmo. Eu não sou mais aquele. O rio correu. O tempo passou. Não sou hoje o que fui ontem. Nem sei o que posso ou quero ser amanhã.
Ainda tenho visão e poderia ler qualquer coisa! Poderia começar a ler tudo de Proust, tudo que falta dos russos, daria pra ler dezenas de obras clássicas...
Não daria mais pra correr uma maratona. Meu quadril já era. Que tristeza! Menos uma coisa a fazer.
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Uma das coisas que mais dá origem a narrativas humanas ao longo da história dessa espécie é o instante que marca algo ou alguém, o evento que muda algo ou começa algo, que termina algo. Veredas...
Meus pais decidem mudar de São Paulo para Minas Gerais. Duas pessoas da classe trabalhadora brasileira com dificuldades financeiras para sobreviver na Grande São Paulo no final dos anos setenta. Hoje sei que o período era a ditadura civil-militar e o povo passava uma necessidade desgraçada, a carestia era a regra para a gente como nós.
O que sei é que tenho boas lembranças de minha infância em São Paulo. O que me lembro é que a vida foi muito dura na minha infância e adolescência em Minas Gerais. Acasos. Veredas... por quantas vezes quase me perdi, quase fiquei pelo caminho. As merdas que poderia ter feito e mudado pra sempre minha vida... muita sorte avalio que tive.
Depois dessa vereda trilhada aos dez anos foram tantas outras, quase cotidianas. Uma trilha, um destino, outra trilha, outro destino... Poderia ter seguido no Kung Fu e ser professor e não segui. Poderia ter terminado o curso técnico de Eletrônica e não terminei. Foram tantas veredas. Poderia ter seguido em Uberlândia, poderia ter ido para fora do país como planejei...
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Chega por hoje.
Tudo não passa de acasos na natureza...
William
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