segunda-feira, 10 de abril de 2023

Leitura: O trono no morro - José J. Veiga



Refeição Cultural

Osasco, 10 de abril de 2023. Segunda-feira.


"Engraçado: e o medo? Fora exatamente como o Pifa e outros disseram, que no meio do fogo a pessoa não tem tempo de sentir medo. Será que viria depois? Parecia que não. O que ele sentia agora era bem o contrário de medo, era uma palpitação de coragem e valentia que o deixava até envergonhado de estar lembrando de medo." (VEIGA, O trono no morro. p. 23)


Acordei pensando em meus objetivos de leitura para o ano de 2023. Defini que gostaria de ler ao menos três livros por mês. É um esforço de leitura. Não quero me tornar um analfabeto como estamos nos tornando enquanto espécie. Analfabetos no sentido literal, aqueles que não sabem escrever, e analfabetos funcionais, aqueles que sabem juntar as letras, mas não entendem porra nenhuma ao ler as letras juntadas.

A inteligência humana está em franca decadência, os homo sapiens sapiens caminham para a extinção como aqueles animais hominídeos que sabem que sabem, que têm conhecimentos culturais acumulados ao longo de centenas de milhares de anos. Inclusive pode ser que nos tornemos analfabetos, sem o uso da grafia e do símbolo linguístico porque as novas tecnologias tornaram "desnecessário" saber escrever.

Que começo de postagem... está ruim, sei, são os sentimentos do escriba no momento de escrever.

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Como disse acima, ao acordar nesse dia 10 de abril, primeiro terço do mês, pensei em pegar um livro de romance ou poesia para ler porque os livros que estou lendo são grandes ou de leitura lenta e levarão semanas até o final da leitura. Tanto em abril quanto em maio, para ler seis livros, terei que ler livros de volume pequeno. Livro menor no tamanho não quer dizer livro menor no conteúdo.

Pensei num romance, uma pequena novela ou conto, ou um livro de poesia. A primeira coisa foi escolher na estante o autor e o livro. Tenho livros adquiridos recentemente de conhecidos bancários e tenho livros de coletâneas de artigos. Mas não era o que procurava. Pensei em textos com estórias do tipo "E se..." e com essa característica pensei em José Saramago, Guimarães Rosa ou José J. Veiga. Peguei um de Veiga.

Nem olhei para o celular até o final da tarde... (básico isso!)

Assim fiz a leitura do 10º livro do ano.

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O TRONO NO MORRO 

(lançado por J. Veiga no livro De jogos e festas, em 1980, e depois relançado em 1987)

Ao abrir o livro, conheci a estória de Dom Quintino, governador e senhor supremo da serra do Mossongo.

Quintino Jerônimo Júlio foi sequestrado ainda novo pelo bando do Gumercindo Frade. Não tinha família, nasceu nas terras do seu Demoste e foi ficando por lá trabalhando por um prato de comida. Era medroso e não conseguiu voltar do sequestro dos jagunços. Foi ficando. Aprendeu a atirar e o primeiro bicho que mirou, acertou. Matou um urubu e deixou todo o bando aperreado porque dá azar matar urubu. Mas por atirar bem e por ter o corpo fechado, foi aceito no bando. Viveu assim por um tempo.

Depois, Quintino viveu numa corrutela chamada vila de Três Alferes, região de garimpo. Ali viveu outro tanto de sua vida. 

Os leitores acompanham a vida desse personagem, que apesar de ter o corpo fechado, poderia ter um pouco mais de sorte na vida. Difícil não se solidarizar com o rapaz pelos infortúnios que as veredas da vida trazem a ele.

Ao longo da leitura, J. Veiga me transportou para momentos diversos da vida ao longo de décadas, seus enredos e seu estilo têm essa característica de nos colocar dentro da estória ou de nos fazer ver o mundo aqui fora como suas estórias. 

Este leitor em particular passou a juventude nas Minas Gerais, região próxima ou similar às regiões imaginárias de seus contos, novelas e romances.

MEDO - Talvez eu tenha escolhido a citação sobre o medo porque esse sentimento é um dos sentimentos mais intensos no animal que somos. O medo e o ódio, talvez mais que o amor, são sentimentos que movem o mundo humano. Biologicamente somos racionais com um cérebro altamente desenvolvido, e mesmo sendo homo sapiens sapiens somos levados por indução e manipulação grosseira a praticar as ações mais estúpidas possíveis e a acreditar nas maiores bobagens que se possa imaginar... que foda!

É isso! Conheci mais uma narrativa de J. Veiga. Agora faltam poucas para eu completar a leitura de toda a sua obra. Só li o primeiro livro do autor goiano em 2016, e saí procurando seus livros em livrarias e sebos. Acabei de comprar o último que faltava.

Seguimos fruindo a vida instante a instante, como nos ensina Ailton Krenak, sem a necessidade de ser útil. Tenho que lidar com essa inutilidade que sinto após achar que fui útil algum dia. Es decir, achar que fui útil não quer dizer nada, claro, pode ser que eu tenha sido apenas útil em relações utilitárias como a vida moderna nos demonstra.

William


Bibliografia:

VEIGA, José Jacinto. O trono no morro. 8ª ed. - São Paulo: Ática, 2007.


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