quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Diário e reflexões - Fevereiro



Refeição Cultural

Osasco, 29 de fevereiro de 2024. Quinta-feira. Noite quente de um dia trágico (o mundo assiste ao genocídio do povo palestino e nada para o extermínio).


"Patria es Humanidad" (José Martí)


Depois de duas semanas quase sem ler e escrever, volto ao blog para registrar alguns sentimentos e fatos de nosso mundo mundo vasto mundo, como fazia o nosso cronista e poeta Carlos Drummond de Andrade. Não ouso pensar que tenha nos meus registros a qualidade do mestre, mas ao menos registro com honestidade o que sinto e vejo.

As semanas deste mês de fevereiro foram intensas e incomuns em relação ao meu cotidiano. Este fevereiro foi diferente do cotidiano dos fevereiros comuns, pois este só ocorre a cada quatro anos. 

Quatro anos atrás, o fevereiro nos trouxe a maior pandemia do último século. Oito anos atrás, uma quadrilha de homens brancos canalhas finalizava a trama para roubar o governo que o povo elegeu e semanas depois a presidenta honesta Dilma Rousseff sofreu um golpe de Estado.

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GENOCÍDIO DO POVO PALESTINO 

Neste fevereiro de 29 dias, o que tenho para registrar sobre esse dia extra é o assassinato de mais de uma centena de inocentes palestinos famintos numa fila em busca de algo para comer. Foram metralhados pelo exército do Estado de Israel. 

E pensar que José Martí nos ensina que pátria não é o solo onde pisamos, pátria é a humanidade e cada ser humano morto ou injustiçado deveria doer fundo em cada um de nós. Imaginem a dor que nós que temos uma ética humanista estamos sentindo ao vermos todos os dias dezenas de crianças, mulheres e civis sendo exterminados pelo governo sionista e racista de Israel...

Difícil! Não dá nem para se colocar no lugar do outro, de um palestino ou palestina na Faixa de Gaza, por exemplo. Estou no conforto de meu lar em Osasco, no Brasil do governo Lula, um governo tentando reconstruir um país arrasado por uma horda de genocidas e bandidos, como esta que governa atualmente o Estado de Israel.

Registro minha solidariedade ao povo palestino e aos demais seres humanos que sofrem neste momento em qualquer parte do mundo. Minha pátria é a humanidade.

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UM PROBLEMA DOMÉSTICO RESOLVIDO

Neste mês de fevereiro me desfiz de um problema doméstico que já durava dois quadriênios. A solução da questão era protelada mês após mês, ano após ano, por diversos motivos. E assim o incômodo seguia. Acabou neste mês de fevereiro incomum.

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CUBA, TE QUERO, TE ADMIRO E TE RESPEITO!

Este mês de fevereiro foi marcante em minha vida pessoal, pois tive uma segunda oportunidade de viajar para a República Socialista de Cuba. Acabei de voltar da Ilha.

Ano passado fui com um grupo de brasileir@s para passar o 1º de maio e conhecer algumas cidades e um pouco da cultura e história do povo cubano.

Neste ano voltei com outro grupo de brasileir@s e novamente pude conhecer um pouco mais sobre essa comunidade humana que busca resolver seus problemas e seguir a vida com outra forma de organização social, a construção de uma sociedade solidária, humanista e sem a exploração de humanos por outros humanos.

Vamos ver se escrevo um pouco sobre essa segunda experiência. As sensações foram diferentes, complementares. As veredas da vida nos trazem experiências novas, mesmo quando os caminhos são conhecidos. Basta lembrarmos que mudamos todos os dias, o tempo segue avançando, e todos os dias somos outra pessoa. Tudo muda, pois tudo é natureza.

Imaginem vocês que as veredas me colocaram ao lado da escritora Conceição Evaristo para voarmos juntos por horas. Depois tive a oportunidade de passar dias em contato com o querido Frei Betto. Vi Emicida palestrar com uma sapiência que emociona. Conversei com Ailton Krenak e fiquei admirado com sua simplicidade. 

Fui 3 vezes em apresentações em teatro: ouvi música clássica, música brasileira, música cubana. Conversei com lideranças de um Comitê de Defesa da Revolução. Conheci uma pessoa que organiza há décadas brigadas de brasileiras e brasileiros para irem prestar solidariedade a Cuba, conheci um frei brasileiro que é uma grande liderança nas Minas Gerais, entendem como foram os dias? Emoções... Estou repleto de sensações que ainda estou digerindo.

Ao mesmo tempo que temo pelo regime socialista e pelo querido povo cubano, porque acho que existe uma certa inocência por parte deles ao acreditarem que vão conseguir vencer a manipulação das big techs, que chegaram à Ilha, torço para que eles sejam tão criativos e únicos como foram ao longo de sua história, ao derrotarem os dois impérios que os subjugaram em séculos e se reinventam todos os dias, enfrentando com altivez um bloqueio assassino que humilha e sacrifica um povo que só quer ser feliz.

O povo cubano tem a minha solidariedade, o meu respeito e a minha admiração! "Hasta la victoria, siempre!", como disse Ernesto Che Guevara em sua carta de despedida ao seguir seu destino de lutar pela liberdade dos povos explorados pelos impérios capitalistas, lutando ao lado dos oprimidos pela revolução mundial.

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OLHOS D'ÁGUA...

(enquanto escrevo, meus olhos d'água me ofuscam o escrever - lembrei-me dos "Olhos d'água de Evaristo" -, pois meu coração está amargurado com o que sinto, o genocídio do povo palestino, a situação de miséria imposta ao povo cubano pelo bloqueio assassino dos EUA, essas coisas apertam o coração de qualquer pessoa que ainda seja humana e tenha uma ética humana)

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EQUILIBRAR HUMILDADE, ALTIVEZ E AMOR-PRÓPRIO

Fechado o mês incomum de fevereiro. 

Li quase nada, não foi possível. No entanto, li uma imensidão, li o mundo, se considerar que li Paulo Freire, Frei Betto e José Martí... Nestes homens superiores, colhi sabedorias que ainda estou digerindo.

Frei Betto abriu sua palestra para os estudantes da diplomacia cubana dizendo que aprendeu com um mestre que uma pessoa jamais poderia deixar de andar com um livro na mão, a gente pode até não conseguir ler, mas acaba que a gente lê um pouco.

Foi assim comigo. Obrigado pela lição Frei Betto. Nunca estar só, sempre estar com um livro à mão.

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A ÉTICA DO DESPRENDIMENTO

Outro ensinamento que está martelando na minha cabeça desde que ouvi de Frei Betto em outra palestra foi a ética do desprendimento como lição de vida.

Frei Betto citou Ernesto Che Guevara e Francisco de Assis... é muito emocionante a lição dada.

Francisco de Assis, ao compreender o efeito da riqueza e do sucesso de seu pai em prejuízo dos artesãos da comunidade, ele tirou as vestes de sua família e fez a opção pelos pobres.

Che Guevara poderia ter uma vida com todas as venturas que a sociedade humana dispõe, mas fez a opção por lutar pela liberdade do povo oprimido e explorado pelos poderosos. E ainda assim, mesmo depois de triunfar, pediu licença a Fidel e ao povo cubano, deixou mulher e filhos, e partiu para lutar pela revolução mundial, sonhando libertar mais povos no mundo.

Esses homens e esses atos de desprendimento de si mesmos são exemplos para nós de ética.

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EQUILIBRAR HUMILDADE, ALTIVEZ E AMOR-PRÓPRIO (MAS CUIDADO COM A VAIDADE)

Como tenho dito em minhas reflexões, eu não tenho domínio do passado, e pensando o que diz Krenak, nem sequer tenho o amanhã, seria muita audácia achar que o amanhã me pertence. 

Preciso encontrar um equilíbrio em meus sentimentos. Ao ter a consciência de que não temos controle das coisas, precisamos encarar os dias de forma mais racional, e mais leve. Um pouco de amor-próprio pode ser bom para a saúde.

Exercitar a humildade também pode ser uma receita de saúde. Se possível, contribuir de alguma forma para a sociedade humana.

Fechamos o mês e a vida segue. Temos que salvar a humanidade de si mesma. E com isso, tentar salvar o nosso planeta e as formas de vida.


William Mendes

(mais um na multidão)


6 comentários:

Miriam Goes Shibata disse...

Muito profunda sua escrita, gostaria de ter esse dom de comunicar os meus sentimentos com essa leveza indignada. As tragédias do mundo são causadas por esse capitalismo cruel e genocida, devemos sim gritar bem alto e em uníssono para que os indiferentes e surdos possam ouvir e entender que ninguém pode se salvar se esses homens cruéis continuarem o seu projeto.
Que viagem maravilhosa e rica você fez à Cuba, foi a segunda mas tenho certeza que não vai parar por aí. Quem conhece essa terra fica enfeitiçado e com vontade de conhecer mais e mais. Quanta cultura e amor pela história e pela escrita.
Como você disse acima, o meu medo é que se deixem levar pelo encantamento das redes, esqueçam as letras e se deixem levar pelas falsas informações, como aqui.

William Mendes disse...

Oi querida companheira Miriam! Obrigado pelo comentário e que bom que gostou das reflexões.

Miriam, imagino que vou voltar a Cuba sim, a gente fica sempre com vontade de conhecer mais. Desta vez, voltei também com vontade de conhecer mais o Frei Betto, que é muito querido pelo povo cubano. Já estou lendo textos dele e sobre ele.

Um fraterno abraço, companheira! Vamos nos ver qualquer dia desses e tomar um café, ok?

William

Anônimo disse...

William tudo que vc escreveu é fascinante, tenho pouca cultura ,mas admiro tudo que vc escreveu, seu crescimento e esforço para ser um ser humano cada dia melhor e mais humano !! Parabéns e obrigada!! Um abraço com carinho ❤️

William Mendes disse...

Oi mãezinha querida! Obrigado pelo comentário! Um beijo filial de alguém que tem muita referência em ti.

William

Valsa disse...

Texto tão delicado e tão forte, um bocado de coisas para eu pensar. Abraços e obrigada pela leitura.

William Mendes disse...

Olá, Marili! Que bom que gostastes das reflexões! Aliás, suas crônicas e poemas fazem os leitores pensarem bastante, também! Abração!

William