quarta-feira, 7 de março de 2012

ODISSÉIA - HOMERO (em prosa)

Homero - fonte: Wikipedia.

(atualizado em 11/03/12)

Tradução de Jaime Bruna

CANTO I

Musa, narra-me as aventuras do herói engenhoso, que, após saquear a sagrada fortaleza de Tróia, errou por tantíssimos lugares vendo as cidades e conhecendo o pensamento de tantos povos e, no mar, sofreu tantas angústias no coração, tentando preservar a sua vida e o repatriamento de seus companheiros, sem, contudo, salvá-los, mau grado seu; eles perderam-se por seu próprio desatino; imbecis, devoraram as vacas de Hélio, filho de Hiperião, e ele os privou do dia do regresso. Começa por onde te apraz, deusa, filha de Zeus, e conta-nos a nós também.

Já se achavam em sua terra todos os demais que escaparam ao fim abismal, salvos da guerra e do mar; só ele ainda curtia saudades da pátria e da esposa, retido no seio duma gruta pela real ninfa Calipso, augusta deusa, que o cobiçava para marido.

(...)


Vendo a postagem anterior em verso dá para perceber o quanto é diferente a mesma obra adaptada em tecituras diferentes. Após o começo acima, ocorre uma reunião dos deuses no Olimpo sobre os acontecimentos que envolvem Odisseu e suas desventuras. A deusa Atena atua em defesa de Odisseu.

(Fui mexer um pouco em minhas edições da Odisséia porque minha sobrinha iniciou o curso de Letras na Universidade Federal de Uberlândia e estava pedindo aos colegas e conhecidos alguma edição para ler. Tenho uma edição em prosa, mas estou a seiscentos quilômetros de distância dela. De qualquer forma, ela já conseguiu uma edição eletrônica)


Após a reunião dos deuses no Olimpo, a deusa Atena - de olhos verde-mar - decide ir à Itaca, em visita a Telêmaco, filho de Odisseu, para estimulá-lo a sair em busca de seu pai, de maneira a salvar suas posses e mãe, que estão na mão dos aproveitadores locais que pensam em desposar Penélope e ficar com as posses de Odisseu e Telêmaco.

(...)
Assim falou e atou em seus pés as lindas sandálias divinas de ouro, que a transportaram, tanto sobre a água como sobre a terra infinita, com a rapidez do sopro do vento; apanhou a forte lança, de ponta de bronze acerado, pesada, grande e grossa, com que subjuga fileiras de varões guerreiros com quem ela, filha de um pai poderoso, se agasta. Desceu de um salto dos cimos do Olimpo e pousou no país de Ítaca, no vestíbulo de Odisseu, na soleira do pátio; empalmava a lança de bronze, sob a figura dum estrangeiro, Mentes, caudilho dos táfios. Deparou ali os arrogantes pretendentes, que se distraíam jogando gamão diante das portas, sentados sobre couros de bois por eles próprios abatidos. Dos arautos e ativos criados, uns misturavam água ao vinho em crateras, enquanto outros, com esburacadas esponjas, limpavam e achegavam as mesas e ainda outros picavam carne abundante.


O primeiro a avistá-la foi Telêmaco, de aspecto divino. Sentado entre os pretendentes, via, em imaginação, o nobre pai chegar um dia, desbaratar os pretendentes pelo solar, impor respeito e reinar em sua casa. Enquanto cismava nisso, sentado entre os pretendentes, avistou Atena; caminhou direito ao vestíbulo, indignado, no íntimo, de que um forasteiro aguardasse longo tempo à porta. Aproximou-se, apertou-lhe a destra, recebeu sua lança de bronze e disse-lhe aladas palavras:


- Salve, estrangeiro; sê bem-vindo a esta casa. Quando tiveres provado o nosso jantar, dirás o de que precisas..."


COMENTÁRIOS:
Na Grécia Antiga, a recepção de um visitante era toda marcada por um ritual. Jamais se iniciavam as tratativas e assuntos diversos antes de se alimentar bem as visitas. Só após a refeição é que se começavam as discussões e conversas.


Os deuses tinham o hábito de andarem disfarçados entre os humanos. É o que vocês podem observar no texto acima, quando a deusa Atena se faz ver como o estrangeiro Mentes. Eles apareciam e desapareciam em meio a fumaça ou de um instante a outro.


A tradição oral dos poemas épicos também era toda construída com rimas e ritmos para facilitar a memória. De maneira que os aedos (cantadores populares e artistas de rua) tinham estruturas inteiras na memória, assim como os repentistas da atualidade, que fazem rimas nas ruas com suas violas.


(...)
"Eia, porém, dize-me uma coisa, falando sem rebuços; quem és? de que lugar no mundo? onde demoram tua cidade e teus pais? em que espécie de barco chegaste? como te trouxeram os mareantes a Ítaca? quem se prezavam eles de ser?"


"(...) todos os fidalgos potentados das ilhas, de Dulíquio, de Same e da selvosa Zacinto, e quantos senhoreiam em Ítaca rochosa, todos pretendem a mão de minha mãe e vão consumindo a casa. Ela nem repele as odiosas núpcias, nem é capaz de pôr cobro à situação; eles vão, assim, com seus banquetes, dando cabo de minha casa e não tardarão a liquidar também a minha pessoa."


Telêmaco pede (acima) ao estrangeiro Mentes (Atena), após a refeição, que se identifique. O modelo fixo das perguntas se repete várias vezes na Odisséia.


Mais adiante ele explica ao estrangeiro sobre aquela caterva de gente dilapidando seu patrimônio.


A parte que cito abaixo é muito engraçada. Atena dá o maior sermão no jovem Telêmaco por ele ficar se lamentando pelos cantos vendo aquele bando em sua casa.


Diz a Telêmaco que chame uma assembleia com os aqueus para tratar das coisas de seu guerreiro pai, que mande aqueles pretendentes para casa, que mande sua mãe ir para junto do pai dela. Também lhe diz para que saia em viagem a procura de notícias de seu pai Odisseu. Sugere perguntar ao guerreiro Menelau em Esparta, pois este foi o último a chegar de Tróia. Por fim, diz a Telêmaco que seja homem e faça como o jovem Orestes, que vingou o assassinato de seu pai guerreiro Agamêmnon matando Egisto. 



"(...) Mas depois que levares a termo esses pios deveres, cogita, em tua mente e teu coração, em como matar os pretendentes em teu solar, quer pela astúcia, quer em luta aberta. Não deves proceder como criança, pois já não estás nessa idade. Não ouviste contar quanta glória adquiriu em todo o mundo o divino Orestes, quando matou o assassino de seu pai, o patife Egisto, o matador do glorioso Agamêmnon? Sê valoroso também tu, meu caro, pois te vejo tão formoso e crescido, para teres igualmente os louvores da posteridade..."


Bibliografia:
HOMERO. Odisséia. Tradução de Jaime Bruna. Editora Cultrix, São Paulo.

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