domingo, 19 de abril de 2020

190420 (d.C.) - Diário e reflexões




Amor e Amizade - Fontes de energia vital

Domingo de sol em Osasco, Brasil.

Na última postagem que fiz, três dias atrás (ler aqui), senti um certo cansaço ao escrever e uma sensação ruim de inutilidade no que fiz. Gastei quase o dia todo para confeccionar o texto porque entendo que ao escrever publicamente, mesmo que seja para um leitor somente ou alguns poucos e nobres leitores, não se pode escrever sem cuidado: é preciso pesquisar quando for escrever algo minimamente confiável. Eu me esforço para fazer isso desde que virei diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região lá em 2002. É uma questão de respeito aos outros, ao mundo das letras e a si mesmo.

Hoje me deu vontade de escrever alguma coisa sobre amor ao próximo, aos outros. Falar de amor parece-me algo necessário em tempos de ódio, da ascensão do mal na vida das sociedades humanas deste início de século e milênio. Eu poderia dizer que senti muito ódio e muita ira durante pelo menos a metade de minha curta e longa existência. A pessoa que sou hoje é uma pessoa um pouco melhor, espero, por causa das oportunidades que a vida me proporcionou ao conhecer e participar das lutas coletivas do movimento organizado dos trabalhadores, o movimento sindical. Enfim, sentei para escrever sobre algo que podemos chamar de AMOR.

A vida voltou a ficar muito esquisita e sem sentido depois que saí do movimento de representação e organização da classe trabalhadora. Durante quase duas décadas, especificamente durante dezesseis anos de mandatos, teve muito AMOR no que fiz: acordar, estudar, pensar estratégias e táticas, sonhar utopias, agir e realizar coisas coletivas, sofrer nas lutas e comemorar conquistas (e lidar com as derrotas) e outras ações da vida humana foram as motivações e fontes de energia vital que me moveram. O ser que fazia isso era ao mesmo tempo pai, filho, parente, amigo, amante e conhecido das pessoas. Este se completava por ser aquele. Agora percebo que este indivíduo sem aquelas representações e ações se esvaziou bastante. Os sentidos do viver.

Até conhecer e participar das lutas da classe trabalhadora, de me sentir pertencente a algo coletivo, de representar pessoas, eu sofria dos padecimentos mais comuns e comezinhos dos mortais humanos, sentia dores n'alma e desapego à vida talvez por alguma forma de depressão desde a tenra idade. Viver ou não viver era a mesma coisa pra mim. Mesmo tendo o amor de pessoas queridas, meu egoísmo falava mais alto e não me importava em magoar as pessoas caso morresse. Depois que me peguei dentro do movimento sindical, nunca mais tive recaídas nessas dores d'alma. Viver e viver passou a ser a única alternativa, porque a energia vital das lutas coletivas enchia veias e artérias, músculos e pensamentos de mim. A energia da coletividade é contagiante. Na poesia, Drummond era a referência pra mim: 

"Alguns, achando bárbaro o espetáculo,

prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação." (Os ombros suportam o mundo)

Tudo mudou muito radicalmente na minha vida e isso traz dificuldades de adaptação. Estamos tentando sobreviver e viver nesses novos tempos pessoais e coletivos porque o cara que saiu dessa última fase da existência é o que prevalece em mim. Drummond segue sendo a referência. No limite, prefiro viver que morrer ou prefiro guerrear que me deixar matar. Mas com a ascensão do mal ao nosso redor, ficou muito ruim viver, ficou algo esquisito porque está difícil ver esperança de dias melhores no horizonte de uma vida e até num horizonte coletivo das vidas proletárias.

Chega de escrever. Quando vejo, já estou me alongando. Caramba, vai ser prolixo na casa do chapéu!

AMOR

Sobre o amor, o amor ao próximo, quis registrar que saí para correr porque quero estar vivo por causa de meu filho, por causa da minha companheira, por causa de meus pais, irmã e sobrinhos. Por causa dos amigos, muitos amigos. Porque amo muita gente pela qual vale a pena estar vivo.

Se eu não tivesse pessoas queridas para amar, relações de amizade a cultivar, o amor de tanta gente e para tanta gente que amamos, eu não me importaria nem um pouco de morrer a qualquer minuto. Seja de Covid-19, seja de infarto ou outra merda qualquer, por falha do corpo da gente, enfim, eu não me importaria. 

Eu tento me cuidar de forma consciente para sobreviver porque o amor e a amizade são as energias que me sobraram hoje. Eu me sinto um privilegiado pelas relações de amor e amizade que tenho, e que enchem mais de duas mãos. De novo: se começo a lembrar de pessoas queridas uma... duas... três... oito... dezesseis... vinte e três... tem muita gente querida em meu mundo de relações, mesmo a maioria estando distante fisicamente. O amor e a amizade não ligam para distância física. 

Aprendi a querer viver pela solidariedade, pela justiça social, pela liberdade e igualdade, pela capacidade que os seres humanos têm de praticar o bem e inventar coisas boas. A vida pode ser melhor. Eu fui do ódio, da vontade de morrer ao outro extremo, ao amor e à vontade de viver porque conheci a cultura, a amizade, vi gente lutando pelos outros, se doando para os outros.

Enquanto estiver vivo, vou sonhar e me esforçar para que a sociedade humana se organize de forma diferente da atual, o modelo de produção e acumulação capitalista, onde alguns exploram o restante, acumulam tudo pra eles (o 1%) e os 99% ficam com migalhas. Associativismo, cooperativismo e autogoverno são formas possíveis de organização humana.

Vivi e participei de várias formas associativas e organizativas das classes trabalhadoras e essas oportunidades me transformaram num ser humano melhor, mais decente, mais humano. A Cassi, a Previ, o Sindicato, o condomínio onde moro, tudo isso é fruto de associativismo e cooperativismo. Pensem nisso!

Um abraço carinhoso ao amig@ leitor(a) dessa singela postagem.

William

4 comentários:

João Cardoso Mairiporã disse...

Companheiro William,admiro muito tudo o que escreve. Você é uma referência pra mim no mundo sindical. Seu gosto pela poesia em muito se assemelha ao meu pelo teatro. Sei que você é jovem demais e muito mais teria a contribuir para com a luta da classe trabalhadora. Por isso acredito que seu afastamento é apenas um descanso para recarregar energias e continuar sua luta, gloriosa luta, em prol dos trabalhadores, dos humilhados, dos marginalizados,dos injustiçados. Vejo você tanto na assessoria de algum Sindicato, como na política, adoraria ver você eleito para algum cargo público, vereador, deputado, algo assim! Continue a apreciar Drummond, Fernando Pessoa, Paulo Leminski, Neruda etc a poesia vai te fazer cada dia melhor e o mundo agradecerá seu esforço em melhorar o mundo. Forte abraço companheiro! João Cardoso, Seeb Guarulhos

William Mendes disse...

Querido companheiro e amigo João, como vai você e família? Espero que estejam todos bem.

Amigo, suas palavras encheram meu coração... me emocionaram muito! Só posso dizer obrigado! São momentos assim, na reciprocidade do outro, do irmão, que nos fazem acreditar que valeram a pena todos os esforços que fizemos ao longo de uma vida de dedicação às nossas causas coletivas.

Neste momento de tudo novo e incerto, só nos resta ir construindo os dias que vão nascendo. E seguimos assim, mas confortados por termos pessoas como você e tantos outros lutadores por um mundo melhor.

Abração!

William

Unknown disse...

Tempos de reflexão. O amor é produtivo. Você é um militante de causas nobres. Converse com os seus, candidate-se e represente publicamente estas causas. A soma das pequenas diferenças são tudo para muitos.
Esta energia está aí.

William Mendes disse...

Olá querid@ leitor(a),

Neste momento de minha existência, o que tem me movido tem sido o amor pelas pessoas com as quais convivemos e pela vida melhor que poderia acontecer para o povo. O golpe de 2016, os processos de lawfare e de manipulação das pessoas pelas ferramentas que inventaram com algoritmos me fizeram perder o interesse em participar de processos eletivos. Do nada nos transformam em perseguidos por estruturas corrompidas só por representarmos a classe trabalhadora.

Mas valeu pelas palavras.

Abraços, William