Pensa o trabalho que dá pra percorrer o caminho que leva a essa medalha... |
Refeição Cultural
Correu tudo bem na minha 10ª participação na corrida de São Silvestre, que este ano completou 95 edições. Poderia dizer que as ondas de arrepio que percorrem nosso corpo nos quilômetros finais traduzem a sensação gostosa de vencer o desafio de correr 15 Km num dia de quase 30º de calor na cidade concreto São Paulo.
Eu estava muito ansioso em relação à minha participação e sequer consegui dormir à noite. Uma mescla de receio de me contundir no meio da prova e não completá-la e a expectativa de voltar à prova mais charmosa do calendário anual, com uma multidão de cerca de 35 mil inscritos se apertando pelas ruas e pontos históricos de São Paulo; isso fez com que eu ficasse bem tenso nos últimos dias.
Ao reler a postagem que fiz em 2016, me despedindo da prova por causa das péssimas condições da organização do evento, desrespeitando os participantes que não tiveram sequer água para se hidratarem direito (ler aqui), posso dizer que neste ano a organização se saiu melhor. Não faltou água em nenhum dos 7 postos programados, a entrega da medalha foi bem tranquila e, antes da prova, a retirada do kit também foi eficiente, não houve filas gigantes.
Pensa uma multidão... |
Na questão de avaliação pessoal, completar a prova e no tempo médio que sempre fiz foi algo que me deixou feliz. Completei a prova em 1h55.
O ano em que completei 50 anos trouxe-me surpresas desagradáveis em relação à saúde. Foi um ano de dores no quadril, na coluna e de mudanças físicas. De uma hora para outra, o corpo já não responde como era até ontem. E a gente tem que aprender a lidar com isso. Somos hoje o que sobrou de ontem. Essa é uma frase que conheço desde muito jovem.
Em relação ao futuro, a fazer planos e planejar metas esportivas e desafios corporais, as coisas estão muito estranhas em minha cabeça. Da mesma forma que senti algo estranho ao fazer pela enésima vez a Romaria em agosto, senti hoje a mesma coisa. Não sei se farei de novo a Romaria, não sei se correrei de novo a São Silvestre. Não sei se vou seguir correndo provas no próximo ano ou se vou fazer caminhadas introspectivas.
Meu ser está todo contaminado pela destruição de nosso mundo a partir do golpe de Estado em 2016, a partir da descoberta que parte de nosso povo é má, sempre foi, e agora está claro isso. Quando olho para trás, através dos ensaios literários, antropológicos e filosóficos sobre o Brasil, e também refletindo sobre a maldade nas pessoas da família, nos vizinhos, nos colegas de trabalho, nas pessoas comuns do cotidiano, fica evidente que nos enganávamos. O bolsonarismo é o espelho de parte de nosso povo. Não sei como aceitar isso e ser feliz.
Bem, deu tudo certo na São Silvestre. Não me contundi. Conversei muito com meu corpo. Nunca me concentrei tanto. Neste ano, sequer vi as coisas engraçadas ao redor, de tanto que estava focado em mim, na minha energia, na minha corrida. No entanto, passada a emoção, o prazer do objetivo alcançado, as coisas voltam ao normal, estão sem sentido.
Não desisti de nada. Quero encontrar sentidos. Só que o país, o povo, o contexto, o momento mundial não ajudam. Sigo procurando mesmo assim.
I still haven't found what I'm looking for...
William
Post Scriptum:
Decidi correr a São Silvestre no início de novembro, justamente para buscar sentidos. Durante os dois meses, fiz um treinamento monitorado por mim mesmo. Foram 18 treinos e percorri cerca de 90 Km durante o período. Isso foi fundamental para a realização da corrida hoje. Ver aqui a postagem sobre o treinamento.
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