Refeição Cultural
Osasco, 31 de maio de 2023. Quarta-feira fria e chuvosa.
Li A impureza da minha mão esquerda (2021), livro de contos de Henry Bugalho, durante um voo entre o Brasil e Cuba, com escala no Panamá. Escolhi o livro aleatoriamente entre os livros que tinha no Kindle. Foi uma leitura agradável e fácil.
É o segundo livro que leio do jovem escritor e youtuber Henry Bugalho. Se calhar de ler o próximo livro dele durante uma viagem, vai parecer que os livros do Bugalho são livros para viagens (rsrs) porque Margot Adormecida li durante uma viagem de ônibus para Uberlândia (MG) no final do ano passado (comentário aqui).
Os contos estão reunidos no livro em três grupos temáticos: Nostalgia (8), Fissuras (8) e Tragédias (5).
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A IMPUREZA DA MINHA MÃO ESQUERDA
O conto de entrada, que dá nome ao livro, é de temática forte, pesada.
"O Canhoto. Este é um dos nomes do diabo. E este era o meu apelido na escola: o Canhoto.
Em uma sala com trinta alunos, eu era o único a escrever com a mão esquerda. O único invertido. O único do avesso..."
Tem uma passagem no conto que aborda a questão do preconceito em sua forma estrutural na sociedade brasileira, e a fala do personagem me lembrou muito do locus onde passei a infância e a adolescência.
"Era um tipo de discriminação sutil e que eu nem sabia ser discriminação. Não era o tipo de coisa que faziam com que as pessoas me apontassem na rua, como ocorria com o Bambi, o bicha da minha turma; nem que me batessem no recreio, como vi várias vezes com o Tiziu, aquele 'neguinho fedido' segundo os meus colegas; nem que levasse os meninos a passarem a mão em mim, como com a Tati, a 'vagabunda' que todos tinham catado; nem que fosse motivo de piadas diárias, como a Rafa, que tinha a mãe desquitada."
Nossa! Numa frase temos quase todas as formas de preconceito que destroem pessoas e que compõem a sociedade brasileira do passado e do presente, infelizmente.
E com a frase seguinte, foi impossível não me lembrar do meu caso pessoal de ter nascido canhoto, sinistro, e ter sido forçado a usar a mão direita porque era feio, era pecado... fui descobrir isso depois dos vinte anos de idade.
"Ser canhoto era um pecado leve num mundo repleto de pecados muito maiores e muito mais visíveis."
O conto é meio macabro. Leiam pra ver.
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Os outros contos dessa primeira parte, Nostalgia, são de temáticas variadas e bem interessantes: o caso do cãozinho Cotó; o rapaz com trauma de café; a vovó que fazia pães caseiros, achei a estória o máximo; o conto do galo Harrison...; o conto "A Alma da Capital" é muito bonito!
A primeira parte fecha com o conto "O doutor adevogado". O conto poderia também estar no grupo das narrativas trágicas. Na verdade, nos três grupos as temáticas transitam entre o drama e a melancolia.
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O MEU GALO
"Ele desfilava com imponência pelo quintal da minha vó: o meu galo. O mais lindo de todos, alto, quase do meu próprio tamanho no auge de meus oito anos, com uma penugem reluzente, o pescoço de um azul vivo e brilhante, e esporas ameaçadoras como lâminas, mesmo sendo um galo pacífico, até onde eu podia perceber..."
DE NOVO, UM CASO PESSOAL - Gente, eu tive um galo índio quando morava no terreno de minha avó lá em Uberlândia. Ganhei o bicho pequeno e fui ficando com ele, treinando o galinho pra ser bem bravo. O galo cresceu e virou uma fera no terreno. As visitas iam visitar a minha avó, fazer uma fezinha ou tomar café e o galo atacava elas, pulando com as esporas afiadas nas pernas das visitas (rsrs)... tive que dar o galo pra levarem pra uma fazenda. Juro que é verdade, não é um conto mineiro.
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FISSURAS
O primeiro conto dessa parte é comovente: "Os trens da morte". Também é muito bonito o conto "A Ceia dos Solitários".
Essa parte do livro tem contos incríveis. O mais hilário deles é "Seu Tomás vai ao parque", texto curto e direto. Me lembrei de algumas pessoas ao ler esse conto (rsrs).
TRAGÉDIAS
Na última parte do livro, todos os contos são bons. As temáticas vão do sobrenatural à violência e luxúria. Destaco o conto "A Mulher do Alfaiate".
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COMENTÁRIO FINAL
Para fazer a postagem sobre a leitura do 12º livro do ano, um livro de contos de Henry Bugalho lido durante o dia no qual passei voando entre São Paulo e Havana, acabei relendo praticamente todos os 21 contos. São narrativas muito boas. Gostei!
A leitura desse segundo livro do Bugalho confirmou o que avaliei após a leitura do romance Margot Adormecida: o autor é bom escritor. Seguirei lendo outros livros dele que já tenho adquiridos.
William
Bibliografia:
BUGALHO, Henry. A impureza da minha mão esquerda. 2020.
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