Refeição Cultural
Osasco, 18 de novembro de 2023. Sábado.
BOAS LEMBRANÇAS E SAUDADES DE NOSSO QUERIDO TIO LÉO
Este é um fim de semana triste para nossa família. Faleceu ontem o nosso Tio Léo, em Barra do Garças, Mato Grosso. O tio estava com problemas de saúde já fazia algum tempo e graças aos cuidados carinhosos que recebeu da tia Regina, da filha Lara e de toda a família e amigos, lutou bravamente pela vida nos últimos anos. Estive na Barra com meus pais em julho do ano passado e pudemos matar saudades da família.
Meus tios e família se estabeleceram na Barra do Garças há décadas, depois de viverem em Uberlândia (MG) e Ariquemes (RO). A família sempre trabalhou com comércio de alimentos. Na Barra, abriram a Pastelaria do Léo em meados dos anos oitenta. As saltenhas e pastéis do Léo se tornaram referência na região e hoje fazem parte da cultura da cidade.
Pastelaria do Léo, Mercado Municipal, Barra do Garças, MT. |
Eu ia para a casa dos tios em Barra do Garças desde os anos oitenta, vi os primos e prima crescerem. Tomei muita cerveja com o tio Léo e adorava passar alguns dias com a família. Cada vez que ia para lá, depois que voltava para São Paulo dizia que iria levar mais alguém para conhecer as delícias da Barra, a casa dos tios e a pastelaria, a temporada de praia do Rio Araguaia, o clube de Águas Quentes, a escalada ao Cristo lá no alto da Serra Azul, de onde se vê toda a região com as cidades de Barra do Garças (MT) e Aragarças (GO). Foram muitas histórias ao longo da vida.
As famosas saltenhas da Pastelaria do Léo. |
Jamais poderia esquecer um momento que vivi na casa dos tios em Barra do Garças. Foi no início dos anos noventa. Eu havia passado no concurso público para o Banco do Brasil, estava muito feliz e fui passar uns dias com o tio Léo e família. A gente estava sentado à noite na sala, a TV ligada e de repente ouço a notícia de que o concurso havia sido cancelado por fraudes ocorridas em Brasília (DF). Meu mundo desabou naquele minuto. Fiquei arrasado. Felizmente tudo correu bem. Como meus tios haviam dito, eu prestaria a prova de novo e passaria novamente. Assim foi. Passei de novo e fui bancário do BB até pouco tempo atrás.
Estar com o tio Léo e família quando era mais jovem era uma diversão só, e inspiração também. Eu cresci pensando em um dia poder mudar para uma região interiorana para ter uma chácara, sítio ou fazendinha para me afastar da cidade grande e passar mais tempo no mato. Sempre gostei de mato, muito mais que praia. Quando ficava uns dias na Barra, às vezes nos sítios do tio Léo, aumentava meu desejo de aprender sobre administração de um espaço de terra e viver por ali.
O tio Léo e as frutas do pomar. |
O tio Léo gostava de tirar um sarro das visitas de cidade grande quando estávamos na Barra. Qualquer pessoa que a gente levasse na viagem iria passar pelo crivo do tio. Ele ia com a pessoa até o pomar e perguntava que árvore e que fruta era aquela. Perguntava se a pessoa sabia como era um pé de amendoim, de abacaxi, de alguma fruta mais exótica. Ele era um tirador de sarro. E os bichos silvestres, a mesma coisa. "Que bicho é esse?", apontando para uma cutia, ou uma paca, ou alguma ave diferente.
Barra do Garças vista do alto da Serra Azul, onde fica o Cristo. |
E quando a gente ia andar com o tio no meio do mato, era uma comédia só. O tio Léo se metia sem camisa no meio do mato, sem se importar com gravetos, espinhos e urtigas, uma planta que irrita a pele como se fosse taturana. Já os "bichos" da cidade grande, era só andando lentamente, tentando tirar galhos e folhas da frente... se enroscando todo na caatinga, como conta Euclides da Cunha ao descrever o branco do litoral nos sertões de Canudos.
E aí, que ave é essa? Não, não é uma galinha! É uma saracura... |
Uma vez, estávamos para iniciar a refeição, o jantar se não me engano, e tínhamos levado um primo mais novo de São Paulo para lá, o Daniel, e ninguém entendeu por que o tio Léo estava olhando prato por prato na mesa, aquele silêncio momentâneo e, de repente, nhac!, o tio pegou o garfo da mão do Daniel e falou "esse é o meu garfo!" e em seguida disse, "Regina, pega outro garfo pro garoto!". O pessoal caiu na gargalhada, por causa do susto geral na hora que o tio avançou no garfo velho na mão do Dani.
Visitamos o tio Léo e a tia Regina em julho de 2022. Foi muito bom! |
Ano passado, quando visitamos o tio Léo e a tia Regina, estando o tio um pouco debilitado, matamos saudades até do jeitão do tio que nunca mudou. Para me ensinar a pescar corretamente e arremessar a linha com isca da vara de pescar na represa, já que a isca ele que a colocava por dizer que eu não daria conta (risos), o tio teve trabalho comigo. Custei fazer mais ou menos certo o que ele me explicou. E olha que dos três peixes que peguei, um eu "fui mole", segundo o tio, e deixei o peixe escapar quase na hora de pegá-lo. Foram dias de matar saudades aqueles do ano passado com a família na Barra.
O tio Léo teve trabalho com o pescador de araque aí. |
São muitas lembranças, tanto as vividas na Barra quanto as vividas em Uberlândia, quando o tio Léo ia para lá e reuníamos a família para o aniversário da vovó Cornélia.
Encontro no aniversário de 84 anos da vovó Cornélia, em Uberlândia. |
Me lembro até hoje das conversas com o tio Léo, ficávamos horas conversando e tomando uma cervejinha. Na nossa época de adolescência, os tios e tias nos davam conselhos, sim!, os tios nos davam conselhos e a gente ouvia, e eu fui um privilegiado por ter muitos tios e tias, quatro por parte de mãe e oito por parte de pai.
Se tem uma coisa que me lembro é do tio Léo dizendo que a gente precisava estudar, estudar para ser alguém na vida. Legal isso! Nunca me esqueci. O tio dizia até que se precisasse, ele ajudaria os sobrinhos, mas a gente deveria estudar.
O tio Léo estará sempre em nossas lembranças, em nossos corações. Assim como a vovó Cornélia, a tia Alice e meus primos que já nos deixaram. Deixamos o nosso abraço fraternal e de amor para a tia Regina e a Larinha e para toda a família.
Saudades, tio Léo! Meus sentimentos, mãezinha, muita força nessa hora!
William e família
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*Post Scriptum: este texto foi pensado como pertencente a uma série de postagens que venho fazendo sobre memórias e sentimentos de cunho pessoal, mesmo sabendo que os conteúdos trazem contextos históricos. Não se separam a dimensão pessoal da dimensão coletiva, o mundo é um só, o sujeito é um ser no mundo, na natureza inteira. Ao colocar o número do capítulo me equivoquei e repeti o número anterior. Por isso corrigi para nº 12.
Post Scriptum II: o texto anterior desta série, o capítulo 11, pode ser lido clicando aqui.
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