terça-feira, 11 de setembro de 2012

Paradoxos do darwinismo social - lendo Frans de Waal


Frans de Waal. Fonte: Wikipedia.
Hoje li mais um capítulo do excelente livro A Era da Empatia de Frans de Waal. A leitura nos faz pensar muito sobre a vida em sociedade.

O autor nos fala do filósofo Herbert Spencer (século XIX) que levou para os negócios suas teorias biológicas.


O primeiro grande paradoxo do cenário político americano é sua relação de amor e ódio com a biologia. Apesar da teoria evolucionista ser bastante popular entre eles, em debates políticos parte importante dos candidatos diz não acreditar na evolução.


PARADOXOS DA SOCIEDADE AMERICANA (E OCIDENTAL)

"O darwinismo social é bem aquilo que Gordon Gekko chamou  de 'espírito evolucionário'. Ele descreve a vida como uma luta em que os mais fortes não devem se permitir atrapalhar pelos mais fracos. Essa ideologia foi introduzida pelo filósofo inglês Herbert spencer, que, no século XIX, traduziu as leis da natureza para a linguagem dos negócios, cunhando a expressão 'sobrevivência dos mais bem adaptados', muitas vezes atribuída, indevidamente, a Darwin. Spencer condenou as tentativas de nivelamento do terreno onde se desenrola a vida em sociedade. Segundo ele, seria contraproducente que os 'adaptados' sentissem algum tipo de obrigação para com os 'inadaptados'. Em densos volumes que venderam centenas de milhares de cópias, Spencer afirmou a respeito dos pobres que 'todo o esforço da natureza é para se desfazer deles, limpando o mundo de sua presença e deixando espaço para os melhores."


O segundo paradoxo é a pregação da religiosidade cristã ao mesmo tempo que não aceitam nenhum tipo de compaixão e solidariedade com aqueles que não venceram na vida.

"Esse ponto de vista religioso - visível até hoje na chamada Direita Cristã - constitui o segundo grande paradoxo. Enquanto o livro encontrado na maioria dos lares americanos e em todo quarto de hotel recomenda a compaixão pelo semelhante, o darwinismo social ridiculariza esse sentimento, que apenas impede a natureza de seguir seu próprio curso. A pobreza é desdenhada como uma demonstração de preguiça, a justiça social, como uma fraqueza. Por que não deixar simplesmente que os pobres pereçam? Acho difícil entender como os cristãos conseguem abraçar uma ideologia tão implacável na ausência de um estado colossal de dissonância cognitiva, mas muitos parecem capazes de fazê-lo."


O terceiro paradoxo é a liberdade econômica despertar o melhor e o pior nas pessoas.

"O terceiro e último paradoxo é que a ênfase na liberdade econômica desperta tanto o melhor quanto o pior nas pessoas. O pior é a já mencionada falta de compaixão, pelo menos no nível governamental. Mas existe também um lado bom, (...) que é o de ser uma sociedade baseada no mérito. Berço de ouro, títulos pomposos, legados de família, tudo isso é reconhecido e respeitado, mas não é nem de longe tão valorizado quanto a iniciativa pessoal, a criatividade e o esforço puro e simples. Os americanos sentem admiração pelas histórias de sucesso e nunca recriminam aqueles que 'chegam lá' de maneira honesta. Isso é verdadeiramente emancipador para os que se sentem dispostos a encarar o desafio."


FALÁCIA NATURALISTA

Da mesma forma que o darwinismo social serviu para lavar a consciência da burguesia exploradora do século XIX adiante, serviu também para estabelecer o regime liberal nos Estados Unidos, o país formado por emigrantes europeus.

"O darwinismo social procurou fornecer o endosso científico almejado por um nação de imigrantes que havia desenvolvido naturalmente um forte senso de individualismo e de autossuficiência." (pág. 49)


"O problema é que não se pode deduzir os objetivos da sociedade dos objetivos da natureza. A tentativa de fazer isso é conhecida como a falácia naturalista. A falácia naturalista é cometida sempre que se confunde 'o que é' com 'o que deve ser'. Se os animais se matassem uns aos outros em grande escala, isso não significaria que deveríamos fazer o mesmo. Do mesmo modo, caso os animais vivessem em perfeita harmonia, isso também não significaria que temos a obrigação de fazê-lo. A natureza pode nos oferecer informação e inspiração, mas não nos oferece prescrições."


COMENTÁRIO

O pior é que essa falácia naturalista está incrustada no cérebro do povo e da classe trabalhadora, que só reproduz os interesses da elite (ideologia da classe dominante).


Bibliografia:
WAAL, Frans de. A era da empatia. Companhia Das Letras. 2010 SP.

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