Refeição Cultural
Osasco, Brasil. América do Sul.
10/9/23 (13h41)
O livro da professora Maria Leite, sobre a pedagogia em Cuba, é um dos livros que peguei para ler desde que passei a estudar um pouco sobre o país e o povo cubano, há mais ou menos um ano. É um livro exigente, na minha opinião, porque ele é profundo e para mim livros assim não são de leitura rápida, leio e releio parágrafos e páginas, vou e volto, paro e sigo.
Neste momento em que abro esta postagem, ainda faltam cem páginas para terminar a leitura do estudo sobre a pedagogia cubana, é um estudo de 40 anos de vida da doutora e mestra Maria Leite, um estudo profundo sobre a identidade e a educação em Cuba, principalmente após a Revolução de 1959. Já aprendi muito com a leitura feita até aqui.
Acho que é hora de pegar na leitura até acabar. Já vivi a experiência fantástica em minha vida de ir a Cuba por duas semanas e conhecer Havana e mais três cidades do país, Trinidad, Santa Clara e Varadero. Já me demorei demais na leitura do livro.
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ANTES, UMA DIGRESSÃO
Escrever na rede mundial pra quem?
Uma coisa que tenho refletido muito é sobre a profundidade e a superficialidade das coisas, inclusive da sociedade humana. Os problemas atuais do mundo são complexos e toda complexidade deveria ser tratada de forma complexa. Mas os tempos são de superficialidade.
Não quero ser superficial, nem quero escrever superficialidades como escritor de blog. Faço há tempos um esforço de construir textos enormes, com citações e reflexões para contribuir com o compartilhamento de conhecimento humano de forma gratuita. São mais de 5 mil postagens em meus blogs. Seguirei escrevendo.
No entanto, talvez eu mude um pouco o tipo de conteúdo em algumas postagens. Não sei até que ponto vale a pena eu ficar um dia todo para fazer um texto bem trabalhado para disponibilizar na rede mundial e não saber se o conteúdo foi lido por alguns humanos ou se o conteúdo foi apenas roubado pelas máquinas da mentirosa "Inteligência Artificial", que não é inteligente e não cria nada, só rouba tudo que se escreveu até hoje, usa a nossa criação textual sem citar a fonte e engana o povo do mundo como se a máquina que compila textos fosse "inteligente".
Como saber se as centenas de acessos diários aos meus textos são máquinas ou seres humanos? Acho que não tem como saber. Imagino que é da natureza do que nós escritores fazemos viver com a dúvida se alguém leu o que criamos. Até quem edita um livro pode ter os livros vendidos e os mesmos serem colocados nas estantes de metro (de enfeite) sem nunca serem lidos...
Enfim, vamos seguir com a leitura do livro profundo e sério da professora Maria Leite. O deleite do novo conhecimento, no fundo, é meu, é do leitor da obra em si.
Aliás, quando penso ainda nas redes sociais das big techs, aí é que eu fico danado com esse mundo da aparência e da superficialidade... A hora que eu tiver coragem de não saber mais sobre os outros, acabo de vez com as contas que tenho nas redes sociais.
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10/9/23 (21h30)
CAPÍTULO 4
A leitura do Capítulo 4 traz reflexões muito atuais perante os dilemas da sociedade humana, dilemas não só para a República Socialista de Cuba como também para os demais países sob a hegemonia do modelo capitalista. A autora nos falou bastante sobre o modelo de educação cidadã em Cuba.
O capítulo abordou os seguintes pontos:
A EDUCAÇÃO E AS NOVAS DIRETRIZES
4.1 O sistema nacional de educação em Cuba; 4.2 O plano de estudos "E"; 4.3 Os conselhos na atividade educacional; 4.4 As relações entre trabalho e educação; 4.5 A educação para a vida cidadã.
Os "valores morais" devem ser como uma bússola orientadora das conquistas e manutenção do socialismo.
DIREITOS DAS CRIANÇAS E JOVENS CUBANOS
"O Estado Socialista, como poder do povo, garante que não haja criança sem escola, comida e vestuário; que não há jovem que não tenha a oportunidade de estudar; que não há quem não tenha acesso a estudos, cultura e esportes" (Artigo 9, CUBA, 1992)
AS RELAÇÕES ENTRE TRABALHO E EDUCAÇÃO
(...) Em O Capital, a análise da categoria trabalho é apresentada em sua dimensão ontológica, ou seja, a partir da ideia de que é pelo trabalho que se constitui a vida humana ao longo da história..." (p. 139)
Essa parte foi tão profunda na análise que é necessário fazer aqui algumas citações para quando eu for reler a postagem.
A autora cita Marx à página 139:
"Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para a sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele e ao modificá-la ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas e sujeita o jogo de suas forças a seu próprio domínio (MARX, 1996, P. 297)"
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11/9/23 (22h08)
"(...) Na concepção marxista, a divisão técnica e social do trabalho na sociedade capitalista gera a alienação do homem em relação ao próprio trabalho e à natureza, desumanizando-o. Marx une o ato produtivo ao ato educativo, explicitando que a unidade entre a educação e a produção material deve ser admitida como meio decisivo à emancipação humana. No pensamento marxista, a separação entre ensino e trabalho faz da escola uma instituição 'morta'." (p. 139)
Principalmente após a Revolução de 1959, "a escola cubana deposita no trabalho a possibilidade concreta de elevação cultural e desenvolvimento dos seres humanos." (p. 143)
Após a visita a Cuba, acabei vendo diversos vídeos na internet que mostram Che Guevara e os cubanos em intenso trabalho nos primeiros anos da república socialista. É muito legal ver as imagens da época.
O TRABALHO CAPACITA O HOMEM PARA A REALIDADE DA VIDA
"(...) Segundo Castro Ruz (1998, p.12), 'há de ser o trabalho o grande pedagogo da juventude e, simplesmente, é ele que pode capacitar o homem para entender seus deveres e a realidade da vida'." (p. 144)
As leis da didática em Cuba atuam no sentido de criar de forma consciente o amor pelo trabalho socialmente útil nos estudantes e jovens do país.
"A Constituição de 2019 assegura, em seu Capítulo I - Dos fundamentos políticos, Título II, Artigo 31, que: 'o trabalho é um valor primordial de nossa sociedade. É um direito, um dever social e um motivo de honra para todas as pessoas em condições de trabalhar' (CUBA, 2019c)." (p. 147)
No último tópico do Capítulo 4 - "A educação para a vida cidadã" - nos chama a atenção a leitura de que tem sido um desafio para o sistema educativo cubano manter os valores da revolução para as novas gerações, cercadas de novas tecnologias e apelos consumistas.
APARELHOS CELULARES, A ARMA DO INIMIGO DO REGIME: Uma imagem que ficou na minha memória, das caminhadas por Cuba, principalmente em Havana Velha, foi a imagem das pessoas - jovens principalmente - com as caras nas telas de celulares pelas ruas... fiquei triste ao ver isso. Não à toa, diversos cidadãos cubanos com quem conversei, mais velhos, me disseram que a maior arma contra a Revolução é "essa" me mostrando os aparelhos de celulares...
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12/9/23 (14h35)
CAPÍTULO 5
"Em Cuba, existe a consciência de que o mundo está imerso em um quadro de acentuado desenvolvimento e, paradoxalmente, também de espantosos índices de pobreza. Para os cubanos, muitos fatores deste quadro estão ligados às tentativas, em nível mundializado, de anular, no interior das nações, os sentimentos pátrios e suas identidades como estados soberanos. Desde os primeiros anos da Revolução, a Educação foi chamada a ocupar um lugar privilegiado, como a pedra angular da nova sociedade. Existe uma espécie de consenso de que a criação e a formação de valores na consciência das crianças e dos jovens, desde muito cedo, são agora mais necessárias que nunca para salvar a independência de Cuba e a Revolução." (p. 189)
Terminei a leitura do Capítulo 5 - "A interlocução com a realidade", que tratou dos seguintes temas: 5.1 Espaços de observação; 5.2 A interação face a face; 5.3 Eixos de articulação das entrevistas.
Enquanto lia a análise das entrevistas e estudos feitos por Maria Leite, fiquei me lembrando dos dias que passamos em Cuba meses atrás. Como leio quase todos os dias notícias de Cuba, percebo que o capítulo abordou temas muito atuais como a questão do trabalho autônomo - "cuentapropismo" - e os desafios da educação e da economia do país, sobretudo por causa do bloqueio imposto pelos Estados Unidos.
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12/9/23 (22h30)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A última parte do livro de Maria Leite são as considerações finais dela. Gostei muito do estudo, do percurso empreendido pela autora e de tudo que passei a saber sobre Cuba e o povo cubano.
Não dá pra fazer grandes citações, mas deixo duas para finalizar a postagem.
MARTÍ E MARX - BASES DO SOCIALISMO CUBANO
"(...) O legado de Martí, entrelaçado às ideias de Marx, acabou por produzir uma recepção ao marxismo distinta daquela até então hegemônica no continente americano. A combinação desses fatores provavelmente é o sustentáculo capaz de explicar a continuidade do regime cubano após a extinção da URSS, mesmo com o fortalecimento do bloqueio imposto a Cuba, como relíquia da Guerra Fria." (p. 196)
UMA DIFERENÇA CENTRAL DA CUBA SOCIALISTA E DO BRASIL CAPITALISTA
"No entendimento desta pesquisa, a distância que separa os grupos em 'desvantagem social' e os que conhecem a 'filiação', se é possível assim chamá-los, dentro do formato identitário cubano, não se inclui a brutalidade, que mantém as massas em estado de alerta contra balas perdidas, assaltos à mão armada e outras formas de criminalidade frequentes nos países alinhados ao capitalismo da era globalizada. A educação tem colaborado acentuadamente para estabelecer em Cuba um quadro distinto do nível de desagregação social, que marca as grandes cidades da América Latina e do Caribe. As limitações engendradas nos períodos de crise não acarretaram o abandono de prédios escolares, o fechamento de hospitais, o fenômeno de 'meninos de rua', grupos de extermínio e massacres perpetrados por atiradores." (p. 201)
Como cidadãos brasileiros, sabemos o que a autora quer dizer sobre essa brutalidade e os riscos aos quais estamos expostos diariamente. Ao visitar Cuba por duas semanas, andando todos os dias por Havana e pelas outras cidades do país, percebi a diferença em relação ao risco de alguma brutalidade ou ameaça local: praticamente zero risco.
Bom, finalizada a leitura. Seguirei acompanhando o dia a dia do povo cubano e a construção do socialismo na Ilha caribenha.
William
Bibliografia:
LEITE, Maria do Carmo Luiz Caldas. Cuba insurgente: identidade e educação. Curitiba: CRV, 2023.
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