Como se dizia nas gírias: - tá embaçado, meu! |
Madrugada de terça-feira, 5 de maio de 2020, pós novo coronavírus. Osasco, São Paulo, Brasil. América do Sul, planeta Terra.
Dias atrás, assisti a um desses filmes apocalípticos por insistência de minha esposa. Ela havia visto o filme numa madrugada dessas e ficou chocada e pensativa; depois, pediu-me que o visse também. Ela ficou pensando se gostaria ou não de seguir vivendo naquela condição. Pensou no que a mulher fez no filme.
Eu também refleti a respeito do cenário hipotético do filme e, pessoalmente, avalio que não veria muito sentido em continuar o esforço por viver naquele mundo mais um dia, mais um dia, sem perspectivas reais de algo diferente. O que me levaria a continuar lutando pela vida seria a vida de outra pessoa. No filme, o pai está com o filho garoto e isso é o que o faz seguir lutando pela vida deles. O filme se chama A estrada (2009), dirigido por John Hillcoat.
Não citei o filme para ficar filosofando sobre ele não. Me lembrei do contexto do filme, uma ficção, pela falta de perspectivas. Sei que o cenário apocalíptico do filme é muito mais dramático que a nossa realidade. Mesmo assim, a nossa realidade tem nos deprimido e nos levado a perder a esperança nos seres humanos e num futuro melhor. Tá difícil para nós brasileiros que não fomos contaminados pela pandemia do bolsonarismo ou até pela cegueira branca do morismo (Quem não se lembra de Saramago e o seu Ensaio?). Tá difícil!
Já estava difícil respirar, viver, sobreviver, conviver coletivamente com os contaminados pelo vírus do ódio inoculado no povo do país jabuticaba para que ele passasse a ser cego e contra a política, contra a solidariedade, contra a distribuição de riquezas, contra a oportunidade para todos, contra a educação e saúde pública; estava difícil ver tanta cegueira num povo que viu a vida melhorar por mais de uma década e jogou tudo isso fora em troca da destruição do país e em benefício de meia dúzia de bilionários e seus ideólogos manipuladores.
Aí para piorar apareceu essa merda de vírus Covid-19 no início do ano. A vida que já estava ruim em termos de perspectivas de futuro (a boa e velha esperança), mesmo estando o presente comprometido com o caos e a destruição, ficou pior, bem pior. Agora, além de ter que conviver diariamente com a violência bárbara e ignóbil do bolsonarismo em todas as instâncias da vida social, ainda temos a falta de perspectiva de um viver melhor amanhã por causa das incertezas da vida pela pandemia sem data de acabar.
É um saco tudo isso! Por mais que eu não queira morrer nem me deixar matar, tá foda! A gente toma todo o cuidado que recomendam de ficar em isolamento social, quarentena, higienização de tudo, só sair o necessário para adquirir as coisas de necessidades básicas etc. Estou muito infeliz com tudo isso. Muita gente está. Muita gente já estava muito infeliz com a tomada de consciência de que as pessoas ao nosso redor são aquilo que descobrimos serem, gado fanático do sujeito demente, manipulador, machista, racista e adorador de violência e tortura.
Eu não dei certo com essa merda de ter que colocar máscara na cara para ter o direito de sair de casa para fazer as minhas necessidades básicas de comprar alimentos e materiais pra casa e para correr, porque minha pressão arterial voltou a ficar alta depois de uns 4 anos estável. E sei que é pelo estresse, pela tristeza, por toda a merda que não é possível esconder da realidade que nos cerca. Se eu não corro, vai dar merda comigo, meu corpo vai colapsar. Agora, as autoridades de meu Estado definiram mais uma medida preventiva por causa do vírus, se eu quiser sair na rua daqui a dois dias, terei que usar máscara. A gente tem que obedecer... mas a vontade de sair vai ser zero.
Eu não tenho jeito pra tuaregue. Não gostaria de ser uma mulher obrigada a usar burca em países islâmicos. Nunca pensei em ser ou participar de qualquer grupamento social que usasse máscaras... E ainda tem gente cheia de blá blá blá falando que "é legal usar máscara". Legal o c... Eu uso óculos e essas merdas de máscaras embaçam tudo. Como correr assim? Como o vírus vai apavorar por muito tempo ainda, a vida que já está chata vai ficar mais chata ainda. Eu sei que temos pessoas por quem viver, mas tá um saco!
Não levo jeito pra tuaregue, pra gente mascarada! Tô muito infeliz com tudo isso. Bolsonarismo, Covid-19, extermínio dos povos indígenas, reação pífia daquilo que achávamos que eram as esquerdas, o personalismo e estrelismo das lideranças dos movimentos sociais (que racham grupos cada vez que alguém pensa diferente), a pusilanimidade de todos nós em querer enfrentar com flores e diálogo os monstros que querem nos matar, exterminar, vaporizar... Tô infeliz, confesso. Sem perspectivas.
- Tá embaçado!
(E eu nem falei o que tenho pensado ao ler Yuval Harari e seu magnífico Sapiens, de 2014)
William
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