Refeição Cultural
O dia está nublado, com chuviscos. Meio friozinho na Pauliceia arlequinal. É tudo que se precisa para ler Mário de Andrade. Estou com os modernistas nesses dias. Depois de três livros de Oswald de Andrade, li a Pauliceia Desvairada e agora conheci Losango Cáqui. Sigo na procura, como diz o poeta na "Advertência" contida no início da obra.
"Porém peço que este livro seja tomado como pergunta, não como solução que eu acredite siquer momentânea. A existência admirável que levo consagrei-a toda a procurar. Deus queira que não ache nunca... Porque seria então o descanso em vida, parar mais detestável que a morte. Minhas obras todas na significação verdadeira delas eu as mostro nem mesmo como soluções possíveis e transitórias. São Procuras. Consagram e perpetuam esta inquietação gostosa de procurar. Eis o que é, o que imagino será toda a minha obra: uma curiosidade em via de satisfação." (ANDRADE, 1976, p. 81)
O livro de Mário de Andrade é bem curioso. Achei interessante.
Eu não tive a capacidade de aprender toda aquela física quântica das nominações impronunciáveis que inventaram para os fenômenos da gramática e da linguagem poética. Male male fui aprender a ler poesia depois dos trinta anos de idade. Sigo assim nas últimas duas décadas, um curioso lendo poesia, conhecendo um pouco os poetas mais aclamados, e tendo claro que não sou um entendido em poesia. Sou um ignorante, mas um ignorante consciente e que busca preencher suas lacunas culturais.
Deixo na postagem um dos poemas que mais gostei de Losango Cáqui:
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XXIV
A ESCRIVANINHA
Eu vivia quási sem ruído.
Dúmas Terrail Zóla escondidos,
Si ele souber... Meu pai? Meu Deus?
Duas pessoas num só terror.
Meus quatorze anos sorrateiros:
Leituras pobres, vícios feios,
Quanto passado sem valor!
Eu não vivi no meu país.
Zóla Terrail Dúmas franceses...
Que gramáticas portuguesas
Pro miserável de Paris!
Depois a Vida me ensinou
A vida. Meu pai morreu. Quando
Órfão me vi, chora-chorando,
Minha miséria se acabou.
Anjo-da-Guarda, Solidão!
Zóla voltou pra escrivaninha
De meu pai. Que grandeza estranha
Pôs esse gesto em minha mão?...
Não sei.
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Vamos lendo enquanto vivos. As lacunas culturais são cada dia maiores... você lê uma coisa e aparecem as referências que são lacunas a se preencherem em nossas vidas de curiosos, de leitores. Ainda não li um livro sequer de Émile Zola... É f...
Leiam, leiam, raros amig@s leitores. Leiam!
William
Bibliografia:
ANDRADE, Mário de. Poesias Completas. Círculo do Livro S.A. São Paulo, 1976.
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