terça-feira, 6 de junho de 2023

Viagem a Cuba (VI)


Estación Central Ferrocarriles, La Habana.

Refeição Cultural - Cuba (XXIII)

Osasco, 06 de junho de 2023. Terça-feira.


Estivemos em Cuba por duas semanas, entre abril e maio, e o nosso grupo de oito pessoas do Brasil pôde conhecer um pouco da realidade da Ilha socialista durante a nossa estadia. Como ficamos hospedados em casas de cidadãos cubanos e andamos à vontade por lá, pudemos conversar bastante com as pessoas.

Ficamos 6 dias em Havana, depois viajamos pelo país, conhecendo as cidades de Trinidad, Santa Clara e Varadero e retornamos a Havana de onde partimos com novas experiências e sonhos. 

Termos ficado na Casa de Isabel foi um diferencial para nós porque além do acolhimento e apoio em tudo, tivemos o senhor Luis Caballero como guia. Ele é historiador e conhece muito sobre a Revolução. Ainda tivemos o suporte e apoio da professora brasileira Maria Leite, doutora e especialista da pedagogia em Cuba.

Estou refletindo sobre a nossa viagem em postagens abordando a nossa estadia de forma cronológica. Já fiz 5 postagens sobre os primeiros dias em Havana (ver aqui a 1ª delas). Sigo lendo e estudando a respeito da República Socialista de Cuba e também acompanho o que se passa em nosso país capitalista, a República Federativa do Brasil. 

Nesta postagem vou abordar um pouco o nosso dia 1º de maio em Havana, uma segunda-feira de feriado nacional, mas sem a manifestação do Dia dos Trabalhadores, transferida para a sexta-feira 5, devido à forte tempestade ocorrida na véspera do evento.

Ao final do texto, tecerei alguns comentários políticos sobre meu olhar a respeito de Cuba e do Brasil e seus sistemas políticos: poderíamos definir um e outro como ditadura e ou democracia como costuma-se fazer na grande imprensa comercial?

"Contra viento y marea", de la artista
camagüeyana Martha Petrona Jiménez.
Obra lançada na bienal de 2019, dos 500 anos.

FERIADO DO 1º DE MAIO EM HAVANA

Na segunda-feira, um dia bem quente e ensolarado, sem as fortes chuvas que assolaram Havana no domingo, nosso grupo se dividiu para os passeios. O pessoal decidiu ir para a praia em Havana, pegando um táxi logo cedo. Meu filho e eu decidimos andar por La Habana Vieja.

Saímos da Casa de Isabel, que está ao lado do Capitólio Nacional, e fomos no sentido da Estação de Trem que fica na região portuária de Havana, na baía interna que há na Ilha.

Atravessamos a Praça da Fraternidade e pegamos a Calle Factoria até a Estación Central de Ferrocarriles. Já temos ali o início do Malecón, grande estrutura de calçadão com uns 7 Km que circunda Havana com bela vista para o mar.


ESTACIÓN FERROCARRILES E CASA NATAL DE MARTÍ

Paramos uns minutos na pracinha da Estación Ferrocarriles Habana, onde ficam em exposição carros antigos de trens e muita gente sentada na praça, curtindo o feriado. Ao lado da praça, existe uma estrutura da época das Murallas que protegiam Havana, era um posto da guarda.


Pegamos a Av. de Bélgica e fomos até o Museo Casa Natal de José Martí. Como era feriado, não pudemos entrar nos pontos turísticos e históricos porque estavam fechados.


MURALLA DE LA HABANA

Ali na região da estação de trem, vimos uma estrutura conservada da antiga muralha de Havana - a Puerta de la Tenaza - e pudemos imaginar a grandeza da obra quando estava ali no século XVIII.

Achamos bem interessante o mapa em alto relevo demonstrando como era a Muralha na época que cercava e protegia Havana de possíveis piratas e ataques de outras metrópoles colonialistas.


Das muralhas e fortificações da época, ficaram várias estruturas preservadas, testemunhas da história de Cuba e do povo cubano. A cerimônia Cañonazo de las nueve (ver uma postagem a respeito aqui) é um exemplo cultural sobre a história da Ilha.


CENTRO CULTURAL SAN JOSÉ

Ao chegar à região portuária - el Paseo Marítimo Flotante de la Bahía de La Habana - onde se localiza o Centro Cultural Antiguos Almacenes San José, ou seja, mercado de artesanatos, seguimos caminhando pelo Malecón

No feriado o mercado de artesanato estava fechado, mas voltamos a ele outro dia e pudemos comprar alguma lembrança ali.

A região do porto está toda restaurada.

O conjunto arquitetônico ali foi todo restaurado e o lugar está muito bonito e aconchegante. La Alameda de Paula, por exemplo, na Avenida del Puerto, é repleta de bancos à sombra para se avistar o visual da baía, lugar muito agradável!

Passamos pela Sacra Catedral Ortodoxa Rusa e seguimos até a Plaza de San Francisco de Asis

Vale lembrar que em Cuba existe liberdade para cada pessoa professar a fé que quiser e pelo que pudemos apurar são mais de dez matrizes religiosas no país.

Castillo de la Real Fuerza de La Habana.

CASTILLO DE LA REAL FUERZA DE LA HABANA

Terminamos nossa caminhada por Havana Velha na região onde está o forte e museu em forma de estrela do século 16. Estrutura muito bem conservada como as demais que já citamos. 


Cuba trata com muita seriedade seu patrimônio histórico, material e imaterial. O historiador Eusebio Leal Spengler tem muita relação com essa concepção de preservação da história da Ilha.

Restaurante La Flor de Loto.
Bons preços, e tem fila de espera.

BARRIO CHINO DE LA HABANA

Fechamos o feriado indo comer em um restaurante chinês. 

Andamos cerca de um quilômetro ou pouco mais adentro do bairro chinês, lugar simples, sem estrutura urbana adequada, e que pode até assustar turistas como nós que convivemos com violência urbana nas cidades do Brasil. 

Olha aí nosso grupo!

No entanto, apesar das ruas e casas nos lembrarem as comunidades e favelas brasileiras, as pessoas estão brincando e conversando pelas ruas e os turistas caminham por ali sem problema algum.

LA HABANA VIEJA É LINDA

Demos uma bela caminhada no feriado do 1º de Maio por alguns pontos históricos de Havana Velha, lembrando que essa região é uma pequena região da capital de Cuba, a que mais se fala e visita, é uma pequena área de Havana, que é enorme. 

O pessoal curtiu praia em Havana.

Nosso grupo também aproveitou o dia na praia e só nos encontramos para sairmos para jantar à noite. Sim, Havana tem praia, pessoal, não é ali na parte antiga, mas tem.

La Habana Vieja é linda demais!

A cidade de Havana é bem grande e pouco conhecida dos turistas em geral. Normalmente se fala e se mostra muito de La Habana Vieja, que é maravilhosa!

Nos dois últimos dias de viagem, de volta à Havana, pudemos andar por outras áreas e vimos o quanto a Capital é grande e moderna, não à toa temos ali cerca de dois milhões de habitantes.

Fomos à finca onde viveu Hemingway, no Memorial da Denúncia e no bairro onde fica a Fusterlandia, que comento mais adiante em outra postagem.

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As cidades devem ser da classe trabalhadora.

REFLEXÃO: DEMOCRACIA E DITADURA...

Estou na região metropolitana de São Paulo, aqui vivem mais de 12 milhões de pessoas. Vivo num país capitalista. É aqui que ficam alguns dos grandes bilionários do Brasil. É aqui a tal "Faria Lima", nome associado aos banqueiros e rentistas que desgraçam o Brasil. 

É aqui que morreram 4 pessoas nas ruas nos últimos dias, provavelmente de frio, segundo as autoridades públicas e imprensa.

Na República Federativa do Brasil, temos um senhor que determina sozinho a taxa de juros de 13,75% que baliza a economia do país (selic), que paga papéis da dívida pública. O cara não foi eleito por ninguém, é um pau-mandato da casa-grande e dos latifundiários do "agro pop". Ele foi colocado lá por um homem que perdeu as eleições em 2022 e que está às voltas com acusações diversas na justiça. 

O presidente do país, Lula, eleito por 60 milhões de votos, está sofrendo um boicote descarado por parte desse sujeito do Banco Central, boicote para que seu governo não dê certo e a economia não volte a gerar emprego e renda para o povo. É um verdadeiro bloqueo aplicado ao governo brasileiro por parte de um homem do BC, um boicote diferente daquele que Cuba sofre por parte dos Estados Unidos há 6 décadas, mas um tipo de boicote dos capitalistas. É para inviabilizar o país e causar sofrimento ao povo.

Aí dizem que o Brasil é uma democracia. A imprensa da casa-grande não considera ditadura o que vivemos com a taxa de juros determinada por um homem não eleito e que destrói a economia de um país com 210 milhões de pessoas... até gente do meu lado da classe, a dos trabalhadores, acha que aqui vivemos numa democracia. 

O PARLAMENTO BRASILEIRO - Aí temos aqui um legislativo que foi composto nas eleições de 2022 por 513 deputados (poucas mulheres) e 81 senadores, sistema de duas casas - a que representa o povo e a que representa as unidades da federação. Aqui o voto é muito mais que censitário, na prática, pois só são eleitos candidatos com muito poder econômico, é só olhar as bancadas no Congresso.

Desde a eleição de Lula e o fim do mandato daquele genocida e miliciano que ocupava de forma questionável a Presidência da República tem vindo à tona todo o alfabeto de ilegalidades e crimes cometidos pela família de milicianos durante a gestão do líder deles e fraudes, muitas fraudes, durante o processo eleitoral. Digo eleição questionável porque a eleição de 2018 não foi legítima, sofreu intervenção para tirar o candidato que seria eleito e isso interferiu no processo.

O tal orçamento secreto, por exemplo, foi uma das bases do financiamento de campanha para a eleição da imensa, imensa, maioria dos 513 sujeitos que compuseram a Câmara que representaria "o povo". Os votos foram comprados... os bilhões e bilhões foram usados em milhares de municípios de forma "secreta" e é evidente que não temos um parlamento que represente o povo, esses 99% fora do escopo dos bilionários e milionários que compõem o 1% do país.

No Brasil são eleitores habilitados 156 milhões de pessoas. Não participaram do 1º turno 32 milhões de eleitores (21% não votaram).

MARCO TEMPORAL, GENOCÍDIO E DESTRUIÇÃO DOS BIOMAS BRASILEIROS - Nestes dias, aquele Parlamento canalha, vil, que não nos representa, votou às pressas uma lei claramente inconstitucional para colocar em exposição a Corte Suprema do país - que provavelmente julgará a lei ilegal - e expõe também o governo federal eleito, Lula, para criar no povo uma ideia de que o governo eleito está fazendo o contrário do que o povo elegeu.

Para finalizar a respeito da "democracia" brasileira, o atual presidente da Câmara, talvez não devesse sequer ter um mandato, porque concorreu sob liminar após ser condenado por corrupção em seu Estado. Se as Cortes de justiça usassem contra ele as mesmas réguas que usaram contra o cidadão Lula, ele jamais teria concorrido sob liminares. 

No entanto, ele concorreu e tem mandato e após comandar o "orçamento secreto" de bilhões de reais sem clareza no uso do recurso público, o cara chantageia o governo eleito de todas as formas possíveis e tudo parece normal. Não estamos em ditadura... sei!

O PARLAMENTO CUBANO - O povo cubano elegeu em março deste ano os 470 deputados e deputadas da Assembleia Nacional do Poder Popular. Participaram do processo democrático 6,1 milhões dos 8,1 milhões de eleitores possíveis (75,2%). 

Só para dar mais um exemplo de participação popular e democrática na República Socialista de Cuba, 90,15% do eleitorado participou da consulta sobre a atual Constituição do país, de 2019. Em Cuba, o voto não é obrigatório.

Eu vi em Havana muitas pessoas abordando os turistas e oferecendo tudo quanto é tipo de serviço e mercadoria local para complementar suas rendas: corridas de táxi, charutos cubanos etc. Pessoas pedem regalos (presentes) aos turistas. Pelo que nos explicaram, é que depois as pessoas vendem os regalos.

A cidade de Havana Velha é uma cidade em construção, em reforma e em espera de recursos para refazimento da estrutura física da cidade. O bloqueo de décadas deixou a economia da Ilha depauperada. 

Só um país e povo sob embargo sabe o efeito disso. É a bomba atômica atual, efeito mais eficaz que bala de canhão e metralhadora. A ideia é causar a miséria, a fome, o desespero do povo e com isso fazer o povo se revoltar contra seu governo e instituições e causar a ruptura. Bem democrático isso de impor embargo aos outros, né!

Enfim, pelo que pude apurar, os 11 milhões de cubanos têm ao menos uma cesta básica de mantimentos para não morrerem de fome. Se não há recurso econômico do governo, a cesta básica é pior; se há recurso, melhora pra todo mundo a composição da cesta. Como faltam moradias para todo mundo, muitas famílias vivem juntas nas estruturas que existem no momento.

NÃO há em Cuba mais de 30 mil pessoas nas ruas sem casa como em São Paulo, sem comida, sem assistência formal do governo. Não tem! Só tem essa multidão de humanos com fome aqui em São Paulo, no Brasil capitalista.

O QUE É MESMO DITADURA E DEMOCRACIA?

E depois vão dizer que definir o que é democracia e o que é ditadura não é uma questão de narrativa, narrativa bem parcial por sinal, como faz a "imprensa" monopolizada pelo poder econômico do capital e dos bilionários do mundo. É a pós-verdade, o poder de impor a verdade do mais poderoso. 

Para os capitalistas e parte das pessoas de minha classe social, a classe trabalhadora, democracia é o que temos nos Estados Unidos, no Brasil, no Haiti etc. Ditadura é o que temos em Cuba e na Venezuela etc.

Francamente, eu não compartilho dessas leituras de mundo como cidadão. No entanto, respeito a opinião de quem pensa diferente.

Para a leitura do texto anterior sobre esta série da viagem a Cuba, clicar aqui. Para ler o texto seguinte, clique aqui.

William


Post Scriptum: fica para o próximo texto, um comentário que quero fazer sobre as praças e parques em Cuba e em São Paulo e Brasil, e também a questão do novo Plano Diretor da Cidade de São Paulo, cujo interesse absoluto foi favorecer os capitalistas do concreto e aço e prejudicar a população paulistana, que vai perder o resto de praças, parques e áreas públicas que tinham... essa é uma diferença central entre a Havana do historiador Eusebio Leal Spengler e a preservação do patrimônio histórico e foco nas pessoas e a capitalista São Paulo da especulação imobiliária e expulsão das pessoas das áreas nobres da cidade.

Lembremos o que é privatização, é privar, é tirar o acesso de. Privatizar as áreas públicas e as coisas públicas é privar as pessoas do direito a elas. Tão básico e, no entanto, as pessoas não se atentam sequer ao significado da palavra: privatização = privar...



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