Refeição Cultural
É tempo de avaliar coisas. Tempo de avaliar a existência, a existência das coisas, a utilidade das coisas. Tempo de refletir sobre o tempo, o nosso próprio tempo, o tempo das coisas.
Este blog, por exemplo, uma coisa, perdeu o seu sentido no tempo presente, perdeu a utilidade, porque o lugar de fala do autor mudou com o tempo de existência do blog. Essa coisa teve a sua importância no tempo. Hoje, não mais.
Não sou escritor, não sou representante de nada, nem de ninguém. Não sou especialista de coisa nenhuma. Não sei quase nada das coisas presentes; sequer sei das passadas. Sei um pouquinho de algumas coisas, ou suspeito de várias, como já dizia o bom escritor. Mas isso não acrescenta nada ao mundo coletivo.
Nos últimos dois anos, às vezes utilizo o espaço do blog para registrar estudos, ou reflexões, ou lamentos. Mas não se deveria fazer isso em público, é uma exposição estúpida, principalmente se a pessoa não representa nada ou não influencia ninguém. É pura vaidade, dessas que a contemporaneidade criou nos indivíduos, idiotizando os seres humanos.
Enfim, enquanto não me desapego dessa muleta do existir, sigo postando coisas aqui, já que me facilitam até a releitura de textos por uma tela de celular, esteja onde estiver.
William
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Terminei a leitura do livro do professor Benedito Nunes, O tempo na narrativa. Os capítulos foram ficando mais complexos à medida que a leitura avançava. O ideal para compreender cada conceito seria reler e reler até que o conceito fosse absorvido pela inteligência, mas a leitura já me fez refletir bastante, e isso é positivo, em tempos de destruição cerebral crônica e coletiva.
As poucas anotações que fiz, servem para reler quando tiver dúvidas sobre alguns conceitos.
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Leitura do capítulo 7 "Tempo ficcional e experiência do tempo", do livro de Benedito Nunes, O tempo
na narrativa.
É possível tematizar o tempo? Narrar coisas do tempo? Tematizar
o tempo seria uma das potencialidades das narrativas ficcionais.
O texto ficcional tem a característica de não se confundir
com o mundo real, ele não é a reprodução da realidade. Aliás, a linguagem não
pode reproduzir a realidade, já estudamos isso. A linguagem escolhe o que
descrever ou reproduzir, ela é arbitrária.
No entanto, as diversas possibilidades de uso da linguagem podem
trazer aos leitores as relações que associam as ficções às realidades: “O nível
ficcional do texto, fundado na elaboração poética da linguagem, corresponde a
uma variação possível do mundo real.” (NUNES, 1995, p. 74)
O autor nos explica que o tempo ficcional reconfigura o
tempo cronológico, que prevalece na vida real.
A questão dos dois tipos de tempos: o tempo real do discurso
e o tempo imaginário da história. Existe um pacto entre autor e leitor
que valida a natureza fictícia do texto. A função do tempo na narrativa
ficcional só é preenchida e completada com a leitura do texto por parte do
leitor, é ele que reatualiza a reconfiguração do real.
Ao citar A montanha mágica, de Mann, Nunes diz “o
tempo, elemento da narrativa, é por ela preenchido com a matéria dos
acontecimentos, organizados numa forma determinada que permitirá divisá-los.”
(NUNES, 1995, p. 76)
Em relação ao privilégio da narrativa, Nunes cita Paul
Ricoeur que aborda a questão da mímesis em Aristóteles (ato de ordenação
– mise en intrigue). Fala que a mediação do enredo na efetivação
da leitura é “a mediação de uma forma compreensiva da ação humana”. Para
Ricoeur “a narrativa, como forma de linguagem, é um equivalente simbólico da
ação e do tempo humano correlato”. (NUNES, 1995, 77)
A conclusão, ainda com o auxílio de Ricouer, sobre essa função
simbólica da ação e tempo humanos na forma de ficção atinge o auge nos romances
que tematizam o tempo e coisas do tempo, gerando variações imaginárias das
relações temporais. Nunes nomina exemplos de autores do romance moderno: Marcel Proust,
Guimarães Rosa, Thomas Mann e Alejo Carpentier.
Bibliografia:
NUNES, Benedito. O tempo da narrativa. Série Fundamentos. Editora Ática, São Paulo, 1995.
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