quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Diário e reflexões - Janeiro




Refeição Cultural - Janeiro

Osasco, 31 de janeiro de 2024. Quarta-feira, noite fresca após as chuvas de verão.


Nesta postagem, irei refletir sobre alguns fatos e acontecimentos pessoais ocorridos no mês de janeiro. Também a respeito do meu ponto de vista sobre o caminhar da humanidade, seja neste espaço de terra chamado Brasil, seja na própria esfera rodopiante chamada por nós de planeta Terra.

A espécie humana seguirá sendo sábia? (homo sapiens...)

Tenho dúvidas.

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FATO OU FAKE? ESTAMOS VIVENDO O FIM DA DEMOCRACIA E DAS RELAÇÕES HUMANAS?

Neste mês de janeiro, estivemos por uma semana na Praia Grande (SP), na Colônia do Sinpro São Paulo, Sindicato dos Professor@s. É um dos locais que mais me sinto à vontade pela simplicidade do ambiente e praticidade em tudo. A colônia fica na Vila Caiçara. Mesmo sendo uma semana chuvosa, foi muito boa a nossa estadia lá. Caminhei, corri, nadei, li, fizemos novas amizades.

Uma observação feita na rua, ao voltar da praia, me fez refletir sobre a nossa realidade e para onde caminhamos. Ao passar por um grupo de pessoas na calçada, ouvi a garota com o celular na mão noticiar espantada que o Sílvio Santos havia morrido. As pessoas em volta começaram a comentar a notícia do falecimento daquela figura bastante popular na televisão.

Por algum censo de observação que devo ter, falei na hora para minha esposa que aquilo deveria ser falso, uma notícia de bolhas virtuais. Boa parte das pessoas hoje não se informa mais através das fontes mais tradicionais de informação como os meios jornalísticos em qualquer tipo de mídia. Se "informam" pelos grupos (bolhas) onde vivem nas redes sociais.

Sendo alguém que estudou bastante sobre o papel político e ideológico da imprensa tradicional, quase toda ela pertencente a poucas famílias através de propriedade cruzada e com laranjas, poderia ter colocado aspas já no primeiro "informa" do parágrafo acima, deixando claro minha opinião de que os jornalões e revistas são os principais criadores de notícias falsas, ou feitas para manipular seus leitores, invisibilizando temas e trabalhando matérias de forma canalha para ludibriar seus leitores.

Ou seja, as causas da desinformação geral são diversas, sendo a imprensa comercial e "tradicional" uma delas - no Brasil a imprensa é o PIG, o Partido da Imprensa Golpista -, por atuar contra os interesses do país e do povo, e as redes sociais pertencentes às big techs são outras responsáveis pela desinformação das pessoas, porque atuam manipulando seriamente os dados dos usuários com o objetivo agressivo de lucro a qualquer custo. Os usuários das redes sociais são commodities negociáveis com quem paga para os algoritmos direcionarem esse "gado" para o objetivo definido pelo comprador. Também vale direcionar o "gado" para votar por algo-alguém e contra algo-alguém....

Voltando à cena na Praia Grande, sobre a "morte" do apresentador de televisão que não morreu.

Quando vi a cena na calçada, imaginei que a notícia era falsa, ela estaria circulando por algum motivo para que pessoas pensassem que o apresentador Sílvio Santos havia morrido e gerar algum tipo de engajamento e compartilhamento massivo daquela notícia inverídica. As redes sociais e os algoritmos da internet funcionam assim: divulgar coisas para gerar engajamento, curtidas, lucro para alguns e manipulação de comportamento de grande contingente de pessoas, às vezes milhões.

Já estamos vivendo a era humana onde não saberemos se uma informação qualquer é verdadeira ou falsa. O leque de mentiras é inesgotável, vão de fake news criadas para confirmar afetos, medos, receios e gostos das pessoas até as fake news que desfazem todos os conhecimentos humanos acumulados ao longo do caminhar da nossa espécie como, por exemplo, referências científicas: o formato do planeta Terra, as vacinas para imunizar a espécie contra ataques de vírus e bactérias etc.

Não são só as bombas atômicas que podem inviabilizar a sociedade humana como nós a construímos ao longo de milhares de anos. Essa ameaça de décadas atrás - época da guerra fria - ainda contou com homo sapiens (sábios) suficientes para conseguir sensibilizar o próprio ser humano que se algo não fosse acordado globalmente a vida na Terra encontraria um fim. Conseguimos pactuar (até o momento) de não acionarmos milhares de ogivas nucleares que existem, a maioria com os EUA e com a Rússia, e mais um monte delas em outras aglomerações humanas mais conhecidas pelo nome de "países" - que são governados por uma ou algumas pessoas influenciáveis -, países que também têm as suas ogivas. Só algumas ogivas já seriam suficientes para acabar com todos nós e as outras formas de vida.

Agora temos uma tecnologia que manipula bilhões de pessoas, altera o comportamento delas, inventa o que quiser e divulga em segundos para influenciar zilhões de pessoas. E mais, o próprio resultado do efeito das manipulações na formação de novas gerações de humanos é algo ainda incalculável, podemos estar eliminando da face da Terra o homo sapiens, o animal racional sábio. As novas gerações estão vivendo uma experiência cotidiana absolutamente diferente da experiência humana vivida ao longo de milhares de anos. Saber ler e escrever, calcular, raciocinar, ter afetos por outras pessoas, conviver pacificamente com o outro e ações humanas do tipo podem estar em vias de extinção.

Acompanhei alguns debates recentemente que refletiram sobre as eleições que ocorrerão em importantes países neste ano. As autoridades e as organizações que de alguma forma regulam o convívio social não sabem o que fazer para impedir a produção em escala inimaginável de mentiras e desinformações, fraudes e crimes praticados utilizando-se a imagem, a identidade, a voz e todas as características dos alvos sem que o alvo jamais tenha feito ou falado o que os vídeos apresentam.

Uma eleição é decidida em dias, talvez horas, e os eleitores recebem o vídeo falso com aquilo que mais lhes incomodem (os algoritmos sabem) e imediatamente têm o seu comportamento alterado. O resultado de uma eleição na qual as pessoas votaram mediante uma mentira criada para influenciar seu comportamento é um resultado legítimo? Isso é democrático? Aferiu-se a vontade do povo?

Hoje, não temos como frear isso! Não temos! Uma pessoa pode ser linchada, cancelada, perseguida, perder uma disputa eleitoral, ser odiada sem sequer saber o motivo daquele sentimento inverso ao sentimento anterior, de uma pessoa ou público com o qual antes tinha uma relação positiva. 

Algo precisa ser feito pelas sociedades humanas, por homo sapiens, para evitar essa tendência desastrosa para a sequência da humanidade no mundo.

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CULTURA, SAÚDE E ATIVIDADES FÍSICAS

O mês de janeiro foi de muitas leituras, a maioria de revisão de textos próprios. Mas também de leituras de política, literatura e estudos diversos.

LIVRO - Estou editando o livro de memórias sindicais que fiz ao longo de uns dois anos no blog A Categoria Bancária - InFormação e História. Que trabalhão que dá ler e reler textos para uma edição de livro! No blog leio os textos várias vezes também, quando produzo o conteúdo, mas cada mídia tem suas características. No blog deixo link para tudo que estou me referindo. Em livro, isso é impraticável.

Ainda não sei quando a edição estará pronta e nem sei como farei para disponibilizá-la para as pessoas que tenham interesse na leitura.

LIVROS LIDOS - Li dois livros em janeiro, um de política e outro de literatura. 

O livro LulaLivre * LulaLivro foi publicado no calor da prisão política de nosso estadista em 2018. A leitura me trouxe fortes lembranças daquele período (comentário aqui).

O livro de literatura que li foi As aventuras de Tom Sawyer, do norte-americano Mark Twain (comentário aqui). Gostei do romance, escrito no século XIX. A leitura já me pautou para a sequência das aventuras, agora com o garoto Huckleberry Finn, publicado alguns anos depois de Tom Sawyer.

FILMES - Vi alguns filmes que me fizeram refletir sobre diversos temas relacionados à vida humana e ao planeta Terra.

Fomos ao cinema ver Napoleão, com Joaquin Phoenix, de Ridley Scott. Os críticos profissionais, em sua maioria, não gostaram das lacunas históricas na versão de Scott. Eu gostei do filme.

Outro filme que me deixou bem tenso foi Destinos à deriva, com Anna Castillo. Sofri na cadeira em casa! Mas é um filmaço! 

A última floresta, com Davi Kopenawa Yanomami, é um alerta imprescindível sobre a destruição acelerada da Floresta Amazônica e dos povos das florestas, protetores ancestrais daquele bioma. Fiz uma postagem sobre esses três filmes: ver aqui.

ESPORTE E SAÚDE

Após conseguir correr a São Silvestre no final do ano passado, busquei manter as atividades físicas em janeiro, pensando principalmente na questão da saúde.

Com muito cuidado para não me lesionar, corri 10 Km duas vezes, e corri 5 Km três vezes. Percebi uma melhora no condicionamento físico. Tenho monitorado minhas corridas. A frequência cardíaca melhorou de dezembro para janeiro. Minha condição respiratória e minha energia melhoraram um pouco também. 

Se eu considerar minha condição física quando decidi correr a São Silvestre, lá em outubro, posso dizer que melhorei bastante nesse período. Até semanas atrás, não conseguia correr direto alguns quilômetros sem parar para recuperar o fôlego e diminuir os batimentos cardíacos. Agora já faço o trote de forma ininterrupta. Melhorei. É seguir adiante.

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POLÍTICA

Como cidadão, estive nas atividades políticas para as quais fui convidado ou pelas quais me senti no dever de participar. 

A mais importante foi a do 8 de janeiro, data na qual o Brasil rememorou um ano da intentona bolsonarista (comentário aqui).

Também estive nas atividades do Diretório Zonal do PT no Butantã. A militância ali é muito engajada e participativa. Minha zona eleitoral é outra atualmente, mas nasci e vivi muito tempo ali.

CASSI - A autogestão em saúde dos funcionários da ativa e aposentados do BB iniciou seu processo de renovação de parte da direção.

Os fatos na política demonstram bem como as coisas estão na atualidade.

A nossa associação terá 3 chapas disputando o cargo da diretoria de planos de saúde. Todas as chapas são da "situação", não tem nenhuma chapa de oposição. Atípico isso!

Que leitura poderíamos fazer desse cenário? Será que as chapas representam mesmo os reais interesses dos associados e associadas da Cassi?

Alguma delas defende rever a política inviável para a autogestão de apostar nos "parceiros do mercado" e terceirizar tudo, inclusive seu modelo assistencial de Estratégia de Saúde da Família (ESF)? Os "parceiros do mercado", profissionais da área da saúde capitalista, que visam lucro e não saúde, tendem a dar o pé na bunda do parceiro sempre que tiverem propostas ou oportunidades melhores de negócios. Nada como funcionários da própria Cassi com salários e oportunidade de realizarem seus objetivos de cuidar de pessoas.

Alguma delas aceita rever a insensatez de criar um monte de planos de mercado ruins que não conseguem disputar mercado com ninguém e ainda vampirizam o Cassi Família II que é de longe muito melhor que os planinhos para familiares como se eles fossem inferiores aos titulares do Plano de Associados? A ideia não era essa quando criamos um plano para incluir os familiares. Era dar a eles a chance de ter O MESMO atendimento que os titulares teriam... Dá para reduzir a mensalidade do CF II se forem dados descontos para quem quiser aderir à ESF.

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Vamos seguir estudando, lendo e escrevendo, e tentando ser uma pessoa melhor e contribuir de alguma forma para a cidadania e o planeta.

É isso!

William


terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Diário e reflexões



Refeição Cultural

Osasco, 30 de janeiro de 2024. Terça-feira.


O primeiro mês do ano vai terminando. Muitas coisas acontecendo na política no meu mundo, o Brasil, e no mundão de todos nós.

Estou metido com minhas leituras e escrituras. Ao trabalhar o texto de retrospectiva pessoal do ano de 2023, ainda em confecção (ler aqui), peguei para ler todas as reflexões que fiz sobre os livros que li ano passado. 

Parece que não acabam nunca as resenhas e análises literárias que fiz. Foram mais de trinta livros lidos, autores e leituras densas. Se brincar, a releitura das postagens deve dar quase duzentas páginas. Por isso tenho refletido se eu não seria mesmo alguma categoria de escritor.

Como já está acabando o primeiro mês deste ano-calendário (somos todos PJ, contribuintes dos impostos: nós que não somos ricos, claro!), também tenho que fazer minha breve reflexão sobre o mês de janeiro. Não tenho acompanhado a política como acompanhei como dirigente sindical. Não carece mais. As reflexões do passar do tempo cronológico da vida têm sido mais sob o ponto de vista pessoal.

Enfim, está calor, estou cansado física e emocionalmente, estamos com alguns afazeres domésticos também, e sigo lendo diariamente para me manter humano, para manter minhas características de animal homo sapiens e para de alguma forma partilhar o que penso e sei com as leitoras e leitores que me honram ao ler o que escrevo aqui no blog.

Estou vendo alguns filmes, além dos livros que leio e comento, e lendo matérias jornalísticas de qualidade também. Tudo que me toca fundo, sento-me e escrevo para partilhar de forma honesta a reflexão com vocês.

É isso. Registro curto hoje. Podem acreditar que li muita coisa nos últimos dias.

Abraços!

E se valer alguma dica cultural, leiam um pouco todos os dias, sem estarem conectad@s em redes sociais, desliguem-se meia hora e tentem concentrar-se no que estão lendo. Teus cérebros e tuas essências agradecerão vocês, mesmo que de forma secreta.

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ORAÇÃO DO ATEU 

De um instante ao outro

sem me dar conta do porquê,

tomei um baita susto 

olhando no espelho.

Pavoroso ver todo aquele sangue 

manchando meu branco do olho.

Eu que tanto peço ao meu corpo:

corpo corpo meu, preserve-me

olhos e pernas, pernas e olhos meus

porque ler e correr são meus prazeres,

ler e correr são minhas armas na guerra,

na guerra dos sentidos do viver.

Que não me faltem olhos!

Que não me faltem as pernas!

Que a natureza não apronte comigo!


Sorte...

Por fim, sigo sendo um homem de sorte.

Se escrevi, se ainda andei entre árvores,

é porque sigo vendo e sigo andando.

Que assim seja! 

Amém.


William


sábado, 27 de janeiro de 2024

Leitura: As aventuras de Tom Sawyer - Mark Twain



Refeição Cultural - Cem clássicos (56)

Osasco, 27 de janeiro de 2024. Sábado.


Finalmente, li uma obra do escritor norte-americano Mark Twain, uma lacuna cultural a menos para mim. Gostei do romance As aventuras de Tom Sawyer, publicado em 1876. A edição que tinha em casa é essa da Editora Nova Cultural, do início dos anos dois mil, quando comecei a adquirir livros que um dia gostaria de ler. A tradução é de Luísa Derouet.

Literatura é uma forma de cultura deliciosa e que sempre nos estimula a novas leituras e novos conhecimentos! Ao conhecer a história do jovem Tom Sawyer, descobri que é interessante que eu leia também As aventuras de Huckleberry Finn, uma espécie de continuação deste romance e a obra mais referencial de Mark Twain.

O romance narra a história do garoto órfão Tom Sawyer, que vive com sua tia Polly, seu irmão mais novo Sid e sua prima Mary. Tom é um garoto cheio de energia, desobediente e que vive em busca de aventuras. Ele tem uma imaginação incrível e para realizar suas façanhas conta com alguns amigos, como Joe Harper e Huck Finn (Huckleberry Finn), garoto de rua por ser abandonado pelo pai alcoólatra. Tom é apaixonado por Becky Thatcher, filha de uma autoridade da cidade.

Algumas questões abordadas como pano de fundo no romance me chamaram a atenção, temas sociais de dimensões importantes no contexto no qual a obra foi escrita - após a guerra civil de meados do século - e temas que fazem parte da cultura dos norte-americanos como as superstições, a questão da escravidão dos afrodescendentes e a forma como a sociedade se organiza baseada na religião.

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UM POVO SUPERSTICIOSO

As crendices e saberes populares fazem parte das culturas das comunidades humanas, independente da época e de qual país estejamos falando. Alguns têm mais ou menos superstições, mas todos os povos têm as suas crenças e concepções de mundo e de vida.

Cadê o andar 13?
Foto: William Mendes.


Quando estive nos Estados Unidos, fiquei surpreso ao constatar que era verdade que o povo norte-americano tem tanto medo do número 13 que eles se enganam deliberadamente - autoengano - fazendo de conta que não existe o 13º andar dos prédios, é algo muito estranho para nós que não somos de lá. Os números nos elevadores pulam do 12 para o 14...

O romance é repleto de superstições, ditos populares do século XIX, e quase tudo que os garotos e os adultos fazem no cotidiano tem relação com algum tipo de crença ou mística.

Verrugas

"- Agora, sim! Quem que há de querer curar verrugas com água choca de uma maneira tão tola como essa? Claro que assim não faz nada. É preciso ir sozinho para a floresta onde se saiba que há um pau podre com água dentro, e à meia-noite em ponto virar as costas para o tronco, enfiar lá a mão e dizer:

"Cevada e milho dentro desta toca
Engole-me as verrugas, água choca
".

Depois deve-se dar onze passos de olhos fechados, andar em roda três vezes e ir para casa sem falar com ninguém. Porque se falar com alguém quebra-se o feitiço." (p. 47)


E aí? Quem não cresceu em ambiente com cultura de superstição? Quando criança, assim como Sawyer, eu vivia com medo de apontar para a Lua ou estrelas no céu porque isso dava verrugas nos dedos...

Não acho que o problema seja a superstição em si. Ruim é quando as pessoas não mudam de patamar de conhecimento ao longo da existência. Com os estudos e com a ciência, o que antes era a "explicação" das coisas do cotidiano passa a ser entendido como um mito, uma explicação criada antes da ciência esclarecer o fenômeno, se é que era algum fenômeno.

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EDUCAÇÃO BASEADA NA VIOLÊNCIA

Outra coisa comum nas sociedades humanas era a forma violenta de se educar as crianças. Bater e aplicar castigos violentos e humilhantes foram alguns dos métodos pedagógicos ao longo de séculos.

"O professor calou-se a olhá-lo, surpreendido. O sussurro do estudo interrompeu-se e os outros meninos perguntaram a si próprios se Tom teria perdido o juízo.

- O que você está dizendo?

- Parei para falar com Huckleberry Finn!

Não podia haver confusão.

- Thomas Sawyer, essa é a mais espantosa confissão que tenho ouvido, e já não chega a palmatória para castigar o que fez. Tire o casaco.

E o braço do professor bateu até se cansar.

Então as chibatadas diminuíram de intensidade e seguiu-se esta ordem:

- Agora vá se sentar junto das meninas e veja se cria juízo." (p.50)


Que cena dantesca... difícil até comentar!

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FALSA ILUSÃO DE LIBERDADE

Uma característica da visão inocente das personagens infantis do romance é não compreender a miséria vivida por um dos garotos, Huck Finn, que estava em situação de total abandono social. Tom e os demais garotos achavam o máximo a "liberdade" de Finn:

"Huckleberry ia e vinha à vontade, quando o tempo estava bom dormia nos degraus das portas e, quando estava úmido, dentro de algum grande barril desocupado; não tinha de ir à escola nem à igreja, nem de receber ordens de alguém; podia ir pescar ou nadar quando e onde lhe apetecesse, demorando-se quanto quisesse; levantava-se à hora que tinha vontade; ninguém o proibia de brigar; era sempre o primeiro a andar descalço na primavera, e, no outono, o último a se calçar; nunca tinha de se lavar nem de vestir roupa lavada; podia praguejar à vontade; numa palavra, tinha tudo aquilo que torna a vida preciosa! Assim pensavam todos os meninos de São Petersburgo, que tinham a quem obedecer..." (p. 46)


Lembrando que o romance é do século XIX e "São Petersburgo" é o nome fictício da cidade norte-americana onde se passa a história de Tom e seus amigos. A ambientação do romance é na região Sul dos Estados Unidos, no Estado do Missouri, na bacia hidrográfica do Missouri-Mississippi.

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A QUESTÃO DO PRECONCEITO RACIAL

Outra dimensão sensível do romance para leitores críticos é a temática do racismo, pois o romance é ambientado nos Estados Unidos em meados do século XIX, e a questão do preconceito racial e a escravidão fazem parte do cotidiano do país.

"- Boa ideia. Mas onde vai dormir?

- No galpão de Ben Rogers. Tanto ele como o criado preto, o tio Jake, me deixam ficar lá. Carrego água para o tio Jake, quando precisa, e, por sua vez, quando não tenho o que comer, peço-lhe e ele reparte comigo. É muito bom, aquele preto. Gosta de mim, porque não o trato como se fosse menos do que eu e até já algumas vezes tenho comido ao lado dele. Mas não vá contar isso. Há coisas que as pessoas fazem quando têm muita fome, mas não gostam que se saiba." (p. 173)


Vejam essa fala de um garoto abandonado, em situação de rua. Mesmo na condição social na qual ele está exposto, existe a preocupação dele de outros garotos saberem que ele anda com pretos. É duro demais, isso!

Abaixo, Injun Joe, um assassino mestiço falando:

"(...) E isso não é tudo. Isso não é nem a milionésima parte. Ele me mandou 'açoitar'! Mandou que me açoitassem diante da prisão, como se eu fosse um negro! A vista de todos da aldeia..." (p. 179)

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COMENTÁRIO FINAL

O romance de aventuras de Mark Twain, com personagens infantis, me agradou. É uma história leve, apesar de meu olhar crítico apontar essas questões sociais acima. 

Conforme o tipo de leitor ou leitora, mais despreocupados, essas marcas de comportamentos sociais e época talvez nem sejam percebidas.

Agora que conheci Tom Sawyer como protagonista daquelas aventuras no Sul dos Estados Unidos, fica o desejo de conhecer o romance com Huckleberry Finn como protagonista, um garoto abandonado e de pai alcoólatra.

Como dizia o intelectual italiano Italo Calvino, é melhor ler que não ler os clássicos.

Abraços,

William


Bibliografia:

TWAIN, Mark. As aventuras de Tom Sawyer. Tradução: Luísa Derouet. Editora Nova Cultural, 2002.


sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Diário e reflexões


Vila Caiçara, Praia Grande, SP.

Refeição Cultural

Osasco, 26 de janeiro de 2024. Noite de sexta-feira.


Vou dormir daqui a pouco em casa. Estávamos na Praia Grande, litoral paulista, nos últimos dias. Corpo cansado, por fazer atividades físicas. Consciência leve, porque faço a minha parte como animal racional para alongar minha existência, prorrogando a atuação do tempo e os efeitos do desgaste natural por sermos natureza. Minha herança genética e a forma intensa como vivi exponenciam meus riscos de interrupção da existência a qualquer momento (todos nós, mas alguns mais).

Estivemos na colônia dos professores do Sinpro São Paulo, um lugar simples, pequeno e que adoramos. Sentimos a ausência do filho, que não foi desta vez, mas conhecemos pessoas muito legais, professoras e professores. Enquanto a minha razão matuta ideias de fim das relações humanas - o tal pessimismo da razão -, a realidade nos apresenta pessoas que teimam em fazer a vida valer a pena. Muito interessante essa nossa espécie! Esperançar...

Colônia dos professores do
Sinpro São Paulo.

Correndo com um corpo gasto

Posso avaliar de diversas formas as coisas da vida. 

Um novo amigo, o professor Enrique, disse, por exemplo, que Deus (talvez a natureza) estragou os ossos do fêmur e quadril dele. Sob certo ponto de vista, poderíamos dizer que foi a vontade de Deus, dos deuses, do destino, da natureza etc. Aí vieram os animais humanos, a espécie animal que tem capacidade de alterar e controlar a natureza, que tem inteligência para criar coisas, e deram a ele nova estrutura de locomoção, próteses de cabeça de fêmur e encaixes no quadril. Achei a hipótese dele interessante. 

Qual foi a vontade de Deus e qual foi a do homem? A resposta depende das concepções de mundo de cada pessoa. O que posso dizer, por ser testemunha ao ouvir as pessoas, é o quanto a intervenção humana devolvendo a mobilidade e ou saúde a uma pessoa pode ser algo maravilhoso! O professor Enrique e várias pessoas que conheço estão felizes por voltarem a ter mobilidade.

No meu caso, estou com desgastes na estrutura locomotora também. Faz alguns anos que o prazer da corrida passou a ser uma mescla de dor e prazer ao me esforçar para correr, coisa que faço desde adolescente. E posso refletir sem falsa modéstia que, no mínimo, sou esforçado há décadas, e disciplinado, e pessoa com firmeza de propósito. 

Vamos tentando alongar a existência...

Não é pouca coisa! Se eu não fizesse atividade física, aeróbica, talvez eu já tivesse sido vítima de eventos cardiovasculares ou cerebrovasculares aos 54 anos (as maiores causas de mortes no Brasil). É minha natureza genética. Ao correr, adio os efeitos da natureza em relação ao meu colesterol ruim (LDL) e triglicérides, pressão alta, níveis de glicose, sobrepeso e obesidade, fatores centrais de doenças crônicas.

Nunca fui pessoa de aceitar com tranquilidade intervenções cirúrgicas. Entendo que intervenções invasivas em nossos corpos, só em último caso. Nem a cirurgia de miopia quis fazer tempos atrás, mesmo sendo moda e todo mundo fazendo. Aliás, se for falar de moda de cirurgia... fodeu! Eu gostava de práticas esportivas meio radicais, diriam, saltar de paraquedas, cachoeiras, cavernas etc e decidi não me arriscar a entrar para a estatística da pequena porcentagem de cirurgias de miopia que poderiam não dar certo. 

E depois de estabelecer minhas convicções e tendências sobre intervenções invasivas em meu corpo, ainda tive a oportunidade de ser gestor de saúde, de um modelo assistencial baseado em atenção primária e medicina de família: prevenção, promoção de saúde, controle de riscos, visão holística da pessoa etc. Aí que passei a ser mais cuidadoso ainda com essa questão de qualquer capitalista com diploma na área da saúde sugerir fazer uma "operaçãozinha" em você. Existem as intervenções necessárias e as desnecessárias... o difícil é saber como anda a ética do capitalista que vende essas intervenções cirúrgicas.

Enfim, toda essa verborragia acima é para dizer que se puder adiar fazer operações para colocação de próteses disso e ou daquilo, farei isso!

Depois que fiz a romaria de 80 Km ano passado (ler aqui), e depois que achei que não daria para correr a São Silvestre (15 Km) e corri, com uma história de superação incrível (ler aqui), entrei o Ano Novo imaginando coisas, esperançando ideias de corridas (já falei o quanto é fantástica essa invenção humana: o calendário e a contagem do tempo). Ano Novo, esperanças novas!

Vila Caiçara, Praia Grande.
Foto: William


Voltei com as corridas longas

Então, vou dormir com a sensação de dever cumprido em relação à minha saúde e às pessoas que são de minhas relações de afeto. Corri 10 Km na Praia Grande hoje, para me despedir da semana de férias na colônia dos professores. Foi incrível porque foi uma corrida bem tranquila. Minha energia estava ótima!

No domingo, saí para correr no calçadão da praia e não consegui fazer um longão. Depois de correr 5 Km, tive que parar porque se continuasse poderia me prejudicar. Foi ruim.

Eu já tinha corrido uma distância de 10 Km em janeiro, depois de correr a São Silvestre. Mas naquele dia na praia não deu.

Aí durante a semana no litoral choveu a cântaros. Mais de 300 mm de chuvas em quatro dias. Eu não me arriscaria a correr com chuva forte porque nos dias que ficamos na Praia Grande um raio matou uma senhora e feriu mais pessoas.

Como hoje era o último dia, a chuva virou chuvisco e a temperatura melhorou, saí para me despedir da praia. Que corrida gostosa! Que semana gostosa na colônia!

É isso! De volta a Osasco!

Seguimos a vida!

William


quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Leituras capitais (2023)



Refeição Cultural - CartaCapital nº 1291, 27/dez/2023


LULA III, ANO I

A leitura desta edição especial da revista comandada por Mino Carta e sua equipe foi uma leitura de fôlego, demorou um pouco, porém foi feita com atenção. Ela traz artigos e entrevistas com pessoas da melhor qualidade dando suas opiniões a respeito do primeiro ano do governo Lula neste conturbado momento da história do Brasil e do mundo.

Se prestarmos atenção no índice da revista, veremos que os temas e as chamadas das matérias fazem uma boa síntese do que aconteceu ou não aconteceu no ano de 2023 nas mais diversas questões da vida nacional. O que gosto em CartaCapital é saber que a revista tem uma transparência incomum nos dias atuais ao se apresentar aos leitores como apoiadora do governo Lula sem deixar de tecer todas as críticas que entender necessárias.

Como ser político, gostei da abordagem dos articulistas e entrevistados nas temáticas desenvolvidas na revista. Sei quase nada das coisas porque não sou especialista de coisa nenhuma. Entretanto, pela experiência de vida, tenho noções boas de algumas coisas.

Durante minha vida de representação política da classe trabalhadora acabei lidando com alguns temas que me fizeram conhecer um pouco mais que a média das pessoas áreas como comunicação, economia, educação, saúde e política. Fui gestor de secretarias de imprensa e formação, negociador nacional de direitos trabalhistas, e gestor de saúde.

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EDUCAÇÃO

A herança maldita de Temer e Bolsonaro na educação - Otaviano Helene

Essa matéria, por exemplo, me deu uma amargura imensa na alma, por ter a noção exata do que o articulista aponta. Se o governo Lula seguir com sua posição de não desfazer a destruição da educação em andamento desde a reforma do desgraçado do Temer - "Uma Ponte para o Futuro" -, o Brasil não terá chance de libertar seu povo da absoluta ignorância na qual está enfiado de forma consciente por parte das classes dominantes. A ignorância do povo é projeto no país.

Nestes dias de descanso na Colônia do Sinpro São Paulo, tive a oportunidade de conversar com professoras e professores que sentem na pele diariamente o que significa o projeto de emburrecimento geral das crianças e jovens brasileiros, o Novo Ensino Médio (NEM). Por fim, aborda a Lei 13.800, que permite que instituições privadas possam definir atividades curriculares em instituições públicas.

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Recomposição de receitas, o fim do Novo Ensino Médio, interferências privadas. Há muito a corrigir

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Otaviano Helene começa descrevendo as reduções drásticas de orçamento nas áreas de pesquisa científica e tecnológica, orçamento das universidades públicas, e depois enumera a tragédia ocorrida com a mudança da lei da educação, implantando o NEM. 

Amig@s leitores, é foda! Lula não comprou a briga com os canalhas por trás deste projeto de emburrecimento dos jovens da classe trabalhadora, seu ministro é porta-voz dessa gente da casa-grande... aí fica difícil!

Durante 2023 estudei um pouco sobre Cuba e o povo cubano e se tem uma coisa que concluí dos estudos, inclusive após visitar a Ilha por duas semanas, é que a educação cubana baseada em princípios e valores que vêm desde José Martí, no século XIX, é a responsável por manter acesa a chama libertária, ativa e altiva do povo em relação aos países imperialistas do mundo.

Sem educação, nunca teremos um povo, uma pátria, patriotas de verdade!

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HUMANIZAR O CAPITALISMO?

No mundo, caminhamos para um Estado de Mal-Estar Social - Luiz Gonzaga Belluzzo

Outra matéria que ilustra bem o que tenho escrito no blog é a questão da tendência atual de desfazimento da sociabilidade humana por causa do capitalismo, esse sistema organizador de um mundo para poucas pessoas com tudo e o restante sem nada.

Belluzzo pergunta:

"Estamos nós e Luiz Inácio, o Lula, a sofrer no mundo uma crise que nega os princípios fundamentais que regem a vida civilizada e democrática? Se isso for verdade, quanto tempo mais a humanidade suportará tamanha regressão?

O articulista começa suas reflexões agradecendo ao capitalismo a aceleração da criação de bens materiais em larga escala, dominando a natureza para isso (e destruindo a natureza, digo eu). No entanto, Belluzzo conclui que mesmo com toda a riqueza produzida, estamos sob uma "escassez de bem-estar" por nossa escolha política "na escassez de comida, de transporte, de saúde, de moradia, de segurança contra a velhice etc" para o conjunto das pessoas no mundo.

O que achei interessante, mas não é surpresa, é que Belluzzo desenvolve no texto o histórico de como chegamos ao "Estado de Bem-Estar Social" após a 2ª GM, mas não cita o Socialismo real que um terço da humanidade escolheu como forma de organização do Estado como o fator que contribuiu naquelas décadas para forçar os países capitalistas a repartir a riqueza com os trabalhadores através de direitos sociais universais. Nesse sentido, ele me pareceu a Globo contando suas narrativas e omitindo os responsáveis pelas coisas.

Belluzzo fala que a partir dos anos setenta o ideário liberal se impõe e a ética da solidariedade é substituída pela ética da concorrência. Depois cita a questão do 1% versus os 99%... mas nosso professor de economia não aponta o capitalismo como o problema. Seria pedir demais!

Solução? O professor termina o texto da forma como tenho visto as discussões no campo dos partidos como o PT e o próprio governo Lula: cita de novo os avanços do capitalismo ao "controlar" a natureza para a produção de bens materiais, mas não aponta solução que questione o próprio sistema causador da miséria dos 99%... 

Opinião minha: com essa postura de não termos coragem de nos levantarmos contra o capitalismo, seguiremos como gado na fila do abatedouro para o fim da vida humana e do planeta Terra.

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SAÚDE

Fortalecer o Complexo Industrial da Saúde é estratégico para o País - José Gomes Temporão

Para finalizar meus comentários sobre a retrospectiva do primeiro ano do terceiro governo Lula, e um balanço de nosso país e de nossa vida nele, comento sobre outro tema que conheço um pouquinho a mais que a média das pessoas, a área de gestão de saúde.

O ex-ministro da saúde, Temporão, definiu o ano como sendo de reconstrução de políticas públicas na área, o que concordo.

É boa notícia o foco do governo em investir no fortalecimento do Complexo Industrial da Saúde, serão 42 bilhões em quatro anos. Não é admissível um país de 200 milhões de pessoas, um dos maiores do mundo, com o SUS sendo um grande comprador, ter que importar absolutamente tudo na área da saúde. 

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Opinião minha: essa terceirização insana da área da saúde é estúpida, burra e quem faz gestão em saúde terceirizando e apostando no "mercado" não é um gestor que mereça a confiança da classe trabalhadora e do povo brasileiro.

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A falta de visão soberana de nossos "administradores" da saúde é tão grande que Temporão cita o caso da exportação brasileira de plasma para importar medicamentos a custo infinitamente maior, baseados em derivados de plasma.

Vejam o poder do SUS caso o Brasil apostasse na produção nacional através de leis como ocorre nos países que têm amor-próprio e soberania:

"No Brasil, o SUS atende 150 milhões de pacientes em todas as suas necessidades de saúde. O Poder Público representa metade do mercado de reagentes para testes diagnósticos, 40% do mercado farmacêutico, 95% do mercado de imunizantes. O país pode usar o imenso poder de compra do SUS para obter acordos de transferência de tecnologia."

Temporão diz que a internalização da produção industrial na área da saúde não se dá no Brasil por causa das visões ideológicas antagônicas.

"De um lado, os economistas ortodoxos, que veem o Brasil como um grande produtor de alimentos e ponto. De outro, há os que acreditam no potencial industrial do País."

Entenderam? Uns querem que o país seja um fazendão - tipo agro pop - com a riqueza ficando concentrada na mão de meia dúzia de pessoas, outros que a gente seja soberano e tenha produção com valor agregado e com produção de empregos de qualidade.

Até os anos 1980, produzíamos 50% dos princípios ativos usados na fabricação de medicamentos, hoje produzimos 5%...

Na parte final da entrevista, Temporão fala da importância da retomada dos programas Mais MédicosFarmácia Popular. A questão do envelhecimento da população brasileira é séria e isso terá consequências nos sistemas de saúde - públicos e privados. Estamos preparados para isso?

"Hoje, o câncer é a segunda maior causa de mortes no Brasil, atrás apenas das doenças cardiovasculares e cerebrovasculares, mas rapidamente se tornará a primeira."

Temporão termina tecendo críticas à redução de 20 bilhões do orçamento da saúde em 2023 através do "jeitinho brasileiro" e achou "lamentável" essa questão.

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E A CASSI/BB? Como disse, entendo um pouquinho de gestão de saúde, fui gestor da diretoria de saúde da autogestão dos funcionários do BB. A associação era focada em um modelo de atenção primária baseada na Estratégia de Saúde da Família com estrutura própria de atendimento primário, as CliniCassi. Tínhamos um modelo de distribuição de medicamentos para crônicos que contribuía para a manutenção da saúde de dezenas de milhares de doentes crônicos mesmo em áreas remotas do país. A Cassi tem o problema do envelhecimento de sua população atendida de forma exponencial em relação aos números da população atendida pelo SUS. E a ESF era um modelo extraordinário de eficiência no acompanhamento dessa população: provamos isso por estudos. Vieram gestões "liberais" e o foco hoje é o "mercado", terceirização de tudo.

Pergunto: das 3 chapas inscritas para as eleições das próximas semanas, alguma delas propõe reverter essa tragédia anunciada de terceirização de tudo, inclusive do modelo de Estratégia de Saúde da Família e as CliniCassi?

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LEITURA CAPITAL

As 24 matérias da revista estão excelentes, valem a pena para quem ler.

Não daria para comentar muitas delas porque senão a postagem ficaria enorme.

Abraços e vamos para um ano de 2024 de grandes definições para a nossa vida e para o planeta Terra.

William


terça-feira, 23 de janeiro de 2024

O fim do sonho americano - Noam Chomsky


Noam Chomsky. Foto: RBA, Mauro Calove.

Refeição Cultural 

Reflexões a partir do documentário "Requiem for the American Dream - Noam Chomsky and the principles of concentracion of wealth & power" (2015)

 

Plutocracia: faz diferença votar em A ou B num país como os EUA?

Ver o intelectual e ativista Noam Chomsky descrevendo os efeitos da financeirização da economia na fase atual do capitalismo e não se indignar e se posicionar contra essa forma de organização da sociedade humana seria uma forma de confissão da perda da essência daquilo que nos faz humanos, seres dotados de inteligência e raciocínio, espírito de cooperação e solidariedade nas relações sociais, características que nos destacaram na natureza durante o processo evolutivo das espécies. 

E mesmo que você não se manifeste expressamente contra ou a favor da situação atual da sociedade humana sob a hegemonia do modo de produção capitalista de bens materiais e imateriais e distribuição desigual dessa riqueza, você já se posicionou, porque essa coisa de se definir como alguém neutro, apolítico, imparcial etc é desculpa de gente egoísta apoiadora da injustiça social que vigora no mundo.

Se você não for um(a) militante pelo fim do capitalismo e a favor de uma sociedade humana baseada na solidariedade e igualdade entre as pessoas e entre as espécies do planeta Terra, em uma convivência sustentável com as diversas formas de vida nos biomas terrestres, você é parte ativa da destruição do único lugar no universo disponível para a vida humana.

Perguntas sem respostas

O que fazer para se inverter a tendência atual destrutiva da vida cotidiana da espécie humana? O que fazer individualmente? O que fazer coletivamente?

Pensei sobre essas questões enquanto ouvia Noam Chomsky falar... não tenho a resposta para as questões acima sobre o que fazer. 

Às vezes, a gente tem algumas noções do que não fazer (na dimensão individual da questão), mas o que fazer é mais complexo num sentido de ter capacidade política e econômica para alterar a tendência das coisas no mundo.

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Os dez princípios dos donos do mundo concentradores de riqueza e poder

1. Reduzir a democracia

2. Moldar a ideologia

3. Redesenhar a economia

4. Deslocar o fardo de sustentar a sociedade para os pobres e classe média

5. Atacar a solidariedade

6. Controlar os reguladores

7. Controlar as eleições

8. Manter a ralé na linha

9. Fabricar consensos e criar consumidores

10. Marginalizar a população


Comentário

O linguista, filósofo e cientista político Noam Chomsky descreve numa série de entrevistas como a sociedade americana se transformou numa plutocracia, destruindo a essência dos pilares democráticos que os EUA diziam representar nas democracias liberais.

Os Estados Unidos da América é o país do governo dos ricos (os plutos). Eu tenho comigo desde muito novo que todo animal humano rico ficou rico por algum processo ilegal ou injusto, ele enriqueceu às custas do empobrecimento de uma enorme quantidade de pessoas e ou às custas da destruição da natureza, um bem coletivo. 

Para mim, isso é injustiça e corrupção.

Não, você que me lê não é um pluto! Não é! Pare de se achar "rico" porque tem uma remuneração certa por mês, algum dinheiro aplicado ou porque tem um ou dois imóveis e carros na garagem. Você não é um pluto. Deixe de ser manipulado pelos ideólogos dos plutos. Você e eu somos demo, somos uns manés. A cracia não é exercida por nós, os demos, ela é absolutamente dominada pelos plutos.

Já ouviu falar no 1% x 99%. Nós somos os 99%. No Brasil, temos os nossos plutos. Uns deles, por exemplo, roubaram uma das maiores redes de lojas populares manipulando os balanços contábeis, causando o desemprego de milhares de pessoas e continuam desfilando por aí como os bam bam bam endinheirados da casa-grande brasileira. "Gente de bem" (bens) dizem por aí.

Nós não somos os plutos, nós somos a ralé que Chomsky e Jessé Souza falam, os médios. E estou falando dos endinheirados no gênero masculino porque esse universo é praticamente de homens brancos.

O documentário é excelente. Eu assisti pelo YouTube. A indicação foi de uma companheira de lutas, Carmen, de nosso diretório zonal do Partido dos Trabalhadores do Butantã. Vale a pena ver.

William


Fontes:

Documentário no YouTube

Artigo de Carlos Eduardo no site O Cafezinho


Post Scriptum: parei de colocar os links que não sejam do próprio blog porque essas referências são um faz-de-conta, uma ficção. Você cita um link e depois ele vira error e não existe mais... são as tais nuvens que as pessoas acreditam guardar o conhecimento em mídias digitais)


quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Diário e reflexões - CartaCapital 1292



Refeição Cultural - CartaCapital 1292

Osasco, 18 de janeiro de 2024. Quinta-feira: estamos sendo cozidos pelo calor.


REINVENÇÃO VERDE

A revista CartaCapital da primeira semana de janeiro de 2024 traz como matéria de capa a questão do meio ambiente e do desenvolvimento econômico brasileiro. A matéria informa os principais pontos do plano de transição sustentável do governo Lula para reabilitar a indústria e dinamizar a economia nos próximos anos.

Há muita contradição a respeito da temática do meio ambiente e o que seria desenvolvimento sustentável. Entretanto, fico aliviado pelo menos ao ver confirmado o que avaliei no início do ano passado, que não teríamos a ordem de destruição dos biomas brasileiros partindo do Planalto Central, do próprio governo, como tivemos durante os anos de exceção, sob o domínio dos golpistas Temer e Bolsonaro.

Mas que é difícil interromper a destruição dos nossos biomas e adiar ou reverter a emergência climática sob a hegemonia do capitalismo, isso é! Os responsáveis pela destruição de tudo são poucos, são aqueles animais humanos que detêm toda a riqueza do mundo e nada acontece a eles. A multidão de humanos que destrói lá na ponta, no mato, no rio, no mangue, é gente miserável e com fome, sem nada de nada. 

"Humanizar" o capitalismo?

Essa é a questão! Se meus pares petistas e ou de esquerda quiserem só amenizar o capitalismo... vamos todos desaparecer da face da terra.

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SAÚDE: EFEITO SANFONA - Seção de Drauzio Varella

Outra matéria que gostaria de comentar, só para registro, é a respeito do tema saúde.

O Dr. Drauzio Varella aborda resultados de estudos com medicamentos que prometem emagrecimento aos usuários. Os estudos demonstram que o uso contínuo de determinados medicamentos fez as pessoas perderem até 25% do peso, e as pessoas que usaram placebo a partir de determinado momento voltaram a aumentar o peso, tendo uma diminuição bem menor de peso que o outro grupo no período avaliado pelos estudos. 

No final do artigo, ele conclui que os medicamentos em questão são caros, fora do alcance até da classe média, e que ainda não se sabe os efeitos colaterais por um uso permanente.

O Dr. Varella nos lembra que desde muito tempo a receita básica para a questão do sobrepeso e obesidade são aquelas dicas óbvias para que as pessoas façam atividade física e consumam menos calorias. E comentou o óbvio também: é difícil as pessoas fazerem o que não gostam como, por exemplo, exercícios físicos, e deixarem de comer o que gostam. A conta não fecha.

Eu tive a oportunidade de estudar algumas matérias de saúde quando fiz disciplinas da área da Educação Física e depois me aprofundei na área de gestão de saúde em uma autogestão (Cassi) cujo modelo assistencial era baseado em atenção primária e medicina de família. Os resultados de grupos de participantes vinculados ao modelo são expressivos - independente da faixa etária! -, tanto os resultados em saúde quanto no uso dos recursos do sistema.

Outra conta que não fecha são os objetivos antagônicos entre os segmentos que lucram com a indústria da saúde - profissionais e empresas - e os "consumidores" de serviços de saúde, porque é disso que estamos falando no mundo capitalista. Médicos e CNPJs querem lucrar com seus serviços, lucrar. Se fizéssemos medicina preventiva e as pessoas não adoecessem, essa turma ficaria muito estressada, sem "clientes" e com baixos retornos financeiros...

A conta não fecha!

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É isso! 

Quem quer discutir o capitalismo e a saúde preventiva num mercado de venda de procedimentos de saúde para enriquecer alguns capitalistas?

William


Post Scriptum: para a leitura de comentários sobre a edição 1291, edição especial sobre o primeiro ano do novo governo Lula, é só clicar aqui.


quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Leitura: LulaLivre * LulaLivro (2018)



Refeição Cultural

Osasco, 18 de janeiro de 2024. Quarta-feira de calor cozinhante.


O primeiro livro do ano me trouxe muitas emoções, recordações e reflexões sobre as coisas dos homens. Dos humanos é o sentido geral do que quero dizer, no entanto "dos homens" é apropriado porque via de regra a sociedade humana é patriarcal, machista, misógina e dominada pelo universo masculino.

O livro LulaLivre * LulaLivro foi confeccionado e publicado em julho de 2018, no calor do processo kafkiano pelo qual o presidente Lula foi vítima, sendo ele acusado, julgado e condenado num tempo absurdamente rápido para os padrões normais do judiciário brasileiro, processo forjado pela quadrilha da chamada "República de Curitiba", uma organização liderada por um juiz considerado suspeito pelo STF. 

Lula foi preso no dia 7 de abril e passou 580 dias naquela masmorra. O objetivo político daquela tal operação Lava Jato foi alcançado, Lula foi retirado do processo eleitoral em 2018 e o monstro fascista foi eleito presidente para destruir o país e os direitos do povo nos quatro anos seguintes.

Prédio da Polícia Federal, onde 
mantiveram Lula preso (PR).

Durante os 580 dias de prisão política do presidente Lula, o líder do povo brasileiro - preso sem crime algum - ouvia de manhã, na hora do almoço e no final da tarde uma multidão de apoiadores gritarem "Bom dia, presidente Lula!", "Boa tarde, presidente Lula!", "Boa noite, presidente Lula!". Estive no Acampamento Marisa Letícia no dia 25 de abril de 2018, dias depois da criação da Vigília Lula Livre e pude acompanhar o coro de militantes no "- Boa tarde, presidente Lula!".

Lula foi solto no dia 08 de novembro de 2019, após o STF corrigir o abuso inconstitucional que ele mesmo permitiu anteriormente, levando uma pessoa à prisão antes de condenação definitiva como estabelece a Constituição Federal de 1988. O que vimos até então, desde o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, foi uma Suprema Corte covarde e omissa em relação às ilegalidades cometidas contra Dilma e Lula.

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GANHEI O LULALIVRE * LULALIVRO DE PRESENTE

"Seja bem-vind@!!!
Este é um pequeno carinho da Fetec-CUT/PR para você.
"


Quando cheguei a Curitiba, Paraná, em 28 de junho de 2019, para participar do Encontro Estadual do BB e Caixa (postagem aqui), ganhei um dos melhores presentes do mundo, um livro, da dirigente Dani, em nome da Fetec-CUT/PR. O livro é maravilhoso!!!

A edição é da Fundação Perseu Abramo, e foi organizado por Ademir Assunção e Marcelino Freire. 

"Joseph K., o conhecidíssimo personagem de Franz Kafka, se vê enredado em um processo judicial, cujas origens desconhece e cujo desenrolar vai se tornando cada vez mais obscuro, sórdido e absurdo.

O processo a que assistimos no Brasil contemporâneo, contra uma figura pública central da história política dos últimos 40 anos, guarda semelhanças e dessemelhanças com o enredo kafkiano: se o seu desenrolar expõe uma lógica absurda, suas origens e fins são muito delineáveis..."

Assim começa a apresentação do livro. É um livro-manifesto, dizem os organizadores.

"Os 90 poetas, prosadores e cartunistas aqui reunidos - de todas as regiões do país - atenderam ao chamado, na urgência dos fatos em curso no Brasil, para manifestar seu inconformismo com a prisão política do ex-Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva."

É uma delícia cada um dos 90 textos!

O livro é tão bom, que ficaria difícil apresentar aqui alguns dos poemas que adorei!

Amig@s leitores, à medida que vamos lendo cada poema, crônica, cartum, quadrinho, carta, memória, saudação, depoimento, documento, tudo relativo a Lula e sua história conosco, a história do Brasil de Lula e seu povo trabalhador, a gente vai se sentindo representado por aquele ou aquela autora do texto.

E mais!

Os textos são visionários! São registros da certeza que tínhamos da injustiça e da armação que estava ocorrendo naquele momento.

O tempo é o senhor da razão, dizem os ditos populares...

Lula é o Presidente do Brasil pela terceira vez! Aquela gente lesa-pátria, aquela quadrilha da República de Curitiba está sendo desmascarada a cada dia que passa.

A história está seguindo seu curso. Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou aquele juizeco que um dia a verdade viria à tona...

É isso!

William


terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Natais - 1971



Refeição Cultural

Neste momento da história, início do ano de 2024, a sociedade humana vive os seus dilemas como deve ter vivido no início da década de setenta do século passado. 

Estamos cozinhando num mundo superaquecido e nossas crianças e adultos não olham mais para o horizonte, nem precisaríamos mais de visão ocular curvada para perceber o mundo ao redor. Hoje, bastaria uma visão plana para ver uma tela na frente do rosto. Com isso, você pode morrer atropelado mesmo sendo a pessoa mais atenta e cuidadosa do mundo. Mesmo que você olhe, outro não vai olhar e bum... Ninguém olha mais pra frente... até os cachorros vira-latas são mais espertos que boa parte dos humanos andando nos ambientes do mundo.

Se naquela época o mundo vivia sob uma abstração chamada "guerra fria", e o mundo polarizava duas formas de sociedades humanas se organizarem, através de modelos de Estado capitalistas ou socialistas, seja lá o que isso quisesse sugerir à época, hoje o capitalismo venceu o socialismo e temos alguns humanos de carne e osso com riquezas maiores que a soma das misérias de bilhões de humanos no planeta todo. Detalhe: isso é "normal", é normalizado, isso não escandaliza meu vizinho, meu familiar e sequer altera a gana de alguém que se diz de "esquerda" para se engajar mais para mudar essa realidade da sociedade humana. É a minha impressão de observador.

As crianças de nossa sociedade ocidental (acho que no mundo todo) estão sendo aculturadas nos primeiros anos de vida a terem o desejo de serem youtubers ou "influenciadoras", seja lá o que isso queira dizer, e não mais cientistas, professoras, engenheiras, médicas, historiadoras. A ciência não parou de avançar em diversas áreas da sociedade humana. A tecnologia segue sendo alterada. Tudo está cada dia mais rápido no processamento, menor no tamanho, mais automático e instantâneo, e tudo tem contribuído para o ser humano se transformar em outra coisa, em relação às abstrações que nos fazem humanos. Não somos galinhas, jacarés, moscas, pombas, leões, gafanhotos por termos desenvolvido cérebros que nos transformaram em homo sapiens.

Tenho dúvida se seguiremos sendo sábios e se seguiremos existindo nas próximas décadas. Décadas mesmo! Não ousaria especular se estaremos no planeta daqui alguns séculos, como estivemos séculos atrás.

Pelo que tenho lido e estudado, o ser humano está regredindo rapidamente em suas características mais definidoras daquilo que nos fez seres humanos ao longo da evolução de nossa espécie.

Não sou determinista nem acredito em hipotéticos futuros determinados e definidos. No entanto, toda mudança de rota precisa de um momento de virada de tendência. Ainda não vejo sinais de mudança no horizonte humano.

Teríamos que mudar muita coisa a partir de hoje. 

Quem está a fim de mudança da realidade política, social e econômica do mundo? No passado, tanto capitalismo quanto socialismo tinham visões de uso do planeta como se a natureza fosse inesgotável. Um sistema venceu, outro virou palavrão. Mas a forma de uso do planeta segue a mesma. Consumir até acabar.

É uma reflexão. Talvez tenhamos produzido em uma semana de festas e comemorações de fim de ano em 2023 mais lixo e destruição do que todo o ano de 1971, quando eu tinha meus dois aninhos e pouco de idade. Mesmo considerando as guerras de lá e as guerras de hoje.

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NATAL DE 1971

Como terá sido o Natal de nossa família? Eu não tenho a menor ideia também. 

Sei que o mundo recebia estarrecido as imagens da Guerra do Vietnã. Sei que a classe trabalhadora se fodia no Brasil. O regime autoritário era aliado da elite para enriquecê-la, sugando os recursos do Estado e do povo em benefício de poucos. 

A ditadura brasileira promovida pela elite vira-lata arrepiava pra cima das organizações de resistência e a regra desde o AI5 era sequestrar, torturar e assassinar a militância que lutava para recuperar a democracia no Brasil. 

Uma das vítimas da ditadura foi a nossa querida presidenta Dilma Rousseff. Nessa época, a jovem militante estava presa e sofria tortura... mas resistiu bravamente! Que mulher extraordinária! Ela seria no futuro presidenta do Brasil e sofreria novamente a violência de um país machista, misógino e antipovo.

O militante de esquerda e combatente contra a ditadura, Carlos Lamarca, foi pego pelo regime em uma emboscada em setembro daquele ano, foi fuzilado sem dó.

A imprensa empresarial, boa parte dela, lambia as botas dos milicos e falava mentiras contra a resistência democrática o tempo inteiro. 

Será que meus pais caíam na lorota dos meios de comunicação de massa? Avalio que o poder midiático das imagens e versões narrativas com efeito de "verdade" por parte dos meios televisivos e jornalísticos era muito forte, quase irresistível. Só quem tinha acesso a outras visões de mundo tinha chance de questionar os meios midiáticos do poder político e econômico do país.

Quando me tornei adulto soube que meu pai era brizolista, ufa! Bom sinal! Brizola e Lula eram lideranças da classe trabalhadora que enfrentavam a ditadura financiada pela elite vira-lata tupiniquim. Nosso metalúrgico sindicalista, Lula, iria trilhar uma história única nas décadas seguintes neste canto de mundo chamado Brasil.

Fiquei feliz ao saber que as duas vezes nas quais meu pai foi candidato a vereador, uma em São Paulo, quando era taxista, e outra em Uberlândia, quando era radialista, foram pelo PDT. Ao fuçar nos papéis velhos da família, vi os panfletinhos do Palmério. 

É isso! O Natal de 1971 talvez tenha sido em Uberlândia ou em Goiânia, pelo que pude especular com minha mãe. Na foto, vemos meu tio Jorge, eu no colo da vovó Cornélia, mamãe, e tia Alice com a Telma no colo. Pelo que minha mãe explicou, a cena se passa em MG.

William


Post Scriptum: o texto anterior desta série pode ser lido aqui. O texto seguinte pode ser lido aqui.


sábado, 13 de janeiro de 2024

Diário e reflexões



Refeição Cultural

Osasco, 13 de janeiro de 2024. Sábado.


Hoje andei lentamente pelas ruas do Parque e me senti como aquele que fui muito tempo atrás, aquele antes dos trinta anos, aquele que não tinha um sentido certo para si. Cabisbaixo, respiração pesada, desânimo no passo. Desacorçoo. Pensando um milhão de coisas.

Me esforço faz tempo para sentir pertencimento a alguma coisa. Não me sinto pertencente a nada. Como pertenci a coisas grandes, aquele que fui experimentou o efeito dos hormônios mais intensos circulando pelo corpo. E adrenalina vicia como qualquer outro componente químico. E a psique também vicia, a dependência é física e psicológica. Anos após sair do mundo do trabalho e do movimento sindical ainda sinto a abstinência como se tivesse dado a última tragada na noite passada.

Me sinto neste momento da existência mais ou menos como me sentia no início da vida adulta: sem rumo, sem perspectivas, sem utopias. Era assim que me sentia. Não é a mesma coisa que antes porque a natureza foi implacável e agora não tenho mais um corpo para abusar dele ou inventar novos limites. Nem tudo que pensasse agora o corpo acompanharia.

Precisaria inventar qualquer coisa para dar alguma cor ao viver. O pior é que nem posso contar com a benevolência da natureza, nem a minha nem a que me envolve, o mundo definha, a humanidade inclusive. Minha percepção do mundo está horrível, estou azedo com o mundo ao meu redor. E não gostaria de incomodar ninguém com esse meu enjoo do ser humano.

Se não sentisse necessidade de escrever, desligaria tudo que me contata com o mundo. 

Por ter sido político por muito tempo, aprendi a fazer cara de poste para as pessoas e nos ambientes onde representamos nossos papéis sociais. Aprendi a engolir sapo, sofrer humilhações, aguentar provocações, fazer de conta que não entendia certas coisas, eu lidava bem com hipocrisias. 

Aliás, isso éramos nós todos, antes dessa época da intolerância, da superficialidade e do fim das relações duradouras, antes da overdose de prevalência das relações utilitárias. Antes dos cancelamentos. 

Utilitarismo. Tempos de relações utilitárias. Um abraço ou um cumprimento e convivências públicas se daquela relação a pessoa tiver alguma vantagem.

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Se não sou escritor, como foi que escrevi tanto?

E por falar na necessidade de escrever, fico impressionado ao olhar para trás e ver o quanto já escrevi. Neste blog de cultura, por exemplo, acabei escrevendo mais de 900 textos nos últimos cinco anos. Nossa! Vai ter o que escrever assim lá no mundo das letras!

E o contador de acessos do blog acusa que a página tem milhares de acessos por ano. Não tem como saber direito se são as máquinas de roubo de textos sem dar o devido crédito da fonte ("IA") ou se são seres humanos que acessam. Talvez sejam as duas coisas.

Os textos de memórias que fiz no outro blog, A Categoria Bancária, de uma hora para outra passaram a ter muito acesso. Foram dois anos escrevendo 39 capítulos de memórias. Os textos tiveram quase 90 mil acessos. Máquinas de "Inteligência Artificial" ou seres humanos? (Compartilho da leitura de Miguel Nicolelis e Noam Chomsky que não existe "IA", as máquinas não são nem "inteligentes" nem "artificiais").

De fato, às vezes recebo alguns comentários ou depoimentos de pessoas gentis que dizem que leem meus textos e que eles contribuem de alguma forma para as pessoas que os leram. Quando recebo um retorno desses, parece que algo fez sentido na vida, parece que fiz algo útil para esse nosso mundo.

Eu quis ser professor, educador, formador, algo nobre assim. Entretanto, acabei dedicando os melhores anos da minha vida a ser um bom sindicalista, bem na época em que havia entrado na Universidade de São Paulo para ser professor. Valeu a pena centrar o melhor de mim na representação porque quero crer que fiz bem-feito o que tinha que ser feito como representante da classe trabalhadora.

Fica a minha admiração do tamanho do universo para cada pessoa que se dedica a ensinar e educar crianças, jovens e adultos. A profissão de educar pessoas é uma das funções e causas mais nobres da espécie humana.

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Livro Memórias de um trabalhador politizado pelos bancários da CUT

Terminei neste fim de semana a leitura em poucos dias dos 39 capítulos das memórias que fui escrevendo ao longo de dois anos. A releitura sequenciada para editar os textos em formato de livro mexeu comigo por esses dias. Muitas lembranças e emoções acumuladas, muitas histórias pessoais e coletivas.

Me sinto meio esquisito em editar um livro, não sei se por vergonha, por me achar ousado, ou por achar que não vá ter interessados em ler os textos. Não sei nem se tenho coragem de divulgar bastante, talvez peça para as pessoas interessadas me contatarem por mensagem. Nem sei ainda como vai ser.

Tenho lido livros de memórias de militantes do movimento de lutas da classe trabalhadora e, a cada texto que leio, mais me encanto com a nossa história porque somos sujeitos históricos e isso é muito importante para seguir acreditando na educação e na memória como parte de uma cultura humana.

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Acho que por hoje já deu, fim dos registros e reflexões.

William