"Enquanto Macondo festejava a reconquista das lembranças, José Arcadio Buendía e Melquíades sacudiram a poeira da velha amizade. O cigano estava disposto a ficar no povoado. Tinha estado à morte, realmente, mas tinha voltado porque não pôde suportar a solidão. Repudiado pela sua tribo, desprovido de toda faculdade sobrenatural como castigo pela sua fidelidade à vida, decidiu se refugiar naquele cantinho do mundo ainda não descoberto pela morte, dedicado à exploração de um laboratório de daguerreotipia. José Arcadio Buendía nunca tinha ouvido falar desse invento. Mas quando se viu a si mesmo e a toda a sua família plasmados numa idade eterna sobre uma lâmina de metal com reflexos, ficou mudo de espanto..." (MÁRQUEZ, Record-Altaya, p. 52/53)
Refeição Cultural
"Tinha estado à morte, realmente, mas tinha voltado porque não pôde suportar a solidão."
Que expressão profunda essa! Fiquei imaginando as vítimas da pandemia de Covid-19 isoladas em biombos, com toda a parafernália tecnológica que salva vidas, ou sem elas, se não houver recursos, a suportar a solidão, e lidando com o risco de morte. Dura realidade que poderia ocorrer em quantidade menor de casos, se as vítimas não estivessem em grandes países sob controle político de trogloditas "liberais" de direita.
E pensar que os políticos de direita que causam a morte de milhares de pessoas por Covid-19, por fazerem o oposto das recomendações das autoridades de saúde, são os legítimos representantes das elites e das casas grandes que simbolizam séculos de exploração e dominação das maiorias de pessoas sem posses, sem direitos e sem cidadania.
Estou lendo o livro O tempo na narrativa, de Benedito Nunes, é já tomei conhecimento de diversos conceitos a respeito do tempo. Já fazia um certo tempo que havia estudado a temática e a leitura está me trazendo de volta conceitos e reflexões que vieram em momento muito pertinente, tanto para a minha vida pessoal, quanto para o momento social e coletivo em que nos encontramos.
Na Poética, de Aristóteles, temos uma rara referência ao espaço em relação ao tempo: "Silencia a respeito do espaço, e apenas uma vez, para reforçar a distinção entre epopeia e tragédia, refere-se expressamente ao tempo. Enquanto a tragédia limita-se, tanto quanto possível, ao período de um dia, a epopeia tem duração ilimitada." (NUNES, 1995, p. 7)
Na sequência da citação acima, o texto segue apresentando conceitos e referências. Uma tragédia, apresentação dramática através de personagens e com público presente, não deve passar de algumas horas de apresentação. Mas tanto a tragédia quanto a epopeia são gêneros que se baseiam na mimese: "a mímesis praxeos, imitação ou representação da ação, que cada uma realiza de forma diferente, a primeira pela atuação dos personagens, e a segunda pela narração." (p. 7)
Depois, vimos os conceitos de tempo físico e psicológico, tempo cronológico e tempo histórico, tempos linguísticos e tempos verbais. Aqui podemos lembrar rapidamente de temas como a hora que não passa quando estamos no aguardo de algo que queremos; as eras que já marcaram a vivência dos povos do mundo; as diversas formas que as línguas têm de marcar os tempos como modo, pessoas, aspectos etc.
Leitura do capítulo três, "Os tempos da narrativa". Em relação à obra literária de caráter épico ou narrativo, existem 3 planos: "o da história, do ponto de vista do conteúdo, o do discurso, do ponto de vista da forma de expressão, e o da narração, do ponto de vista do ato de narrar." (p. 27)
Citando Todorov, Nunes nos explica a diferença entre o tempo do discurso e o tempo da história, podendo ser o tempo da história pluridimensional. A história, o enredo, pode ter diversos eventos ao mesmo tempo, mas todos devem ser apresentados de forma linear no tempo do discurso.
(É um saco quando eventos externos, do ambiente externo em relação ao local onde estamos concentrados na leitura, nos atrapalham a leitura. encerro o estudo neste momento)
William
Bibliografia:
MÁRQUEZ, Gabriel García. Cem anos de solidão. Tradução de Eliane Zagury. Coleção Mestres da Literatura Contemporânea. Editora Record/Altaya.
NUNES, Benedito. O tempo na narrativa. Série Fundamentos. Editora Ática, São Paulo, 1995.
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