sexta-feira, 12 de novembro de 2021

121121 - Diário e reflexões



Refeição Cultural

"INFÂNCIA

        A Abgar Renault

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé.
Comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala - e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro... que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que a minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé." 

(DRUMMOND. In: Alguma Poesia - 1930)


Sexta-feira, 12 de novembro de 2021.


Dias atrás, reli o livro de poesias que apresentou o poeta Carlos Drummond de Andrade para o Brasil e o mundo. Alguma poesia é um livro que me arrepia só de mencioná-lo! Neste poema - "Infância" -, o Eu-lírico compara sua história à de Robinson Crusoé, personagem do romance do escritor inglês Daniel Defoe, publicado em 1719.

Já no finalzinho das Memórias póstumas de Brás Cubas (1880/81), romance de Machado de Assis que marcou uma revolução na literatura brasileira, o defunto-autor cita um gesto de Gulliver, personagem do romance do escritor irlandês Jonathan Swift, obra lançada em 1726.

"Multidão, cujo amor cobicei até a morte, era assim que eu me vingava às vezes de ti; deixava burburinhar em volta do meu corpo a gente humana, sem a ouvir, como o Prometeu de Ésquilo fazia aos seus verdugos. Ah! tu cuidavas encadear-me ao rochedo da tua frivolidade, da tua indiferença, ou da tua agitação? Frágeis cadeias, amiga minha; eu rompia-as de um gesto de Gulliver." (ASSIS. In: Memórias póstumas de Brás Cubas. Cap. XCIX)

Sou um homem de mais de cinquenta anos de idade. Passei boa parte de minha vida lendo alguma coisa aqui e ali de literatura. Desejo e sede de saber eu sempre tive. Não tive foi tempo livre para ler tudo o que gostaria. Trabalhei muito para os capitalistas e fiz os estudos mínimos exigidos de pessoas como nós da classe trabalhadora. Li bastante se me comparar com os meus pares da classe e com o povo brasileiro. Mas me falta muita leitura ainda. São lacunas culturais imensas, que me incomodam muito.

Dessas citações e referências acima, por exemplo, eu não li ainda As aventuras de Robinson Crusoé e As viagens de Gulliver. Só fui ler Prometeu acorrentado este ano (ver comentário aqui). Percebem minhas lacunas culturais? Aprendi a ter a humildade de saber que me faltam muitas leituras, mas tenho a consciência de quem não passou a vida à toa à toa (como a andorinha de Manuel Bandeira). Passei a vida sendo explorado pelos donos do poder e lutando contra essa exploração da classe trabalhadora, se não li mais romances e poesias não foi por opção, foi por necessidade do viver.

Drummond mesmo, tenho centenas de poemas seus a conhecer. Só conheço seus primeiros trabalhos, até os anos quarenta. Cecília Meireles, essa poeta e intelectual multifacetada, só passei a conhecer alguns poemas seus recentemente. Estou interessado em ler toda a obra de Drummond e de Meireles. Se o tempo de existência me permitir, seguirei lendo eles.

Essa introdução trabalhosa de meu diário cultural e de reflexões é para registrar que comecei ontem a leitura de Robinson Crusoé. Lá vamos nós viajar no tempo e na literatura mundial. Crusoé vai se somar aos meus clássicos lidos recentemente como, por exemplo, Moby Dick e Decamerão

Desejo que a casualidade do viver me permita completar a leitura e saber finalmente a história de Crusoé. Apesar dessa lacuna cultural, não tenho dúvidas sobre a boniteza da história do Eu-lírico do poema de Drummond. Daqui a algumas semanas saberei também das aventuras de Crusoé.

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LUTO E PESAR

Estou muito triste, muito abalado e me solidarizo com o falecimento de Dôia, economista e militante socialista. Dôia era companheira de nosso querido Bemvindo Sequeira. Nosso casal militante e socialista, que tem vivido em Portugal, contraiu Covid-19 dias atrás e Dôia, como era chamada carinhosamente, não resistiu. Bemvindo está se recuperando aos poucos da Covid. Ele esteve nesta sexta-feira em uma live com Kiko Nogueira e Pedro Zambarda, do site DCM.

É tudo muito triste... a vida é um instante, somos muito frágeis, apesar de sermos muito fortes quando lutamos como militantes por um mundo mais justo e solidário. Companheiro Sequeira, receba o nosso carinho. 

- Companheira Dôia, presente!

William


Bibliografia:

ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do Mundo. 10ª ed. - Rio de Janeiro: Record, 2000.

ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. 1ª ed. - São Paulo: Panda Books, 2018.

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