Refeição Cultural - Cem clássicos
Li mais uma vez o livro de poesia de estreia de Carlos Drummond de Andrade - Alguma Poesia -, lançado em 1930, um clássico do poeta modernista e da poesia brasileira.
Do início ao fim do livro temos 49 poemas com pernas, coxas, tetas, nádegas, olhos, bigode... "pernas brancas pretas amarelas", "coxas das romeiras", "pernas adjetivas", "coxa morena", "pernas que passam". Cito isso só para não acharmos que só os estrangeiros têm os seus joyces e suas personagens blooms na primeira metade do século vinte.
Poemas de humor, de crítica e denúncia social, poemas que anunciam os efeitos da modernidade tecnológica nas pessoas. Poemas que contrapõem a cidade e o campo, a velocidade do centro urbano e a lentidão da vida no interior.
Que livro! A gente lê os poemas e quer sair divulgando e comentando com as pessoas e com o mundo o quanto os poemas se encaixam naquilo que estamos vivendo. Os poemas falam por nós, falam de nossa angústia frente ao Brasil e ao mundo em destruição acelerada. Que livro! Caraca!
Estou lendo poesias e conhecendo autores, obras, e livros que tenho em casa. Tenho as poesias completas de Cecília Meireles, de Drummond e diversos livros de outros autores. Mas li pouca poesia em minha vida, não conheço praticamente nada de poesia. E a vida é um instante, é um sopro efêmero. Então é ler e reler e sentir as poesias que nos legaram nossos poetas.
já li os 3 primeiros livros de Meireles, lançados em 1919, 1923 e 1925. Os estilos dos livros, temas e formas são bem diferentes dos de Drummond, que também conheço pouco, praticamente só conheço os primeiros livros de poesia dele - 1930, 1934, 1940 e 1945.
MEIRELES
- Espectros (1919), Nunca mais... e Poema dos poemas (1923), Baladas para El-Rei (1925).
DRUMMOND
- Alguma poesia (1930), Brejo das almas (1934), Sentimento do mundo (1940), A rosa do povo (1945).
Se formos sobrevivendo neste mundo, vamos conhecendo mais um pouco sobre eles - Meireles e Drummond. Estou indo na leitura por ordem cronológica, pela facilidade de ter as obras completas.
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EXÍLIO? NÃO QUERO IR PRA LUGAR NENHUM
Vivemos tempos nos quais um dos principais temas nas cabeças e corações das pessoas progressistas e decentes é o exílio, o ir-se embora daqui do Brasil destruído, seja pra Pasárgada ou qualquer outro lugar longe do bolsonarismo.
Não acho justo abrir mão de meu país por causa dessa burguesia canalha e vil, burguesia que estragou tudo que construímos ao colocar no poder o crime organizado. Não me agrada sequer pensar em mudar, em ir embora daqui. Tenho trauma de mudanças também. Contei na minha vida mais de dez mudanças em dez anos por causa da vida proletária. Minha vida era mudar de aluguel em aluguel porque era preciso.
Cara, que saco isso! Eu não quero ir embora, não quero deixar o meu país. Mas sei que tá foda! A impressão é que não recuperaremos nosso mundo, que não nos veremos livres do bolsonarismo, essa doença odiosa.
Nesse contexto de vida social do país, Drummond é tudo! Cada poema é uma crítica e um contexto, o Eu-lírico pode ser qualquer um de nós a qualquer tempo.
Mas deixo o poema "Lagoa" pra dizer que aqui é minha terra e aqui gostaria de viver e morrer.
"LAGOA
Eu não vi o mar.
Não sei se o mar é bonito,
não sei se ele é bravo.
O mar não me importa.
Eu vi a lagoa.
A lagoa, sim.
A lagoa é grande
e calma também.
Na chuva de cores
da tarde que explode
a lagoa brilha
a lagoa se pinta
de todas as cores.
Eu não vi o mar.
Eu vi a lagoa..." (p. 29)
Aqui é minha terra e nós temos que superar o bolsonarismo, essa gente do mal, gente odiosa, e reconstruir nossa terra, nosso ambiente, nossa cultura, nossas vidas.
William
Bibliografia:
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do Mundo. 10ª ed. - Rio de Janeiro: Record, 2000.
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