24. Ainda estou em Uberlândia. Volto para São Paulo hoje à noite.
Pensando um pouco sobre a questão do que devo fazer de minha vida de agora adiante, avalio que devo fazer o que estou fazendo: cuidando de algumas pessoas para as quais ainda posso dar algum suporte material (não tenho ilusão alguma quanto à questão do que penso, falo, escrevo: minhas ideias não servem pra nada).
Estou indeciso quanto ao que fazer da vida em relação ao tempo que dedico a ler e escrever. O que quero com as leituras? Qual o sentido de escrever sobre coisas para as quais não tenho relevância alguma? É um dilema como aquele de falar para pessoas coisas que entram por um ouvido e saem pelo outro delas. No fundo, nossa vida virou uma conversa de cegos, surdos e mudos que não se conhecem e não conseguem se comunicar.
Enquanto um sujeito ou uma sujeita chamados de influenciadores falam de tudo - às vezes sem saber de nada - e influenciam milhões de pessoas, um reles cidadão não influenciador não convence sequer uma criança de dois anos, um jovem de uns vinte e tantos anos e um idoso de oitenta a fazerem ou não fazerem alguma coisa explicando que aquilo é errado e ou pode trazer consequências irreversíveis para a vida da pessoa.
Outro dia, citei uma fala inútil minha para meu pai, sobre não passar um pano imundo nas lentes dos óculos, e aproveitei para dizer que todos nós fazemos coisas estúpidas, todos nós! Um pouco da questão que abordei tem relação com uma certa frustração por perceber que não conseguimos mais dialogar com as pessoas, inclusive aquelas de nossas relações.
Tenho o privilégio de ter neste momento da existência os meus pais vivos. São duas pessoas super inteligentes, criativas, como costuma ser a geração deles. Meu pai quase não consegue andar por questões de saúde, mas inventa coisa pra fazer o dia inteiro, desmonta e monta coisas, conserta umas e estraga outras tentando arrumar rsrs e fuça fuça em tudo. Minha mãe, idem, se tem alguma coisa que já está velha, não funciona na cozinha, na casa, ela faz funcionar. Na vida, costurou, desenhou, pintou, escreve, corta cabelo. Nossos pais aprenderam a fazer de tudo, como os povos originários e tradicionais sabiam fazer. E as novas gerações, como são? São diferentes, são outros tempos, devem ser especialistas em algo (mas não deveriam ignorar tanto as demais dimensões da vida).
Enfim, estou buscando sentidos para o meu viver. Dar suporte material a algumas pessoas já é ter algum sentido. Foi uma escolha acertadíssima pegar a maior parte de minha remuneração de membro da classe trabalhadora e investir na manutenção da vida de meus familiares mais próximos. Há dez anos que posso fazer isso. Para mim, de nada valeria dinheiros sem as pessoas que amamos.
Tudo muda o tempo todo e todo mundo tem que se virar. Me esforçar para viver é um ato de responsabilidade e um fato social. Não sou imprescindível na família, mas tenho consciência do papel que exerço e do suporte que posso dar para as pessoas terem mais oportunidades em suas próprias vidas.
Quanto à questão do mundo lá fora, aí é complicado! Preciso encontrar algum sentido no que leio e escrevo.
Qual o sentido de ler e escrever sobre política, mundo do trabalho e sindical, Cassi, partidos, governos, temas complexos e dos quais tenho algum conhecimento e experiência se tudo isso é inútil para mim e para os outros? Por que não consigo superar a realidade de que não pertenço mais a esse mundo?
Esse dilema segue nessa busca dos 100 dias...
William
Post Scriptum: vejam o que disse sobre a criatividade da geração dos meus pais... eu preocupado se meu tênis seca ou não até a hora de viajar e meu pai inventou um sistema de captação dos últimos raios solares...
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