segunda-feira, 11 de março de 2024

Cuba (IV)


Heróis cubanos: Cuba preserva seu passado.

Refeição Cultural

Osasco, 11 de março de 2024. Segunda-feira.


DIFERENTE DO BRASIL, EM CUBA O GOVERNO FALA DA HISTÓRIA DA INDEPENDÊNCIA DO PAÍS TODOS OS DIAS!

Cuba e Brasil, Brasil e Cuba. Dois países com histórias seculares de dominação imperialista, dois países com uma violenta história de escravidão dos povos do continente africano, dois países com histórico de extermínio dos povos originários. Cuba e Brasil, países que mexem com o meu coração, com os meus sentimentos.

Até antes do golpe de Estado de 2016 contra a presidenta honesta Dilma Rousseff (PT), mesmo sendo um homem politizado de mais de quarenta anos de idade, eu tinha uma certa inocência política daquela mais comum no movimento organizado e nas pessoas no campo da esquerda, aquela inocência que prefere acreditar que nada de mal vai acontecer ao invés de analisar friamente a realidade e os dados materiais e se preparar para o golpe, a guerra, a morte lutando.

NO BRASIL, ACREDITA-SE DEMAIS NAS "INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS" E ELAS PARTICIPARAM DO GOLPE DE ESTADO EM 1964 E 2016

04/03/16, nas ruas defendendo
o governo Dilma.
 

Meu campo político no Brasil até que lutou contra a nova fase de golpes contra governos democráticos nas Américas e Caribe do último período, ficou nas ruas em pequenos grupos gritando "Não vai ter golpe!", duvidando que fossem prender o Lula, não acreditando que Bolsonaro poderia ser presidente do país. 

Boa parte da esquerda brasileira acreditava e segue apostando que as instituições vão funcionar e que não haverá golpe ou ruptura democrática de novo...

31/03/16, nas ruas contra o golpe,
52 anos depois de 1964.

Eu sigo com a leitura que tenho desde 2022 e 2023 de que nosso governo Lula terá dificuldade de terminar o mandato sem sofrer nova tentativa de golpe de Estado ou algum tipo de atentado contra o próprio presidente Lula. Concordo até com o jornalista Brian Mier (ouvi dele a ideia hoje na TV247) que o governo brasileiro deveria se informar com os governos cubano e venezuelano a respeito de proteção contra golpes e atentados, já que esses governos enfrentam isso com frequência.

17/04/16, nas ruas contra o golpe,
as instituições não funcionaram...

NO BRASIL, A ESQUERDA "PAGA PAU" PRA JUIZ DE DIREITA... ACHO ISSO UM EQUÍVOCO!

As pessoas do meu campo da esquerda até viraram tietes de um certo ministro da Suprema Corte colocado lá pelos traidores da pátria em 2016 e chamam ele por apelido... acho isso ridículo, um absurdo! 

O cara (o juiz apelidado) enfrentou os bolsonaristas em 2022 para salvar a própria pele, a pele deles daquela Corte, que aliás endossou o golpe de 2016 que desgraçou o país e a vida do povo brasileiro e manteve Lula preso numa masmorra por 580 dias. Mas somos assim aqui no Brasil.


EM CUBA, JOSÉ MARTÍ É A REFERÊNCIA, MARTÍ E FIDEL

Estátua de José Martí, em batalha pela
libertação de Cuba do domínio espanhol.

O povo cubano, desde o século 19, sofrendo os mesmos males e violências de todos os povos explorados das Américas e Caribe, se organizou e se rebelou para lutar por sua liberdade e autonomia em 1868, depois mais algumas vezes até 1895, quando morreu em combate uma das figuras intelectuais mais brilhantes que a espécie humana já produziu - José Martí -, e em 1898 os cubanos se libertaram dos espanhóis e já se deram conta de que não haviam se libertado do imperialismo. 


Nova luta de libertação começava, desta vez contra o mais novo império do Norte - os Estados Unidos da América -, que já estendiam suas garras sobre a maior das ilhas das Antilhas, Cuba.

EDUCAÇÃO CUBANA - Na minha opinião, várias coisas separam a história do povo cubano da história do povo brasileiro, a considerar do século 19 adiante: a Educação é uma delas. 

Os ideais martianos de liberdade e autonomia são a base da educação cubana há 150 anos. E após a Revolução, a história e a cultura fazem parte da pedagogia da educação no país.

Quando os jovens liderados por Fidel Castro se organizaram e decidiram que era a hora de enfrentar a ditadura de Fulgencio Batista em 1953 - Batista havia dado um golpe de Estado em 1952 e era bancado pelos Estados Unidos da América -, os jovens cubanos universitários eram martianos. 

Revolución es sentido del momento histórico...

Os jovens estudantes tinham como referência José Martí e a história das lutas de libertação do povo cubano desde o século anterior. E aquele processo de lutas martianas lideradas pelos jovens de 1953 no ataque ao Quartel Moncada culminou com as lutas revolucionários a partir da Sierra Maestra entre 1956 e 1º de janeiro de 1959, quando triunfa a Revolução Cubana.

Patria o muerte!

A HISTÓRIA FAZ PARTE DO COTIDIANO CUBANO

Eu acompanho as notícias de Cuba com mais atenção desde que me preparei para conhecer o país em 2023. É evidente que a forma como faço para ler do Brasil as notícias diárias da Ilha me dá a versão de um lado da história - a do regime socialista - porque leio e ouço os veículos de comunicação do governo cubano e do Partido Comunista Cubano. Mas leio críticas ao regime também, quando leio figuras como Leonardo Padura, escritor cubano importante.

No entanto, para ler e ouvir o outro lado - as versões antirrevolucionárias -, basta olhar o restante da mídia hegemônica e as mídias que os algoritmos das big techs do imperialismo apresentam a todos nós. Sempre será desproporcional a guerra cultural entre a fala da esquerda e ou dos pequenos grupos contrários ao sistema capitalista e as narrativas que falam para bilhões através das mídias do grande capital. 

O ódio à esquerda é o que mais dá likes e monetização para os direitistas e lucro para elas, as big techs.

Museu da Denúncia em Havana, Cuba.

CONHECER E ESTUDAR A HISTÓRIA É ESSENCIAL PARA A LIBERTAÇÃO DO POVO COM PASSADO COLONIAL

Enfim, o tema que me deu vontade de comentar ao refletir sobre os dois países que mexem com o meu coração - Brasil e Cuba - é a questão do momento - os 60 anos do golpe de 1964 no Brasil e os 65 anos da Revolução Cubana em 1959 - sobre falar ou não falar do passado, da história, de acontecimentos que marcaram para sempre a vida de um povo após ideias e fatos que mudaram a história.

No Brasil, o nosso governo decidiu e defende a ideia de que não se deve fazer manifestações e eventos institucionais e ou das principais organizações sociais de nosso campo da esquerda em relação aos 60 anos do golpe de Estado que colocou o país e o povo brasileiro por mais de duas décadas sob uma ditadura violenta, financiada e apoiada pelos Estados Unidos da América e pela elite do país.

Para ser médico revolucionário ou
revolucionário, tem que haver Revolução! (CHE)

Eu considero essa atitude um equívoco do nosso governo neste momento da história. O presidente Lula é a nossa maior liderança política em toda a história do Brasil e eu sei porque o presidente acha melhor contemporizar com as forças conservadoras e de extrema-direita no país, pois Lula sabe que sua correlação de forças é muito aquém do que precisaria para seguir governando e entregando minimamente aquilo que se comprometeu a fazer, e está fazendo, por mais que a comunicação do governo não consiga se sobrepor à comunicação dos inimigos, que têm o suporte das big techs com eles.

Em Cuba, todos os dias - eu disse TODOS OS DIAS - os veículos de comunicação do país trazem matérias, reportagens, efemérides sobre os heróis do povo cubano, sobre datas históricas que mudaram a vida do povo de alguma forma, não há uma escola no país que não tenha o busto ou um quadro destacando a figura de José Martí, Apóstolo da Independência do país, e isso faz toda a diferença na construção de uma mentalidade ativa e altiva do povo cubano desde a mais tenra idade. 

Lançamento do livro de Maria Leite em 2023.

Ao ler o livro da professora Maria Leite - Cuba insurgente: identidade e educação (2023), no qual a especialista apresenta estudos de quatro décadas sobre a pedagogia cubana, fica claro para mim que sem o estudo da história o povo cubano jamais teria resistido até hoje às seis décadas de bloqueio criminoso por parte dos EUA para causar miséria e humilhação ao povo que se negou a ser uma ilha de exploração dos ricos e da máfia estadunidense. Ler sobre o livro aqui.

Fidel Castro e os revolucionários
eram seguidores das ideias de
liberdade de José Martí.

Já estive em Cuba duas vezes, por duas semanas em cada vez que estive lá, e conversando com o povo cubano percebe-se com facilidade que eles têm uma educação com saber histórico anos-luz à frente do saber histórico de nosso povo brasileiro, para o qual sempre foi negada a educação libertadora defendida por Paulo Freire e outras figuras importantes da educação brasileira.

Homenagem a Che Guevara, 
em Santa Clara. O passado faz
parte da história das lutas do povo.

Quando vejo o meu governo defendendo que não falemos sobre a história, sobre a trágica história do golpe de Estado de 1964, que quase se repetiu com sucesso em 8 de janeiro de 2023, com Lula já eleito contra toda uma máquina de dinheiro e fraudes para que Bolsonaro e sua casta de militares e empresários seguissem no poder, quando vejo um equívoco desse em nosso governo, me dá um aperto no coração, uma dor no peito, que não me mata porque me acostumei a isso ao viver entre lutas, vitórias e derrotas por quase três décadas de movimento sindical e político.

José Martí,
Apóstolo da Independência.

Não se pode negar ou esconder o passado, ainda mais quando vivemos uma era onde as falsas narrativas estão vencendo o tempo inteiro porque os meios pelos quais a população mundial tem acesso a informações e desinformações são os meios concentrados das big techs, que fazem parte da guerra cultural mundial do 1% contra os 99%.

Museo de la Denuncia, La Habana.

Viva Cuba e sua aposta na educação e na preservação da história de lutas de seu povo!

Aliás, não deixem de visitar em Havana o Centro Fidel Castro Ruz e o Memorial da Denúncia, são espaços fantásticos de educação e história.

Centro Fidel Castro Ruz, Havana.

E viva o Brasil e o povo brasileiro, viva o presidente Lula, que tenho como a maior figura política de nossa história!

Viva Lula e o povo brasileiro!
Foto: Ricardo Stuckert.

Mas temos que falar e refletir sobre a história para aprender com ela e a partir das referências históricas nos organizarmos para enfrentar os novos desafios pela manutenção dos direitos do povo e pela manutenção de algo que se possa chamar de democracia, não a democracia dos donos do poder econômico, pois isso nunca foi democracia.

William Mendes


Post Scriptum: na minha opinião, o governo Lula está sob ataque organizado da extrema-direita neste momento (guerra híbrida) e acho que Lula tem que ir pra cima e nos chamar para os embates com a direita fascista. A economia cresceu, direitos sociais estão voltando, emprego aumentando e a democracia está sendo exercida. Pra cima deles, Lula!

Post Scriptum II: o texto anterior sobre as viagens a Cuba pode ser lido clicando aqui.


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